Zéh Palito na Simões de Assis, SP

30/mar

 

 

A exposição “Eu sei por que o pássaro canta na gaiola” é a primeira individual do artista visual Zéh Palito (1986, Limeira), em São Paulo, realizada na Simões de Assis, Jardins, São Paulo SP. Introduzido à prática artística por meio do graffiti/pixação, teve ainda jovem aulas de pintura, por estímulo de sua mãe, após um acidente andando de skate. Posteriormente, viria a estudar Design Gráfico e Belas Artes, formação essa que lhe deu a oportunidade de viajar o mundo e exibir suas obras em mais de 30 países.

O primeiro verso do poema “Sympathy”, de 1893, publicado por Paul Laurence Dunbar (1872, Dayton – 1906, Dayton) – primeiro poeta afro-americano a ter destaque nos Estados Unidos e Inglaterra -, expressa, em tom sombrio, a situação dos negros na sociedade americana do final do século XIX e faz uma alusão à falta de plenitude. Tal poema inspirou o título da primeira autobiografia da poeta afro-americana Maya Angelou (1928, St. Louis – 2014, Winston-Salem) na qual retrata parte de sua infância difícil vivida em uma cidade sulista nos anos 30 e 40 durante o período da segregação. Por consequência, também inspirou o título desta exposição.

Nas pinturas apresentadas vemos representações de pessoas negras em poses altivas, com roupas elegantes, com logotipos de marcas conhecidas, em locais triviais como praias, piscinas, em frente a automóveis ou mesmo em fundo e de forma bastante positiva, trazendo aos retratados humanidade. Zéh nos confronta com pinturas-exaltação, pessoas plenas, autoconfiantes e resolvidas, imagens positivas, em contraste com as imagens criadas nos últimos séculos, nas quais a população negra majoritariamente era representada em situações que corroboram o trauma da colonização.

Em uma das telas da mostra está representado um casal na praia, tendo o rapaz estampados em sua sunga dois botos-cinzas, símbolo da cidade do Rio de Janeiro. Outros elementos que remetem à capital carioca – local onde ocorreu o maior aporte de pessoas negras escravizadas na história da humanidade -, são o popular biscoito de polvilho Globo e a canga com o desenho da bandeira nacional, mas nas cores verde, rosa e branco. A flâmula é semelhante àquela que apareceu no desfile campeão do carnaval carioca de 2019 da Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira, cujo o lema positivista francês “ordem e progresso” foi substituído por “índios, negros e pobres”. Tal samba enredo do carnavalesco Leandro Vieira (1983, Rio de Janeiro) homenageou figuras populares brasileiras importantes, porém ainda não reconhecidas pela narrativa hegemônica como Carolina Maria de Jesus (1914, Sacramento – 1977, São Paulo) e Marielle Franco (1979-2018, Rio de Janeiro).

Em ação semelhante, o artista utilizou-se de nomes ainda pouco citados nos livros de história e na academia como títulos de suas obras. Temos homenageadas Maria Firmina dos Reis (1822, São Luís – 1903, Guimarães) escritora, compositora e abolicionista, considerada a primeira romancista brasileira, representada violentamente por anos como uma mulher branca; e Laudelina dos Santos Mello (1904, Poços de Caldas – 1991, Campinas) pioneira na luta pelo direito dos trabalhadores domésticos no Brasil, militante da Frente Negra Brasileira e participante do Teatro Experimental do Negro (TEN), iniciativa do artista plástico, ativista, escritor, dramaturgo, ator, diretor de teatro, poeta, jornalista e professor universitário Abdias Nascimento (1914, Franca – 2011, Rio de Janeiro). A tela intitulada Leide Maria (1961, Ivaiporã), trabalhadora do lar e artesã, é uma homenagem à mãe do artista, que colaborou em outra pintura intitulada “Nosso Sonho” com a feitura de fuxicos de tecidos encerados coletados por Zéh nas suas viagens pelo continente africano como voluntário de projetos humanitários. Outro familiar homenageado é seu pai, Marcel Francisco (1962, Limeira), soldador automotivo aposentado. Na tela “O vaso de Marcel”, um rapaz em traje estampado com motivos de pássaros, referência aos cut-outs de Matisse, segura um vaso com flores semelhantes a bougainvilles.

Frequentes nas pinturas são as representações de frutas como cocos, melancias, bananas, abacaxis, mamões e plantas como helicônias, palmeiras e flores que remetem à tropicalidade. Elas aparecem junto às figuras humanas, ora adornando, ora como temas de estampas – porém, não menos dedicadas, muitas vezes ocupam posição central na composição. Informação relevante é o fato de o artista manter com seus pais, em paralelo ao ateliê de pintura, um jardim/pomar com plantio de diversas espécies, como por exemplo bananeiras (próximas a um muro rosa), bananas rosas (ornamentais) semelhantes às estampas do trajes de banho das moças na tela “Ubatuba ou Guarujá”, mangueiras, mamoeiros e bougainvilles.

Tais representações de frutas têm, na história da arte brasileira, um lugar importante, valendo lembrar de um dos primeiros pintores negros a ingressar na Academia Imperial de Belas Artes, o premiado Estevão Roberto da Silva (c.1844-1891, Rio de Janeiro), reconhecido por suas natureza-mortas. Há uma tela, em especial, intitulada “Garoto com Melancia”, de 1889 e hoje pertencente ao acervo da Pinacoteca do Estado de São Paulo, na qual um jovem negro aparece sorridente, sozinho, desfrutando da fruta diaspórica, originária do continente africano. Ela se relaciona com a pintura “Odin ordene o vento”, na qual um rapaz aparece próximo à mesma fruta, degustando um picolé e estampando em sua roupa a rosa-dos-ventos da Estrela (tradicional e elitista fábrica de brinquedos brasileira), além de estar rodeado de brinquedos populares como bolinha de gude, pipa e estilingue.

Ainda na mesma pintura, podemos identificar diferentes tons de preto na pele do rapaz, além da cor ocre que cria efeito de douramento. Os olhos do personagem parecem flutuar em um fundo negro, relacionando-se à prática do afro-americano Kerry James Marshall (1955, Birmingham), que produziu nos anos 80 pinturas tonais pretas ligadas à temática do homem invisível, nas quais, à primeira vista, só são identificados os olhos e dentes. Depois, porém, com uma análise mais atenciosa, era possível observar as variações da cor preta nas definições do corpo. Essa é uma provocação à inviabilização dos sujeitos e da produção cultural negra. Ironicamente, uma dessas telas ficou por mais de 25 anos no banheiro da casa de um colecionador, e agora é uma das obras fundamentais da pintura ocidental.

As obras dessa exposição, apesar de bastante coloridas – evocando alegria -, carregam aspectos políticos pertinentes e também falam de traumas, dores. Talvez, o pássaro enjaulado que canta seja uma metáfora do momento em que estamos, no qual perdura uma pandemia ainda fatal, guerras, governos autoritários alinhados à necropolítica, privação de direitos básicos. E, mesmo assim, seguimos nossas vidas. Ou esse mesmo pássaro de viver restrito já não se lembra, ou até nunca gozou de sua plenitude, alienado.

Ademar Britto Jr

 

Para Hilda Hilst

 

 

A Biblioteca Mário de Andrade –  BMA, Praça da República, instituição da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, abre a exposição “3 X HILDA”, conceituada por Jurandy Valença e sob curadoria de Maíra Endo. A mostra é composta por 21 trabalhos em técnicas e suportes diversos como aquarelas, técnica mista, e pintura a óleo de Beatriz Abdalla, Egas Francisco, Olga Bilenky, desenhos originais de Hilda Hilst além de um exemplar original de Oswald de Andrade do livro “Poesias Reunidas”, 1 º edição com dedicatória.

No ano da comemoração do centenário da Semana de Arte Moderna de 1922, a Biblioteca Mário de Andrade abriga uma homenagem a Hilda Hilst (1930 – 2004), um dos nomes mais consagrados da literatura brasileira e herdeira do modernismo. Uma referência da literatura brasileira, Hilda Hilst não estava presente na Semana de 22 mas sua relação com o modernismo é palpável. Conheceu e tornou-se amiga de Oswald de Andrade nos anos de 1920 e, anos depois, é por ele citada mesmo antes de publicar seu primeiro livro. O espírito estava presente.

A exposição “3 X Hilda” exibe uma característica de Hilda pouco conhecida: “a da escritora que também desenhava e que manteve em vida uma estreita aproximação não só com as artes visuais mas com vários artistas com os quais conviveu desde a década de 1950”, explica Jurandy Valença. Aos cinco desenhos de sua autoria, juntam-se imagens, desenhos e pinturas de autoria de três artistas visuais, de diferentes gerações: Beatriz Abdalla, Egas Francisco e Olga Bilenky, os dois últimos a conheceram e com ela conviveram.

Na mostra, Hilda Hilst é exibida por ângulos diferentes, vertentes mais delicadas, humanas e carinhosas. Olga Bilenky, amiga que com ela manteve contato desde os anos 1970 até sua morte, hoje mora e trabalha na Casa do Sol – sede do Instituto Hilda Hilst, e sua pintura com cores fortes e mais escuras apresenta animais, mandalas, a casa com seus muros e jardins, trazendo uma Hilda mais íntima. As pinturas de Egas Francisco, expressionistas, registram além do retrato da autora, pois “elas também parecem atravessar sua carne para alcançar a alma”, explica Valença. E por fim Beatriz Abdalla, mineira radicada em Campinas, não conheceu Hilda em vida, mas após uma imersão de sete meses em sua obra criou uma série de desenhos feitos com aquarela, nanquim, lápis de cor e caneta, itens semelhantes aos usados por Hilda. “Beatriz evoca o universo mágico, alquímico e cabalístico da autora, exibindo uma Hilda Hilst que sempre teve a escrita como uma grande alquimia”, elucida Jurandy Valença.

No dia da abertura de “3 X HILDA” a BMA apresenta mais um evento:

Das 11 às 13hs, uma conversa aberta ao público com participação dos três artistas convidados – Beatriz Abdalla, Egas Francisco, Olga Bilenky – e curadora – Maíra Endo, com mediação de Roberta Ferraz. Na ocasião, vão dialogar sobre a relação e convivência com a autora homenageada, e como ela influenciou e inspirou suas respectivas produções.

Complementando com ações sobre o tema, nos dias 13 e 27 de abril, sempre às 19h, será exibido o filme “HILDA HILST PEDE CONTATO”, com direção de Gabriela Greeb. Misturando diferentes estilos narrativos, ficção com realidade e de forma não linear, o filme explora o cerne do pensamento hilstiano e diferentes elementos da obra da autora. Hilda Hilst, poeta paulista falecida em 2004 e uma das mais importantes vozes da literatura brasileira, volta para a Casa do Sol, chácara onde vivia em Campinas, e convida intelectuais, pensadores, poetas e amigos para um encontro com o objetivo de estabelecer contato entre os vivos e os mortos.

 

De 02 de abril a 01 de maio.

 

 

Marcel Broodthaers: Décor

 

Marcel

 

Venho usando telas fotográficas, filmes e slides para estabelecer relações entre o objeto e a imagem desse objeto, além das relações que existem entre o signo e o significado de um objeto particular: a escrita.

M.B., 1968

A Gomide&Co, Jardins, São Paulo, SP, apresenta “Marcel Broodthaers: Décor”, primeira exposição individual do artista belga em galeria comercial no país, abarcando cerca de doze anos de um processo criativo marcado pela crítica institucional e a crítica da representação. Pouco conhecido no Brasil, o artista foi mostrado em duas notáveis ocasiões: na 22ª Bienal de São Paulo, em 1994, com curadoria de Nelson Aguilar, e na 27ª edição do mesmo evento, em 2006, com curadoria de Lisette Lagnado, em homenagem aos trinta anos de sua morte. Repetição e rasura; escritura e imagem; cânones e ficções. Na aparente oposição desses termos, é possível localizar alguns dos principais traços que constituem o horizonte conceitual da produção de Marcel Broodthaers (1924-1976). Com grande dose de ironia, colocou em evidência a questão do gosto e a subscrição de uma assinatura. Sabendo que a finalidade dessa invenção burguesa sempre visou forjar uma ideia de singularidade, resolveu associá-la com o seu princípio o oposto, o da tiragem ilimitada, no título “La Signature”, série 1, Tirage illimité (1969) – que, em contrapartida, se refere a um trabalho ele mesmo de tiragem limitada. Broodthaers foi poeta até sua entrada estratégica no campo das artes visuais com “Pense-bête” (1964), primeiro trabalho escultórico a partir de seu livro de poemas que, imobilizados em gesso, adquirem tridimensionalidade. Desde então, a poesia visual nunca mais será a mesma. Suas experimentações incidem, de saída, sobre a banalidade da cultura cotidiana, como vemos em trabalhos com panelas, frigideiras, carvão, mexilhões, cascas de ovo etc. Ainda que o pintor René Magritte (1898-1967), célebre artista belga com quem estabeleceu intenso diálogo, também tenha questionado a relação entre as palavras e as coisas, Broodthaers irá expandir esta reflexão para fora dos conhecidos limites do quadro. Em meio aos convulsivos eventos de Maio de 1968, Broodthaers participou, com outros artistas, da ocupação do Palais de Beaux Arts de Bruxelas, cujo intuito consistia em contestar o papel daquele museu na capital, ou seja, a relação entre arte e sociedade. A partir disso, resolve fundar, em sua casa, o Musée d’Art Moderne – Département des Aigles, seu projeto mais complexo e hoje um divisor na história da arte do século 20. Estruturado em doze seções, esse “museu fictício” tem seu encerramento decretado em 1972. Durante os cinco anos de existência, em paralelo às seções de seu museu (1968 – 1972), o artista produziu as placas industriais que constituem uma parte importante de sua obra. Broodthaers dedicou todo esse período a legitimar e denunciar, simultaneamente, o funcionamento das coleções e os mecanismos arbitrários do papel da instituição e, em última instância, da Arte. O aparato institucional da Arte seria identificado, assim, a partir de uma série de interdições e elementos operacionais que o constituem. Daí a produção de placas que emulam o sistema de sinalização, como as setas em Museum – musée, Section Cinéma (1971) que, espirituosamente, apontam para direções opostas. Os convites das inaugurações permitem acompanhar o perfil de sua missão, como em seu Musée d’Art Moderne, Département des Aigles, Section Cinéma (1971). Ainda na chave institucional, Marcel Broodthaers introduziu o conceito de Décor, fazendo de cada exposição uma obra em si – donde o desafio constante de reunir peças soltas que possam ser novamente apresentadas como um conjunto organizado. Não seria exagero afirmar que o artista foi um exhibition maker, alguém que dominou tão profundamente a arte do display que conferiu à exposição um estatuto de linguagem, chegando a inserir trilhas sonoras para conectar palavras, objetos, palmeiras no espaço etc. Entre os trabalhos mais representativos desse momento de sua produção, figuram “Un Jardin d’Hiver” e “Ne dites pas que je ne l’ai pas dit”, ambos de 1974. Este último, consiste no arranjo entre uma gaiola com um papagaio-cinzento vivo, duas palmeiras e uma mesa sobre a qual vê-se o catálogo de uma exposição de 1966 que reproduz seu texto “Ma Rhétorique”, que, por sua vez, ecoa em uma gravação em que ouvimos o artista dizer: “Je tautologue. Je conserve. Je sociologue. Je manifeste manifestement.” (Eu tautologo. Eu conservo. Eu sociólogo. Eu manifesto manifestamente). Texto e voz, objeto e imagem, bicho e planta sintetizam o esforço de Broodthaers em explodir os sentidos e abraçar trabalhos multimídia. Sobre isso, o artista comentaria: “Tenho procurado reacomodar objetos e pinturas, que foram feitos entre 1964 e este ano, com o objetivo de formar nas salas um espírito décor. Ou seja, com o objetivo de restituir uma função real ao objeto ou à pintura. O Décor não é um fim em si.”¹

Marcel Broodthaers criou para si um sistema de signos recorrentes a partir de elementos que serão recombinados em diferentes suportes e situações. É o caso das moules – palavra ambígua que, em francês, designa tanto mexilhões como moldes – e das cascas de ovo que aparecem em diversas obras tanto apropriadas in natura como desenhadas, fotografadas ou escritas em textos. Outros exemplos podem ser encontrados nas cores da bandeira da Bélgica e no carvão de “Trois tas de charbon” (1966 – 67). A repetição de imagens variadas de uma mesma figura em “Bateau Tableau”, que consiste em 80 slides projetados, e o livro e filme “A Voyage on the North Sea” ambos de 1973, operam uma espécie de reunião iconográfica (pintura, fotografia e filme) de um mesmo motivo – uma pintura do século XIX – para construir uma imagem relacional e temporalizada: um barco ao mar.

Venho usando telas fotográficas, filmes e slides para estabelecer relações entre o objeto e a imagem desse objeto, além das relações que existem entre o signo e o significado de um objeto particular: a escrita.

M.B., 1968

A poesia visual acompanhou a produção de Marcel Broodthaers ao longo de toda a sua trajetória. Seu interesse pela linguagem escrita seguiu sendo nutrido e exercitado sobretudo através de trabalhos em que aproximações entre palavra e referente são tensionadas de maneiras diversas: seja em uma espécie de investigação da correspondência entre o elemento nomeado e o termo que o designa, como quando repete incessantemente a palavra pot (pote, recipiente) e desenha ao lado um pot; ou em uma espécie de exercício de confusão das correspondências quando escreve a palavra moules ao lado de imagens de ovos. Já a imbricação da gestualidade com a escrita se vê tanto na sua caligrafia por vezes trêmula, rasurada e errante, quanto em trabalhos como “La Pluie” (Projet pour un texte) (1969), em que, debaixo de um temporal, a escrita se resume ao ato, já que quem escreve tem suas palavras diluídas e apagadas pela chuva, mas persiste no gesto. Há, ainda, um frequente jogo entre o significante e o significado, como em “Les Poissons” (1975) quando, sobre a tela, vemos os nomes dos elementos que ali estariam retratados, e não a sua forma, incluindo supostos intrusos em meio aos “peixes”, notadamente o “ovo” ao lado dos “arenques”. Ao ser questionado por seu editor acerca do motivo de publicar um livro, Broodthaers respondeu: “Para fazer dedicatórias e estabelecer essa relação arte/mercadoria.” Este diálogo integra a folha colada nas páginas iniciais da obra “Vingt Ans Après”, de Alexandre Dumas, escrito em 1845, do qual Broodthaers se apropria em 1969 adicionando uma cinta com seu nome e o de seu editor sobre a capa da edição de bolso de Dumas. Segundo Rosalind Krauss, se devêssemos nomear o principal medium de Broodthaers, seria a ficção.² Não se trata de mera coincidência, portanto, que o artista se valha de um romance do século XIX para intervir no imaginário da criação. Se o romance foi o “suporte técnico através do qual a ficção virou convenção durante o século XIX”³, o artista amplificou seu campo especulativo, já que, usando suas palavras, “a ficção nos permite compreender a realidade e, ao mesmo tempo, o que ela esconde.”

O caráter inesgotável dos problemas abordados por Marcel Broodthaers em sua obra é o que nos convida à viagem: é como se, de alguma forma, estivesse tudo ali. Sempre bom lembrar quão carregada de humor é essa produção, conferindo leveza ao estranhamento que pode provocar. Seu recado não poderia ser mais jocoso:

“À mes amis,

… peuple non admis. On joue ici tous les jours, jusqu’à la fin du monde.”

M.B., 1968 ⁴

 

¹ Marcel Broodthaers, L’Angélus de Daumier, vol. II, 1975.

² Rosalind Krauss, A Voyage on the North Sea: Art in the Age of the Post-Medium Condition, 2000.

³ Idem

⁴ “Aos meus amigos, … pessoas não permitidas. Aqui brincamos todos os dias, até o fim do mundo.”

 

Até 28 de maio.

 

Lenora de Barros no MAM-SP

29/mar

 

 

A partir do dia 02 de abril, o MAM-SP, Parque do Ibirapuera, apresenta a instalação “Retromemória” de Lenora de Barros, trabalho desenvolvido especialmente para a Sala de Vidro a convite de Cauê Alves, curador chefe do museu.

A instalação estabelece um diálogo direto com a obra Spider (Aranha), concebida por Louise Bourgeois em 1996, que foi exibida no MAM São Paulo por cerca de 20 anos nesse mesmo espaço.

Em “Retromemória”, as imagens refletidas pelos espelhos junto às palavras escritas com a mão direita e esquerda simultaneamente, são fragmentadas em sílabas impressas em vinil formando a grande aranha de metal, que reflete a memória do local diante do seu diálogo artístico com Louise Bourgeois. O trabalho é composto também por uma instalação sonora que ecoa a voz da própria artista Lenora Barros, proferindo as palavras “memória”, “aranha”, “emaranha” repetidamente. Ao se entrelaçarem, essas palavras produzem novos sons e sentidos como uma teia dominando o espaço. O gráfico e o fonético da palavra se aproximam da dimensão verbivocovisual inventada pelo poeta irlandês James Joyce. O tratamento sonoro é assinado pelo compositor e produtor cultural Cid Campos.

Para o curador-chefe Cauê Alves, “…no momento em que o MAM apresenta em sua programação a segunda geração da arte moderna e a abstração geométrica, Lenora de Barros nos faz pensar sobre as obras que já foram exibidas no museu, nos ajudando a superar as perdas e enfrentar os desafios do presente.”

“A estrutura silábica representa esses fragmentos de memória, e no caso deste trabalho, remete diretamente à memória da Aranha de Louise. A expressão na caligrafia, na projeção de luzes e reflexos, além da dimensão sonora criada, formam essa teia pelo espaço expositivo”, comenta Lenora de Barros.

Três eventos

28/mar

 

 

Uma experiência compartilhada: Ateliê de Gravura da Fundação Iberê Camargo

A partir 29 de março, o público poderá visitar a nova exposição na galeria do Instituto Ling, Porto Alegre, RS. Trata-se de um recorte da “Coleção Ateliê de Gravura da Fundação Iberê Camargo”, resultado do projeto Artista Convidado, em atividade na instituição desde o ano de 2001, sob a coordenação do curador desta mostra, Eduardo Haesbaert, que foi assistente e impressor de Iberê Camargo (1914-1994). Em forma de residência, artistas de projeção nacional e internacional experimentaram a gravura, muitos deles pela primeira vez, e produziram obras inéditas criadas a partir de suas poéticas. A tradução dessa experiência é, agora, compartilhada, numa parceria entre o Instituto Ling e a Fundação Iberê Camargo, que apresentam vinte e sete artistas desse acervo, incluindo o próprio Iberê Camargo. As visitas acontecem com ou sem mediação. Em 29 de março, 10h30min.

 

Ciclo de debates

O Museu Depois

Ling aquece Noite dos Museus

No último encontro do ciclo de debates “O Museu Depois: qual será o papel das instituições culturais no pós-pandemia?”, o pesquisador e crítico de arte Paulo Herkenhoff e a diretora do IEAVi e do MACRS, Adriana Boff, serão os convidados para falar sobre as instituições culturais de hoje e amanhã. A mediação será do jornalista cultural Roger Lerina. O bate-papo será aberto ao público, no auditório do Instituto Ling. Para participar, basta fazer um breve cadastro em nosso site. As vagas são limitadas, de acordo com a capacidade do espaço. O encontro faz parte da programação “Ling Aquece Noite dos Museus”. Outras atividades já estão previstas nosso calendário da instituição. A entrada é sempre gratuita. Em 30 de março, 19h.

 

Guilherme Dable e Ricardo de Carli/Performance Sonora

Dentro da programação “Ling Aquece Noite dos Museus”, Guilherme Dable e Ricardo de Carli apresentam uma performance sonora inédita. Usando baixo, bateria, sintetizadores e outros objetos, a intervenção foi pensada especialmente para a galeria do Instituto Ling e dialogará com a exposição em cartaz. A atividade será aberta ao público. Para participar, basta fazer um breve cadastro no site do Ling. As vagas são limitadas, de acordo com a capacidade do espaço. O encontro faz parte da programação “Ling Aquece Noite dos Museus”. Entrada gratuita. 01 de Abril, 20h30min.

Na Gentil Carioca, SP

25/mar

 

A Gentil Carioca, Higienópolis, São Paulo, SP, convida a todes para os últimos dias da exposição “O Perde”, de Renata Lucas, no fim de semana de 26 e 27 de março.

A artista definiu seu campo de ação com a colocação de uma mesa de sinuca num estacionamento desativado na vila. Atualmente fechado, como quase tudo no entorno, o estacionamento se situa no ponto equidistante entre a galeria e o Cemitério da Consolação. A bola que se joga aqui cai também em outra parte: a mesa instalada no estabelecimento ocioso se oferece como divisa entre mundo operante e mundo inoperante, num jogo de vida e morte.

A mostra integra os circuitos SP-Arte Weekend, que nos dias 26 e 27 reúne as principais galerias do Centro e Barra Funda, e “Arte Caminha”, que traça um circuito cultural para ser feito a pé, de Higienópolis à República, materializado através de um mapa impresso que estará disponível para distribuição gratuita nos endereços das galerias participantes. Como parte da programação, Renata Lucas também participa do arte passagem na Praça da República, 177, com uma intervenção na vitrine da loja 7 do Edifício Eiffel.

A artista estará presente na galeria no dia 26, sábado, das 16h às 18h.

 

Adriana Varejão na Pinacoteca do Estado

 

 

A Pinacoteca de São Paulo, museu da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, apresenta ”Adriana Varejão: Suturas, fissuras, ruínas (Adriana Varejão: Sutures, Fissures, Ruins), exposição panorâmica de Adriana Varejão, Rio de Janeiro, 1964. A mostra é a mais abrangente já realizada sobre o trabalho da artista, reunindo, pela primeira vez, um conjunto significativo de mais de 60 obras, desde 1985 até 2022.
O diretor-geral da Pinacoteca de São  Paulo,  Jochen Volz,  assina a curadoria da exposição. A seleção dos trabalhos propõe uma narrativa da obra de Adriana Varejão, uma das artistas brasileiras mais potentes da atualidade, que evidencia a diversidade e a complexidade de sua produção.
Sua obra põe em pauta o exame reiterado e radical da história visual, das tradições iconográficas europeias e das convenções e códigos materiais do fazer artístico ocidental. Desde suas primeiras pinturas barrocas, a superfície da tela nunca é mero suporte; ao contrário, é um elemento essencial da mensagem da pintura. O corte, a rachadura, o talho e a fissura são elementos recorrentes nos trabalhos da artista desde 1992, sem medo da ruptura e da experimentação.
A exposição evidencia essas características e o corpo de obras ocupa 7 salas da Pinacoteca assim como o Octógono. A curadoria inclui desde as primeiras produções, da década de 1980, quando artista ainda estudava na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio de Janeiro, como as pinturas ”A praia”, “O fundo do mar” e “O Universo”, todas de 1985, até as recentes pinturas tridimensionais de grande escala da série ”Ruínas de charque”.
Inéditos
Para o Octógono, espaço central da Pinacoteca, serão apresentados 5 trabalhos dessa série. Dois inéditos que foram produzidos especialmente para esta exibição: ”Moedor” (2021) e ”Ruina 22″ (2022). Um terceiro destaque deste conjunto é ”Ruína Brasilis” (2021), generosamente doado pela artista para a coleção da Pinacoteca de São Paulo e esteve em sua última exposição em Nova York no ano passado.
Importante destacar que muitas das obras desta mostra tiveram pouca ou quase nenhuma visibilidade no Brasil, ganhando rumos internacionais quase que imediatamente após a sua realização. É o caso de “Azulejos” (1988), primeiro trabalho em que Varejão usa como referência um painel de azulejaria portuguesa, encontrado no claustro do Convento de São Francisco, em Salvador.
A tela, que pertence a uma coleção europeia, antecede os seus famosos “azulejos” que acabaram se tornando um fio condutor para tantas outras peças, aparecendo como suporte, geometria ou objeto pictórico. Dada a importância desta matéria em sua trajetória, uma das salas da exposição está   dedicada as pinturas influenciadas pela azulejaria portuguesa, entre outras a instalação “Azulejões” (2000) com 27 telas de 100x100cm cada uma.
“O que para mim é latente nesta mostra é a maneira como Adriana Varejão trabalha com a pintura pois, desde o início, ela segue uma direção que vai além da bidimensionalidade da tela, usa elementos que rompem a matéria; são frestas, cortes, vazamentos que descortinam uma situação e dão um novo significado, como por exemplo as “vísceras” e “carnes” que se derramam em muitos dos seus trabalhos”, afirma Jochen Volz.
Dentre as que mais exemplificam essa expansão física da obra para o espaço, são as da série das “3 grandes Línguas”, produzidas em 1998, que serão exibidas lado a lado pela primeira vez: ”Língua com padrão em X”, “Língua com padrão de flor” e “Língua com padrão sinuoso”.
Na exposição, as três Línguas são apresentadas ao lado das pinturas ”Comida” (1992), ”Azulejaria de cozinha com caças variadas” (1995) e ”Azulejaria de cozinha com peixes” (1995), entre outras. Num diálogo potente, o espectador se vê lançado entre o suporte, o fundo e as figuras das pinturas.
Em um dos períodos de relevo da mostra, entre 1992 e 1997, Adriana Varejão se dedicou ao que podemos chamar de uma série de ficções históricas, emprestando novos significados visuais a mapas, paisagens e interiores do passado colonial. Pode-se considerar que essas obras constituem a fase mais figurativa da trajetória da artista. Uma sala da exposição está dedicada a este conjunto de obras, entre elas se destaca a pintura ”Autorretratos coloniais” (1993) e, nela, a artista se apropria das tipologias de representação das “pinturas de castas” da América Espanhola para falar  de assuntos  relacionados à violência  da classificação racial.
A Pinacoteca de São Paulo e a exposição “Adriana Varejão: Suturas, fissuras, ruínas”  tem patrocínio da Siderúrgica Ternium, maior produtora de aço da América Latina e acionista da Usiminas  na cota Apresenta; B3 e Itaú na Cota Platinum; Mattos Filho e Verde Asset Management na Cota Ouro; Grupo Carrefour Brasil e Ageo na Cota Prata; e Magazine Luiza e Iguatemi na Cota Bronze.
De 26 de março a 01 de 01 de agosto.

Roberto Alban apresenta Adrianne Gallinari

21/mar

 

 

A Roberto Alban Galeria, Ondina, Salvador, Bahia, anuncia a exposição “Adrianne Gallinari: desenho+pintura”, primeira exposição individual da artista na galeria, com abertura no dia 24 de março. Natural de Belo Horizonte, MG, Adrianne Gallinari vive e trabalha entre Salvador, São Paulo e a capital mineira. Em “desenho+pintura”, a artista apresenta um conjunto de vinte e oito pinturas, em diferentes formatos, e um desenho em grande escala, realizado em 2018 e exibido recentemente em São Paulo na Casa de Cultura do Parque. 

Formada pela renomada Escola Guignard, na capital mineira, Gallinari é expoente de uma geração cuja aparição no circuito da arte contemporânea aconteceu ainda na década de 1980, incluindo nomes como os de Cao Guimarães, Rivane Neuenschwander, Rosangela Rennó, Alexandre da Cunha e outros. A artista integra importantes coleções institucionais como a do Itaú Cultural (São Paulo), Coleção Madeira Corporate Service (Ilha da Madeira, Portugal), Museu de Arte da Pampulha (Belo Horizonte, Minas Gerais) e Banco de Espanha (Madrid, Espanha).

Ao longo de sua trajetória, teve importantes exposições individuais em espaços como o The Drawing Center, em Nova York e participou de prestigiadas mostras como a Bienal de Pontevedra, com curadoria de Maria de Corral, além de exposições coletivas como Ordenação e Vertigem (curadoria de Agnaldo Farias, CCBB-SP), Desenhos A-Z (curadoria de Adriano Pedrosa) e a exposição paralela à Bienal de São Paulo de 2008 (curadoria de Rodrigo Moura).

Adrianne Gallinari também foi contemplada com prêmios como “Aquisição”, no XXII Salão Nacional de Arte, no Museu de Arte da Pampulha (Belo Horizonte, Minas Gerais, 1991); “Programa de Bolsas para Artistas Jovens Guillermo Kuitca” (Buenos Aires, Argentina, 1997); e “Primeiro Prêmio” na I Bienal Bridgestone Centro Cultural Borges (Buenos Aires, Argentina, 2000).         

Tal como o título da presente exposição, a prática da artista mineira debruça-se, majoritariamente, sobre o desenho e a pintura, explorando as potencialidades e interseções destes suportes artísticos. Ainda em seus anos de formação, Adrianne Gallinari encontrou no desenho a porta de entrada para o aprofundamento de sua obra, através de uma rigorosa e intensiva prática em diferentes suportes, como o papel, tecidos e o próprio espaço arquitetônico.

Foi da extensa prática no campo do desenho que, ainda no início de sua produção, Adrianne Gallinari migra para a pintura, transitando até hoje entre os dois meios com uma singular desenvoltura e apuro técnico. Obra de 2018, o grande desenho presente na exposição consiste em um enorme tecido estendido na parede do espaço expositivo, sobre o qual a artista traceja – numa espécie de ordenamento obsessivo e delicado – pequenos traços em crayon. Ainda que pensado em uma grande escala, o painel revela as minuciosas intenções gráficas da artista, em que as leituras sistematicamente formadas parecem desvelar as próprias imperfeições da parede que a obra esconde. A percepção visual criada, assim, é a de um trabalho laborioso e repetitivo, que investiga a organização do espaço da obra tal como se a artista estivesse esboçando um mapa mental.

Não por coincidência, as ranhuras se assemelham a uma escrita “rasurada” – dos pensamentos que não conseguem se traduzir apenas no plano do papel. E é neste intervalo das rasuras onde surgem formas abstratas, geométricas e visivelmente distintas, tal como atos falhos que se apresentam com mais lucidez do que aquilo que teria sido dito – escrito ou desenhado – conscientemente. Nas palavras do curador Agnaldo Farias, no texto curatorial que acompanha a mostra, “Na obra da artista, o desenho é o seu ponto de partida. Sempre. Mesmo estando circundado por pinturas dotadas de cores suaves e iluminadas, paisagens embaciadas por névoas, ou acesas, recém despertas pelo sol da manhã ou, ainda, resistindo à despedida da luz, quando da chegada da noite, mesmo assim, o desenho fala mais alto, até porque, nessas pinturas, ele também é protagonista.”

Já em suas pinturas, realizadas desde pequenas escalas até formatos médios e grandes, a artista explora diferentes noções e nuances da ideia de paisagem. Temática amplamente explorada ao longo da história da arte, a pintura de paisagem aparece na obra de Gallinari dotada de um léxico que remete, ao mesmo tempo, à tradição destes tipo de pintura quanto a uma radical contemporaneidade.

Suas paisagens situam-se em um campo híbrido entre a figuração e a abstração, através do uso da tinta acrílica e de pinceladas que ora nos revelam montanhas, traços de vegetação e outros elementos típicos do gênero. Os espaçamentos em branco de suas telas valorizam suas escolhas cromáticas, que vem a compor as delicadas figuras e paisagens que pinta, criando uma sensação harmônica entre áreas de respiro e áreas de intenso trabalho sobre a tela.

A artista cria assim um certo sentido de uma totalidade visual, em que toda a superfície da tela compõe este conjunto híbrido entre abstração e figuração: uma justaposição entre planos distintos ao mesmo passo de uma ampla perspectiva unitária entre estes diferentes elementos.

Suas paisagens – frutos da vivência e da memória destes espaços, ao longo de sua vida – revelam a aparição de ramos, árvores, campos e montanhas que dividem o espaço visual com delicadas figuras humanas, gerando um pertencimento entre homem e natureza,  através de um jogo entre aparição e desaparecimento, pintura e também subtração do plano pictórico. Tal aproximação também é realizada a partir do uso de desenhos geométricos semelhantes, permitindo uma potente convergência poética entre todos os elementos que habitam suas pinturas – a um só tempo impactantes e delicadamente articuladas.

A mostra continua até o dia 30 de abril.

Dois livros de artista

 

 

Os livros de artista “…Umas” de Lenora de Barros e “Búfala e Senhora das Plantas” de Rosana Paulino publicados por Familia Editions ganharam lançamentos na livraria Gato Sem Rabo e nessa ocasião houve uma conversa entre Lenora de Barros, Rosana Paulino e Maria Lago, editora da Familia Editions, mediada por Johanna Stein fundadora da Livraria Gato Sem Rabo, Vila Buarque, São Paulo, SP.

As artistas participam da 59ª Bienal de Veneza de 2022 na exposição principal “The Milk Of Dreams” com curadoria de Cecilia Alemani.

O livro de artista “…Umas” é a reprodução fac-similar de uma seleção das colunas experimentais que Lenora de Barros publicou no “Jornal da Tarde” entre 1993 e 1996. O projeto de livro surgiu da colaboração entre Lenora de Barros e a editora Maria Lago como resultado de conversas sobre o desejo da artista de reproduzir e registrar, fora do âmbito do arquivo do jornal, algumas das colunas originais.

O livro “Búfala e Senhora das Plantas” de Rosana Paulino surge do diálogo entre a artista e a editora Maria Lago sobre a relevância do desenho e sua reprodução em publicações em projetos especiais, onde se trata o valor do desenho como obra, não somente como processo.

Novidade da Gomide&Co

17/mar

 

 

A galeria Gomide&Co, Jardins, São Paulo, SP, anuncia com grande entusiasmo a representação do artista português Tiago Mestre (1978). Radicado em São Paulo há cerca de doze anos, o artista desenvolve o seu trabalho entre a pintura, a escultura e a instalação, meios pelos quais explora questões que relacionam a sua formação inicial em arquitetura com a discursividade da arte contemporânea.

Valendo-se de materiais diversos, Mestre constrói um universo que responde, através da arte, à dimensão retórica dos projetos arquitetônicos e artísticos da modernidade (e seus desdobramentos em nossos dias). O carácter impreciso (e por vezes ambíguo) das suas esculturas e pinturas nos remetem frequentemente para um olhar que atravessa a relação primordial do homem com a natureza e toda a vasta cultura material que daí surge. Não raro, contudo, o seu trabalho se desdobra em especulações voltadas para as relações tensas – mas sempre lúdicas – entre fundo e forma, superfície e estrutura, possibilitando assim uma alternância constante entre questões relativas à especificidade dos meios artísticos (por vezes técnicas ou funcionais) e um exercício de manutenção da liberdade de uma poética mais ampla que evoca outras práticas (cinema, literatura, música…).

“É na exposição que meu trabalho realmente acontece” – sublinha Tiago Mestre, querendo com isso dizer ser ali que o espaço do ateliê realmente termina, contando que muito do raciocínio do artista se vale dessa organização e edição da obra no espaço de apresentação. A exposição torna-se, em si, uma disciplina.

Tiago Mestre formula os seus “comentários do mundo” a partir de trabalhos que não se fixam em um estilo definitivo – cada projeto pode se inscrever em um campo de pesquisa temática e formal particular. A partir do trabalho dessa mão “não especializada”, mas disponível, o artista visa promover o que chama de “descontinuidade/clivagem do estatuto” da obra, possibilitando uma troca mais livre e intuitiva entre disciplinas artísticas, temporalidades históricas, dispositivos de apresentação e narrativas, em contraponto a uma discursividade mais linear e normalizada.