José Patrício sob curadoria de Paulo Herkenhoff

24/jul

O Paço Imperial, Centro, Rio de Janeiro, RJ, inaugura em 03 de  agosto, a exposição “Agitações pelo número”, exibição individual do artista José Patrício (1960, Recife), conhecido pela combinação de centenas e até milhares de peças de dominó que provocam um intenso efeito óptico. A mostra ocupará três salas no Paço Imperial com mais de 70 obras, em curadoria de Paulo Herkonhoff, com trabalhos criados principalmente nos últimos dez anos.

Colecionador de objetos e de arte popular, José Patrício trará de seu ateliê no Recife um armário-vitrine com obras de artistas do nordeste selecionadas por ele, e dispostas de acordo com sua autoria, forma ou cor. Peças de quebra-cabeças de plástico compõem a maioria das obras expostas, mas estarão também trabalhos feitos com dados, botões, dominós e também pastilhas de cerâmica provenientes de uma reforma em seu ateliê. Ao apontar o celular para as quatro obras “Vanitas QR Code” (2011-2018), em peças de quebra-cabeças de plástico sobre madeira, o público verá na internet a citação em latim “Sittibi terra Levis”: “que a terra te seja leve”.

“Agitações pelo número” ocupará as Salas Gomes Freire e sua antecâmara, e a Treze de Maio, no primeiro andar do Paço Imperial. José Patrício tem uma longa história de exposições no Paço Imperial, como as coletivas “Anna Maria Niemeyer, um caminho” (2012), “1911 – 2011: Arte brasileira e depois, na Coleção Itaú” (2011), “Tudo é Brasil” e “28º Panorama da Arte Brasileira” (2004), “Espelho cego: seleções de uma coleção contemporânea” (2001), e sua individual “Ars Combinatoria”, em 2001, em que fez uma instalação utilizando 2.500 jogos de dominó, cada um com 28 peças, totalizando 70 mil peças. José Patrício integra a Trienal de Tijuana (julho de 2024 a fevereiro de 2025), no México.

José Patrício diz que “é com alegria que retorno ao Rio de Janeiro para expor no Paço Imperial uma parte da minha produção, fruto de muitos anos de pesquisa e produção constante, baseada em princípios matemáticos e em sintonia com uma certa tradição construtiva da arte brasileira”, comemora. “Esta exposição apresenta uma série de obras que realizei nos últimos anos, a partir da curadoria de Paulo Herkenhoff, com ênfase no Número como elemento norteador da minha produção artística”, destaca.

O curador criou um percurso na exposição em que dispôs os trabalhos nas salas de acordo com suas séries, e escreveu textos que estarão nas paredes de cada um dos segmentos.

Até 20 de outubro.

Exposição Coletiva Diadorim

01/jul

A NONADA SP, Praça da Bandeira, Centro, São Paulo, SP, exibe até 21 de agosto a mostra  coletiva “DIADORIM”, sob curadoria de Guilherme Teixeira reunindo 17 artistas em torno de 19 obras que exploram temas como corpo, inadequação, pertencimento e gênero, utilizando diversas técnicas e suportes, incluindo pintura, escultura, fotografia, desenho, objetos, videoarte, performance e instalações, atualizando questões conceituais do clássico “Grande Sertão: Veredas” de João Guimarães Rosa, obra da qual a galeria retirou seu nome e conceito. A exibição permanecerá em cartaz até 31 de agosto.

Diadorim, um personagem que se veste como homem para acompanhar os cangaceiros e proteger-se, traz à tona discussões contemporâneas sobre construção de gênero e performance social. Esta narrativa literária oferece um ponto de partida para a reflexão sobre identidades de gênero e seus desdobramentos na sociedade atual.

Guilherme Teixeira, o curador, é reconhecido por seu trabalho que atravessa temas de identidade, sexualidade e pertencimento. A seleção de um grupo diversificado de artistas possibilitou a exibição de suas próprias perspectivas e experiências para o evento. Esta abordagem pluralista permite uma ampla gama de interpretações e provocações sobre as temáticas abordadas. Andre Barion, Andy Villela, Ana Matheus Abbade, Ana Raylander Martís dos Anjos, Amorí, Bruno Magliari, Rafaela Kennedy, Santarosa, Juno, Ode, Diambe, Daniel Mello, Domingos de Barros Octaviano, Linga Acácio, Flow Kontouriotis, Wisrah C. V. da Celestino e Nati Canto trazem uma diversidade de estilos e abordagens. A pluralidade de técnicas e temas reflete o compromisso da NONADA em proporcionar um espaço para a diversidade artística e cultural.

NONADA, cujo nome deriva de um neologismo criado por João Guimarães Rosa, tem como missão preencher lacunas na cena artística contemporânea, promovendo um espaço inclusivo e de experimentação. Seus fundadores, João Paulo, Ludwig, Luiz e Paulo, destacam que a NONADA é um espaço híbrido que acolhe, expõe e dialoga, oferecendo uma plataforma para trabalhos de alta qualidade que abordam temas políticos, identitários e de gênero, entre outros.

Dois artistas na Galatea Salvador

18/jun

A Galatea Salvador anuncia sua segunda exposição, intitulada “Bahia afrofuturista: Bauer Sá e Gilberto Filho”. A mostra se estrutura em dois núcleos distintos: no primeiro, fotografias de Bauer Sá (1950, Salvador, BA), produzidas entre os anos 1990 e 2000, exploram a potência da ancestralidade afro-brasileira através de figurações do corpo negro representado como protagonista da cena; no segundo, esculturas em madeira que retratam cidades utópicas e modernas imaginadas por Gilberto Filho (1953, Cachoeira, BA) se reúnem pela primeira vez de forma tão ampla em uma exposição, com obras produzidas desde 1992 até o momento atual.

Este diálogo entre os trabalhos dos artistas baianos cria uma rica narrativa visual, conectando ancestralidade e fabulação em torno de futuros possíveis. A exposição conta também com texto crítico do artista e curador Ayrson Heráclito, reconhecido por abordar símbolos e tradições vinculados à cultura afro-brasileira em sua obra, e Beto Heráclito, escritor e historiador.

Com abertura em 04 de Julho e duração até 28 de Setembro.

Waltercio Caldas em BH

14/jun

A individual “Mero Espaço”, de Waltercio Caldas, acaba de chegar à Albuquerque Contemporânea, em Belo Horizonte.

“Não há melancolia, há desconcerto” diz Luiz Camillo Osorio, referindo-se às obras recentes de Waltercio Caldas. Nos trabalhos do artista, as noções de tempo e espaço são exploradas com linguagem e rigor formal próprios. Diversas obras, diante da perspectiva tridimensional, exaltam a temporalidade, sugerindo movimentos e deslocamentos no espaço e provocando tensões, outra marca de seu percurso artístico.

Nesta mostra, Waltercio Caldas descarta as noções de desenho, pintura, escultura e objeto. Para ele, todos os trabalhos têm caráter tridimensional e convidam o espectador a estabelecer as relações entre os objetos: “A exposição só acontece se você estiver fisicamente, ela não se reproduz, ela não se transforma em imagem de vídeo ou celular. Ela propõe uma relação física das pessoas com os objetos que elas vão ver”, explica.

“Mero Espaço” descarta a ideia de “produção mais recente do artista” e apresenta mais de cinco décadas de trabalho de Waltercio Caldas. De acordo com o artista, a mostra não é o fim do trabalho, mas característica fundamental da própria obra.

Exposição individual de Fani Bracher

13/jun

A Galeria Evandro Carneiro Arte, Gávea, Rio de Janeiro, RJ, anuncia a Exposição Fani Bracher, que estará aberta ao público até 29 de junho. A mostra apresenta 29 obras da artista cuja trajetória reflete uma profunda conexão com as paisagens e a história de Minas Gerais. A individual apresentará quatro caixas-colagens, inéditas ao público, 14 grandes telas datadas em diversas fases e algumas gravuras feitas a partir de pigmentos e bordados sobre papel. Cada peça reflete a dedicação de Fani Bracher em explorar e reinterpretar as paisagens de Minas Gerais, oferecendo ao público uma visão única e poética do território mineiro. A curadoria é de Evandro Carneiro.

Fani Bracher é conhecida por reduzir a paisagem à sua estrutura mínima, utilizando céu, montanhas e árvores como elementos centrais de sua composição. Sua obra reflete a temporalidade e a história de Minas Gerais, frequentemente abordando as cicatrizes deixadas pela mineração na região. Durante a pandemia, Fani Bracher explorou novas dimensões cromáticas, inspirada pela delicadeza da chita e pela memória da casa verde de sua infância. Este período resultou em murais vibrantes e em uma série de caixas-colagens que utilizam materiais naturais como pigmentos, pedras, folhas e carvão, coletados em suas caminhadas pelos vales de Ouro Preto.

Sobre a artista

Paisagens imaginárias e memórias da mineração

Fani Bracher nasceu em uma Fazenda Experimental de Coronel Pacheco, Zona da Mata Mineira, onde seu pai era pesquisador da Embrapa. Cresceu feliz e passou sua primeira infância bem vivida, no campo e em família. Percebe-se aí uma ancestralidade rural e ligada às pesquisas do solo que retomaremos adiante, ao comentar a sua pintura. Aos nove anos, foi estudar no colégio interno Santa Catarina, em Juiz de Fora. Aos 17, cursou Comunicação na Federal dessa mesma cidade, onde conheceu o seu companheiro da vida inteira, Carlos Bracher. Em 1965, ainda namorados, Fani e Carlinhos – como o pintor é chamado por sua amada – fundaram a Galeria Celina, que marcou culturalmente uma geração de artistas e intelectuais mineiros. Em 1967 pintou seus primeiros quadros, paisagens rurais. No ano seguinte, ela e Bracher se casam e ele recebe o Prêmio de Viagem ao Estrangeiro pelo Salão de Belas Artes. Juntos, seguem para a Europa, lá vivendo por dois anos, principalmente entre Portugal e França, mas conhecendo outros lugares e sempre antenados às artes. Visitam todos os museus e fortalecem a relação.

Em seu retorno ao Brasil, decidem viver em Ouro Preto, MG, e ali estabelecem residência, família e laços culturais. Parceiros na vida e em suas obras, constroem juntos uma bonita jornada. O casal teve duas filhas, Blima e Larissa, entre 1972 e 1976 e alguns anos mais tarde, já maduros artisticamente e avós de Valentim, fundaram um centro cultural que dirigem até hoje: o Ateliê Casa Bracher. Nos anos 1970, Fani conseguiu conciliar a família com uma carreira de sucesso. Mulher forte, “espartana” como ela mesma se define, seguiu estudando, produzindo e participando de Festivais de inverno, Salões e Concursos Nacionais de Artes Plásticas, chegando a ganhar alguns prêmios, até realizar, em 1977, as suas primeiras exposições individuais, respectivamente em Viçosa e Juiz de Fora. Daí em diante não parou de produzir, expor seu trabalho em diversas mostras e receber premiações. É uma trajetória artística tão rica e volumosa que não caberia reproduzi-la no espaço gráfico deste folder. Ainda assim, destaco alguns marcos, sem com isso desmerecer quaisquer outros eventos: as exposições na Galeria Oscar Seráphico, DF, 1979; na Galeria Bonino, RJ, 1982, 84, 85 e 88; no CCBB, RJ, 1996; Cynthia Bourne Gallery, Londres, 1996; Latin American Women, Miami, 1998; Galeria Errol Flynn, BH, 2005; Museu da República, DF, 2007; Os Bracher, Juiz de Fora, 2015, dentre tantas outras. Além dos Prêmios Jabuti de 1995 e Fernando Pini de Excelência Gráfica pelo livro do qual extraímos as citações usadas aqui nesse texto. O conjunto de sua obra se evidencia na quantidade de coletivas de que participou e a sua qualidade espartana se mostra no volume de trabalho realizado e exposto. E também na robustez formal de sua pintura. Frederico Morais escreveu que a Fani “reduz a paisagem a sua estrutura mínima: céu, montanhas, árvores” e que ela “secciona as montanhas em planos para formar a estrutura espacial da composição, planimétrica, ou, ao contrário, para indicar uma visão em movimento, a passagem do tempo” (Morais. In: Fani Bracher, Ed. Salamandra, 1994, p.10). Eu diria: o tempo histórico das Minas Gerais. Fani reside e trabalha onde escolheu viver: o quadrilátero ferrífero mineiro, na histórica Vila Rica (como Ouro Preto era chamada no auge do ciclo do ouro). No documentário que sua filha dirigiu sobre a artista, ela confessou que o “óxido de ferro se tornou alimento” para a sua obra. Declarou também que “a cor da terra me faz bem, eu gosto, é algo que me enche a alma” (Blima Bracher. A casa verde de todas as cores, 2021). Essa afinidade se dá tanto porque ela pesquisa o solo das montanhas nos arredores de Ouro Preto, percorrendo as suas fendas e seus vales e riachos, em busca de pedras terrosas de que extrai os pigmentos com que pinta, como também porque ela expressa memórias inconfidentes das cicatrizes históricas da mineração. O quadrilátero ferrífero é justo ali onde a terra brasilis foi mais ferida pelo extrativismo mineral, desde os tempos coloniais até os dias de hoje. A região é continuamente cortada, mutilada e deformada. Inúmeros cumes montanhosos desapareceram, como é o caso do Monte Itabirito, entre tantos outros. Essa violência calada que a paisagem sofre não passa desapercebida pelas lentes de Fani Bracher. Fendas e crateras, solos sangrentos do vermelho ferroso, adobes terrosos e nuvens cinzas ou pretas que são quadradas de tão pesadas pela evaporação oxidada da mineração, ossos de animais que já morreram… Paisagens que, como bem disse Morais “são um epitáfio e um alerta” (Idem, p.11).

O tempo transcorrido na cronologia das Minas Gerais.

Em sua obra, Fani faz cortes sincrônicos desse continuum e expressa uma paisagem enigmática que algumas vezes também é imaginária, arquetípica, cheia de símbolos, conforme destacou Ronald Polito (In: Fani Bracher, 1994, p. 128). “Quadros que são, a um só tempo, paisagens e incursões abstratas (nunca abstracionistas) sobre as relações entre os estados de volume, densidade e alturas” (Idem, p.129). Obras que, também segundo este crítico, são quase esfinges pictóricas. Na reclusão da pandemia, em Piau, berço materno de sua família, Fani se abriu às cores. Segundo ela, talvez tenha sido devido à delicadeza plástica da chita, material com que estava trabalhando em bordados e panneaux quando a epidemia nos assolou. Tomou gosto por essa leveza colorida e fez de sua casa um museu a céu aberto com 18 murais de 3×4 metros. A “casa verde” da sua infância foi ressignificada com “todas as cores” pela pintora que sempre privilegiou os tons cinzas, ocres e terrosos em suas telas. A mesma doce e forte Fani Bracher que pinta sobre a mesa e não usa cavalete, que produz seus próprios pigmentos com pedras terrosas que ela mesma vai buscar nas montanhas, em pesquisas geológicas e memórias remanescentes de seu querido pai. Fani nos diz que “o quadro quando é bom, ele vai na frente, se encaminha” (Live com Fani Bracher, Ateliê Casa Bracher, 2021). Isso explica porque em sua obra, sejam em paisagens rurais, ossos, flores ou montanhas, as diferentes fases vão se avolumando sem negação; ela concilia e agrega uma à outra. Sua pintura é contundente demais, pela expressão da historicidade de que falamos antes, mas, principalmente, pela estética de cada peça e do conjunto de sua produção, uníssona e diversa a um só tempo. Atualmente atingiu o ápice da força telúrica de sua obra, fazendo “caixas-colagens” com pigmentos, pedras, folhas, carvão, e terras em seus diferentes tons… Material que encontra em suas andanças pelos vales e leva para dar forma em seu ateliê. Há quatro delas nesta mostra, além de 14 grandes telas de diferentes datas e algumas gravuras, feitas a partir de pigmentos e bordados sobre papel. Vinte e nove trabalhos à venda para serem contemplados na exposição de 13 a 29 de junho na Galeria Evandro Carneiro.

Laura Olivieri Carneiro, maio de 2024.

Feira de Artes Gráficas

20/maio

A 5ª edição do MAB Margens – Feira de Artes Gráficas acontece dia 18 de maio no Museu Afro Brasil Emanoel Araujo. O Museu celebra o sucesso do evento que reúne artistas e coletivos sob sua marquise, diante do lago do Parque Ibirapuera, em meio à 22ª Semana Nacional de Museus.

O Museu Afro Brasil Emanoel Araujo, instituição da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo, reúne artistas e coletivos para celebrar um evento que já se tornou tradição no calendário cultural de São Paulo. Com gratuidade no Museu durante todo o dia 18 de maio (sábado), a 5ª edição da feira de artes gráficas MAB – MARGENS ocorre das 12h às 18h. Venha conhecer e refletir sobre “as margens” enquanto espaço-fronteira de produções, com artistas e coletivos que nem sempre são visibilizados no cenário das artes visuais.

Como um manifesto vivo, o Museu oferece sua bela marquise diante do lago do Parque Ibirapuera às produções de artistas inovadores, visando o diálogo e as trocas com o público, possibilitando o fomento da diversidade e a valorização. O objetivo é lhes oferecer espaço privilegiado de divulgação e venda de suas produções gráficas. Para esta 5ª  edição, foi lançado um chamamento público, divulgado via redes sociais e site do Museu, por meio do qual foram selecionados 14 artistas e coletivos pela Comissão de Seleção formada por profissionais de diferentes núcleos de trabalho do Museu. Foram também convidados 5 artistas, cujos portfólios retratam a diversidade social brasileira.

Segundo Guinho Nascimento, um dos artistas que irão expor na feira, participar da MAB Margens é uma possibilidade de encontro. “É estar em comunidade pra ser e fazer mercado, entendendo a feira numa perspectiva que Exu apresenta: um lugar de movimentação, comunicação, prosperidade e caminhos. Assim, vai além de estar à margem do museu, é estar dentro. Não é a parede que nos distancia, porque a MAB é o quintal do Museu, aberto para comer, dançar, enfeitar, apreciar, rezar e celebrar”. Para a artista Neia Martins, a importância é, “estar no espaço do Museu Afro Brasil Emanuel Araujo e no coletivo de artistas que representam esse cenário cada vez mais inclusivo”.

Haverá ainda uma oficina que convida os visitantes à reflexão sobre articulações comunitárias em torno da cultura e do direito à cidade. Será realizada com mediação de Izabel Gomes, educadora popular e artista que divide suas histórias com as pessoas na região do Jardim Miriam, no JAMAC – Jardim Miriam Arte Clube. O evento contará com a venda de bebidas e de quitutes do tabuleiro baiano do Alcides.

A 5ª MAB – MARGENS acontecerá na marquise do Museu, localizada na área externa do pavilhão Padre Manoel da Nóbrega no Parque Ibirapuera, próximo ao Portão 10. O acesso será livre e sem a necessidade de inscrição prévia, lembrando que no dia da feira a entrada do Museu Afro Brasil Emanoel Araujo será gratuita.

Artistas e coletivos selecionados:

CaiOshima – De um lado, o mundo da ginga; do outro, o equilíbrio. De família metade pernambucana, metade japonesa, o artista visual CaiOshima nasceu e cresceu nas duas culturas. Instagram: @Cai0shima

Cauã Bertoldo – Artista visual autodidata, produz imagens a fim de discutir o mundo estético que tange às questões das pessoas negras em sua pluralidade e subjetividades. Instagram: @cauabertoldo

Daiely Gonçalves – Artista visual mineira, articula narrativas que se lançam sobre a representação do corpo e território em temas de raça e gênero por meio da pintura, desenho e gravura. Instagram: @daielygoncalvesart

Guinho Nascimento – Educador e multi-artista, graduado em Artes Visuais pela Universidade Cruzeiro do Sul e em Dança pela Escola Viva. Instagram: @guinhonascimento @galopretoatelie

Hanna Gomes – Artista visual e designer de Salvador, explora visualmente os questionamentos sobre o ato revolucionário de sonhar, utilizando cores primárias e cenários tropicais ou desérticos. Instagram: @the.hannag

Juliana Mota – Designer gráfica paulistana, trabalha com ilustração digital, pintura, bordado e a experimentação disso tudo junto. É inspirada pela mistura da natureza com retratos femininos. Instagram:@julianamotabordado

Katarina Martins – Artista plástica e arte educadora paulistana, investiga o campo botânico e de manchas orgânicas, com ênfase na busca da beleza cotidiana, com diferentes técnicas da gravura e fotografia. Instagram: @katarinamartins_

Mayara Smith – Mestre em Artes Visuais pela Universidade Federal de Minas Gerais (2024), é artista visual, designer gráfica e pesquisadora. Em seu trabalho aborda identidade e corpo negro, principalmente feminino. Instagram: @mayarasmith_

Neia Martins – Trabalha com escultura, pintura, desenho, calcogravura e seus segmentos.Instagram@neia.vancatarina

ÒRÚ – Artista da zona leste de São Paulo, possui trabalhos voltados à ilustração e colagem digital. Instagram: @oru.artista

Pixote Mushi – Artista visual, trabalha com muralismo, arte 3D, xilogravura, pintura e educação artística. Iniciou sua carreira no graffiti e tem explorado temas como raça, sociedade e espiritualidade. Instagram: @pixote_mushi

Rodrigo Abdo  – Designer, ilustrador e artista preto. Seu trabalho observa o cotidiano e organiza coisas que estão no ar. Busca representar a rua, a juventude e questões sociais diversas.  Instagram: @vbdx_

Thiago Vaz – Artista visual e arte-educador, faz um recorte especial sobre a arte urbana: graffiti e street art; pesquisa sobre os modos de ocupação com arte nos espaços públicos: zonas e territórios. Instagram: @thiagovaz.arts

Artistas e coletivos convidados:

Coletivo Anansi Lab – Laboratório de experiências transmídia que promove o letramento racial por meio de livros, revistas, papelaria, eventos, cursos, exposições e produtos digitais. Instagram: @anansi.La

Gejo Tapuya – Reúnem-se via editora especializada em prints, toy art, gravuras e street art. Buscam criar renda para artistas originários, negros e periféricos da cultura hip-hop, graffiti, pixação e outras manifestações culturais marginais. Instagram: @editora.marginal

JAMAC – Artista popular autodidata, autora de estampas exibidas em diversas exposições, cujas inspirações relembram as memórias da sua infância, banhadas pelas belezas do Rio São Francisco.  Instagram: @izabel._gomes – @jardim.miriam.arte.clube

Nei Vital – Baiano que cresceu em São Paulo, se inspira em suas origens do cordel, em seus traços que mesclam o sertão com a metrópole. Instagram: @cordelurbano

Coletivo Xiloceasa – Coletivo formado por integrantes periféricos que buscam por meio da arte, manifestar suas ideias e desejos do cotidiano. Instagram: @xiloceasa

Na atividade, serão apresentadas técnicas de estamparia em tecido com os artistas do JAMAC (Jardim Miriam Arte Clube). A Educadora Izabel Gomes utiliza materiais simples e acessíveis para criação de padrões únicos e personalizados em panos de prato – uma superfície para contar histórias e ensinar a técnica de estêncil, criando desenhos a partir de memórias pessoais e coletivas. Não é necessário ter experiência prévia para participar, mas as vagas são limitadas! As inscrições podem ser feitas via site do Museu.

Exposição no Sesc Pinheiros

19/abr

O livro “Um Defeito de Cor”, escrito por Ana Maria Gonçalves e lançado em 2006, tornou-se uma das principais obras da literatura brasileira contemporânea sobre a escravidão no Brasil e todas as mazelas advindas disso. Após ser homenageado pela escola de samba Portela, que fez da obra o seu samba-enredo de 2024, a publicação ganha uma exposição no Sesc Pinheiros, em São Paulo.

A mostra, que recebe o nome do livro – “Um Defeito de Cor” – é fruto de uma parceria entre o Sesc São Paulo e a Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI), com a concepção original do Museu de Arte do Rio de Janeiro (MAR). Por sua vez, a curadoria da exposição é da autora do livro, Ana Maria Gonçalves, em parceria com os pesquisadores Marcelo Campos e Amanda Bonan.

Brasil colônia

Por meio de obras de arte, a exposição faz alusão ao período do Brasil Império (1822-1889) para discutir os contextos sociais, culturais, econômicos e políticos do século 19 e seus desdobramentos em elementos contemporâneos. Ao todo, 372 peças entre arte têxtil, fotografias, instalações, cartazes, pinturas e esculturas de autoria de artistas do Brasil, da África e das Américas interpretam “Um defeito de cor”, ganhador do prêmio Casa de las Américas e considerado um dos mais importantes clássicos da literatura afro-feminista e nacional. Assim como o livro, a exposição faz um enfrentamento às lacunas e ao apagamento da história da população negra ao contar a jornada de uma mulher africana nascida no início do século 19, escravizada no Brasil, e sua busca por um filho perdido.

Na exposição em São Paulo, estarão presentes os figurinos e croquis das fantasias do Grêmio Recreativo Escola de Samba Portela, assinados pelo artista e carnavalesco Antônio Gonzaga, que se inspirou no livro de Ana Maria para desenvolver o samba-enredo do Carnaval 2024, no Rio de Janeiro. O desfile impulsionou a procura em livrarias físicas e digitais e elevou “Um defeito de cor” para a categoria de mais vendidos do Brasil. Além disso, estarão em exibição, pela primeira vez, um “Retrato de Ana Maria”, quadro de Panmela Castro; “Bori – filha de Oxum”, do artista e babalorixá Moisés Patrício, e “romaria”, mural que será pintado por Emerson Rocha na entrada do Sesc Pinheiros, além de uma programação integrada, com ações educativas divulgadas ao longo do período expositivo.

A exposição “Um Defeito de Cor” está dividida em dez núcleos não-lineares, que se espelham nos dez capítulos do livro, a exposição não é cronológica nem explicativa. O objetivo é trazer uma visão do Brasil com momentos históricos e recortes sociais transmitidos por meio de uma produção intelectual e de imagem presentes na arte contemporânea. Dessa maneira, a mostra faz um mergulho na essência de temas como os levantes negros, o empreendedorismo, o protagonismo feminino, o culto aos ancestrais e a África Contemporânea, que reexaminam os caminhos da população afro-brasileira desde os tempos de escravidão até os dias atuais, e fazem uma interpretação dos conceitos apresentados no romance, principalmente as origens e as identidades africanas que constituem a população, das quais ainda pouco se sabe.

Até 1º de dezembro.

Cruzando Carmela Gross com Lina Bo Bardi

17/abr

Chama-se “Quase Circo” a exposição de Carmela Gross no Sesc Pompeia, São Paulo, SP. A mostra estará em cartaz até 25 de agosto e compreende 13 obras, em grande escala, que ocupam diferentes espaços da antiga fábrica. Com curadoria de Paulo Miyada, a exibição reúne uma convergência do trabalho de Carmela Gross com a arquitetura de Lina Bo Bardi. Carmela Gross realiza trabalhos em grande escala que se inserem no espaço urbano e que assinalam um olhar crítico sobre a arquitetura e a história urbana. O eixo comum, para além da diversidade dos contextos e das propostas elaboradas em cada caso, é o conceito básico de trabalhar-na-cidade. O conjunto de operações que envolvem desde a concepção do trabalho, passando pelo processo de produção, até a disposição no lugar de exibição, enfatizam a relação entre a obra e o espaço, entre a obra e o público.

A exposição propõe uma leitura panorâmica das obras da artista, pautada no diálogo com a fábrica projetada por Lina Bo Bardi.  Esta exposição apresentará trabalhos de grandes dimensões, como a instalação “Roda Gigante”, de 2019, e “Escadas Vermelhas”, de 2024.  Painéis luminosos, vídeos, e desenhos também compõem o espaço da área de convivência, além de duas obras expostas anteriormente no Sesc Pompeia, intituladas “Rio Madeira” (1990) e “Estandarte Vermelho” (1999). Destaca-se ainda, a obra “Gato”, realizada especialmente para a exposição, que será instalada nas passarelas do complexo esportivo, inspirada em um desenho de Lina Bo Bardi.

Sobre a exposição, diz o curador Paulo Miyada

“Esta exposição é uma convergência. De uma parte, a obra da paulistana Carmela Gross, que há quase seis décadas produz arte como uma forma peculiar de observar, deslocar e recombinar as coisas do mundo, muitas vezes fazendo dos despojos do crescimento urbano a matéria de suas obras. De outra parte, a arquitetura da italiana Lina Bo Bardi, que encontrou no Brasil lições sobre o trabalho, arquitetura e design populares, que ela estudou e incorporou em sua própria arquitetura de princípios modernistas”.

Sobre a artista

A artista visual Carmela Gross nasceu em São Paulo, em 1946. Suas primeiras obras, nos anos 1960, foram realizadas enquanto estudava no Curso para Formação de Professores de Desenho, na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), em São Paulo. Concluiu o mestrado em 1981, e o doutorado em 1987, na Escola de Comunicação e Artes da USP, ambos sob orientação do crítico de arte e curador Walter Zanini (1925-2013).  A artista participou de oito edições da Bienal de São Paulo (1967, 1969, 1981, 1983, 1989, 1998, 2002 e 2021); duas edições do evento Arte-Cidade (1994 e 2002); da 2ª Bienal de Arte Contemporânea de Moscou (2007) e da 5ª Bienal do Mercosul (2005), em Porto Alegre.  Algumas de suas obras públicas permanentes são: Grande Hotel (2017), no Sesc 24 de Maio, São Paulo;  Terra (2017), no Museu de Escultura e Ecologia – MuBE, São Paulo; Cascata (2005), em Porto Alegre, Rio Grande do Sul; Fronteira, Fonte, Foz (2001), em Laguna, Santa Catarina; Painel Hans Staden (1997), no Hotel Renaissance, em São Paulo. Seus trabalhos fazem parte de diversas coleções: Museu de Arte Moderna de São Paulo, Museu de Arte Contemporânea da USP, Pinacoteca do Estado de São Paulo, Museu de Arte de Brasília, Fundação Padre Anchieta, Museu de Arte de São Paulo, Itaú Cultural, Biblioteca Luis Angel Arango de Bogotá, Museum of Modern Art, em Nova Iorque, Museum of Fine Arts, em Houston, entre outras.

Sobre o curador

Paulo Miyada é curador e pesquisador de arte contemporânea. Graduado em Arquitetura e Urbanismo pela FAU-USP, tem mestrado em História da Arquitetura e Urbanismo pela mesma instituição. Foi assistente de curadoria da 29ª Bienal de São Paulo, em 2010, e fez parte da equipe de curadores do Rumos Artes Visuais do Itaú Cultural, entre 2011 e 2013. Em 2021, passou a atuar como curador adjunto do Centre Pompidou, em Paris, uma das mais renomadas instituições de arte da Europa. Miyada também foi curador adjunto da 34ª Bienal de São Paulo e do 34º Panorama da Arte Brasileira do MAM-SP. Atualmente, é diretor artístico do Instituto Tomie Ohtake.

Celebrando a arte de Poty

Os 100 anos de Poty Lazzarotto estão sendo celebrados com três exposições inéditas em Curitiba. O centenário foi no dia 29 de março. No Museu Oscar Niemeyer (MON), uma mostra com aproximadamente 500 obras do artista, nome relevante na produção artística paranaense e brasileira, o público pode esperar um recorte das principais temáticas do Poty, como relata a curadora Maria José Justino. A iniciativa vem da doação de mais de 4,5 mil peças do desenhista para o museu, em 2022. Segundo a diretora-presidente, Juliana Vosnika, a mostra é uma das mais grandiosas da instituição.

Com o apoio institucional do MON, a Caixa Cultural inaugurou uma exposição com gravuras do artista que conversam com a arte digital. Além das obras originais, a mostra conta com vídeos, hologramas, uma experiência imersiva em óculos 3D e um documentário inédito, a curadoria é de Juliane Fuganti.

No Museu Municipal de Arte (MuMA) também está em cartaz uma exposição com 100 trabalhos de Poty, distribuídos entre ilustrações, gravuras e um busto em bronze.

“Trilhos e Traços – Poty 100 anos”, no MON, Sala 6

“Poty Expandido”, na Caixa Cultural Curitiba, Galeria do 2º andar

“Poty de Curitiba, Curitiba de Poty”, no MuMA.

Em cartaz até janeiro de 2025,

Mano Penalva na Simões de Assis Curitiba

12/abr

Dois pra lá, dois pra cá

Uma das possibilidades de revisão da história social do Brasil apresenta-se através de uma história do movimento. Polivalente, esse movimento pode acontecer de inúmeros modos: migrações populacionais, variações de maré, dinâmicas comerciais e de troca e, próprio ao corpo cultural, a dança. Apesar das variantes sedutoras, opto por manter esta investigação historicamente próxima ao “movimento”, pela insubordinação que o próprio fenômeno carrega consigo em relação ao desapego disciplinar e à liberdade de deslocamento no pensamento.

Em Dois pra lá, dois pra cá, exposição individual de Mano Penalva em Curitiba, é a tentação do olho que comanda o deslocamento, que ativamente distorce a imagem fruída ao passo que o espectador se move no espaço. As salas expositivas, idealmente neutras, tornam-se um diagrama de coreografias planejadas pelo artista. Nas obras da série Ventana, produzidas com ripas de madeira multicoloridas, é como se cada canto assobiasse, chamando para mais perto, em disputa com os chamarizes em si mesmo. Os trabalhos demonstram uma repulsa à frontalidade, a um ponto de vista único, hermético e pré-fixado, questão amplamente discutida pela prática escultórica contemporânea. Ambíguo, os objetos tridimensionais de Penalva se apresentam camuflados de pinturas postos à parede; sem a intenção do engano, mas com o truque do fascínio. A apontar para uma crise de classificação em um mundo de objetos e nomes cambiantes, o trabalho engendra compreensões intervalares em sua própria natureza.

Penalva incentiva uma observação livre da forma, pautada pelos apetites sensoriais a serem saciados através do movimento em diversos ângulos, em mudanças completas de cor e composição em determinadas posições. Com esses trabalhos, portanto, o artista propõe ao espectador uma insinuação de dança defronte às obras: dois pra lá, dois pra cá. Tal movimento pendular, como as contas de um ábaco – ou como seus Alpendres que balançam ao vento -, joga pontos de referência a primorosos sistemas estéticos de origem popular, assim como sobrescreve um incontornável legado da arte cinética, sobretudo do modernismo latino-americano. Esse resíduo histórico que acompanha a produção de Penalva é análogo ao ruído visual causado pelos trabalhos apresentados, onde fenômenos ópticos – como o moiré – se intensificam e se acumulam na retina de quem absorve os trabalhos, impregnando o próximo trabalho com o zumbido do anterior. Desse modo, Penalva reverencia a sofisticação de vocabulários visuais igualmente populares – e, por consequência, suas epistemologias e relações sociais -, como na composição de elementos da arquitetura vernacular, na composição de bancas de feira com lonas e caixas de madeira, na diagramação de cartazes com letras pintadas manualmente. As ventanas guardam semelhanças com os aparatos arquitetônicos postos em vãos de janelas e portas que permitem o fluxo de ar ao mesmo tempo que bloqueiam a incidência solar. Tal solução formal, criada em países com climas desafiadoramente quentes, apresenta diversidade caleidoscópica de formas e combinações de padrões geométricos – como em cobogós, muxarabis, venezianas e persianas. Pedindo o inverso do que o objeto que as geram propõe, as Ventanas de Penalva pedem ao espectador que as descortinem, que as esguelhem, que as desvelem em soslaio. Essa geometria dinâmica encontra diálogos bem humorados: em Beijo, por exemplo, a parábola formada pelo tenso peso da fiada de contas encontra, em uma carícia tangente, o arco côncavo da forma circular pintada em acrílica sobre madeira. Essa espécie de colar de miçangas, além de sugerir conexões religiosas e espirituais densamente ocorrentes nas visualidades populares, fazem cócegas no conceito do ornamento, presença temida pelo modernismo minimalista. Em Beleba, esferas imantadas que sugerem divertidas bolinhas de gude, comuns em brincadeiras e rua, também simbolizam campos de troca, de conquistas e de estratégias¹. Visualmente, inserem pontos visuais marcantes em meio ao ritmo vertical, como semibreves em uma partitura rotacionada.

Ao intitular a mostra como Dois pra lá, dois pra cá, o artista desvia o movimento para a dança, e alguns pilares fulcrais bailam no horizonte: a relação intrínseca com a música; a corporificação de expressões culturais das mais diversas, miscigenadas, transpostas e reconfiguradas; a dimensão afetiva; e a efemeridade da dança, que só acontece em determinado momento e, quando se repete, é sempre nova, embora repita uma tradição. A dança é, portanto, inexata em suas recorrências, tenha o mesmo princípio medidor, uma matriz de instruções comum. Quadris, ombros, pés e mãos obedecem a cantos inteligíveis que ativam corpos sensíveis, cuja inteligência corporal é mestra. Há, por certas matrizes, uma tentativa de esquematização dos movimentos da dança, de modo a controlá-lo, reproduzi-lo em intentos disciplinares, geométricos, científicos. Ironizar a tentativa de ensinar alguém a ter molejo foi uma das intenções centrais de Andy Warhol na série Dance Diagram (1961-1962), onde a sinuosidade e espontaneidade dos movimentos dão lugar a linhas duras e vetoriais que instruem sobre o movimento dos pés². Nas ocasiões em que trabalhos dessa série eram expostos – em lugares onde ver pessoas dançando causa estranheza, como museus e galerias de arte –, eram raras as vezes em que os observadores não tentavam replicar as instruções defronte às obras.

Em Dois pra lá, dois pra cá, Mano Penalva propõe uma ativação similar: em uma sala com paredes em tom mais quente, ecoa um bolero que incentiva os visitantes à dança. As duas caixas de som sobre tripés, defronte aos grandes Alpendres que lavam as paredes do teto ao chão, sugerem dois corpos que, em par, somam-se à dança. A instalação sonora Bolero para o silêncio – composta por Penalva e pelo produtor musical Meno Del Picchia -, além de atentar para os hibridismos culturais da América Latina, suas influências hispânicas e resistências originárias e diaspóricas, disserta sobre a importância do intervalo: a pausa que intercala os passos é tão importante quantos os elementos cheios. Maestro é quem domina o tempo, determina o ritmo e dispõe as frestas na completude. Cercado de obras que privilegiam a apreensão visual em detrimento a outros sentidos, Bolero para o silêncio amalgama-se com o observador em um processo de ignição do corpo através da audição. Nota-se, portanto, uma inexatidão nas práticas da dança: embora haja um decoro que as rejam, cada uma acontece de modo específico, dentro de um parâmetro convencionado. Essa matemática orgulhosamente inexata, descompassada pela generosidade, tende sempre ao transbordamento, a um pouco a mais: surge, assim, a obra Um tanto e meio. Penalva questiona se esse sistema de medida pautado pela partilha não se faz mais pertinente nas relações humanas do que a escala de unidade métrica, onde, em frieza tal, o que determina o que é medido é o comprimento de raios de luz no vácuo em um intervalo mentalmente incompreensível.

Embora as medidas representem uma lata de um litro e uma de meio litro – empírica, sábia e precariamente apropriadas da produção industrial, ao reutilizarem latas metálicas de óleo de cozinha como recipiente para medida de grãos e farinhas em feiras públicas -, Um tanto e meio indaga acerca da arbitrariedade dessas convenções: não se sabe quanto faz um tanto ser um tanto, muito menos meio. A obra propõe uma alternância, sempre dinâmica: de um lado, o cheio intransponível, como esculturas maciças de Iran do Espirito Santo que não servem para medida alguma; ou o vazio presente, como nas moedas sem valor de Cildo Meireles. Os objetos em si nada valem, mas pautam o valor das coisas que medem e trocam. Existem virtualmente, em potência. Com conteúdo mutável, podendo ser preenchidas com matérias dos mais diversos valores, Um tanto e meio enfatiza a dinâmica da troca. Além disso, indaga se propor possibilidades centradas na generosidade nas dinâmicas capitalistas não são encenações utópicas. Complica-se ainda mais quanto as etapas produtivas são subvertidas pelo paulatino abandono da reutilização das latas industriais, passando a produzir artesanalmente – e vender – novos utensílios medidores com volumes aproximados. Assim, reitera-se um deslocamento central: um instrumento de medida passa a ser de representação, em uma ciranda cruzada entre imagem, objeto e significado. Ao mesmo tempo que se referem a uma prática dada, Um tanto e meio independe dos objetos que a constituem, posto que (in)citam, em senso estrito, os movimentos feitos por outras latas que não aquelas. Incentivando os mecanismos imaginativos, Penalva sugere a possibilidade sonora dessas latas quando cheias, como chocalhos que cumprem a percussão do bolero, a soar o ritmo do cotidiano, o barulho das feiras, o som do baile.

Mateus Nunes

Até 20 de abril.