Arquitetura para abelhas

12/jul

O artista e ambientalista João Machado apresenta esculturas feitas com a interferência de abelhas nativas. Uma fusão de arte e biologia em obras interespécies.  Com curadoria de Arasy Benítez, mostra acontece no Jardim Botânico Plantarum, Nova Odessa, na zona metropolitana de Campinas, São Paulo, SP, de 13 de julho a 11 de agosto.

Obras manifestam a interdependência das espécies e a importância da biodiversidade no planeta. Um trabalho colaborativo entre humanos e abelhas como forma de mostrar a interdependência entre os seres vivos e a importância da biodiversidade. Essa é a base da pesquisa artística de João Machado, que também é ativista em defesa das abelhas nativas do Brasil. Na mostra “Geoprópolis – Arquiteturas para Abelhas”, o artista apresenta esculturas em cerâmica criadas a partir de desenhos com própolis e finalizadas com a colaboração de abelhas originárias do país. Além de esculturas, a exposição traz desenhos, peças gráficas e uma performance mostrando a comunicação sonora que existe entre plantas e abelhas.

A exposição é mais um desdobramento do projeto desenvolvido por João Machado desde 2015, que aborda temas como colonialismo, desmatamento, território e o crescimento acelerado das cidades, que oprime plantas, animais e humanos. Geoprópolis nasceu de sua pesquisa envolvendo abelhas autóctones brasileiras. Em seu processo artístico, ele tem como companheiros de trabalho os cerca de 50 enxames de abelhas nativas cultivados por ele na Serra da Mantiqueira, em Bocaina de Minas (MG). Também conhecidas como “indígenas”, essas espécies se distinguem por não terem ferrão e serem indispensáveis para a polinização da flora brasileira.

Na mostra, as obras de João Machado serão expostas ao ar livre, em diálogo com a natureza. Uma delas é uma escultura viva, habitada por abelhas da espécie Melipona mondury. O processo de construção dessas esculturas é tão complexo quanto sustentável. Tudo começa com desenhos feitos a partir do própolis que o artista colhe de seus enxames. “Em contato com o papel, o própolis cria formas orgânicas que parecem com o oco das árvores onde as abelhas naturalmente enxameiam. Depois, replico esses desenhos em esculturas de cerâmica, que mais tarde as abelhas vão habitar. Ao longo de algumas semanas, são elas que completam o trabalho, com cerume ou geoprópolis, termo que dá nome ao projeto”, explica ele.

Outro ponto alto da exposição é a incorporação de ruídos extraídos de plantas e abelhas nativas, mostrando a comunicação sonora que existe entre elas. Trata-se da performance “Arquitetura bioacústica para abelha Mandaçaia”, com colaboração de Daniel Magnani. Como programação paralela está previsto o workshop “Arquiteturas para abelhas nativas”, a cargo de João Machado com participação especial do fundador do Instituto Plantarum, Harri Lorenzi. João Machado vai falar sobre abelhas nativas e ensinar sua técnica de construção de casas para abelhas em argila. Harri Lorenzi, engenheiro agrônomo e botânico, terá como tema as plantas nativas, sobre as quais tem dezenas de livros e artigos publicados.

Sobre as abelhas nativas

Uruçu, Mandaçaia, Jataí, Manduri, Bugia, Borá, Tubuna, Irapuã, Iraí… O Brasil possui mais de 300 espécies de abelhas nativas sociais e aproximadamente 1.500 espécies de abelhas nativas solitárias, também conhecidas como abelhas indígenas. Elas estavam aqui antes da chegada da abelha europeia (Apis mellifera), trazida pelos colonizadores. As abelhas nativas são cultivadas e amplamente conhecidas pelos povos originários, fazendo parte da cultura deles há milênios. Essenciais para a nossa sobrevivência, elas são responsáveis pela polinização das plantas. Ameaçadas pelo desmatamento, pela redução de seus habitats naturais e pela concorrência da agressiva abelha europeia, que é exótica ao nosso território, as abelhas nativas correm perigo de extinção.

Sobre o projeto

Essa é a quarta exposição de João Machado em torno da pesquisa Geoprópolis, que atravessa questões como território, anticolonialismo, responsabilidade e cuidado com o meio ambiente. Em maio de 2023, o artista apresentou o trabalho no espaço independente Villa Mandaçaia Projetos, em Pinheiros, São Paulo. Em seguida, no Bananal Arte e Cultura Contemporânea, na Barra Funda; e, no início de 2024, na Oficina Cultural Alfredo Volpi, em Itaquera. Depois da mostra no Jardim Botânico do Instituto Plantarum, em Nova Odessa, a pesquisa segue para outros espaços.

Sobre o artista

João Machado é artista visual, cineasta e ambientalista, nascido no Rio de Janeiro, em 1977. É bacharel em Cinema pela Art Center College em Los Angeles, Califórnia (EUA). Cofundador da Mandaçaia Projetos (SP), espaço de arte independente, em parceria com a curadora Arasy Benitez. Tem uma carreira de 20 anos como diretor de cinema de filmes autorais, documentários e obras de videoarte. Como artista visual, participou de várias exposições em galerias e espaços culturais em diversos países. Em 2014, foi selecionado pelo edital da Caixa Cultural com a exposição individual “Atlas”, apresentada na Caixa Cultural de Salvador, Curitiba e Rio de Janeiro. De 2015 em diante, sua pesquisa artística une-se ao ativismo pela preservação das abelhas sem ferrão nativas do Brasil. Nessa investigação, desenvolve trabalhos em vídeos e esculturas produzidos a partir de elementos extraídos da sua criação de abelhas, como a cera, o própolis e o mel. João Machado vem conduzindo também um mapeamento de abelhas que resistem em ambientes urbanos e fazem morada em lugares inóspitos para elas.

Sobre Arasy Benítez

Nascida em Assunção, Paraguai, é bacharel em Ciências Econômicas pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (2018), dedicando sua pesquisa monográfica ao estudo do setor cultural no desenvolvimento econômico do Brasil. Durante a pós-graduação em Arte: Crítica e Curadoria, na PUC-SP (2022), elaborou uma revisão crítica do conceito de Estética Relacional, abordando o mesmo a partir do trabalho e pensamento de Hélio Oiticica. Cofundadora, gestora e curadora das iniciativas da Villa Mandaçaia (MG) e Mandaçaia Projetos (SP), espaços de arte independentes, se dedica também a curadorias independentes.

Cerâmicas na Galeria Mercedes Viegas

02/jul

A artista Jacqueline Belotti inaugura no dia 06 de julho, exposição individual “E DE TODAS AS COISAS UM”, com cerâmicas e porcelanas na Galeria Mercedes Viegas, Horto, Rio de Janeiro, RJ, com curadoria de Paula Terra-Neale. Integrando elementos díspares e construindo peças que contenham acontecimentos, informações e objetos de universos multifacetados, Jacqueline Belotti vai moldando, manualmente suas obras, sempre agregadas a um caráter experimental. Paula Terra-Neale, que faz a curadoria, selecionou 15 cerâmicas e porcelanas de produção recente. A argila, nas mãos da artista, se torna um meio para transmitir histórias, emoções e visões únicas, ecoando o poder da criação que celebra. Da argila bruta ao objeto final, a magia do processo artístico dá nova vida e significado à matéria, que pode assumir a forma de folhagens, rosas, orquídeas, entre outras flores – inventadas ou não – mãos, cabeças, pássaros, asas, peixes, conchas, vegetação marinha, misturados a cacos de cerâmica diversos.

Inspiração em Bordalo Pinheiro e Heráclito

Segundo a artista, a obra de Bordalo Pinheiro sempre foi uma fonte inesgotável de inspiração para o seu trabalho: “Sua capacidade de combinar técnicas tradicionais com uma abordagem inovadora e crítica ressoa profundamente com minha própria prática artística”. Mas é do conceito de “harmonia dos contrários”, do filósofo Heráclito, que vem a inspiração para dar forma às suas cerâmicas, que parecem afirmar que os opostos não são apenas necessários para a existência de tudo, mas também a harmonia e a unidade emergem da tensão entre eles. A artista incorpora ao seu processo de criação a visão de que a realidade é caracterizada pela mudança constante e pelo fluxo, tudo está em constante transformação e os opostos são interdependentes. A “harmonia dos contrários” sugere que a tensão e contraste entre os opostos cria um equilíbrio dinâmico. Assim como para Heráclito, essa tensão e contraste são fundamentais para a ordem e a estrutura das suas obras únicas, sempre se transformando mas mantendo a harmonia através do conflito contínuo entre todas as partes da obra. Cada peça de Jaqueline é uma expressão desse espírito.

A palavra da curadora

“Jacqueline Belotti nos apresenta sua mais recente série de trabalhos: são vasos biomórficos de cerâmica em argila e porcelana esmaltados, produzidos desde 2020. O senso de urgência, de iminência da tragédia e de potência de vida transpiram deles. São peças únicas e elaboradas com experimentalidade técnica e sofisticação intelectual. Apresentam um deslocamento delicado e conflituoso entre as pequenas partes; os pequenos dramas equilibrados na totalidade da peça única, o vaso. As formas de cada uma das partes individuais, que podem ser associadas às da flora e da fauna, incluindo as dos corpos feminilizados, são aqui amalgamadas num todo fluído, e contínuo como que na tradição barroca e do rococó, mas com um toque de surrealidade. O fogo da queima unindo pigmentos e pedra num ardor sensual e erótico. A artista cria seu próprio diálogo e exploração com a cerâmica, não apenas com o material em si, mas na possibilidade de trabalhar nele as questões da arte, as questões subjetivas, e empreender uma reflexão crítica sobre processos históricos, num mesmo mergulho”.

Sobre a artista

Jacqueline Belotti vive e trabalha no Rio de Janeiro. Atua por múltiplos meios e procedimentos em exposições individuais e coletivas. Participou de diversas exposições coletivas e individuais no Brasil, Portugal e Inglaterra. Recebeu o Prêmio Funarte de Arte Contemporânea, 2014 e o Prêmio Funarte Mulheres nas Artes Visuais, 2013, da Fundação Nacional de Artes, Ministério da Cultura/BR. Pesquisadora e PhD em Artes Visuais. Lecionou na Universidade Federal do Espírito Santo.

Até 09 de Agosto.

Galatea com Miguel dos Santos na 3ª edição da ArPa

19/jun

A Galatea anuncia sua participação na 3ª edição da ArPa, entre os dias 26 e 30 de junho no Mercado Livre Arena Pacaembu, São Paulo, em continuidade à proposta de trazer artistas de fora do eixo do Sudeste para a feira, apresentando um projeto solo de pinturas e esculturas do artista Miguel dos Santos (Caruaru, PE, 1944), representado pela galeria.

A seleção traz dezoito obras históricas produzidas entre 1968 e meados da década de 1980, permitindo acompanhar o desenvolvimento das características formais e simbólicas decisivas na consolidação do corpo de trabalho de Miguel dos Santos. Entre as pinturas “São Miguel” (1968), dotada de um estilo que se alinha às propostas do Movimento Armorial do qual fez parte, e “Um neto de Aleijadinho” (1977), produzida no mesmo ano em que participou do Second World Black and African Festival of Arts and Culture – FESTAC ’77 (Lagos, Nigéria), onde a depuração dos seus traços e composições resultaram em figuras de caráter inconfundível. Como fio condutor entre as obras, há a combinação de referências da cultura popular do Nordeste, das mitologias dos povos originários das Américas e da arte iorubá trazida pelos povos da África.

A Galatea ocupará o estande U7 do setor UNI, organizado sob a curadoria de Germano Dushá e Benedicta M. Badia, que reúne projetos com artistas da América Latina e Caribe que exploram o mistério da vida por diferentes meios. A seleção traz artistas que, em seus diferentes contextos e práticas, sintetizam ou reelaboram questões terrenas a partir de dimensões espirituais, imaginação e pensamento especulativo. Seus trabalhos, entre o corpóreo e o etéreo, reverberam visões cosmológicas, imaginários coletivos, tensões contemporâneas e futuros povoados por forças ancestrais e fenômenos inefáveis. É nesse encontro da espiritualidade com a materialidade cotidiana que dinâmicas críticas à colonização e à modernidade se transmutam em caminhos para a potência da vida.

Exposição e palestra no IBEU

26/abr

A exibição da mostra “Hecatombe”, individual de Alessandra Vaghi, segue até o dia 30 de abril na Galeria de Arte IBEU, Jardim Botânico, Rio de Janeiro, RJ. No dia 29, às 18h, haverá uma conversa com o curador, Luiz Alberto Oliveira a exposição apresenta uma instalação com sacos de carvão e reúne obras como vídeos, fotografia e esculturas em cerâmica. Durante o coquetel para os convidados, a partir das 17h, serão apresentadas sessões do vídeo A Última Ceia.

Segundo Luiz Alberto Oliveira, “o conjunto de trabalhos artísticos que Alessandra Vaghi nos apresenta sob este título oferece várias dimensões de reflexão. A mais imediata diz respeito a uma inflexão que vivemos na sociedade contemporânea: a hecatombe é das matas, em favor dos bovinos. Um segundo viés de devastação ampla foi o da conversão de madeira em carvão, em particular para uso em siderúrgicas. Deixando de fabricar ar, a mata fornece fogo para forjar o ferro; a contemplação dos sacos alinhados de lenho carbonizado inevitavelmente nos questiona sobre sua origem.”

Sobre os trabalhos em vídeo, produzidos e performados pela artista, Luiz Alberto Oliveira nos diz: “De Jorge Luis Borges aos paradoxos quânticos e às histórias em quadrinhos, o conceito de multiverso se disseminou largamente em nossa cultura. O rol de questionamentos que Alessandra nos traz tão sutilmente talvez tenham como eixo integrador, fundacional ainda que indiscernível, fulgurante ainda que obscuro, o mistério mesmo de que as Deusas arcaicas eram símbolo: o da potência multiversal do feminino.”

Nova artista representada pela Fortes D’Aloia & Gabriel

16/abr

Tatiana Chalhoub

A produção de Tatiana Chalhoub é estruturada segundo os parâmetros técnicos e formais da pintura, expandidos por meio da cerâmica, em relevos de superfície acidentada ou fragmentada. A fusão entre imagem e matéria que tem lugar em seus trabalhos faz com que manchas de pigmento em acabamentos esmaltados ou oxidados ganhem contornos de paisagem ou natureza morta. Peças soltas, fragmentos e resíduos são processados em reinterpretações da natureza, da história da arte ou de anotações mentais, reunindo esses pedaços díspares num mundo marcado por matizes líquidos e tons aquáticos. Em peças suspensas entre ícones e atmosferas em pequena escala, Chalhoub abraça o acaso e a imprevisibilidade da prática de ateliê, projetando soluções pictóricas a partir de quebras, ruídos e desvios de processo.

Entre suas exposições individuais recentes estão Romper o dia, crack of dawn, Fortes D’Aloia & Gabriel, São Paulo, Brasil (2024); Mais uma casa, Kubik Gallery + Espaço Cama, São Paulo, Brasil (2022); On the grass, 1111 Project Space, Budapeste, Hungria (2019) e O brilho do bronze, Galeria Ibeu, Rio de Janeiro, Brasil (2015). Entre suas últimas exposições coletivas estão Contra-flecha: gestos de amor, práticas de sedução, Almeida & Dale, São Paulo, Brasil (2024); Nunca só essa mente, nunca só esse mundo, Carpintaria, Rio de Janeiro, Brasil (2023); Desmanchar, desfaz, Quadra, São Paulo, Brasil (2022).

Obras de Gabriela Machado em exposição

09/abr

A Luciana Brito Galeria, Jardim Europa, São Paulo, SP, abriu a maior exposição da artista Gabriela Machado. A exibição de “Cadê o Abre Alas?” tem curadoria de Oswaldo Corrêa da Costa e essa é a primeira exibição da artista na galeria e a mais completa que já realizou ao longo da carreira reunindo mais de cem obras, entre pinturas de maior e menor escala, assim como esculturas em porcelana, ocupando todos os espaços da galeria.

“Uma grande exposição de pinturas pequenas. Uma pequena exposição de pinturas grandes. Uma estante que vai do chão ao teto com pequenas esculturas (…) Montagem sistemática, minimizando subjetividade, provocando combinações impensadas”, diz Oswaldo Corrêa da Costa. A montagem da exposição foi inspirada pela ideia da “Morte do Autor”, de Roland Barthes, onde este defende que o autor deve desaparecer no momento em que nasce o leitor (ou espectador, no caso), pois é a partir das reflexões desse último que novas ideias surgem. Aqui, essa ideia pode ser entendida como um apagamento do rastro do curador, ou a diminuição radical de seu protagonismo, parte da crítica contemporânea à autoridade do “homem branco ocidental”. Para por essa ideia em prática, a proposta curatorial dividiu as pequenas pinturas em três grupos, ou “enxames”, compostos de telas do mesmo tamanho. Dentro de cada enxame, o ordenamento nas paredes será por degradês que vão do mais claro ao mais escuro, ou vice versa. Transferir a responsabilidade para critérios mais objetivos aumenta o enfoque sobre a cromaticidade dos trabalhos e gera um ordenamento coletivo, ao mesmo tempo em que cada obra continua se sustentando individualmente.

Essas pequenas pinturas são realizadas por Gabriela Machado como quem escreve um diário de bordo. Por onde passa, registra suas impressões na tela. Sua percepção pontual das cores, formas, brilho e luminosidade ficam registrados a óleo nas telas pequenas, que carrega para todos os lados, e contam as histórias do seu caminhar. Desde 2017, elas guardam memórias de lugares onde a artista esteve para residências artísticas, ou apenas para a formação de um olhar para sua pintura, seja em diferentes regiões de Portugal, França e Estados Unidos, ou em cidades de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Bahia, incluindo impressões e percepções pontuais, registradas em determinados momentos, e captadas com a ajuda de frases escritas, como “Aqui cabe tudo”, “O céu perto de mim”, “Queira ou não queira, esse é o meu lugar”, “Pulo do gato” e “Cadê o Abre Alas?”, título que dá nome à exposição; frases que são exteriorizadas como verdadeiros tiros certeiros no tocar de um relógio cuco. Como num acordo íntimo entre a artista e o relógio, a cada cantada do pássaro a artista escrevia uma frase na superfície da pintura que realizava no momento, compondo o “livro do cuco”. Muitas vezes, as pinturas de Gabriela Machado situam-se no limiar entre o figurativo e o abstrato, deixando o entendimento para o espectador.

A mostra também apresenta um conjunto de pinturas mais recentes, de maior escala. Diferentemente das pequenas, essas obras maiores carregam o peso do gesto da artista em uma escala corporal. Por meio da tinta acrílica, Gabriela Machado utiliza processos rápidos e orgânicos, exteriorizando sentimentos e estados de espírito em grandes desenhos abstratos. Enquanto as pinturas menores, a óleo, realizam um trânsito de fora para dentro, trazendo para a tela as percepções do entorno, as grandes, em acrílica, acontecem de dentro para fora, traduzindo sensações momentâneas.

Em um diálogo direto com as pinturas, Gabriela Machado também apresenta uma série de pequenas esculturas em porcelana esmaltada. Dispostas da mesma forma que costumam permanecer no estúdio da artista, as peças são apresentadas em uma grande estante de madeira. Os gestos intimistas de moldagem, em escala manual, ditam os movimentos dessas peças que, segundo o curador, são “informadas pelo conhecimento acumulado em uma longa estrada, por uma habilidade desinteressada em exibicionismo. A primazia é sempre da mão; sua pegada sempre visível”.

Diáspora asiáticas no Instituto Tomie Ohtake

08/mar

Como aponta o diretor artístico do Instituto Tomie Ohtake, Perdizes, São Paulo, SP, Paulo Miyada, em um espaço cultural que recebe o nome de Tomie Ohtake, pensar as diásporas asiáticas é uma tarefa inevitável. Os numerosos conflitos, crises, invenções, revoluções e guerras ao longo do século XX foram determinantes tanto para a diáspora de importantes parcelas da população asiática quanto para o afluxo de imigrantes de diversas partes do mundo ao Brasil – tendo o estado de São Paulo como um destino comum para muitos fluxos diaspóricos devido a suas dinâmicas econômicas e sociais. “É um processo conflituoso, com perdas e trocas que atravessam as gerações e são definidas pela constante transformação”, completa Paulo Miyada. O programa Diásporas asiáticas procura somar forças a esse processo ao sublinhar o impulso criativo de artistas vindos da China, da Coreia do Sul e do Japão (ou mesmo nascidos aqui, em famílias imigrantes), exemplares de seus fluxos migratórios e, ao mesmo tempo, casos singulares dentro da história da arte brasileira. O programa foi produzido com recursos captados via Lei de Incentivo à Cultura, do Ministério da Cultura.

Diásporas asiáticas compreende três mostras, sendo duas individuais: Chen Kong Fang (Tung Cheng, China, 1931 – São Paulo, SP, 2012) e Hee Sub Ahn (Seul, Coreia do Sul, 1940), e uma coletiva, com trabalhos dos ceramistas nipo-brasileiros Akinori Nakatani, Alberto Cidraes, Hideko Honma, Katsuko Nakano, Kenjiro Ikoma, Kimi Nii, Kimiko Suenaga, Luciane Sakurada, Marcelo Tokai, Mário Konishi, Megumi Yuasa, Mieko Ukeseki, Renata Amaral, Shoko Suzuki e Tomie Ohtake. Ao lado das obras dos ceramistas, será possível apreciar haicais do artista Kenichi Kaneko que dedicou suas criações a cada um deles. O programa ainda conta com uma publicação, que apresenta algumas obras públicas de Tomie Ohtake e conta com textos inéditos dos curadores e um texto comissionado de Lais Miwa, pesquisadora que vem se destacando no debate acerca da presença e da visibilidade da população asiática no contexto brasileiro.

Hee Sub Ahn – O Caminho

Hee Sub Ahn – O caminho, com curadoria de Catalina Bergues e Julia Cavazzini, exibe pela primeira vez o trabalho da artista em um contexto institucional. A partir dos mais de cinquenta anos de criação intensa, selecionou-se um recorte das obras produzidas principalmente na década de 1980, poucos anos após sua chegada. Segundo as curadoras, a produção de Hee Sub Ahn é atravessada pelas memórias do lugar de origem, e pela nova comunidade aqui construída no bairro do Bom Retiro, no qual a artista ocupa papel central. “A disciplinada e rotineira criação artística de Hee se torna um íntimo ritual de dar significado ao que percebe em seu entorno”, destacam Catalina Bergues e Julia Cavazzini.

Chen Kong Fang – O Refúgio

Chen Kong Fang – O refúgio tem curadoria de Paulo Miyada e Yudi Rafael e se debruça sobre a carreira e a obra desse artista que construiu sua vida no Brasil, desenvolvendo a sua prática pictórica no cenário artístico paulistano por cerca de cinco décadas. A exposição, primeira retrospectiva do artista em uma instituição brasileira, reúne um conjunto de mais de cem obras, entre pinturas a óleo e sumi-ês produzidos entre o final dos anos 1940 e o início da última década. Segundo os curadores, ao invés de um partido cronológico organizado em fases sucessivas, a mostra enfatiza como o artista, que concebia a pintura como um caminho, fez de seu labor uma lida constante com gêneros pictóricos consolidados. “Tomando partido da reabertura experimental pelas vanguardas modernas, Fang imprimiu sua dicção própria nas ideias de retrato, paisagem e natureza morta”, completam. Essa exposição conta com o patrocínio da CTG Brasil.

Tocar a Terra – Cerâmica Contemporânea Nipo-Brasileira

A mostra Tocar a terra – cerâmica contemporânea nipo-brasileira, com curadoria de Rachel Hoshino e assistência de Ana Roman, elege a cerâmica para tratar do tema diáspora japonesa – “por ser ela, simultaneamente, matéria e metáfora: o terreno no qual se aporta, se planta e se habita é a terra tocada com arte pelo ethos nipônico”, explica a curadoria. São obras de 15 artistas baseados no estado de São Paulo cujas atividades, pesquisas e repertórios são influenciados pelas tradições do Japão, independentemente de sua ascendência. Segundo as curadoras, para além de forma e símbolo, é a experiência de energia latente que faz com que sementes e brotos sejam temas recorrentes em suas obras. “Muitas delas são deixadas em ambiente natural, onde continuam sua metamorfose, sob os efeitos de intempéries e da ocupação por outros seres”. Disso, ressalta Rachel Hoshino, resulta outro importante conceito nipônico: “wabi-sabi” (侘び寂び), ideal estético-filosófico segundo o qual o belo reside no imperfeito, no impermanente e no incompleto. “A plasticidade da argila, o respeito pelo tempo e a consciência da interdependência entre tudo fazem com que a cerâmica seja prática favorável ao diálogo do ceramista com a sua história, seu entorno e consigo próprio”, completa Rachel Hoshino.

Até 26 de maio.

Novas pinturas de Helena Carvalhosa

07/nov

A Galeria Marcelo Guarnieri, Jardins, São Paulo, SP, apresenta, de 18 de novembro a 20 de janeiro de 2024, “Tinha uma saia rodada e um galope na cabeça”, segunda mostra da artista Helena Carvalhosa na unidade de São Paulo. A exposição reúne um conjunto de pinturas, objetos e cerâmicas produzidas pela artista durante os últimos anos que dão conta de evidenciar sua íntima relação com a poesia. “Tinha uma saia rodada/E um galope na cabeça/O galope virou trote/E passo a passo/ caminho”. Helena Carvalhosa dá forma às suas imagens também através da palavra, reanimando memórias afetivas e reconstruindo, dentre outras arquiteturas, espaços domésticos e jardins. Suas pinturas de jarros de flores, galhos, cadeiras e passarinhos se confortam nas pequenas dimensões de suas telas, assim como os objetos com os quais escolhe trabalhar, coisas que podem caber dentro das mãos. A artista se vale do ritmo de seus poemas, por vezes também curtos, para pensar em sínteses: figuras que se resolvem em pinceladas soltas, descrições abertas, assemblages que rimam. “Eu pinto um ar que me habita”, define a artista. A inauguração desta exposição marca também o lançamento de seu livro de poemas “Tinha uma saia rodada e um galope na cabeça”, publicação que conta com texto de apresentação do artista Paulo Pasta e posfácio do curador Marcelo Salles.

Em “Tinha uma saia rodada e um galope na cabeça”, um centenar de pinturas compõem o espaço como uma espécie de álbum de recordações, cenas banais que adquirem valor pelo equilíbrio entre a simplicidade da abordagem temática e manejo sofisticado do uso da cor. Como observa Paulo Pasta em seu texto de apresentação “Para isso ela se vale desse lugar indefinido entre a figuração e abstração, entre ser e parecer, como também do emprego de relações cromáticas, vivas e sutis, destacando suas possíveis harmonias, e – com coragem, também suas notas dissonantes. Suas pinturas fazem uso igualmente de um claro sentido planar, matisseano, que, a exemplo do ensinamento do mestre, buscam um olhar novo e fresco sobre as coisas.” Complementado essa extensa coleção de imagens, incorporam-se os seus objetos, arranjos entre elementos aparentemente díspares que, ao serem combinados, ressignificam, convidam a leituras múltiplas enquanto poemas tridimensionais. “E, penso mais, que depois de um tempo o poema de Helena é ainda mais potente. A imagem mental que se constrói é tão poderosa e menos literal que sentimos pena das belas e frágeis contas negras, envoltas numa transparência gelatinosa, emolduradas por tons alaranjados que cumprem uma efêmera existência.”, conclui Marcelo Salles.

Desde o final da década de 1970 Helena Carvalhosa explora o campo tridimensional por meio de uma investigação sobre as formas e os significados gerados a partir de associações improváveis entre objetos encontrados, tais como potes de vidro, pedaços de madeira, peças de ferro retorcido e molas. O interesse da artista por tais objetos passa não somente pela particularidade de sua composição material e visual, seus significados e usos, mas também pelo vínculo afetivo que possui com cada um deles e com a possibilidade de conservarem histórias. A partir da segunda metade dos anos 1980, Helena Carvalhosa desenvolve, em paralelo, um trabalho em pintura, onde explora a ambiguidade das formas a partir da observação do mundo ao seu redor, desde paisagens até cenas interiores.

Sobre a artista

Helena Carvalhosa nasceu em 1938 em São Paulo, onde vive e trabalha. Iniciou seus estudos em artes na Escola Brasil em 1970 e em 1977 formou-se em Artes Plásticas pela FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado). Ainda no final da década de 1970 estudou na New School of Arts, em Nova York e desde os anos 1980 vem fazendo cursos e sendo orientada por artistas como Hélio Cabral, Nelson Nóbrega, Paulo Pasta e Sara Carone. Sua produção transita entre a pintura, a escultura, o desenho e o objeto. O início de sua carreira foi marcado pela participação na “Mostra de Escultura Lúdica” em 1979 no MASP, que contou com artistas como Palatnik, Tomie Ohtake, Leon Ferrari e Guto Lacaz. Na ocasião, a artista expôs “Estruturas Mutantes”, duas peças formadas por tecido, ferro e isopor que remetiam à forma de um casulo e que podiam ser vestidas e transformadas pelo público. A escolha por materiais acessíveis, de uso cotidiano, é ampliada em “O objeto reinventado”, exposição que ocorreu no SESC Pompeia em 1992 e que reuniu assemblages formadas por objetos descartados, já gastos por outros usos. Sobre aquela produção de Carvalhosa, o crítico Pietro Maria Bardi escreveu: “Com o máximo de simplicidade, Helena demonstra, através da combinação de formas, que aquilo que está ao nosso redor pode ser motivo de fruição estética”. No ano seguinte participou da coletiva “Objeto. Objeto-Livro. Fotografia” na Pinacoteca de São Paulo. Segundo a crítica Maria Alice Milliet, em texto de 1993: “Os objetos de Helena pertencem ao universo feminino da sedução, do jogo de aproximações que transforma o banal em inédito, do encantamento surpreendido no arranjo das coisas inúteis cuja gratuidade retém um frescor derivado da fantasia. Atestam a possibilidade de criar a partir do encontrável, do desprezível, de restos e sobras.” Em 1998, Carvalhosa retorna à Pinacoteca para ocupar um dos “vãos livres” do edifício com “O Caminho: Instalação com Flores”, composta por móveis antigos, fotos de família, vasos, quadros e peças em porcelana, propondo uma reflexão sobre as fases da vida e a passagem do tempo. Em paralelo ao seu trabalho com o campo tridimensional, Helena Carvalhosa desenvolve, desde a segunda metade dos anos 1980, uma produção em pintura. Em seus primeiros anos, centrou-se em paisagens e retratos através do uso mais despojado da pincelada, e a partir de 2005 dá início à transição de sua pintura para uma abordagem mais sintética da composição. Segundo o jornalista Antonio Gonçalves Filho, essas pinturas são “quase um diário íntimo sem compromisso com o tempo, como nas composições intimistas de Morandi, feitas de cores sóbrias e perfeito equilíbrio tonal”. Nelas, a artista ainda mantém o seu interesse pelos objetos, agora amalgamando-os, no campo bidimensional, aos outros elementos do quadro, operação que se dá pelo uso da tinta em diferentes cores e texturas. Em texto para o catálogo da exposição “Pulo do Gato”, apresentada no Museu Afro Brasil em 2016, o curador Marcelo Salles escreve: “a artista lida com um fazer que não é orientado por premissas políticas, sociais, mercadológicas; seu interesse reside numa necessidade ancestral, aquela que existia antes de nomearmos todas as coisas e aprisionarmos não somente coisas, mas nós mesmos”. Em mais de quatro décadas de carreira, participou de inúmeras mostras individuais e coletivas, em instituições como: MASP, SESC Pompeia, Pinacoteca do Estado de São Paulo, Museu Afro Brasil, SESC Belenzinho e Centro de Arte Dragão do Mar, em Fortaleza. Desenvolveu curadorias para o SESC São Carlos, SESC Santana e Museu da Casa Brasileira. Possui três livros publicados: Fazenda Pinhal; Ócio: obras de Helena e poesia de Manoel de Barros; e Pulo do Gato.

Arte Brasileira na Casa Fiat

11/out

Esta é a primeira vez que uma mostra de tamanha robustez é montada em Belo Horizonte, MG, fora do Museu de Arte da Pampulha (MAP) – algumas obras, inclusive, jamais foram vistas que não na icônica construção encravada às margens da Lagoa da Pampulha, pensada originalmente para abrigar um cassino aberto ao público. A exposição “Arte Brasileira” está organizada em seis núcleos inter-relacionados: Conjunto Moderno da Pampulha, Os Modernos, Pampulha Espiralar: Um Lar, Um Altar, Nossos Parentes: Água, Terra, Fogo e Ar, O Menino Que Vê o Presépio e Novos Bustos. Obras de Cândido Portinari, Guignard, Di Cavalcanti, Burle Marx, Mary Vieira, Oswaldo Goeldi, Antônio Poteiro, Yara Tupynambá, Cildo Meireles, Jorge dos Anjos, Vik Muniz, Nydia Negromonte, Froiid, Wilma Martins, José Bento, Eustáquio Neves e Luana Vitra, entre outros, são artistas de diferentes gerações e movimentos que agora se reúnem na exposição “Arte Brasileira: A Coleção do MAP na Casa Fiat de Cultura”, inaugurada em Belo Horizonte.

No terceiro e extenso andar da Casa Fiat de Cultura, cerca de 200 obras, entre gravuras, pinturas, fotografias, esculturas e cerâmicas, nunca antes expostas em conjunto, fazem um importante passeio pela produção artística brasileira dos séculos XX e XXI, ressaltando os principais deslocamentos da arte contemporânea do país. Ali, estão nomes que contribuíram para elevar não só o pensamento estético, mas também uma criação que lançou olhares inovadores e utópicos sobre o Brasil, a partir de uma elaboração da releitura de uma identidade nacional proposta pelo modernismo.

As obras expostas na Casa Fiat evidenciam, também, a característica vanguardista do MAP, como sublinha o curador do Museu de Arte do Rio (MAR), Marcelo Campos, que assina a curadoria ao lado de Priscila Freire, ex-diretora do museu, inaugurado em 1957: “Na arte brasileira, a palavra vanguarda foi inaugurada no modernismo e acompanha essa coleção do MAP, que sempre se mostrou com muita coragem ao constituir seu múltiplo acervo”.

Priscila Freire, que esteve à frente do MAP durante 14 anos, diz que pode contar um pouco dessa história por meio da exposição. “Indiquei obras que considero interessantes da coleção de um museu que passou pelo moderno, pós-moderno e contemporâneo sendo sempre contemporâneo”, comenta.

Fruto da parceria entre a Casa Fiat de Cultura e prefeitura de Belo Horizonte, por meio da Secretaria Municipal de Cultura e Fundação Municipal de Cultura, “Arte Brasileira: A Coleção do MAP na Casa Fiat de Cultura” fica aberta ao público até fevereiro do ano que vem e é parte das celebrações dos 80 anos do Conjunto Moderno da Pampulha, eleito Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco.

Para a secretária de Cultura de Belo Horizonte, Eliane Parreiras, “a exposição é um marco para a história do MAP, abre portas para pesquisas futuras e olhares que até então não tinham sido feitos sobre o acervo e a instituiçao”. Por sua vez, o presidente da Casa Fiat, Massimo Cavallo enfatiza o aspecto ousado, grandioso e inovador da mostra, “que desvela novos ângulos que habitam esse Patrimônio Cultural da Humanidade, nutrindo vínculos de pertencimento e identidades”.

Vocação contemporânea

“Arte Brasileira” dialoga com as indagações que permeiam o que há de mais atual nos debates sociais e com a literatura de Conceição Evaristo, Ailton Krenak e Leda Maria Martins, homenageados e retratados no núcleo Novos Bustos. Muito antes de termos como decolonial ou pós-colonial se popularizarem no nosso vocabulário, as obras que serão vistas na mostra já traziam questionamentos que hoje encontram o pensamento contemporâneo. Quando Marcelo Campos e Priscila Freire propuseram que a exposição revelasse tal traço, perceberam que a coleção do MAP respondia a esse anseio e unia o que é considerado erudito, popular e contemporâneo.

“Só um acervo de vanguarda poderia nos dar insumos e elementos para constituir uma exposição com quantidade de arte popular que temos, com artistas negros e negras e também com muitas mulheres fundamentais para a arte brasileira. A exposição explicita isso, mas também busca renovar a leitura. Muitas obras aqui pertencem ao acervo, mas nunca tinham sido expostas. Isso é fundamental”, explica Campos.

Os quadros “Os acrobatas” (1958), de Candido Portinari, e “Espaço (da série Luz Negra)”, de Jorge dos Anjos, são dois destaques da exposição. “No Portinari é bonito porque a gente vê um artista modernista observando a cultura popular. Uma das utopias modernistas foi pensar uma sociedade mais justa, igualitária, com os ideais humanistas presentes. A grandeza de Portinari foi alertar para um Brasil que tinha na população suas riquezas culturais”, ressalta o curador.

Sobre Jorge dos Anjos, que tem outras duas obras expostas na Casa Fiat, Marcelo Campos salienta que o ouro-pretano ampliou tradições e “é um artista negro que olha para o seu tempo e, por outro lado, não esquece as discussões ancestrais”.

Entre as obras inéditas, vêm à tona o conjunto de pinturas populares e o presépio pertencente ao núcleo O Menino Que Vê o Presépio, montado em uma das pontas do terceiro andar da Casa Fiat. Exibido pela primeira vez ao público, a obra, inspirada em um conto de Conceição Evaristo, tem cerca de 300 peças e é composta por esculturas em cerâmicas originárias do Vale do Jequitinhonha, com autoria de Cléria Eneida Ferraz Santos e Mira Botelho do Vale.

“Esse é outro grande destaque, vamos colocar isso dentro de uma exposição que, em tese, seria de arte moderna e contemporânea. Esse gesto reforça a ideia de vanguarda do acervo do MAP”, afirma Marcelo Campos. Outra novidade fica por conta do restauro de duas obras: “Estandartes de Minas” (1974), de Yara Tupynambá, e “Tempos Modernos” (1961), de Di Cavalcanti, que se juntarão à mostra.

“Arte Brasileira: A Coleção do MAP na Casa Fiat de Cultura” joga luz na potência cromática da arte brasileira e faz as pazes com a diversidade e a força das cores, tão rechaçadas e inferiorizadas por uma leitura antiquada e elitista. Com a mostra, atual e tropicalista, o curador diz que esse trauma pode ser superado: “A cor é uma conquista, horizontaliza a arte”.

Programação paralela

No dia 29 de outubro, às 11h, o Encontros com o Patrimônio convida a diretora de museus da Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte, Janaina Melo, para o bate-papo “Museu de Arte da Pampulha (MAP): Um Museu e Suas Histórias”. O evento é virtual e gratuito, com inscrição pela Sympla. Já no dia 07 de novembro, às 19h30, a Casa Fiat de Cultura realiza um bate-papo presencial com os curadores Marcelo Campos e Priscila Freire.

A exposição “Arte Brasileira: A Coleção do MAP na Casa Fiat de Cultura” fica aberta ao público, na Casa Fiat de Cultura (Praça da Liberdade, 10 – Funcionários), até 04 de fevereiro de 2024.

Novo representado pela Gomide&Co

21/set

É com orgulho que a Gomide&Co anuncia a representação de Megumi Yuasa. A apresentação do seu nome ocorre no contexto de um programa da Gomide&Co que devota especial atenção ao território da cerâmica, tendo como bússola a superação das distinções estabelecidas entre essa técnica e outras linguagens artísticas com vias à afirmação dessa produção no campo da arte contemporânea.

Em uma entrevista de Megumi Yuasa, encontramos a seguinte passagem: “Ao se formar, nosso planeta era uma bola de magma que esfriou e formou a pedra dura. Sobre a pedra veio a água e, dela, a vida. Enquanto isso, a rocha decomposta virou argila. Não fiquei espantado quando a Nasa declarou, há algum tempo atrás, que somos feitos da mesma matéria das estrelas. Todo ceramista sabe isso.” Esse breve trecho resume um dos sentidos centrais da obra do artista, qual seja, nos recordar que há um amálgama entre seres humanos e natureza. Desse ponto de vista Megumi nos apresenta uma série de paisagens imaginadas. Árvores, sóis, luas, montanhas, nuvens, sementes, ganham formas simultaneamente familiares e improváveis, ao mesmo tempo em que se aliam, de forma fiel, ao vazio. Aqui, os espaços preenchidos pelo ar são tão importantes quanto aqueles feitos de matéria concreta. Vazio que, por sua vez, pode nos recordar a dimensão do silêncio. Em meio a um mundo cada vez mais ruidoso, as suas esculturas de acento pictórico evocam uma necessária esfera meditativa. Tendo realizado as suas primeiras exposições ainda no fim da década de 1960, o artistachega aos anos  2020 somando mais de meio século de trajetória como um nome seminal da cerâmica no Brasil. Em realidade, diante das obras de Megumi Yuasa, não se trata de lidar com a especificidade de uma técnica, mas sim pensar na amplitude de sua poética e na sua capacidade de endereçar, a parir dela, um universo de aguda singularidade.

Luisa Duarte

Diretora Artística

Sobre o artista

Megumi Yuasa, 1938. O escultor e ceramista, Megumi Yuasa inicia-se nas artes plásticas em 1964, quando passa a realizar suas primeiras cerâmicas. Viaja em seguida junto a sua companheira Naoko Yuasa ao interior do estado de Goiás, pesquisando técnicas e materiais. Em 1968, realiza em Goiânia sua primeira exposição, e no ano seguinte retorna para São Paulo. Logo seu trabalho passa a ser reconhecido. Já em 1971, frequenta por seis meses a Escola Brasil, a convite do pintor Luiz Paulo Baravelli (1942). Desde o início de sua carreira, Megumi está sempre presente nas mostras de artistas nipo-brasileiros, e nas mostras voltadas para a linguagem da cerâmica. Sempre imbuído de um discurso filosófico e político, é um artista com viés anárquico em suas práticas, na medida que incorpora outros materiais às suas cerâmicas, como metais e tintas, o que foge de um escopo tradicional dentro da cerâmica japonesa. Em 1979, inicia atividades como professor de cerâmica, às quais se dedica até hoje, organizando cursos e oficinas. Entre 1981 e 1982, presta assessoria à Escola Senai Armando Arruda Sampaio. Em 1982, é convidado a ministrar um curso de cerâmica na Universidade Caxias do Sul. No ano de 1984, é convidado pelo Museu de Artes do Rio Grande do Sul – MARGS, a ministrar o curso Observação da Realidade. Em 1987, realiza uma individual na Galeria de Arte São Paulo. Em 1988, recebe o Prêmio Escultura Associação Paulista dos Críticos de Arte – APCA. No mesmo período, morando em Itu, passa a trabalhar na Cerâmica Aruan, de Gilberto Daccache. Lá teve um espaço na fábrica onde modelava suas peças e ensinava o ofício aos jovens operários que produziam utilitários. Além disso, organizou uma biblioteca onde estudavam poesia, música e literatura. Em 1989, viaja a Lisboa (Portugal) para ministrar curso no Seminário de Cerâmica Brasileira em Lisboa. Em 1991, volta a Galeria de Arte São Paulo com nova individual. No fim dos anos 1990 realizou as suas últimas individuais, na Skultura Galeria de Arte (São Paulo), em 1997, e na Galeria LGC Arte Hoje (Rio de Janeiro), em 1998. Das exposições coletivas, cabe destaque às suas participações nas 13ª e 14ª edições da Bienal Internacional de São Paulo (1975 e 1977, respectivamente); na coletiva itinerante Encuentro de Ceramistas Contemporaneos de America Latina, de 1987, que passou pelo Museum of Conteporary Hispanic Art (New York, USA), Museum of Fine Arts (St. Pittsburg, USA), Centro de Arte Contemporâneo (Ciudad de Mexico, México), Museo de la Universidad Nacional de Colombia (Bogotá, Colômbia), Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (Rio de Janeiro); Sala Nacional de Exposiciones (Buenos Aires, Argentina), entre outras. Também participa da coletiva Laços do Olhar, em 2008, no Instituto Tomie Ohtake (São Paulo) e, em 2023, integra a coletiva O Curso do Sol, na Gomide&Co, também em São Paulo. Participa de várias edições de festivais e encontros de ceramistas, além de mostras realizadas por ocasião de aniversários da imigração japonesa ao Brasil. Ao longo de sua carreira, e até os dias de hoje, Megumi Yuasa também ministra oficinas, palestras e cursos dentro dos temas que abrangem suas práticas artísticas.