Samico & Suassuna

25/set

A Galeria BASE, Jardim Paulista, São Paulo, SP, cumprindo todos os protocolos determinados pelas autoridades, exibe “Samico e Suassuna -Lunário Perpétuo” com, aproximadamente 39 obras, entre xilogravuras e iluminogravuras, de Gilvan Samico e Ariano Suassuna, complementadas por trabalhos de Ana Maria Maiolino, Derlon e Goeldi. O texto é assinado por Douglas de Freitas. A exposição marca a abertura da nova sede da galeria, em imóvel com projeto assinado por Isay Weinfeld, agora tendo à frente Daniel Maranhão, Leonardo Servolo e Cássia Malusardi.

“Lunário Perfeito”, de Jerônimo Côrtes, é um livro em forma de almanaque ilustrado, escrito em 1954 e ilustrado com xilogravuras, que serviu de inspiração ao movimento do Cordel no nordeste brasileiro. A exposição busca contextualizar o movimento, que teve início no século XVI, em Portugal, até o Movimento Armorial de 1970, cujo objetivo foi a criação de uma arte erudita fundada na arte popular nordestina, contemplando todos os tipos de manifestações artísticas.

“A obra de Samico tem como cerne a técnica de xilogravura, utilizada por artistas da Literatura de Cordel, como por exemplo o grande cordelista J. Borges. Brasões, insígnias, e diversos símbolos são vistos na produção do artista, que de maneira própria, constrói uma narrativa traduzida em imagens de contos, lendas, anedotas e histórias. Essa forma de compor pode ser vista também no próprio conjunto de Iluminogravuras produzidas por Ariano Suassuna” define Douglas de Freitas.

Os trabalhos de Samico, que abrangem o período das décadas de 1950 a 2012, são xilogravuras com técnica única, registram personagens bíblicos, animais fantásticos, histórias e lendas do romanceiro popular. Seu reconhecimento como artista atravessa fronteiras e compõe acervos de diversos museus e instituições internacionais. Além do MoMA/NY, o artista também possui em seu currículo participação nas Bienais Internacionais de Veneza e São Paulo. “Três Mulheres e a Lua”, de 1959, exposta ao lado da “Nuvem”, xilogravura de Goeldi, exibe um dos registros resultantes do período onde Samico estudou com o artista, em 1958, e se pode verificar a visceral influência em sua obra.

Ariano Suassuna, Imortal da Academia Brasileira de Letras, exibe sua pouco conhecida faceta de artista visual, com as iluminogravuras executadas na década de 1980, que compõe os álbuns “Dez sonetos com mote alheio” e “Sonetos de Albano Cervonegro”. Seus trabalhos têm inspiração nas iluminuras da idade média, quando os manuscritos eram ilustrados e pintados à mão. O neologismo iluminura + gravura dá nome a esta produção. “As iluminogravuras aliam poesia à pintura, onde se destacam imagens humanas, animais, brasões e insígnias, ao lado de textos literários, alguns escritos com um alfabeto criado por Suassuna, em total consonância ao que previa o Movimento Armorial, por ele proposto em 1970”, acrescenta  Daniel Maranhão.

Integram a mostra: a artista ítalo-brasileira Anna Maria Maiolino, que também estudou com Goeldi e produziu uma série de xilogravuras como “Glu Glu” e “Ecce Homo”, com o Cordel como tema; a obra do grafiteiro pernambucano Derlon, com trabalho fortemente impactado pelo Cordel e pelo Armorial, representa a contemporaneidade de tais linguagens; como também exemplares de livretos de cordel do artista J. Borges, capas de LP’s do Quinteto Armorial, algumas publicações literárias de Ariano Suassuna e vídeo com compilações que incluem algumas cenas de “Auto da Compadecida”, de Guel Arraes, parte de um show de Antonio Nobrega e um recorte de uma entrevista com Suassuna.

Até 14 de novembro.

 

Thomaz Rosa na Artsy

22/set

A Bergamin & Gomide, Jardins, São Paulo, SP,  tem o prazer de apresentar obras do artista Thomaz Rosa na Latitude Art Fair, que acontece de 24 a 27 de setembro, na plataforma Artsy.

O cerne do trabalho do Thomaz é a relação do pensamento e da prática. O pensamento da pintura e pensamento do pintor são elementos intrínsecos ao seu processo criativo, que perpassam as questões clássicas e atemporais da prática da pintura, mas que encontram significado na essência da execução.

 

Sobre o artista

Linhas, grafismos, gestos reflexivos, composições a partir de pontos e formas concretas, analogias verbais de imagens: marcas presentes na obra de Thomaz Rosa. Seus trabalhos são pensados como construções autônomas capazes de descrever a sensação do processo criativo – entre um idealismo romântico e um planejamento racional diante a tradição moderna. As obras de Rosa parecem sempre questionar sua inserção no mundo, de forma semiológica, onde a obra tenta de forma recíproca conviver com a história. A prática de Thomaz tenta re-processar, por meio de suas próprias línguas em prosa, as influências que, subjetivamente, ele escolhe como uma referência entre vários pintores-artistas, brasileiros ou não, em momentos específicos da própria produção. Essas escolhas mantêm um caráter transeunte com a coisa, uma caminhada que parte sem um objetivo claro, em que caminhar sem destino faz do eu um flâneur no meio dessas escolhas, intrincando uma interação entre matéria e significado. Assim, as discrepâncias entre singularidade e todo, indivíduo e história, experiência pessoal e significação, passam a assumir uma forma cristalina. A memória simbólica, sua força empírica e a vivência imediata do artista com a obra tomam corpo no projeto. O objetivo último de Rosa é mostrar uma pintura que fala de pintura; mostrar uma ou mais declinações de várias linguagens, porque a linguagem é fluida e mutável, e, assim como a arte de Thomaz, caminha em constante evolução. por Luiza Teixeira de Freitas

Thomaz Rosa (1989). Vive e trabalha em São Paulo. Em 2009, iniciou sua formação em Bacharelado e Licenciatura em Artes Visuais pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual de São Paulo – UNESP. Entre 2012 e 2013, fez residência na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto – FBAUP, em Portugal. Fez assistência para artistas como Lucas Arruda, Claudio Cretti, Caetano de Almeida, Marina Rheingantz, Paulo Monteiro e Sergio Sister. Em 2016, participou das exposições “Oito Artistas” na Galeria Mendes Wood DM, organizada pelos artistas Bruno Dunley e Lucas Arruda; “Circumscriptio, Compositio, Receptio Luminum” na BFA Boatos Fine Arts; “Um desassossego” na Galeria Estação; e a coletiva “Na soleira da noite” na Galeria Sancovski. Em 2017, realizou sua primeira individual “Unwelt” na BFA Boatos. No ano de 2018, fez residência artistica no PIVÔ. Em 2019, participou da exposição “Fevereiro” na Mendes Wood DM; e realizou sua segunda exposição individual e primeira na Europa “Intorno alla mia cattiva educazione” na galeria Castiglioni, em Milão. Também em 2019, organizou o projeto “Featuring” em parceria com os artistas Leandro Muniz e Marcelo Pacheco, e exposição no Ateliê Massapê. Em 2020, participou da coletiva Entre Bordas no SESC Santo André com curadoria de Paula Braga.

 

Matrioshka, mostra coletiva

17/set

 

A Bergamin & Gomide, Jardins, São Paulo, SP, e o Projeto Vênus têm o prazer de apresentar a coletiva “Matrioshka”, com obras das artistas Flora Rebollo, Giulia Puntel, Janina McQuoid e Paula Scavazzini. A exposição acontece de 19 de setembro a 31 de outubro de 2020.

“Matrioshka” parte de um processo criativo coletivo através de encontros virtuais entre as artistas, o Projeto Vênus e a equipe da Bergamin & Gomide.

A exposição será em 3 atos porque serão 3 os momentos em que a montagem poderá ser reconfigurada, assim, constitui-se como impermanente, uma vez que o espaço expositivo estará suscetível a transformações conforme as obras vão sendo inseridas, reorganizadas ou retiradas.

Enquanto a exposição estiver em cartaz, o conteúdo de comunicação também seguirá o fluxo dessas novas inserções de obras e diálogos. O público poderá acompanhar simultaneamente nas nossas redes sociais as transições da exposição, bem como a imprensa, que terá acesso aos novos materiais produzidos até o encerramento da coletiva.

Visitação: Segunda a sexta-feira das 10 às 19 horas, sábados das 11 às 15 horas.

 *O uso de máscara é obrigatório em espaços de uso coletivo.

Turbulências Cerâmicas 

14/set

A Galeria Simões de Assis, Jardins, São Paulo, SP, apresenta entre os dias 19 de setembro e 31 de outubro, a exposição “Turbulências Cerâmicas” individual de Juan Parada na qual explora uma via escultural inteiramente diferente. Seus relevos, nascem da alquimia da cerâmica e de seu lento processo – orquestrado pela mão e pelo calor do fogo – que leva do “húmus” da terra ao “lápis-lazúli” da pedra. No entanto, diferentemente da cerâmica milenar, essa transmutação não para na queima, mas se estende pelo aspecto versátil das obras e pelas suas muitas ressonâncias com a vida.
As turbulências cerâmicas de Juan Parada
Na era atual das impressoras 3D que expelem vagarosamente um fio de plástico derretido para materializar uma sequência digital de abscissas e ordenadas, Juan Parada (nascido em Curitiba, em 1979, atualmente vivendo e trabalhando em São Paulo) explora uma via escultural inteiramente diferente. Seus relevos, dos quais trataremos aqui, nascem da alquimia da cerâmica e de seu lento processo – orquestrado pela mão e pelo calor do fogo – que leva do “húmus” da terra ao “lápis-lazúli” da pedra. No entanto, diferentemente da cerâmica milenar, essa transmutação não para na queima, mas se estende pelo aspecto versátil das obras e pelas suas muitas ressonâncias com a vida.
Com efeito, o processo de realização dessas pinturas em relevo mostra-se livre de nostalgia do artesanal, na qual Last tweaks Os diversos micro-padrões e modulações luminosos revelam-se apenas ao observador atento, como em Estratificação Geométrica (2019), na qual a forma facetada de cada módulo produz um jogo de luz e sombra, dando a impressão de cores e tons instáveis. A cerâmica é considerada por Parada um “meio elástico”, de “natureza mais subversiva”, ao contrário das limitações impostas pelo seu uso tradicional. Assim moldada e harmonizada na sua composição, cada obra surge como um labirinto dotado de mil entradas e saídas, através do qual o olhar – canalizado, pois submetido a esta condução hipnótica – retorna constantemente em seu caminho. As correntes e ondas petrificadas, como que interrompidas em seu movimento, tal qual fragmentos congelados de um continuum, retêm o olhar –  tem-se aqui em mente The Great Wave off the Coast of Kanagawa, a famosa gravura de Hokusai (1830).
A complexa geometria ondulatória que norteia principalmente os patterns óticos de Estranhos Atratores I e II é herdada de artistas do neoconcretismo. Podemos citar, por exemplo, Lygia Clark. Seu primeiro Bicho, em 1960, já aliava o rigor geométrico à variabilidade dos seres vivos, e foi dado a Sérgio Camargo, cujos relevos monocromáticos, povoados por pequenos cilindros cortados, eram igualmente ambíguos. Além dessa referência óbvia, Parada também toma emprestado o movimento característico de seus patterns da arte cinética dos anos 1960 e 1970, como de Bridget Riley, Enrico Castellani e Abraham Palatnik. No entanto, seus relevos, como Linhas de Força (2016), remetem a elementos biológicos – como teias de aranha e a carapaça ou pele de certos répteis – pois Juan Parada apresenta acima de tudo uma estética naturalista, orgânica (mesmo visceral). Pequenas ondas de areia criadas pelas correntes marítimas lhe servirão, por exemplo, de ponto de partida para os relevos da série Elogio à Água (2018), cujos moldes foram confeccionados diretamente nas praias de Superagui (especialmente preservadas da presença humana).
Uma história naturalista, até mesmo ecológica, se revela igualmente nas primeiras esculturas de vidro transparente em forma de colmeia e com conteúdos vegetais diversos (Série Invólucros, 2013-15), destinadas a serem inseridas nos relevos arquitetônicos. Já os Volumes Simbióticos (2011-12) evocam as formas básicas da Minimal Art – como os L-Beams (1965) de Robert Morris –, mas com uma das superfícies, externa ou interna,  dotada de abundante vegetação. Essas formas por vezes chegam a envolver o observador – à maneira de Anish Kapoor –, mas em uma matriz muito densa, constituída de plantas e flores (Memória da Matéria, Museu da Gravura, Curitiba, 2012). Aliás, somente em 2018 esse tipo de ambiente foi mineralizado, com a obra Glaciares, que incorpora uma superfície all-over em cerâmica monocromática. Trata-se de um quadro panorâmico de imersão, evocando a curva panorâmica das Nymphéas, de Claude Monet, no Museu Orangerie em Paris (1915-26).
Mesmo que a forma em tondo (circular) de certos relevos ecoe a história da shaped canvas, Parada direciona o espectador ao interior do padrão visual, em vez de lhe oferecer um objeto de estudo a ser observado à distância, friamente (temos aqui em mente Mark Rothko ou Barnett Newman, que preconizavam uma distância reduzida entre suas obras e os espectadores, no intuito de aumentar a sensação de imersão). Esse tropismo de absorção – tanto do olhar como do corpo – é essencial nas pinturas em relevo. Tal prática é, aliás, um paradoxo em Parada: faz coexistir, e isso não é simples, o caráter ondulatório e fenomênico da vida com a invariável dureza do “lápis-lazúli”, o rigor geométrico do pattern e a materialidade curvilínea dos relevos, cujas saliências e reentrâncias evocam as do corpo humano. Um relevo recente, Cascata Invertida (2020), apresenta claramente um motivo de onda, é verdade, porém voltada para cima, invertendo o sentido da gravidade. Várias excrescências, ora orgânicas, remetendo a vísceras, ora geológicas,  evocando rochas, emergem dessas ondas verticais. A sua estranheza, podendo despertar certa aversão, refuta o registo ornamental ao qual se poderia erroneamente associar o artista. Essa prática, que se desenvolve há cerca de dez anos, por mais singular e promissora que seja, insere-se em uma perspectiva histórica mais ampla.
O fazer artístico de Parada tem suas raízes nos anos do pós-guerra, quando se misturam arte abstrata e psicologia da percepção, régua óptica e traço manual, cinetismo e neoconcretismo, geometria e psicodelia. Entre os atores de vanguarda, o alemão Heinz Mack, – fundador do grupo ZERO, em 1957, com as obras intituladas Metallreliefs ou Lichtreliefs – estabelece um diálogo constante, importante para Juan Parada, entre ordem e caos,  matéria e luz. Embora abstratas, suas duas obras evocam a ação de elementos naturais – luz do sol, vento e chuva em superfícies aquáticas ou desérticas –, cuja aparência não deve nada ao acaso, mas surge da ação de forças fluidas sobre um material maleável – sem  desconsiderar, ao mesmo tempo, a rigorosa economia de meios visuais de Lee Ufan (dando simples toques de tinta em relevo em telas imaculadas). O resultado geral desse processo evoca, naturalmente, os tecidos plissados e recobertos com caulim branco de Piero Manzoni, para sua série de “Achromes”. Porém, enquanto o trabalho do italiano lembra as dobras das esculturas da Antiguidade, as obras de Mack e de Parada distinguem-se por seu eco natural e sua dinâmica perceptiva.
Heinz Mack expressou do seguinte modo esse desejo de separar a parte fenomênica e perceptiva da obra de seu suporte estritamente material: “Eu não enxergava mais um relevo de metal, mas uma estrutura vibrante e pulsante, feita de luz. Minha impressão era de que a estrutura pairava sobre o relevo de metal, dele se separando, como o reflexo da luz no mar que começa a vibrar sob o sol intenso, assumindo a aparência de um tapete de luz feito de reflexos de uma luz dançante”[1]. Com outros termos estéticos e materiais, Juan Parada pretende, através de uma matriz material e tangível, tornar-nos conscientes da natureza ondulatória, rítmica e corporificada da vida, como resistência última ao devir digital do mundo.
Prof. Dr. Matthieu Poirier

[1] Heinz Mack, citado por Yvonne Schwarzer [tradução nossa], Das Paradies auf Erden schon zu Lebzeiten betreten. Ein Gespräch mit dem Maler und Bildhauer Heinz Mack, Witten, ars momentum Kunstverlag GmbH, 2005, p. 15.

 

A Gentil Carioca, ano 17

09/set

17 Anos A Gentil Carioca [17 Years A Gentil Carioca]

No dia 06 de setembro seria o 17º aniversário Gentil, gostaríamos muito de celebrar na Encruzilhada, mas nesse ano atípico, nossos planos precisaram ser adiados. Apesar da distância, seguimos fortes e unidxs por essa magia que só a arte é capaz de conjurar. Sobretudo, queremos enfatizar nosso amor e gratidão a cada um que segue apoiando, acreditando, vivendo e escrevendo conosco tantas histórias incríveis. Sejam vocês amigxs, artistas, curadores, críticos, colecionadores, equipe, colaboradores, visitantes, simpatizantes, vizinhança do Saara, ou pessoas que simplesmente circulam pelas redondezas e buscam refúgio em nossos corações. É essa mistura gostosa que faz a Gentil ser A Gentil Carioca!

Os espaços internos da galeria seguem fechados, mas estamos a todo vapor com novos projetos e uma programação que pode ser acompanhada de forma online. Atualmente, na área externa, está em atividade a 36º PAREDE GENTIL realizada pelo coletivo água de beber em parceria com Mais Amor Menos Capital e Taboa Engenharia e o Gentil Apoio da 342 Artes. Você pode ver o projeto, em tempo real, através de nosso site.

Muito obrigado!

 

Equipe A Gentil Carioca

 

Se precisar de mais informações entre em contato pelo correio@agentilcarioca.com.br

Exposição Manuel Messias dos Santos

25/ago

 

A Galeria Evandro Carneiro Arte, Gávea, Rio de Janeiro, RJ, apresenta de 29 de agosto a 23 de setembro a Exposição Manuel Messias dos Santos.  A mostra conta com trinta gravuras do artista nascido em Sergipe, mas que fincou suas raízes no Rio de Janeiro. Nordestino, pobre e doente, acabou vagando pelas ruas do Rio de Janeiro sem o sucesso merecido. Sua arte evidencia expressões das mazelas sociais que nos assombram historicamente. Além da força imagética de seu trabalho, a narrativa em linguagem própria nos deixa um legado de mistério, ainda a ser revelado. Em destaque as obras “O que tem na fala do Cão da lua?”, “Por que me abandonaste”; “Fuga”, entre outras.

“Não preciso de côr – afirma – ela diminui a agressividade da gravura. Me basta o conflito do preto e do branco.”

Manuel Messias dos Santos ao crítico Frederico Morais para o Diário de Notícias (1968).

“Outro dia cruzei com Manoel Messias num dos corredores da Funarte. Trazia debaixo do braço um rolo com suas gravuras. Nervoso, ao mesmo tempo tímido e agressivo, atento e desligado, rosto encovado, os olhos ameaçando explodir. Ali mesmo no chão abriu suas gravuras, enormes, verdadeiros cartazes. Entretanto, o que ele anuncia não são amenidades ou veleidades, nem slogans ou mercadorias. Anuncia a dor e a revolta, abre a boca, cospe sangue, exala o protesto, espuma raiva. Finca o mastro, abre a bandeira e como um Messias condena o erro e antecipa a palavra final. Sua gravura, em que sobram os espaços brancos e o vermelho e o azul são as únicas cores empregadas, tem algo de bíblico. E apesar da rigorosa economia de recursos, é uma gravura sofrida, amarga e de forte impacto visual. (…) Sobram qualidades em sua gravura. Qualidades que já deveriam ter sido notadas pelas galerias e organismos culturais.”  Frederico Morais, “Gravura de Manoel Messias. Galeria de Arte em casa”, In. Coluna Artes Plásticas, O Globo 28/02/1979.

A mostra será aberta ao público SEM VERNISSAGE devido à pandemia, durante o horário de visitação da galeria, de segunda a sábado, das 10h às 19h.

O shopping Gávea Trade Center funciona com obrigatoriedade do uso de máscaras e fornece álcool em gel e medição de temperatura para quem entrar. Não há necessidade de agendar a visita, pois o espaço é grande e sem aglomerações.

Sobre o artista:

Em sua coluna Artes Plásticas no Diário de Notícias de 07 de agosto de 1968, Frederico Morais dedicava-se à Gravura de Manuel dos Santos e dizia o seguinte, a propósito de uma exposição do artista que inaugurava naquela ocasião:

“Manuel dos Santos, ou Manuel Messias para alguns amigos, é de Sergipe, onde viveu até os cinco anos de idade, acostumando-se a uma paisagem de extrema penúria. Na sua descida para o sul, o que fêz com sua tia e sua avó, de caminhão, parou primeiro na Bahia, onde ficou uns 2 anos. Após o que se mandou de trem para o Rio. E enquanto sua tia trabalhava como doméstica na casa do ex-diretor do MAM Leonidio Ribeiro, Manuel dos Santos fazia alguns rabiscos e ensaiava seus primeiros contatos com a pintura. Chegou mesmo a frequentar, como ouvinte, a Escola Nacional de Belas Artes, inclusive assistindo as aulas de Abelardo Zaluar. Acabou sendo notado, e pelas mãos de Marilu Ribeiro foi levado a Ivan Serpa, em 62, que contudo, achou ruim seus pastéis e pinturas. Manuel dos Santos, porém, não desanimou e foi ficando, olhando, lendo alguns livros recomendados por Ivan Serpa. Até que decidiu fazer xilogravura, devido, talvez, à presença de Mirian Cerqueira. E o professor que não aprovara sua pintura não teve dúvidas em elogiar a sua gravura. A partir de então, Manuel dos Santos jamais pegou em pincéis ou fêz uso das côres.”

Conforme resumiu o próprio artista em entrevista ao jornalista crítico de arte para a matéria: “ – ‘Não preciso de côr – afirma – ela diminui a agressividade da gravura. Me basta o conflito do preto e do branco.’ E Manuel dos Santos explica a evolução de sua gravura: ‘primeiro, era preciso dominar a linguagem. Conseguindo isto era preciso dizer. Foi quando então senti vontade de falar da fome e da miséria que eu vi na minha infância lá no Nordeste. Mulher virando boi é uma das gravuras dessa época. Finalmente, a descoberta da madeira e seu domínio. O tema, hoje, é de importância relativa, pelo menos em relação ao próprio ato de gravar. É por isso que o fantástico vai tomando o lugar da realidade. A realidade da gravura: eis o que importa. Ou ainda, o desenho é puro pretexto para cavar a madeira. O objetivo não é gravar o desenho, mas dar ao corte um sentido de autonomia, como que um valor próprio’.”

Frederico Morais finaliza a crítica daquela semana, contando-nos sobre o desafio do artista quanto à tiragem: “Manuel dos Santos gostaria de ampliar o tamanho de sua gravura e eliminar o preconceito da tiragem. Fazer gravuras de dois metros ou mais e tirar 50, 100 cópias para baratear o preço individual. Só assim, entende, a gravura poderá atualizar-se e romper com suas origens medievais.” (Frederico Morais, “A gravura de Manuel dos Santos”, In. Coluna Artes Plásticas, Diário de Notícias, 07/08/1968).

Alguns anos antes, na mesma década em que Frederico Morais escreveu a matéria acima, reproduzida quase na íntegra aqui, Evandro Carneiro frequentara o curso de Ivan Serpa no MAM a que Frederico se refere, tendo sido colega e amigo de Messias. Evandro relembra que o trabalho pictórico inicial do artista “era realizado com pasteis oleosos e carregava uma grande influência de Van Gogh”. Tratava-se de “um jovem bastante talentoso e de grande curiosidade intelectual. Ele adorava Dostoievski exatamente devido àquele clima pesado com o qual se identificava. Em 1974 Evandro organizou na Bolsa de Arte uma exposição de Messias, Goeldi e Grassmann, pela semelhança temática e da gravura dos artistas.” E acrescenta:

“Alguns artistas têm a sua obra indissociável de sua biografia. No caso do Messias, para conhecer a sua obra, é importante notar que ele entrou num agudo e irreversível processo de esquizofrenia, com algumas internações e muita resistência quanto à institucionalização. Fugia sempre, não tomava os remédios e usava drogas na rua, onde vivia com sua mãe. Após o falecimento da mesma, seu quadro clínico se agravou. Mas ainda assim ele produzia sem parar e houve um período em que ele construiu um vocabulário próprio, com um alfabeto que se tornava cada vez mais presente em sua obra. As letras tinham origens diferentes, sendo uma grega, outra do latim antigo, e ele misturava tudo numa linguagem própria, cujo sentido é difícil decifrar. Eu tenho um álbum com uma série de gravuras e esse código ao final, no entanto é impossível entender.” (Evandro Carneiro, entrevista oral realizada em 19/05/2018).

Retornando a Frederico Morais, já em outro jornal onde tinha sua coluna de artes plásticas e uma década depois da primeira crítica citada aqui, ele relata um caso sobre o artista que revela algo sobre a confusão psíquica de Messias:

De fato, desde 1965 o artista apresentou seus trabalhos em alguns espaços, mas permaneceu sempre a espera de reconhecimento: coletivas que incluíram os Salões de Arte Moderna (1965/1968) e de Artes Plásticas (1966). Participou de importantes eventos internacionais, como a Bienal de Desenho e Gravura da cidade do México (1979), onde  conquistou o prêmio de sua área, a I Bienal Iberoamericana de Arte (1980), além de salões regionais pelo Brasil. Realizou ainda algumas mostras individuais nos anos 1980/ 1990 e após a sua morte. Nos últimos anos de sua vida, amigos, marchands e artistas tentaram ajudá-lo a sair das ruas e a promover sua obra, mas Messias era resistente e insistia em não se tratar. Faleceu em 2001 já completamente envolvido pela mendicância.

Esta exposição na Galeria Evandro Carneiro Arte reúne gravuras de duas coleções de amigos de Manuel Messias. Procuramos o Frederico Morais, crítico de arte icônico que também conheceu bastante o artista, para referenciar o talento e a importância de sua obra, a partir de textos originais sobre o artista. No fundo, a história de Messias diz muito sobre o nosso país: nordestino, pobre e doente, acabou vagando pelas ruas do Rio de Janeiro sem o sucesso merecido. Sua arte evidencia expressões das mazelas sociais que nos assombram historicamente. Além da força imagética de seu trabalho, a narrativa em linguagem própria nos deixa um legado de mistério, ainda a ser revelado, que também compõe a sua obra.

Laura Olivieri Carneiro  Agosto de 2020

Ecolines

04/ago

A exposição da artista Maureen Bisilliat poderá ser visitada a partir de 05 de agosto a 03 de outubro na unidade Jardins, São Paulo, SP, respeitando todos os protocolos e recomendações das autoridades de saúde, com visitas mediante agendamento pelo email: info@galeriamarceloguarnieri.com.br, ou pelo telefone:  11 – 3063 5410.

 

A Galeria Marcelo Guarnieri tem o prazer de apresentar ECOLINES, primeira mostra em nossa unidade de São Paulo da fotógrafa Maureen Bisilliat, que passa a ser representada pela galeria. A exposição será a primeira a ser realizada em circuito comercial e contará com obras das séries “Ecolines” (1960-2020) e “Sertões” (1960- 2020), de tiragem limitada. Na série “Ecolines”, Bisilliat apresenta fotografias feitas na década de 1960 em viagens pelo Brasil posteriormente modificadas por intervenções feitas com a tinta Ecoline. O processo consistia em ampliar as fotografias em preto e branco e “tintá- -las” através de um método intuitivo, retomando a prática de pintura que desenvolvia em suas aulas no Arts Students League, durante a década de 1950 em Nova York. As fotografias, que ficaram em pausa durante sessenta anos nos arquivos da artista, foram reencontradas no último ano e passaram por uma série de processos antes de se apresentarem como se vêem na exposição. Elas foram digitalizadas, impressas em tamanho reduzido, fotografadas novamente e finalmente impressas em uma escala maior à que originalmente havia sido ampliada. Essas “tintagens” e “refotografias” acabam produzindo ambiguidades na estrutura da imagem enquanto tal: entre os elementos da composição – pelo jogo de luz e cores –, assim como entre o limite da imagem como superfície e como objeto, remetendo à materialidade da fotografia analógica. Para Bisilliat, tais processos, posteriores ao registro fotográfico, constituem um momento particular de reflexão e construção do trabalho, onde se entrecruzam temporalidades múltiplas: “o instante da foto / o tempo do acontecer / a memória do fato / a reinvenção da imagem / os processos editoriais / o cotidiano / o originário / o sem fim…”.

 

Todos esses processos, incluindo a composição dos conjuntos durante a montagem, contaram com o envolvimento de diversas pessoas, que com saberes e maneiras distintas de atuação, foram de fundamental importância para dar origem à nova forma de vida dessas imagens. A série “Sertões” é composta por fotografias feitas entre os anos de 1967 e 1972 em aldeias e lugares santos dos municípios de Canindé, Juazeiro do Norte e Bom Jesus da Lapa, nos estados do Ceará e da Bahia e contou com o incentivo de uma Bolsa do Guggenheim.

 

Algumas das imagens dessa série deram origem à publicação “Sertões: Luz & Trevas”, de 1982, que combina trechos do clássico “Os sertões” de Euclides da Cunha aos seus registros fotográficos, produzindo diálogos, justaposições e dissonâncias. Os conjuntos apresentados na exposição misturam fotografias em cores e fotografias em preto e branco modificadas por intervenções de cor.

 

Sobre a artista

 

Nascida na Inglaterra em 1931 e radicada no Brasil, Maureen Bisilliat é responsável por uma investigação fotográfica de mais de cinquenta anos. Viajou intensamente quando criança, uma vida desenraizada que levou à busca de raízes que caracteriza o seu trabalho. Após estudar artes plásticas na França e nos Estados Unidos, estabeleceu-se na cidade de São Paulo na década de 1950, atuando inicialmente como fotojornalista nas revistas Realidade e Quatro Rodas a partir de 1962. Durante os dez anos que trabalhou para a Editora Abril, pôde fotografar em contextos diversos do Brasil, produzindo ensaios que ficaram célebres, dentre eles “Caranguejeiras”, no qual retrata mulheres catadoras de caranguejos na aldeia paraibana de Livramento.

 

A curiosidade por um Brasil ainda desconhecido durante a década de 1960 se associa ao fascínio por obras literárias brasileiras e resulta em um projeto de longa duração que Bisilliat classificou como de “equivalências fotográficas” com a literatura. Produz, entre as décadas de 1960 e 1990, uma série de livros de fotografias que dialogam com as obras de Jorge Amado, Guimarães Rosa, Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Ariano Suassuna, Adélia Prado e Euclides da Cunha. Em 1985 expõe em uma sala especial da XVIII Bienal de São Paulo um ensaio baseado no livro “O turista aprendiz” de Mário de Andrade. Na década de 1980, começa a dedicar-se também ao audiovisual, lançando em 1981 o documentário “Xingu/ Terra”, filmado com o diretor de fotografia Lúcio Kodato, na aldeia Mehináko do Alto Xingu. Foi curadora da Sala Especial XINGU TERRA, instalada na XIII Bienal de São Paulo (1975). Seu olhar devota uma especial atenção ao fator humano, interesse que pode ser observado na multiplicidade de retratos que compõem a sua obra e no registro das manifestações culturais dos retratados, seja através da vestimenta do sertanejo, da pintura corporal da indígena, da rede do pescador ou da fantasia da carnavalesca. A ideia de equivalência que utilizou para definir seu trabalho com a literatura, norteia também a sua prática através da relação de cumplicidade e troca que constrói com aqueles que retrata enquanto filma ou fotografa. “Forma-se uma cumplicidade natural. Eu não gosto da solidão. Não gosto de trabalhar sozinha”, afirma Maureen .

 

Maureen Bisilliat foi bolsista da Fundação Guggenheim, do CNPq (1981-1987) e da Fapesp (1984-1987). Em 2010 foi vencedora dos prêmios Porto Seguro de Fotografia, Ordem do Ipiranga, Ordem do Mérito Cultural e a Ordem do Mérito da Defesa. Desde fevereiro, Bisilliat apresenta na sede de São Paulo do IMS “Agora ou nunca – Devolução: paisagens audiovisuais de Maureen Bisilliat”, exposição que percorre seu vasto acervo audiovisual, concebida em colaboração com Rachel Rezende. O Instituto é detentor do acervo fotográfico de Bisilliat desde o ano de 2003.

Claudio Tobinaga, Jimson Vilela e Yoko Nishio

29/abr

Na quinta e última semana da “Seleção de obras de arte” nas páginas digitais da galeria Simone Cadinelli Arte Contemporânea, Ipanema, Rio de Janeiro, RJ, o público verá trabalhos dos artistas Jimson Vilela, Yoko Nishio e Claudio Tobinaga.

 

As obras desta semana de 27 de abril a 1º de maio são: “Sem título” (“Distorção”), 2019, de Jimson Vilela; “Vista Pitoresca de Bertillon 2” (2019), de Yoko Nishio e “Viva Melhor” (2018), de Claudio Tobinaga.

 

“O sentido de deslocamento do que entendemos como realidade pode ser observado nas três obras selecionadas”, comenta Érika Nascimento, gestora artística da galeria. Em “Distorção” o papel do livro em branco na biblioteca, “Viva Melhor” com uma paisagem “bugada”, e “Vista Pitoresca de Bertillon”, onde o objeto capacete torna-se protagonista, ao invés do indivíduo.

 

São partes fundamentais da poética de Jimson Vilela a palavra, a linguagem e a gramática. Da mesma forma, os suportes que utiliza – o livro e o papel – integram sua pesquisa. “Distorção” – impressão com pigmento mineral sobre papel Photo Rag Baryta 315 – é uma relação direta com as folhas de papéis em branco de um livro, inseridas em seu ambiente usual de leitura.

 

A série de aquarelas “Vista Pitoresca de Bertillon”, de 40 x 30 cm, de Yoko Nishio, reverte o procedimento criado em 1879 por Alphonse Bertillon (1853-1914) – o Sistema de Identificação Criminal, que padronizou a imagem e ficha fotográfica policial – em que é o capacete o personagem ameaçador.

 

Na pintura em óleo sobre tela, de 140 x 100 cm, Claudio Tobinaga faz uma das raras paisagens em sua produção, em que usa elementos do cotidiano carioca. Em “Viva Melhor” (2018), estão presentes as listras, uma constante em seus trabalhos, que representam o “glitch” (erro) da imagem, uma paisagem em processamento, “bugada, como as falhas das imagens das barras de rolagem das redes sociais, em estado de quase desaparecimento”.


Novo espaço na Simone Cadinelli

13/mar

Quando abriu a exposição “A vulnerabilidade da solidez”, com uma instalação inédita da artista carioca Isabela Sá Roriz, em uma edificação que estava desocupada ao lado, Simone Cadinelli Arte Contemporânea passa a ocupar mais um espaço – o terceiro – na vila situada na Rua Aníbal de Mendonça, Ipanema, Rio de Janeiro, RJ.

 

Apostando na relação entre arte/arquitetura/urbanismo, e assim reverberando as discussões provocadas pela escolha da UNESCO de o Rio de Janeiro, este ano, ser a Capital Mundial da Arquitetura – por conta da realização em julho do Congresso Mundial de Arquitetura – Simone Cadinelli convidou Isabela Sá Roriz para fazer esta intervenção. Com materiais compostos por polímeros (macromoléculas) de diferentes densidades, como cera – principalmente de abelha – látex e silicone, a artista investiga estratégias de potência e intensidade dos corpos, diante das tentativas de controle das percepções.

 

“Já que nossa sociedade é uma construção disforme, e que passamos por vários processos autoritários de formatação, quis apresentar distorções de corpos, fluxos, insubordinações de materiais, o disforme enquanto potência, em contraposição e tensão, às contenções geométricas e aos processos de formatação”, explica Isabela Sá Roriz. A artista quis propor uma diferente relação do corpo e a espacialidade, “com potência e intensidade”. “A cera, com uma densidade diferente, um sólido maleável, geométrico, apresenta uma estrutura de formatação, mas ao mesmo tempo é um material que está contido, na imanência de derreter, de sair, escorrer. É, portanto, uma solidez temporária, capaz de ser transformada”, diz.

 

O trabalho parte de um questionamento da artista: “Como resistir à autoridade das formas?” Ela se interessa em discutir “a borda entre corpo e espaço e a permanente troca e produção de conhecimento entre eles”. “Portamos os espaços que habitamos no corpo, na carne, assim seus processos de formação seguem conosco”.

 

O crítico João Paulo Quintela, no texto que acompanha a exposição, afirma que “a melhor das pretensões é a instabilidade”. “A escultura não funciona aqui como categoria mas como um estado. Desimpedido, solto e escorrido. A reiteração de um estado frugal dos sólidos. O molde não serve à artista como ferramenta de compressão mas sim de transbordamento. Se por um lado o molde oferece ao material um lugar para acoplar-se, por outro a dinâmica proposta pela artista favorece a superação do espaço ofertado. A forma se dá em relação com o molde e não por determinação dele”, observa.

 

Para Simone Cadinelli, “as intervenções urbanas e a arquitetura proporcionam mudanças significativas e renovação de espaços em diversas escalas nas ruas, bairros e cidades”. Com a iniciativa, ela pretende “dar um novo sentido, experimentar algo que proporcione uma mudança positiva, assim como a arte tem o poder de se manifestar”.

 

Sobre a artista

 

Isabela Sá Roriz nasceu em 1982, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha. Artista visual, mestre em Linguagens Visuais pela UFRJ (2012), onde por quatro anos foi professora temporária no curso de Artes Visuais/Escultura da Escola de Belas Artes. Ganhou o primeiro lugar na XX Bienal de Santa Cruz de La Sierra, em 2016, e foi finalista do III Prêmio Reynaldo Roels Jr., em 2018, e selecionada para o programa de imersões artísticas, ambos na EAV Parque Lage, em 2019. Participou do Programa Incubadora Furnas Sociocultural, que abrigou e investiu em artistas plásticos emergentes. A artista participou de mostras no Brasil e no exterior em importantes espaços culturais, como: Fundação Eugênio de Almeida, em Évora, Portugal, Museu de Arte Contemporânea de Niterói, Solar dos Abacaxis, Museo de Arte Contemporáneo de Santa Cruz de La Sierra, Bolívia, e Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. A construção de alguns de seus trabalhos evoca instabilidades físicas para desestabilizações ideológicas, propõem uma ação confrontadora diante de perspectivas dominantes e resignações pessoais, construindo pequenos “ataques” subjetivos, apontamentos poéticos, entendendo também a impermanência de sua temporalidade. Assim, “a instância política é poética, e entendo o espaço como uma categoria produtiva, um acontecimento, o local das transformações sociais e não um fundo à priori homogêneo ou heterogêneo, onde as ações se estabelecem”. Ganhou as bolsas de pesquisa Formação Deformação – Qualquer Direção fora do centro, na EAV Parque Lage, 2018; Capes (Mestrado), 2011; e Iniciação Artística e Cultural, UFRJ (Graduação), 2006 e 2007.

 

A exposição fica em cartaz até o dia 04 de abril.

 

Eleonore Koch / Alfredo Volpi

A Galeria Marcelo Guarnieri, Jardim Paulista, São Paulo, SP, apresenta até 09 de abril a primeira exposição do ano, que reúne obras de Eleonore Koch e Alfredo Volpi. Pinturas produzidas por Volpi nas décadas de 1950 e 1970 dividem o espaço das duas salas da galeria com pinturas que Eleonore Koch produziu nas mesmas épocas. Além destas, um dos cadernos de desenho da artista elaborado entre as décadas de 1950 e 1980 e um farto conjunto de estudos em gravura, pintura e desenho produzidos por ela entre as décadas de 1970 e 1990 também integram a mostra. O diálogo entre Volpi e Eleonore Koch nesta exposição ressoa a importante relação de trocas que tiveram ao longo dos anos – inicialmente como professor e aluna e depois como amigos e parceiros de profissão – dando continuidade ao programa iniciado pela galeria em 2019, que apresenta de maneira simultânea obras de artistas que possuíram um diálogo durante a sua trajetória ou que podem ser lidas a partir de aproximações conceituais e poéticas.

 

Naturezas-mortas, jardins ingleses, ambientes domésticos, marinhas e desertos. Ao longo de sua produção, Eleonore Koch (Berlim – Alemanha, 1926) explorou, através destes temas, o manejo de cores e formas que materiais como a têmpera, o pastel, o óleo, o grafite e o carvão lhe permitiam. Os campos de cores que preenchem os elementos de suas composições evidenciam sua estrutura através das pinceladas ou dos traços em paralelo que os compõem, transparência de um fazer que se traduz também no uso da perspectiva – quando a representação de alguns objetos mostra-se fiel a um ponto de fuga ao mesmo tempo em que a de outros ignora-o completamente, reduzindo-os a formas geométricas planificadas. Koch permite aos seus jarros de flores que flutuem no espaço e que o chão e o teto se distingam apenas pela cor. Seus estudos em grafite nos mostram que sua preocupação não centrava-se somente na cor, mas também no arranjo das geometrias – das linhas e superfícies – e no balanceamento de tons que o lápis lhe permitia explorar através das intensidades do traçado.

 

Frequentemente mencionada como discípula de Volpi, Eleonore Koch possuiu uma formação bastante diversa, através de professores artistas como Yolanda Mohalyi, Samson Flexor, Bruno Giorgi, Elisabeth Nobiling e Arpad Szenes e também de suas temporadas de estudo e trabalho fora do Brasil, em Paris entre 1949 e 1951 e em Londres entre 1968 e 1989. A maioria dos estudos e pinturas que integram a exposição foram produzidas justamente durante os vinte anos que viveu na Inglaterra, onde admitiu ter sofrido grande influência da pop art britânica, através do trabalho de artistas como David Hockney. Estão reunidos na mostra alguns conjuntos de estudos que permitem ao público observar o desenvolvimento de uma pintura ou de um pastel a partir de pequenas variações dos elementos que as compõem – como a composição de uma mesa e cadeira que em uma das versões se apresenta somente em traços esquemáticos e em outra já se soma outra cadeira à frente de um fundo negro em carvão, variando em mais três versões. O trabalho com texturas, presente no emprego da têmpera e do carvão, se completa no uso da colagem de papel cartão e papel jornal que dão forma e cor aos vasos, árvores, pétalas e até mesmo aos degraus das escadas dos seus jardins. Recortes do que parecem ser listas telefônicas dos residentes da cidade de Londres dão profundidade e ritmo às frondosas copas das árvores através dos grafismos dos números e das letras que os compõem.

 

Pertencente a uma geração anterior de imigrantes europeus que fixaram residência no Brasil, Alfredo Volpi (Lucca – Itália, 1896) estabelece-se em São Paulo ainda mais jovem que Eleonore, com apenas um ano de idade. O encontro com Koch se daria dali a 56 anos, em 1953, em seu ateliê no bairro do Cambuci, por intermediação do colecionador, crítico e psicanalista Theon Spanudis. Naquele mesmo ano, Volpi receberia o prêmio de Melhor Pintor Nacional conferido pela Bienal de São Paulo, onde havia apresentado suas “Casas”, representações de fachadas de casas populares sintetizadas em formas geométricas. A década de 1950 marcava um momento de maturação da pesquisa de Volpi sobre a simplificação formal de suas composições. Já distanciada de um certo figurativismo que havia guiado sua produção até então, empenhava-se na construção de um vocabulário de formas elementares que surgiam das portas, janelas, arcos e bandeirinhas que faziam parte de seu cotidiano e que lhe serviram para explorar as possibilidades da técnica e da composição.

 

Volpi inicia seu contato com a pintura em 1911, trabalhando como pintor decorativo de paredes, ofício que mantém até pelo menos a década de 1940. Sua expertise artesanal também lhe deu suporte quando trocou a tinta a óleo pela têmpera, indo na contramão do imaginário industrial da década de 1950. Foi com Volpi que Eleonore Koch aprendeu as técnicas de uso e preparo da têmpera e de pigmentos feitos a partir de terras naturais, e foi também a partir dali que passou a adotá-las frequentemente em suas pinturas, definindo seu estilo. Os debates figuração vs. abstração, formalismo vs. informalismo eram bastante intensos naqueles anos que Koch passou com Volpi em seu ateliê, entre os anos de 1953 e 1956.

 

Em 1953 o MAM/RJ organiza em Petrópolis a 1ª Exposição Nacional de Arte Abstrata, reunindo diversas tendências do abstracionismo no Brasil, do lírico ao geométrico, e em 1956 o grupo Ruptura organiza a I exposição Nacional de Arte Concreta no MAM/SP, que já explicitava divergências dentro do próprio movimento concreto. Apesar de ter sido um dos participantes desta última mostra – que também ocorreu no Rio de Janeiro no ano seguinte -, Volpi preferia abdicar da associação a grupos ou movimentos, optando pela liberdade de poder incorporar em suas obras elementos plásticos de variadas ordens. Tal posicionamento pode ser explicitado não somente pelos afrescos que produziu na capela de Nossa Senhora de Fátima em Brasília, mas também pela pintura da década de 1950 apresentada nesta exposição, na qual figura um anjo humanóide sobre um fundo de losangos verdes e azuis. Essa fluidez entre a figuração e a abstração ou entre o formal e o informal também pode ser encontrada nas pinturas da década de 1970, como “Fitas e Mastros”, por exemplo. Neste caso, a obra transita entre uns e outros através de uma composição ritmada formada pelo intercalamento de cores em uma malha geométrica irregular.