CCBB de Brasília exibe mais de 40 artistas.

12/mai

A partir dos anos 1930, mais precisamente após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), países econômica e socialmente vulneráveis passaram a ser denominados “subdesenvolvidos”. No Brasil, artistas reagiram ao conceito, comentando, posicionando-se e até combatendo o termo. Parte do que eles produziram nessa época está presente na mostra Arte Subdesenvolvida, que tem curadoria de Moacir dos Anjos e da Tuîa Arte Produção. A mostra fica em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil Brasília (CCBB Brasília) de 20 de maio a 03 de agosto.

O conceito de subdesenvolvimento foi corrente por cinco décadas até ser substituído por outras expressões, dentre elas, países emergentes ou em desenvolvimento. “Por isso o recorte da exposição é de 1930 ao início dos anos 1980, quando houve a transição de nomenclatura, no debate público sobre o tema, como se fosse algo natural passar do estado do subdesenvolvimento para a condição de desenvolvido”, reflete o curador Moacir dos Anjos. “Em algum momento, perdeu-se a consciência de que ainda vivemos numa condição subdesenvolvida”, complementa. A mostra, com patrocínio do Banco do Brasil e BB Asset, por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura, apresenta pinturas, livros, discos, esculturas, cartazes de cinema e teatro, áudios, vídeos, além de um enorme conjunto de documentos. São peças de coleções particulares, dentre elas, dois trabalhos de Candido Portinari e duas obras de Anna Maria Maiolino. Há também obras de Paulo Bruscky e Daniel Santiago cedidas pelo Museu de Arte do Rio – MAR.

Na mostra “Arte Subdesenvolvida”, o público pode ver peças de grande importância para a cultura nacional. Duas obras de Candido Portinari, Enterro (1940) e Menina Ajoelhada (1945), fazem parte do acervo da exposição. Muitas pinturas do artista figuram o desespero, a morte ou a fuga de um território marcado pela falta de quase tudo. Outra obra que também se destaca na mostra é Monumento à Fome, produzida pela vencedora da Bienal de Veneza, a ítalo-brasileira Anna Maria Maiolino. Ela é composta por dois sacos cheios com arroz e feijão, alimentos típicos de qualquer região do Brasil, envoltos por um laço preto. Esse laço é símbolo do luto, como aponta a artista. O público também terá acesso a uma série de fotografias da artista intitulada Aos Poucos.

Outro ponto alto da mostra é a obra Sonhos de Refrigerador – Aleluia Século 2000, de Randolpho Lamonier. “A materialização dos sonhos tem diversas formas de representação, que inclui um grande volume de obras têxteis, desenhos e anotações feitos pelas próprias pessoas entrevistadas, objetos da cultura vernacular e elementos que remetem à linguagem publicitária”, ressalta o artista. “Entre os elementos que compõem a obra, posso listar, além dos têxteis, neons de LED, letreiros digitais, infláveis, banners e faixas manuscritas, até conteúdos sonoros com relatos detalhados de alguns sonhos”, completa Lamonier. Assim como em São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro, lúdica e viva, a instalação multimídia realizará um inventário de sonhos de consumo, que inclui desde áudios e manuscritos das próprias pessoas entrevistadas a objetos e peças têxteis. A instalação ocupa o Pavilhão de Vidro do CCBB Brasília e, como explica o curador Moacir dos Anjos,”faz uma reflexão, a partir de hoje, sobre questões colocadas pelos artistas de outras décadas”.

Ao todo, mais de 40 artistas e outras personalidades brasileiras terão obras expostas na mostra, entre eles: Abdias Nascimento, Abelardo da Hora, Anna Bella Geiger, Anna Maria Maiolino, Artur Barrio, Candido Portinari, Carlos Lyra, Carlos Vergara, Carolina Maria de Jesus, Cildo Meireles, Daniel Santiago, Dyonélio Machado, Eduardo Coutinho, Ferreira Gullar, Graciliano Ramos, Henfil, João Cabral de Melo Neto, Jorge Amado, José Corbiniano Lins, Josué de Castro, Letícia Parente, Lula Cardoso Ayres, Lygia Clark, Paulo Bruscky, Rachel de Queiroz, Rachel Trindade, Solano Trindade, Regina Vater, Rogério Duarte, Rubens Gerchman, Unhandeijara Lisboa, Wellington Virgolino e Wilton Souza.

Gabriel de la Mora no MON.

08/mai

A exposição “Veemente”, do artista mexicano Gabriel de la Mora, é a mais nova realização do Museu Oscar Niemeyer (MON), Curitiba, PR. A mostra, em cartaz na Sala 1 a partir do dia 08 de maio, tem curadoria de Marcello Dantas. São 77 obras, entre instalações, telas com técnicas mistas e esculturas, a maioria produzida entre 2000 e 2025. O conjunto apresenta não só a estética do artista e sua evolução, mas também a diversidade e peculiaridade dos materiais utilizados, que vão além dos suportes e pigmentos tradicionais. No processo de criação, ele transforma objetos encontrados em matéria-prima para singulares obras de arte, evocando o conceito ready-made.

A diretora-presidente do MON, Juliana Vosnika, comenta que o artista desafia nosso olhar e percepção com suas pinturas, instalações e esculturas feitas a partir de itens inusitados, descartados. “Nada em seu intenso e extenso trabalho é óbvio. Tudo é resultante de um perspicaz olhar sobre a natureza humana, seus sentimentos e sensações”, diz.

O curador Marcello Dantas explica que a prática de Gabriel de la Mora envolve uma investigação sobre materiais, explorando os limites físicos e conceituais de um processo de coleta e reconstrução. “À primeira vista, suas obras podem parecer abstratas, com caráter escultórico ou até minimalista. No entanto, um olhar mais atento revela que nada é o que parece ser”, diz o curador: “Suas obras são compostas por elementos inesperados: fios de cabelo, fragmentos de espelhos, cascas de ovos, solas de sapato, asas de borboleta e outros vestígios da vida cotidiana. Sua técnica denota um processo quase obsessivo, que transforma a matéria-prima em novas formas, padrões e texturas. A repetição contínua do gesto artesanal – ora restaurador, ora destrutivo – revela um método que desafia a experiência visual e sensorial do espectador”, comenta.

Sobre o curador.

Marcello Dantas é um premiado curador com ampla atividade no Brasil e no exterior. Trabalha na fronteira entre a arte e a tecnologia, produzindo exposições e múltiplos projetos que proporcionam experiências de imersão por meio dos sentidos e da percepção. Nos últimos anos, atuou na concepção de diversos museus, como o Museu da Língua Portuguesa, Japan House (SP), Museu da Natureza (PI), Museu da Cidade de Manaus, Museu da Gente Sergipana (Aracaju, SE), Museu do Caribe e o Museu do Carnaval (Barranquilla, Colômbia). Realizou exposições individuais de alguns dos mais importantes nomes da arte contemporânea mundial como Ai Weiwei, Anish Kapoor, Laurie Anderson, Michelangelo Pistoletto, Rebecca Horn e Tunga. Foi também diretor artístico do Pavilhão do Brasil na Expo Shanghai 2010, do Pavilhão do Brasil na Rio+20, da Estação Pelé, em Berlim, na Copa do Mundo de 2006.

Sobre o artista.

Nascido em 1968, na Cidade do México, onde vive e trabalha, Gabriel de La Mora é formado em Arquitetura pela Universidade Anáhuac del Norte e possui mestrado em Pintura pelo Pratt Institute, de Nova York. Concentra sua prática artística no uso e reaproveitamento de objetos descartados ou obsoletos, que parecem ter completado sua vida útil. Mais interessado na desconstrução e fragmentação de um objeto ou material ao longo do tempo, ele aposta na reconstrução a partir de práticas baseadas na passagem do tempo.

Visão estética e conceitual do corpo humano.

06/mai

A exposição individual de fotografias de Gilberto Perin – “A Carne” – abre a programação de maio no Espaço Cultural do Hotel Praça da Matriz, Centro Histórico, Porto Alegre, RS. A exibição é composta de 20 imagens inéditas e novos recortes de trabalhos já apresentados pelo artista. A programação inclui duas novas edições do projeto “Roda de Cultura”, com o artista recebendo o público para um bate-papo descontraído sobre sua obra e trajetória nas tardes de duas quartas-feiras – 14 e 28 de maio. É necessário agendamento pelo telefone/whatsapp (51) 98595-5690.

Sobre a obra e o artista.

Com formatos e dimensões variadas, as fotos da série têm por foco estético e conceitual o corpo humano, com seus múltiplos significados e interações, em uma época marcada pelo contraste entre padronização da beleza, sufocamento de sensações, banalização da intimidade e perda de espaço do natural para o artificialismo. O autor acrescenta: “Não se trata de uma crítica conservadora à superexposição ou algo do tipo, mas do convite a um novo olhar sobre a cultura em que o corpo é visto de forma fragmentada, impactando a percepção individual e coletiva. Parte desse trabalho foi inspirada pela conversa que tive com uma amiga sobre os aplicativos de relacionamento, que exploram fetiches e narcisismos, comercialmente ou não, de forma explícita ou insinuada”. Gilberto Perin, 71 anos, tem trajetória consagrada na área cultural, como roteirista, diretor de cena, ator de teatro/cinema e artista visual. Nascido em Guaporé (RS) e radicado em Porto Alegre desde 1972, é formado em Comunicação Social pela PUCRS. Criou e dirigiu premiados curtas-metragens, videoclipes e minisséries para televisão. Suas fotografias já foram expostas em instituições como o Centro Cultural CEEE, Sesc-RS, Casa de Cultura Mário Quintana, MARGS, Museu de Arte Contemporânea do Rio Grande do Sul, Espaço IAB, Santander Cultural, Memorial do RS, Fundação Ecarta e Museu Joaquim José Felizardo, além de Portugal, França, Itália, Suíça e Hungria. É também autor dos livros “Camisa Brasileira”, “Fotografias para Imaginar”, e “Theatro São Pedro – 165 anos” (2023),  sem contar a presença de seu trabalho em capas de quase 30 publicações de contos, poesias, romances, biografias e outros gêneros.

Um Escultor de Significados.

05/mai

O CCBB, Centro Cultural Banco do Brasil, Belo Horizonte, MG, apresenta até  dia 02 de junho, sob a curadoria de  Lilia Moritz Schwarcz a exposição individual de esculturas “Flávio Cerqueira: Um Escultor de Significados” que reúne 40 obras produzidas ao longo dos últimos 15 anos. Em itinerância em quatro espaços do Centro Cultural Banco do Brasil, a mostra passou por São Paulo e seguirá para Brasília (de 24 de junho a 24 de agosto) e no Rio de Janeiro (de 22 de outubro a 26 de janeiro de 2026).

“Eu penso a escultura como o instante pausado de um filme.”

Flávio Cerqueira

“Meu fazer artístico é o processo de transformação pelo qual passa cada material até se tornar uma escultura: a cera de abelha misturada com óleos e um pó de barro peneirado que transformo em platina e que, modelada por minhas mãos, se torna uma figura. As misturas das ligas metálicas como cobre, estanho, chumbo, zinco, ferro e fósforo derretidos a mais de mil graus centígrados que, despejadas em um bloco de areia com dióxido de carbono, eternizam essas formas modeladas em um dos mais nobres materiais da escultura, o bronze”, diz o artista.

Os questionamentos acerca da individualidade e da coletividade são centrais na produção de Flávio Cerqueira. As figuras retratadas, embora ficcionais e em escalas distorcidas, resguardam níveis de reconhecibilidade com a realidade, acentuando a dinâmica empática que suas narrativas propõem. Desse modo, ressalta denúncias sobre a violência exercida sobre pessoas negras, das suas forças de vilanização à autodestruição e transforma cenas do cotidiano em esculturas de bronze que capturam experiências e questões negras. O artista subverte a história do material que utiliza e, com uma perspectiva decolonial, emprega o bronze – tradicionalmente associado a representações de corpos brancos – em contextos humanizados. Como fotografias, Flávio Cerqueira registra no metal instantes do dia a dia de pessoas negras, nos momentos de lazer, mas também em gestos que evocam Resistência, Memória e Identidade.

Flávio Cerqueira nasceu em São Paulo, SP, 1983. O artista tem passagens por importantes instituições no Brasil e no exterior. Suas obras integram acervos de destaque, como o MASP, MAC-USP, Museu de Arte do Rio, Museu Afro Brasil, Museu Oscar Niemeyer, Museu Nacional da República, Pinacoteca do Estado de São Paulo, Instituto Inhotim, Instituto Itaú Cultural e Instituto Moreira Salles. No cenário internacional, está presente na coleção da Universidade de Missouri Kansas City (UMKC) e participou de mostras na National Gallery of Art, LACMA e The Museum of Fine Arts Houston. Suas exposições e projetos também passaram por centros culturais e galerias como o CCBB, Santander Cultural, National Gallery of Washington e Goodman Gallery.

Exposição homenagem para Maria Tomaselli.

30/abr

Onde os pássaros caem e as casas flutuam, é a nova exposição de Maria Tomaselli em exibição no Museu de Arte do Paço – MAPA Praça Montevidéu, Centro Histórico, Porto Alegre, RS.

Com foco numa homenagem que aborda diferentes aspectos da produção de Maria Tomaselli, a exposição “Onde os pássaros caem e as casas flutuam” traça um panorama que une obras da Pinacoteca Aldo Locatelli com obras do acervo particular da artista.

Sob curadoria de Nicolas Beidacki, a exposição mergulha no mundo pictórico e filosófico de Maria Tomaselli, abordando questões que vão das deformidades habitacionais até as agonias do corpo, numa mescla de passado e presente, sem desconsiderar desafios contemporâneos, como o sentido de um futuro ancestral e a abordagem que o mesmo trouxe para pensar o mundo que habitamos, seja nas ocas, nas casas ou em nós mesmos.

Ainda que aberta para visitação do público, a curadoria, considerando a condição de saúde atual da artista – que está em recuperação de um procedimento médico – optou por realizar uma atividade de encerramento em substituição ao evento de abertura. Assim, no dia 17 de maio, sábado, às 11h, no Museu de Arte do Paço, será realizada uma conversa pública com Maria Tomaselli e o curador para abordar a trajetória e os processos criativos da artista, recentemente homenageada no “XVII Prêmio Açorianos de Artes Plásticas”.

Em cartaz até 22 de maio

Contradições da contemporaneidade.

24/abr

A Galatea Salvador apresenta Ininteligibilidade, primeira exposição a itinerar de São Paulo para a capital baiana. Nessa exibição individual Isay Weinfeld apresenta obras elaboradas a partir de objetos garimpados em diferentes contextos, como em feirinhas e mercados ao redor do mundo. Em Salvador, a mostra traz seis obras diferentes daquelas que compõem a seleção original, incluindo três inéditas.

Pequenos objetos como bonecos de porcelana, flores e molduras, que à primeira vista transmitem delicadeza, conduzem o público em uma experiência estética em que o artista utiliza do humor e da ironia para evidenciar contradições da contemporaneidade, utilizando signos e símbolos até então tidos como rotineiros e convencionais. Ao exercitar sua faceta artística, Isay Weinfeld não busca criar discursos, mas desmontá-los com chiste.

Na ocasião da abertura, Isay Weinfeld lançará os catálogos Isay Weinfeld Works – Rizzoli New York e ISAY W – WEINFELD, ISAY, anteriormente lançados em São Paulo, e que apresentam de forma aprofundada a sua produção na Arquitetura e na Fotografia.

Até 31 de maio.

Dialogando com o Barroco.

15/abr

O Museu de Arte Contemporânea da Bahia (MAC_BAHIA), unidade do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC), vinculado à Secretaria de Cultura do Estado da Bahia (Secult), recebe até o dia 13 de julho, a exposição “Sonia Gomes – Barroco, mesmo”, primeira mostra institucional da artista em solo baiano. Realizada pelo Instituto Tomie Ohtake, em parceria com o Ipac e patrocínio do Bradesco e Grupo CCR, por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura (Rouanet) do Ministério da Cultura, a exposição propõe um diálogo entre a poética contemporânea da artista mineira e o legado do barroco brasileiro.

A mostra reúne cerca de 60 obras de diferentes fases da trajetória de Sonia Gomes, além de fotografias inéditas da artista em seu ateliê, registradas pela fotógrafa baiana Lita Cerqueira. A exposição ocorre em duas etapas, em Salvador e Ouro Preto (MG) que, posteriormente, convergem em uma única mostra no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo, de novembro de 2025 a março de 2026.

Em Salvador, o público poderá desfrutar de uma programação diversificada, com encontros, oficinas e vivências realizadas no museu. A abertura aconteceu com a oficina educativa Palavra-semente, voltada para famílias e conduzida por Mariana Per, gerente de Educação do Instituto Tomie Ohtake. Foi realizada a mesa de debate Barroco ressignificado: memória e arte colonial em Salvador, com a participação da arquiteta Alejandra Muñoz, da historiadora Wlamyra Albuquerque e do urbanista Nivaldo Andrade, o público pode acompanhar uma roda de conversa com a artista Sonia Gomes, o curador Paulo Miyada, o diretor do MAC_Bahia, Daniel Rangel, e a artista Goya Lopes.

Para o Ipac, a chegada da mostra reforça a missão do Instituto de promover e valorizar expressões artísticas conectadas à memória, à identidade e à diversidade cultural brasileira. “Receber Sonia Gomes no MAC_Bahia é uma oportunidade de celebrar uma artista que transforma tecidos e memórias em obras que dialogam com a história, o território e as ancestralidades brasileiras – sobretudo negras e femininas”, como destacou Daniel Rangel, diretor do museu.

Livro e lançamento

A exposição é acompanhada pelo lançamento do livro Sonia Gomes – Assombrar o mundo com beleza, publicado pela editora Cobogó e organizado por Paulo Miyada. A publicação reúne imagens de obras recentes da artista, além de cadernos de anotações e cartas, revelando detalhes de seu processo criativo. O livro estará à venda no MAC_Bahia durante todo o período expositivo, com lançamento oficial previsto para o dia 25 de abril, em São Paulo.

A cor como ferramenta de exame.

11/abr

Julia Kater & Deni Lantz Alvorada Reveille.

A Galeria Simões de Assis, Balneário Camboriú, SC, apresenta até 12 de abril, Julia Kater & Deni Lantz: Alvorada / Reveille.

Texto de Lucas Albuquerque.

Alvorada. A primeira claridade. O instante crepuscular. A clara nata que prepara a chegada do sol. Um convite à redescoberta do mundo dia após dia. Esse momento, que tanto encantou os impressionistas no desejo fugaz de captar o preâmbulo cromático da precoce manhã, é o fio poético que une os trabalhos de Deni Lantz e Julia Kater. Seja nas colagens e recortes fotográficos de Kater ou nas pinceladas enceradas de Lantz, o que instiga esta seleção é menos o conteúdo de suas produções que a proposição imersiva em uma fenomenologia da cor, partilhada entre olho e pele na experiência sensível de suas poéticas. Uma aproximação que acentua a curiosa intenção de ambos sobre a figura, cuja aparição em suas composições se dá pelas bordas. Afeitos ao desejo de ultrapassar o invólucro aparente das coisas para vislumbrar as relações sensíveis que permeiam o tema representado e quem o representa, os artistas encontram como ferramenta de exame a cor. Valem-se da sensualidade das gradações cromáticas para propor novas maneiras de contemplar que muito se assemelham à primeira vista do dia, quando abrimos os olhos e vemos de modo borrado as formas fugidias do entorno. Lembra-nos, afinal, que alvorada é também toque do despertar, de recobrar os sentidos.

As fagulhas luminosas inaugurais são aqui sugeridas por Lantz ainda em tons soturnos. A textura riscada, quase ríspida, de alguns trabalhos, se dá pelo uso experimental da própria tinta: em seu estado endurecido, ela é pressionada diretamente contra o suporte, criando sulcos e rastros do caminho percorrido pelo pincel. Outros, todavia, carregam consigo uma camada sedosa, resultado do uso da cera de abelha junto à paleta cromática. Nesses diferentes acabamentos, em que o olho consegue tocar a superfície, repousam as mais tenras sensações das qualidades de incidência da luz sobre objetos e paisagens. É de maneira dúbia, contudo, que a realidade é, para Lantz, o tudo e o nada. Tudo, visto que em cada uma das telas é um pequeno índice da relação de equidade e escuta que o artista presta à terra, aos seus seres vegetais, aos fungos que a revolvem, e, enfim, a todo o ecossistema natural que resvala em sua prática pictórica, sempre embebida de seu aprendizado com a natureza. Nada, pois há um tanto de imaginação nossa, como do artista, em traçar um paralelo de composições tão abstratas com um tema em específico. Neste jogo de relações bipolares, sua pintura se torna, fundamentalmente, um campo de ensaio em que cada peça é o resultado de uma tênue equação entre o desejo do mundo material e o modo como Lantz maneja o espaço dessa dança.

Julia Kater, por sua vez, tem um compromisso com a imagem completamente divergente da premissa da fotografia clássica de capturar o instante ideal. Seu interesse é o de liberar a fotografia de sua função primeva. Por meio de recortes, faz um desenho-colagem de resquícios fotográficos de paisagens, sobrepondo-as na intenção de construir um outro horizonte. Assim, a superfície planar fotográfica, tão voltada à ilusão, conquista a tridimensionalidade em blocos configurados para agrupar as minuciosas camadas. O gesto do corte, por sua vez, cria outros desenhos – que podem ser percebidos como silhuetas de montanhas ou de dunas de areias, ou como a transmutação de uma sensação rítmica de um corpo perante uma música ou som. Aqui, seus trabalhos estabelecem uma ideia de variação pela cor, traçada na recombinação de fotografias de diferentes momentos do dia. O gesto do corte estabelece o ritmo da leitura das camadas sobrepostas, enquanto experimentos analógicos partilham do mesmo desejo de captura de algo que foge à representação fotográfica, atendo-se às falhas e borrões que conduzem o espectador a tatear a incerteza. Talhadas em tiras de céus, mares e incidências de luz natural, as composições de Kater rearticulam o sentido deste mundo para ansiar a chegada de um outro, inédito, ainda que mediante a evocação de um imaginário de tantas outras cenas de paisagens quaisquer.

Alvorada sugere um jogo entre o amanhecer e o anoitecer. Na relação quase tátil que Lantz e Kater estabelecem com a cor, os ciclos do dia e suas oscilações entre claridade e escuridão tornam-se alegorias mediadas pelas pinceladas e composições reunidas aqui. Lamber o céu, tatear o horizonte: o convite à candura de quem abre os olhos e é irradiado pelas faixas de luz da manhã como se fosse a primeira vez.

Lucas Albuquerque.

Até 12 de abril.

Um gesto de desejo e pertencimento.

10/abr

No meu jardim tudo se mistura

A Ocre Galeria, bairro São Geraldo, 4° Distrito, Porto Alegre, RS, apresenta a exposição individual “no meu jardim tudo se mistura”, de Téti Waldraff (Sinimbu, RS, 1959), com curadoria de Paula Ramos. A mostra revela o profundo vínculo da artista com a Natureza, que se manifesta em sua prática de desenhar, pintar e criar a partir das formas orgânicas e dos ciclos de vida observados em seus jardins.

Para Téti Waldraff, o ato de desenhar e pintar é também um gesto de desejo e pertencimento. É no cotidiano entre Porto Alegre e Faria Lemos, cercada por árvores, arbustos e flores, que ela encontra matéria e inspiração. O jardim é espaço de cultivo e de criação, um território onde o natural e o artístico se fundem. Ali, o ato de observar o desabrochar das flores se transforma em linhas, cores e formas. Seu ateliê é móvel, adaptável: um banco, um bloco de notas, papéis soltos. Em cada gesto, emerge o desejo de registrar o instante e a matéria viva que o compõe.

A exposição expande essa experiência sensível, ao mesmo tempo em que desdobra pesquisas formais e conceituais realizadas em projetos anteriores, a exemplo da série “Nos rastros do Jardim de Giz”. Produzidos durante o período de isolamento social, imposto pela Pandemia, os desenhos da série surgiram a partir do painel produzido por pela artista junto ao Centro Cultural da UFRGS, em março de 2019.

No dia 12 de abril, às 11h, a Ocre Galeria promove uma conversa com Téti Waldraff e mediação da curadora Paula Ramos, crítica, historiadora de arte e professora do Instituto de Artes da UFRGS. O evento é uma oportunidade para o público conhecer mais sobre o processo criativo da artista e os caminhos que levaram à construção da exposição. A entrada é franca e o espaço tem acessibilidade.

Até  03 de maio.

Uma seleta de pinturas.

02/abr

O pintor Eduardo Vieira da Cunha exibe, a partir de 02 de abril,  uma seleta de pinturas no Espaço Cultural HPM, Centro Histórico, Porto Alegre, RS. O conjunto de obras recebeu do artista o curioso título “Pintura à deriva”. Eduardo Vieira da Cunha possui uma linguagem altamente descritiva e literária. A mostra faz parte da série de exibições paralelas a realização da Bienal do Mercosul