Pinturas de Cristina Canale por Daniela Labra

19/fev

O Instituto Ling, Três Figueiras, Porto Alegre, RS, tem o prazer de abrir no dia 27 de fevereiro a mostra individual “Cristina Canale – A Casa e o Sopro”, apresentando obras inéditas da artista carioca, estabelecida na Alemanha desde 1993. Sob a curadoria de Daniela Labra, a exposição apresenta mais de vinte obras, criadas entre 1992 e 2023. Na seleção, pinturas a óleo sobre linho ou tela e desenhos em aquarela e técnica mista. No dia da abertura, às 19h, acontecerá uma conversa aberta ao público, com participação de Cristina Canale e Daniela Labra. O bate-papo poderá ser acompanhado presencialmente, com entrada franca, no auditório do Instituto Ling. Na ocasião, será lançado o catálogo com distribuição gratuita a todos os participantes. Terá a duração de 60min. com 80 assentos disponíveis. A mostra permanecerá em cartaz até 01 de junho, com visitas livres de segunda a sábado, das 10h30 às 20h, e a possibilidade de visitas com mediação para grupos, mediante agendamento prévio e sem custo pelo site.

Sobre a artista

Cristina Canale nasceu em 1961 no Rio de Janeiro e, atualmente, vive em Berlim, Alemanha. Iniciou seus estudos na EAV Parque Lage, Rio de Janeiro, na década de 1980. Após firmar-se na cena brasileira como parte da Geração 80, recebeu em 1993 uma bolsa atelier-residência do Estado de Brandemburgo, na Alemanha, e outra bolsa de estudos do Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico (DAAD) na Academia de Artes de Düsseldorf. Expôs na 21ª Bienal de São Paulo (1991) e na 6ª Bienal de Curitiba (2011). Entre as suas exposições recentes, estão Entremundos, Paço Imperial, RJ (2014); The Encounter, Galeria Nara Roesler, Nova York (2021); Memento Vivere, Galeria Nara Roesler, SP (2023); e as coletivas Modos de Ver o Brasil: Itaú Cultural 30 Anos, OCA, SP (2017), Xenia: Crossroads in Portrait Painting, Marianne Boesky Gallery, Nova York (2020); e Crônicas Cariocas, MAR, RJ (2021)

Sobre a curadora

Daniela Labra é curadora, professora e vive entre o Rio de Janeiro e Berlim. Doutora em História e Crítica da Arte pela Escola de Belas Artes da UFRJ, atua nos temas: arte brasileira, cultura visual latino-americana, performance, arte e política. Curadorias selecionadas: Frestas – Trienal de Artes, SESC Sorocaba, SP (2017); museo de la democracia, nGbK, Berlim (2021); Ana Mendieta: Silhueta em Fogo, SESC Pompeia, SP (2023); Lygia Clark & Franz Ehrard Walther: Action as Sculpture, FEW Villa, Fulda, Alemanha (2024). Também colabora com organizações e instituições no Brasil e na Europa.

A Casa e o Sopro

Cristina Canale é mestra da cor. Carioca estabelecida na Alemanha desde 1993, participou da icônica exposição coletiva Como vai você Geração 80? em 1984, na Escola de Artes do Parque Lage, Rio de Janeiro. Naquele período, a tendência na pintura era o neoexpressionismo abstrato, mas Cristina interessava-se por figuras e paisagens. Desde então, explora o vocabulário da pintura investigando texturas rasas, formas blocadas, campos cromáticos, nuances, sutilezas e contrastes entre porções de áreas de cor densas-sólidas e outras líquidas-transparentes. A Casa e o Sopro traz vinte e duas obras com elementos antropomorfos, orgânicos e botânicos, em pinturas a óleo sobre linho ou tela, e desenhos em aquarela e técnica mista. A pintura “Branco de Medo” (1992) abre a visita. Com paleta de cor baixa e figuras de contornos difusos, pertence a uma fase de investigação em modulação cromática. Seu tema e atmosfera remetem às paisagens sem céu sobre blocos de cor do impressionista Claude Monet (1840-1926) e já contêm alguns antecedentes formais, de composição e texturas, de trabalhos como a “A casa e os sonhos” (2021) e “Sopro” (2023). Zonas densas de pigmento, presentes nessas e demais obras, mostram-se como ilhas de matéria e massas de cor formando figuras ambíguas ou híbridas que se transmutam em flores, folhas, gotas, nuvens, pernas, mãos, rostos…ou o que a imaginação quiser, pois a figuração de Cristina Canale não é literal. Aproveitando a maleabilidade da tinta a óleo, a artista compõe múltiplos significantes instáveis. Sua pincelada preenche, cobre e rasura campos cromáticos atravessados por diversos elementos justapostos, criando cenas, rostos, objetos cotidianos ou situações oníricas-lisérgicas em uma linguagem visual própria. O título A Casa e o Sopro remete à presença de elementos “sólidos” ou “gasosos” contrastantes. Ele alude às mitologias do sopro que dá vida ao barro, ou mesmo ao vidro – material rígido translúcido resultante da transmutação de massa liquefeita soprada. Examinando a relação entre opacidade e transparência, a casa como signo de solidez contrasta com a imaterialidade do ar/sopro, cuja força pode tanto destruir como servir de alento, regeneração ou agente polinizador.

Daniela Labra/Curadora

Esta programação é uma realização do Instituto Ling e Ministério da Cultura / Governo Federal, com patrocínio da Crown Embalagens.

Artistas reunidos

03/nov

 

Coletiva de artistas instiga questionamentos através de trabalhos apresentados em técnicas, escalas e suportes diversos.

O Consulado Geral da República Argentina, Botafogo, Rio de Janeiro, apresenta a exposição “Territórios Insustentáveis”. Artistas oriundos de países distintos, como a Argentina e a França, em conjunto com artistas brasileiros, convergem ao lidar com um vasto horizonte de relações – sejam elas referentes à história da arte, aos diversos saberes que incidem sobre os seus trabalhos ou às questões concernentes ao tempo histórico. A coletiva foi inaugurada no dia 04 de novembro, na Sala Antonio Berni, sob curadoria de Aline Reis, e reúne 26 artistas: Adriana Nataloni, Albarte, Bernar Gomma, Beth Ferrante, Beatriz Calmon, Camila Morgado, Daniela Barreto, Graça Pizá, Isadora F., Jack Motta, JaquesZê, Jannini Castro, Jeni Vaitsman, Julia Garcia, Katia Politzer, Marcelo Palmar Rezende, Mario Camargo, Nando Paulino, Nora Sari, Regina Dantas, Reitchel Komch, Ricardo Laranjeira, Sandra Sartori, Solange Jansen, Tathyana Santiago e Verônica Camisão. Os trabalhos possuem diferentes formatos e vão da pintura à fotografia, passando pela escultura, instalação, objeto, vídeo e intervenção.

“Os trabalhos de arte não repetem mundos, mas criam mundos. Os artistas vivem num momento histórico sempre muito próprio e isso aparece na visualidade de suas obras. Não como ilustração de um tempo, mas como uma força propositiva frente aos desafios que sentem na própria carne, produzindo diferenças que são fruídas pelo espectador”, diz a curadora.

A guerra das narrativas incide sobre todos os conceitos que são utilizados na curadoria: a globalização – desde as grandes navegações e as ideias iluministas modernas até a discussão se há ou não integração econômica, social e cultural no espaço geográfico em escala mundial, no que tange aos fluxos de capitais, mercadorias, pessoas e informações, proporcionada pelo avanço técnico na comunicação e nos transportes numa mesma condição ética -, o pensamento descolonial (opção pela grafia portuguesa da palavra não desconsiderando a diferença entre o termo Decolonial e Descolonial, mas assumindo tanto a importância de falar sobre o colonialismo referente à dominação social, política, econômica e cultural dos europeus sobre os outros povos do mundo quanto à colonialidade que diz respeito à permanência da estrutura de poder até os dias de hoje) e o antropoceno, referente à época em que as ações humanas começaram a provocar alterações biofísicas em escala planetária e uma crise definitiva da natureza.

 

Sobre a curadora

Aline Reis é carioca, formada em Comunicação Social, pós-graduada em Crítica e Curadoria de Arte Contemporânea pela Universidade Cândido Mendes-EAV, em Psicologia Clínica Fenomenológica-Hermenêutica e em História da Filosofia. Tem mestrado em Filosofia, lecionou por mais de vinte anos. É colunista semanal do BLOGDEARTE.art, participa do Grupo de Pesquisa Entre – Educação e arte contemporânea (CE/UFES), tem trabalhos de arte contemporânea expostos nas plataformas ArtMaZone e Acessoartecontemporanea e integra a oficina Antiformas de Intervenção sob a orientação do artista David Cury, no Parque Lage. Em sua formação filosófica e artística integrou vários grupos de estudo, fez cursos com curadores e artistas do circuito, tais como Paulo Sergio Duarte, Marcelo Campos, Daniela Labra, Clarissa Diniz, Ligia Canongia, Lia do Rio, Fernando Cocchiarale. Participou de exposições coletivas: “Ainda fazemos as coisas em grupo”, em 2020, no Centro Municipal de Arte Helio Oiticica, “Fixo só o prego”, em 2019, no Espaço Cultural Municipal Sérgio Porto, ambas exposições com curadoria de Ana Miguel, Brigida Balthar e Clarissa Diniz; “Uma afirmação da presença”, no Centro Cultural dos Correios, em 2018, no Acesso arte contemporânea – Qual é seu link?, em 2016, no Centro de Artes Calouste Gulbenkian, ambas com as curadorias de Lúcia Avancini e Marilou Winograd, entre outras. Aline Reis vive e trabalha no Rio de Janeiro.

 

Até  05 de dezembro.

 

 

Instalação de Daniel Senise

25/jul

A Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, RS, inaugura no dia0 3 de agosto a exposição “Antes da Palavra”, exibição individual de Daniel Senise. A abertura ocorre às 14h e pode ser visitada até 29 de setembro, no Átrio e 2º e 3º andares.

 

Com curadoria de Daniela Labra, a mostra apresenta 23 trabalhos de Senise, entre pinturas e objetos, articulados em torno da instalação monumental “1.587”, constituída por duas grandes telas suspensas no Átrio, postadas frente a frente, cujas lonas são lençóis usados em um motel carioca e no INCA – Instituto Nacional do Câncer, no Rio de Janeiro. “As marcas e manchas visíveis nas superfícies das peças são prova de um tempo transcorrido que é protagonista. Nesse lugar, essa representação – como numa natureza-morta, é substituída pela temporalidade de fato, palpável, a qual exacerba um segundo paradoxo, o da representação/real, contido na obra de arte contemporânea”, explica a curadora.

 

O título da obra decorre do cálculo de pessoas que passaram por esses lençóis ao longo de seis meses. Senise pouco interferiu na maculada imensidão branca, de onde saltam imagens mentais de estórias pessoais desconhecidas. Os números das presenças/ausências, registros, lembranças, momentos de muito amor, mas também de muita dor, impregnados nos tecidos foram alcançados com a ajuda de um matemático e nomeiam cada face da instalação: “Branco 237″ refere-se à movimentação no hospital, enquanto “Branco 1.350″, no motel.

 

Somadas, essas cifram atingem 1.587 dramas e êxtases de desconhecidos amalgamados nesta obra de aspecto solene e vertiginoso. Em Porto Alegre, por questões de adequação ao espaço, esta é uma versão reduzida do trabalho original, intitulado “2.892”, criado no final da década de 1990 e exibido apenas em 2011, na Casa França-Brasil, Rio.

 

Em diálogo com a exposição, Daniela Labra convidou seis artistas que pensam o som não em sua estrutura melódica, mas em proposições que indicam ausência, fisicalidade, espacialidade, interrupção, silêncio, tempos alongados e outros motes integrados às ideias primordiais presentes em “Antes da Palavra”. São eles: Marcelo Armani, Ricardo Carioba, Raquel Stolf, Pontogor, Tom Nóbrega e Felipe Vaz.

 

Outra novidade da mostra é a joia feita com exclusividade por Daniel Senise para a Fundação Iberê Camargo, à venda na loja do espaço cultural. “A peça corresponde ao inverso dos nichos das placas de concreto aparente presentes na fachada da Fundação. O objeto foi moldado em um nicho próximo à entrada da arquitetura de Álvaro Siza e se encaixará perfeitamente, funcionando como uma “chave de acesso” ao prédio”, diz o artista.

 

Curso de Arte

22/mar

A Anita Schwartz Galeria, Gávea, Rio de Janeiro, RJ, fez uma parceria com a Escola sem Sítio para a realização do curso sobre “Gêneros da Pintura”, com a crítica e curadora de arte Fernanda Lopes, nos meses de abril, maio e junho de 2019. Em cada mês, sempre às terças-feiras, das 18h às 20h, será abordado um dos gêneros presentes na pintura ao longo da história até os dias de hoje: retrato, paisagem e natureza-morta. O curso é direcionado a todos aqueles que queiram aprofundar seus conhecimentos em arte.

 

A programação

Retrato – 09, 16 e 30 de abril

Paisagem – 07, 14, 21 e 28 de maio

Natureza-Morta –  04, 11, 18 e 25 de junho

 

As inscrições vão até o próximo dia 02 de abril, e para mais informações os interessados podem escrever para o email escolasemsitio@gmail.com. Cada módulo pode ser frequentado individualmente, e o valor mensal é de R$350,00.

 

 

Conversas sobre Retrato, Paisagem e Natureza-Morta

 

A cada encontro serão apresentadas as concepções originais/iniciais, e de como a arte moderna e a arte contemporânea (no Brasil e no exterior) se apropriam, subvertem, relativizam e ressignificam esses termos clássicos. O curso se coloca como uma investigação sobre a história da arte a partir da prática e da definição dos gêneros clássicos da pintura: retrato, paisagem e natureza-morta. A predominância progressiva de tais gêneros pictóricos marca o abandono pelo mundo burguês emergente das temáticas icônico-religiosas em nome de uma pintura laico-secular em que a atenção do pintor passou a fixar-se na composição, no cromatismo e nos elementos estritamente pictóricos, que eclipsaram os grandes temas da arte desde a Renascença. As pinturas de gênero foram, portanto, fundamentais para a modernização da pintura, sendo essenciais para a sua renovação até o surgimento dos abstracionismos informal e geométrico no começo do século 20.  A partir de um primeiro olhar histórico, as aulas, divididas em três módulos, pretendem traçar um panorama das transformações de cada um desses gêneros desde sua formação, passando pela modernidade, até hoje os dias de hoje, apontando caminhos possíveis de apropriação, subversão, relativização e ressignificação desses termos clássicos.

 

 

Sobre Fernanda Lopes

 

Fernanda Lopes (Rio de Janeiro, 1979) vive e trabalha no Rio de Janeiro. Doutora pelo Programa de Pós-Graduação da Escola de Belas Artes da UFRJ, Fernanda Lopes atua como curadora assistente do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro e professora da Escola de Artes Visuais do Parque Lage e da Escola sem Sítio. É organizadora, ao lado de Aristóteles A. Predebon, do livro “Francisco Bittencourt: Arte-Dinamite” (Tamanduá-Arte, 2016), e autora dos livros “Área Experimental: Lugar, Espaço e Dimensão do Experimental na Arte Brasileira dos Anos 1970” (Bolsa de Estímulo à Produção Crítica, MinC/Funarte, 2012) e “Éramos o time do Rei – A Experiência Rex” (Prêmio de Artes Plásticas Marcantonio Vilaça, Funarte, 2006). Entre as curadorias que vem realizando desde 2008 está a Sala Especial do Grupo Rex, na 29a Bienal de São Paulo (2010). Em 2017 recebeu, ao lado de Fernando Cocchiarale, o Prêmio Maria Eugênia Franco da Associação Brasileira dos Críticos de Arte 2016 pela curadoria da exposição “Em Polvorosa – Um panorama das coleções MAM Rio”.

 

 

Sobre a Escola Sem Sítio

 

A Escola sem Sítio é uma escola de ideias, que promove programas de cursos e ações culturais. Sua programação se conecta, oferecendo a possibilidade de uma ampla formação aos participantes, destinando-se tanto àqueles que buscam uma aproximação com a arte até aqueles que já atuam e procuram interlocução profissional. A Escola, por meio de seus programas, procura refletir sobre as demandas e lacunas do sistema da arte, em seus aspectos dos campos da prática e da teoria, entendendo-os integrados, como parte de um grande universo de conhecimento. Exposições, rodas de conversas, palestras e outras atividades aderem aos conteúdos oferecidos nos diversos cursos. Todas as atividades têm uma reserva de vagas para bolsas, com o objetivo de contemplar aqueles que não possuem recursos para arcar com os custos financeiros dos programas.Os orientadores permanentes da Escola sem Sítio são artistas, arquitetos, curadores, educadores. Outros profissionais são convidados a cada programa atuando, também, como orientadores. O objetivo é oferecer aos participantes a maior diversidade de olhares e vozes sobre as questões emergentes. São orientadores permanentes: Cadu, Efrain Almeida, Marcelo Campos e Tania Queiroz. Entre os orientadores convidados participam ou já participaram os artistas Anna Bella Geiger, Brígida Baltar, Erika Verzutti, Fernando Leite, Leda Catunda, Daniel Senise, Milton Machado, Paulo Vivacqua, Raul Mourão, Sandra Cinto. Dentre outros importantes profissionais do campo da arte integram ou já integraram curadores, arquitetos e pesquisadores como Agnaldo Farias, Bia Petrus, Cristina de Pádula, Daniela Labra, Guilherme Bueno, Ileana Pradilla, Leila Scaf, Fernanda Lopes e Ivair Reinaldim.

Visão Fontana no IBEU

02/mar

No dia 08 de março será inaugurada a exposição individual “Visão Fontana”, de Bruno Belo, artista selecionado através do edital do Programa de Exposições Ibeu. A mostra, que acontece na Galeria de Arte Ibeu, Copacabana, Rio de Janeiro, RJ, tem curadoria de Bruno Miguel.

 

Em “Visão Fontana”, Bruno Belo reúne um recorte da sua produção recente. A mostra apresenta trabalhos em tela e papel, em grandes e pequenas dimensões, executados com tinta a óleo, acrílica, aquarela e pó de grafite, todos inéditos. As obras apresentadas são o resultado de um trabalho desenvolvido a partir das inter-relações e reordenação de fragmentos de imagens, textos, apropriações, referências cinematográficas e da fotomontagem, expondo “camadas” da poética do artista.

 

A pintura se revela gradativamente em uma imagem pouco referencial. A ideia não é reproduzir o visível, mas entorná-lo neste meio pictórico, de cores lavadas, permitindo que imagens extraídas de fontes dessemelhantes possam se fundir em um processo de sobreposição de camadas e transparências.

 

“A construção do trabalho deriva da ideia de ‘Cut Up’, de W. S. Burroughs, e surge a partir de um processo de constantes projeções de imagens sobre a tela, utilizando um equipamentos antigo de 100mm, e também fotografias extraídas de fontes diversas, gerando assim novas possibilidades e construções ao processo de pintura. Isto revela uma convergência que não é unívoca, não reproduz verdades, mas produz sentidos. As imagens se confundem à essa pintura, na qual ambas não dariam conta da experiência a que se referem”, conta Bruno Belo.

 

Enxergar as coisas por igual “moda ave”, como dizia Manoel de Barros ao falar sobre visão fontana, se aproxima do trabalho do artista através das mudanças de percepção e desconstrução de significados – permitindo que fragmentos e partes se relacionem, mimetismos, contágio… Não é para ilustrar a experiência, mas revelar a nova substância. A “consciência descrita por círculos”, em que a imagem é um desdobramento de camadas – é de outra natureza.

 

“A pesquisa de Bruno é madura, tecnicamente impecável, conceitualmente firme e arriscada ao não tentar se enquadrar nas características mais óbvias de nossa geração”, descreve Bruno Miguel, curador da exposição.

 

 

Sobre o artista

 

Bruno Belo nasceu no Rio de Janeiro, RJ, 1983. Vive e trabalha em Petrópolis/RJ. Artista, graduado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Santa Úrsula, teve sua formação artística através de cursos livres e pelo acompanhamento e orientação de Luiz Ernesto, João Magalhães, Anna Bella Geiger, Fernando Cocchiarale, Glória Ferreira, Bruno Miguel e Daniela Labra. Foi selecionado para os programas da EAV e do Governo do Estado – Aprofundamento 2011; e Projeto de Pesquisa 2012. Participou de exposições no Brasil e exterior, dentre elas: Bienal do Recôncavo (BA); Declaring Independence (Eric Fischl Gallery, Phoenix, USA); 45º Salão De Arte Contemporânea (Piracicaba,SP); 13º Salão Nacional De Arte (Jataí, GO).

 

De 08 de março a 08 de abril.

CCBB Contemporâneo, Rio

11/jan

Ricardo Villa é mais um contemplado do Prêmio CCBB Contemporâneo, com a individual “Como atravessar paredes”. Ele ganhou também o Prêmio ArteRef de junho de 2013. O artista paulistano começou como grafiteiro e tem uma relação política com a arquitetura e o solo das cidades. O Prêmio CCBB Contemporâneo apresenta mais um contemplado da série de 10 exposições individuais, inicada em junho de 2015. Agora é a vez do paulistano Ricardo Villa, que reúne obras em diferentes suportes – desenho, colagem, escultura, modelagem 3D, vídeo e uma instalação –, na mostra intitulada “Como atravessar paredes”.

 

Nessa individual, Villa articula questões relacionadas à ocupação do espaço público:

 

– Busco o entendimento das dinâmicas politicas e econômicas que radicam os conflitos urbanos, especialmente no que se refere à noção de público e privado, as relações entre planejamento urbano e operações imobiliárias, a ideologia presente nos projetos arquitetônicos e sobre (talvez) alguma possibilidade de atuação, situa o artista.

 

Ele começou a trabalhar com graffiti e outras formas de intervenção em superfícies públicas. Com a fotografia, desenvolve trabalhos nos lugares-resíduo da cidade, construções degradadas, abandonadas ou em preparação, estabelecendo um jogo associativo entre a ação executada e o espaço (des)ocupado.

 

“Hoje, o tema de sua pesquisa é a cidade e suas problemáticas humanas, econômicas, ambientais, […] que pouco lembram o caos do picho”, observa Daniela Labra, que faz acompanhamento crítico da produção do artista e é autora do texto de apresentação dessa mostra.

 

 

Sobre a exposição

 

A instalação “Cada lugar é, à sua maneira, o mundo”, composta por quatro árvores (ficus), com quatro metros de altura, e gradil de metal, ocupa o centro da sala de exposição.  O título dessa obra é uma citação do geógrafo Milton Santos (1926-2001). “Dividir para governar” é um conjunto de 49 desenhos a nanquim, de 30 x 42cm cada um, com a imagem de uma cerca violada. Como exemplos de esculturas, Villa apresenta uma feita de resíduos de demolição, lapidados em forma de diamante, e um conjunto de martelo e pregos amassados, de porcelana escura, sob o título  “Amor por princípio, ordem por base, progresso por fim”. Vídeos da série “Modelo fractal” mostram animações hipnóticas, como em um caleidoscópio de imagens humanas, animais e de veículos, entre outras obras. Links para os vídeos:

 

 

Sobre o artista

 
Ricardo Villa nasceu em São Paulo, SP, 1982, é bacharel em Arte e Cultura Fotográfica pelo Centro Universitário Senac. Ele começou a expor em coletivas e salões em 2003. Sua primeira individual foi em 2007. Participou de coletivas no Rio de Janeiro, em São Paulo, Belo Horizonte, Uberlândia, Juazeiro do Norete, Fortaleza, Belém do Pará e Phoenix, Arizona, EUA. Em 2011, mostrou seu trabalho na SP Arte, SP Foto e ArtRio. Ele ganhou menção honrosa no Salão de Artes Visuais da Praia Grande 2014, SP, Prêmio ArtRef Junho 2013, destaque no site da Fundação Iberê Camargo como resultado do programa de residência “Bolsa Iberê Camargo” em 2013 e o 1º Prêmio do Programa de Exposições da Galeria do Instituto Porto Pensarte, São Paulo, SP, em 2007. Villa tem obras nas coleções do Museu de Arte do Rio|MAR,  Palácio das Artes, Praia Grande, SP e da Nike S.A.

 

Prêmio CCBB Contemporâneo 2015-2016 

 

O Prêmio CCBB Contemporâneo foi criado em 2014, quando, pela primeira vez, o Banco do Brasil incluiu no edital do Centro Cultural Banco do Brasil um láurea para as artes visuais. Patrocinado pela BB Seguridade, o Prêmio contemplou, nessa primeira edição, 10 projetos de exposição, selecionados entre 1.823 inscritos de todo o país, para ocupar a Sala A do CCBB Rio de Janeiro.

 

O Prêmio é um desdobramento do projeto Sala A Contemporânea, que surgiu de um desejo da instituição em sedimentar a sala  como um espaço para a arte contemporânea brasileira. Idealizado pelo CCBB, em parceria com o produtor Mauro Saraiva, o projeto Sala A Contemporânea realizou 15 individuais de artistas ascendentes de várias regiões do país entre 2010 e 2013.

 

A série de dez individuais inéditas começou com o grupo Chelpa Ferro [Luiz Zerbini, Barrão e Sergio Mekler], seguido das mostras de Fernando Limberger [RS-SP], Vicente de Mello [SP-RJ], Jaime Lauriano [SP] e Carla Chaim [SP]. Depois da de Ricardo Villa, vêm as de Flávia Bertinato [MG-SP], Alan Borges [MG], Ana Hupe [RJ] e Floriano Romano [RJ], até julho de 2016.

 

Entre 2010 e 2013, o projeto que precedeu o Prêmio, realizou na Sala A Contemporânea exposições de Mariana Manhães, Matheus Rocha Pitta, Ana Holck, Tatiana Blass, Thiago Rocha Pitta, Marilá Dardot, José Rufino, do coletivo Opavivará, Gisela Motta&Leandro Lima, Fernando Lindote, da dupla Daniel Acosta e Daniel Murgel, Cinthia Marcelle, e a coletiva, sob curadoria de Clarissa Diniz.

 

 

 

De 12 de janeiro a 15 de fevereiro.

Na Fundação Eva Klabin

02/dez

Eduardo Berliner é o artista de “A presença da ausência”, na atual edição do “Projeto Respiração”na Fundação Eva Klabin, Lagoa, Rio de Janeiro, RJ. Criado em 2004, o “Projeto Respiração” tem por objetivo criar intervenções de arte contemporânea no acervo de arte clássica da Fundação Eva Klabin. Com curadoria de Marcio Doctors, o projeto consiste em convidar artistas contemporâneos a intervirem no circuito expositivo da casa museu, criando uma ponte entre a arte consagrada do passado e as manifestações contemporâneas.

 

 

 

A presença da ausência

 

 

Esse texto tem sua inspiração conceitual na exposição “Ausência”, de Claudia Bakker, realizada na Fundação Medeiros de Almeida, Lisboa, em março de 2015.

 

 

[…] Se eu fosse um animal, seria provavelmente o macaco de tinta, descrito por Borges em seu livro dos seres imaginários. Assim como esta pequena criatura bebe o líquido restante em um tinteiro, devido ao prazer que sinto ao praticar caligrafia, muitas vezes paro apenas quando a tinta do reservatório se esgota. Também me identifico com a cruza entre gato e ovelha descrita por Kafka. Amistoso e inquieto, certas vezes, aos olhos de seu dono o animal parece clamar por alívio através da faca do açougueiro. Como se eu pudesse carregar em mim a ausência de cada perda. 1

 

 

 

 

Eduardo Berliner

 

 

Eduardo Berliner é o primeiro pintor a ser convidado a participar do Projeto Respiração. Parecia-me natural não convidar pintores devido às características da Fundação Eva Klabin, que, por ser uma casa-museu, tem suas paredes totalmente preenchidas pela coleção, não sobrando espaço físico para absorver mais pinturas. E por isso, tornou-se mais simples trabalhar com instalações.

 

 

Para além dessa constatação, há subjacente outra intencionalidade, presente nos dois projetos de longa duração que criei, o Respiração e o Espaço de Instalações Permanentes do Museu do Açude, na Floresta da Tijuca, que reflete minha formação ao lado de Mário Pedrosa e que norteia minhas opções como curador. Meu objetivo nessas duas propostas é o mesmo: dar continuidade à experiência da ruptura pós-neoconcreto – marco fundador da arte contemporânea no Brasil -, que, ao aproximar arte e vida, rompe radicalmente com o conceito de representação.

 

 

Como, então, convidar um pintor, para quem a questão da representação ainda se coloca, mesmo que de outra maneira? Em razão da forte atração que sinto pela qualidade da pintura de Berliner, que mobiliza minha percepção, acreditei que deveria dar atenção à minha intuição e pensei que a experiência de um pintor participar do Respiração seria uma contribuição importante para o projeto, ao mesmo tempo em que me daria a oportunidade de explicitar a mim mesmo os limites do meu pensamento a partir do desafio que a potência de sua obra me propõe, buscando evidenciar questões de seu trabalho que vão para além da representação.

 

 

A pintura de Eduardo Berliner trabalha com a técnica da “colagem”, como percebeu Daniela Labra, no primeiro texto produzido sobre o artista, em 2008: As técnicas utilizadas na composição das obras são diversas, indo desde o desenho de observação minucioso até a colagem. Esta última, porém, é percebida como mote conceitual da produção total de Berliner. Recortes são justapostos a lastros de memórias e estes são semiencobertos por camadas de tintas, de lápis, de outros recortes, de espaços vazios. 2

 

 

Labra, tem razão, a colagem pode ser vista na obra de Berliner como o mote conceitual de sua produção. Eu a relaciono, num primeiro momento, como resultado da proliferação de imagens da realidade do mundo digital, que cria um estado de confluência de forças das mais diferentes origens, possibilitando, para a pintura, a construção de imagens que vão além da história da pintura, ao inseri-la no cruzamento de diferentes formas de expressão e informação, replicando, em certa medida, um dos conceitos do Respiração, que propõe intervenções a partir da ideia de espaços contaminados. Em outras palavras, espaços que já vêm carregados de diferentes camadas de informação, até mesmo conflitantes, como é o caso da Fundação Eva Klabin – uma casa e um museu -, que tem obras de diferentes períodos históricos convivendo numa mesma sala, que conserva a presença ausente de sua fundadora, fazendo com que seja um museu de uma vida, tornando presente, em cada visitante, fragmentos de memória de uma existência não convivida, com seus desejos, conflitos, dúvidas e sonhos. Cruzamento de memórias, de informação e de diferentes áreas de conhecimento e de formas de expressão aproximam a pulsão fundadora do Respiração e as imagens “superpostas” da obra de Berliner, que faz com que sua pintura não tenha qualquer sentimento fetichista ou nostálgico. 3

 

 

Porém, na medida em que fui convivendo com o artista e com a sua riquíssima produção, fui percebendo que a origem da “colagem” na sua obra teria outra dinâmica e preencheria talvez outra função, apesar dela ser evidente e de nos saltar aos olhos, e apesar do fato de o próprio artista e os que escreveram sobre sua pintura se referir à colagem ou à edição de imagens como uma prática constante na sua criação. Mas como em todo pensamento há rachaduras, minha reflexão sobre o tema foi penetrando nesses espaços vazios e fui me questionando, à maneira de Merleau-Ponty, se não seria graças às colagens e não apesar delas que poderíamos nos aproximar não do que elas mostram – do que nelas está evidente -, mas do que está implícito nessa fabulação imagética. Em outras palavras, o que me interessa é desmontar o brinquedo para ver como ele funciona, tronando visível o processo de sua geração. Acredito que esse procedimento nos ajudará a perceber o diagrama (para usar uma expressão foucaultiana), que permite trazer à superfície do entendimento o visível e o dizível da obra de Berliner. Se conseguir chegar a bom termo, acredito que perceberemos que a potência de sua obra está na maneira singular com que aborda a “colagem”, muito reveladora dos procedimentos da arte da atualidade.

 

 

Suas “colagens” não são como o papier collé do cubismo sintético ou das colagens de Matisse (não há nelas nenhuma preocupação estetizante); não são uma visão de composição por fragmentos; não são justaposição de imagens como ocorre nas telas dos computadores; nem tampouco são imagens oníricas ou inconscientes como nas pinturas surrealistas, mas há algo nelas que as aproximam da pulsão das obras de Magritte e Millet, que reveste a realidade com silêncios suspensos e situações ensimesmadamente estáticas, que nos indicam o vazio da presença da ausência; ou ainda, da pintura de Courbet, na sua apreensão direta da realidade, como nos indica Alcino Leite Neto 4, no seu texto “A pintura inquietante de Eduardo Berliner”. As imagens de Berliner são imagens sonambúlicas de uma realidade surpreendente e inquietante, que contêm todos os indícios da realidade. Por vezes são bem-humoradas, mas, muitas das vezes, trazem o prenúncio de acontecimentos, como se estivessem em suspensão, aguardando a ocorrência de uma situação trágica ou íntima por vir.

 

 

Ainda na tentativa de desmontar o brinquedo para ver como ele funciona, fui levado a refletir sobre o museu dos acidentes idealizado por Paul Virilio, cuja proposta era reunir registros da memória dos diferentes tipos de acidentes produzidos pela sociedade contemporânea. Acredito que essa reflexão poderá nos ajudar a pensar a questão da “colagem” de uma maneira diferente. O que é, para mim, a estética do acidente? É a proliferação de imagens que nos bombardeiam cotidianamente (que nos atrai e nos horroriza) em que nos confrontamos com todo tipo de destruição resultante da violência produzida pela guerra, pelo trânsito, pelos conflitos pessoais, pelas intempéries da natureza. A característica fundamental dessas imagens é que, como dois corpos físicos não podem ocupar o mesmo espaço ao mesmo tempo, o resultado visual é uma imagem de um corpo físico sendo atravessado por outro.

 

 

Imaginemos um carro que se choca contra uma árvore. A imagem resultante é um híbrido entre uma estrutura maquínica e uma estrutura orgânica, que não é nem mais carro nem mais árvore. É um terceiro estado em que a composição é dada pela falta de partes de cada um dos elementos que a compõem. É uma imagem em que a presença da ausência de partes do carro e da árvore se dá por subtração e não por soma, como ocorre na colagem. Podemos imaginar, então, que essas imagens são o resultado de estados híbridos e metamorfoseantes, como se estivesse sendo gerada uma “terceira natureza”, cuja matriz é a falta tornando-se presente. Para clarear melhor a questão, gostaria de citar a resposta dada por Berliner em uma entrevista realizada por Wang Fang, em 2013, para a revista Art World China, quando perguntado como ele tratava a relação entre o humano e o animal:

 

 

Assim como para muitas crianças, meu primeiro contato com a morte se deu através de um animal querido. O cachorro que considerava meu, um grande fila brasileiro dourado, teve câncer e precisou amputar a pata traseira. A caminho do veterinário minha mãe tentou explicar o ocorrido, mas ao ver o animal tive minha primeira lição no que diz respeito ao abismo existente entre a compreensão oral de um fato e a coisa em si. Quando vi o animal enorme sem a pata de trás, não consegui acreditar nos meus olhos. Pensando com distanciamento, percebi que talvez esta tenha sido minha primeira experiência visual com a ideia de colagem. O poder da ausência e a violência do corte. Onde havia perna, restou uma área desprovida de pelo e uma cicatriz desenhada com linha cirúrgica preta. 5

 

 

O que me chama a atenção nesse depoimento é o fato de Berliner declarar que essa talvez tenha sido sua primeira experiência visual com a ideia de colagem e que ela esteja relacionada exatamente com o poder da ausência e não com o poder da presença. Em outras palavras, a colagem para o artista não é provocada pelo que é adicionado, como no papier collé, por exemplo, mas pelo que desaparece quando uma imagem é interceptada por outra; tal como em um desastre, em que a imagem do mundo físico é reconfigurada pelo que foi perdido ou pela presença da ausência do que era antes, criando uma polifonia de imagens que dá expressão à forma como metamorfose.

 

 

Outro dado importante desse depoimento é quando ele menciona o abismo entre a compreensão oral de um fato e a coisa em si. Esse vazio é responsável por impulsionar a imaginação criadora e a enorme capacidade de fabulação do artista. De fato, existe esse abismo, que Foucault apresenta como uma irredutibilidade entre as palavras e as coisas. Imagens e palavras não se comunicam diretamente entre si, como tendemos a imaginar, mas, ao contrário, uma não pode ser reduzida a outra; são como duas pedras que ao se chocarem provocam uma centelha, que nos ilumina a realidade. Portanto, por haver um gap entre o mundo das palavras e o mundo das imagens, o não dito pelas palavras é expresso nas coisas do mundo, assim como o que é silenciado pelas ações e pela materialidade do mundo é expresso pelas palavras. Apesar de não ser possível reduz\ir uma a outra, só percebemos o diagrama sobre o qual a realidade se sustenta quando fazemos ver por meio das palavras e quando conseguimos ler as coisas e suas imagens. Essa conjunção é que permeia e o que agencia o sentido de uma época.

 

 

No caso de Berliner é a consciência da intransponibilidade entre o dizível e o visível (entre a compreensão oral e a coisa em si) que fará que ele busque outra sintaxe visual, cuja narrativa vai impregnar a imagem não mais pela ideia da forma como fôrma, mas através da forma que se transmuta constantemente pela metamorfose. Suas pinturas são guiadas por um olhar que procura nos apresentar a imagem na sua incompletude, tal como a percebemos, pela simples razão que uma imagem esconde sempre o que está por detrás dela. Suas pinturas, então, não usam, de fato, o artificio tradicional da colagem, mas nos apresentam aquilo que realmente vemos quando vemos. Isto é, uma imagem encobrindo a outra. Ao apresentar a imagem dessa forma, ele nos indica a radicalidade da intransponibilidade entre as palavras e as coisas. São puras associações imagéticas que não permitem a entrada da palavra como costura de sentido. Ele nos apresenta pela sua pintura a radicalidade do visível e é por isso que elas têm essa aparência de realidade fantástica.

 

 

Quando percebi que a questão de Eduardo Berliner na pintura era a radicalidade do visível, entendi, então, o que me atraía na sua obra: diante da realidade e do real não há recuo possível. Não há metafisica transcendente. Essa questão me é muito próxima na medida em que eu acredito que a potência da arte resida nesse fato. Foi isso que a ruptura pós-neoconcreto nos trouxe. Em outras palavras, a arte é em potência; não representa nada: é expressão da radicalidade do real, que é a via que temos para nos aproximar do caos, que é o magma que alimenta a poesia: pura metafisica imanente.

 

 

A Fundação Eva Klabin foi um território fértil para o trabalho que Eduardo Berliner pôde realizar no Projeto Respiração. A possibilidade de atravessamentos de tempos e imagens permitiu que seu olhar fosse descobrindo incessantemente novas formas que iam sendo formadas pela metamorfose que seu olhar é capaz de construir, erigindo uma polifonia de imagens que ressoam ao longo do percurso de sua intervenção. Nenhum artista conseguiu aproximar-se tão intensamente da história das imagens que é apresentada pela coleção. Percorrer a exposição de Berliner é rever os múltiplos detalhes do acervo que nos passam despercebidos. O que apresenta nessas pinturas e esculturas são extrações e afecções da coleção ou remissões a outras obras já realizadas, que são memórias despertadas pela sua intensa convivência com o acervo da Fundação Eva Klabin. É incrível poder percorrer o circuito expositivo da fundação através de sua experiência e ver como as obras são transmutadas em novas formas que podem nos revelar, no mais singelo vaso, uma violência avassaladora ou ainda nos surpreender com a familiaridade de animais, que descobrimos estar espalhados nos desenhos dos tapetes, ou personagens das pinturas que retornam em um novo contexto.

 

 

Poderia me estender longamente sobre como os “encobrimentos” e as “revelações” do artista estabelecem relações polifônicas com o acervo, criando um território de metamorfoses; mas acredito que o mais importante é percorrer sua intervenção nos permitindo ser atentos, assim como ele foi, ao visitar várias vezes a fundação, e permitir-se simplesmente ver. A maior potência do seu trabalho é seu poder arrebatador de nos lançar diretamente em contato com a crueza do visível. Essa maneira direta de relacionar a imagem ao visível abafa a representação no que ela tem de desviante da intensidade do caos, que é o que permeia a apreensão poética do mundo, e nos permite atravessar a realidade e descobrir que o mistério é transparente – lembrando Octavio Paz – e, por isso mesmo, ele é a própria realidade manifesta. Por essa razão não há representação, ou melhor, tudo é expressão. Esse é o fulcro que me interessa na arte e Berliner consegue manifestá-lo ao criar uma sintaxe visual que não se sente tributária às palavras porque, como nos indica Daniela Labra, ele manifesta uma “[…] vontade consciente de desafiar novas possibilidades na difícil prática de retornar à pintura para conseguir tocar no mundo”. Eu acrescentaria: a difícil tarefa de tocar na realidade através de imagens que carregam consigo a presença da ausência.

 

 

 

Marcio Doctors

 

 

1 – Entrevista dada a Wang Fang. Publicada na revista Art World China, 2013; 2 – LABRA, Daniela. “Colagens”. Texto de parede da exposição realizada na Galeria Durex, São Paulo, 2008; 3 – LEITE NETO, Alcino. A pintura inquietante de Eduardo Berliner. In: Prêmio CNI SESI Marcantonio Vilaça artes plásticas, 2009/10: mostra itinerante, Brasília, 2011, p. 44-48; 4 – Alcino Leite Neto indica que, para sua surpresa, a obra de Berliner aproxima-se da de Courbet e dos pintores realistas do século XVIII. Concordo com ele e eu destacaria o fato de que essa aproximação denota que, assim como os realistas estavam interessados naquilo que há de radical nas temáticas da realidade social do povo, Berliner está interessado na radicalidade da realidade visual. Retomo essa questão mais adiante; 5 – Entrevista dada a Wang Fang. Art World China, 2013.

 

 

 

Até 31 de janeiro de 2016.

 

No Parque Lage

24/abr

Na próxima terça-feira, dia 28 de abril, a Escola de Artes Visuais do Parque Lage, Jardim Botânico, Rio de Janeiro, RJ, inaugura  a exposição “Encruzilhada”, com mais de cem obras de cerca de 70 artistas, em curadoria de Bernardo Mosqueira.

 

“Encruzilhada” inaugura o programa Curador Visitante, novo desenho do calendário de exposições da instituição, que convidou para este ano cinco curadores – Bernardo Mosqueira, Bernardo de Souza, Daniela Labra, Luisa Duarte e Marta Mestre – para realizarem exposições, que, em meio a nomes já reconhecidos no circuito, incluam também trabalhos de ao menos cinco estudantes da Escola.

 

Para acompanhar criticamente a produção desses estudantes, os cinco curadores ministram cursos na Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Bernardo Mosqueira acompanha  desde o início do ano as atividades da Escola, e escolheu o estudante Ulisses Carrilho como seu assistente na curadoria, mais sete artistas estudantes da instituição.

 

A exposição abrange trabalhos de nomes consagrados e de artistas que integrarão a Bienal de Veneza em maio como André Komatsu e Berna Reale.

 

A relação completa dos artistas presentes na exposição é: Afonso Tostes + Aderbal Ashogun, Agência Transitiva, Alexandre Mazza, Ana Linnemann, Ana Mazzei, André Komatsu, André Parente, Anna Bella Geiger, Anna Costa e Silva, Antonio Dias, Armando Queiroz, Berna Reale, Beto Shwafaty, Cao Guimarães + Rivane Neueschwander, Caroline Valansi, Carla Zaccagnini, Carlos Vergara, Chico Fernandez, Cildo Meireles, Cinthia Marcelle e Tiago Mata Machado, Cláudia Andujar, Daniel Steegmann Mangrané, Dias&Riedweg, Domingos Guimaraens, Eduardo Kac, Elisa Castro, Fyodor Pavlov-Andreevich, Grupo UM, Guga Ferraz, Gustavo Ferro, Íris Helena, Ivan Grilo, Jac Leirner, Joana Traub Csekö, Jorge Soledar, José Patrício, Laura Lima, Leandro Nerefuh, Lenora de Barros, Lucas Parente, Luiz Braga, Marcos Chaves, Maria Laet, Martha Araújo, Mauro Restiffe, Maya Dikstein, Milton Marques, Montez Magno, Nazareno Rodrigues, Odaraya Mello, Opavivará!, Paula Sampaio, Paulo Bruscky, Paulo Nazareth, Pedro Victor Brandão, Rafael RG, Rafael França (1957-1991), Raquel Versieux, Rebola, Regina Parra, Renata Lucas, Rodrigo Braga, Tiago Maladodi, Tiago Mata Machado, Tiago Rivaldo, Vivian Caccuri, Wesley Duke Lee e Waltercio Caldas.

 

 

Até 02 de junho.

MUV, novo espaço

04/jun

A MUV Gallery, galeria virtual dedicada à arte contemporânea, projeto de Camila Tomé e Stéphanie Afonso, abre mais uma frente, além do virtual. O projeto, que já completou um ano, funcionou muito bem e a tal ponto que clientes, parceiros e artistas não se contentaram com o movimento inovador na internet e com o showroom no espaço da casa no Joá. Por conta disso as galeristas buscaram um espaço onde possam realizar exposições individuais e ampliar o conceito MUV Gallery, que tem como objetivo aproximar o público da arte contemporânea e apresentar novos artistas. Na inauguração, será realizada a exposição individual de Piti Tomé, que apresenta seis obras inéditas, titulada de modo bastante original: “entre uma e outra coisa todos os dias são meus”.

 

O novo espaço situa-se em Ipanema, Rio de Janeiro, RJ, no burburinho artsy, na galeria ao lado da Livraria da Travessa. A grande novidade será o monitor touch screen, onde o visitante poderá ver os trabalhos dos artistas, preços das obras, e currículo/Biografia dos artistas, ou seja, se aproximar da arte sem se intimidar com perguntas. “Sabemos que faz parte perguntar na galeria detalhes sobre as obras, e isso vai continuar acontecendo, mas tivemos essa ideia do monitor para que o astral seja o mais informal possível”, conta Stephanie Afonso. Até o fim do ano, a galeria que representa hoje 13 artistas, entre eles Bob N, Felipe Fernandes, Cláudia Porto e Eloá Carvalho, pretende abrir mais duas exposições individuais, um dos motivos que fez com que a galeria nascesse e agora será possível trabalhar os artistas por inteiro, com uma quantidade maior de obras e realizar um trabalho mais aprofundado em cada exposição. A mostra tem curadoria de Marcelo Campos.

 

 

Sobre a artista

 

Piti Tomé é artista visual e trabalha com fotografia, vídeo e instalação. Seu interesse pela fotografia começou os 16 anos quando ganhou sua primeira câmera. É formada em cinema, pós-graduada em direção de fotografia pelo CECC e pela ESCAC, respectivamente, ambas em Barcelona, e começou seu percurso pela arte contemporânea participando de diversos cursos livres na EAV – Parque Lage, com professores como Fernando Cochiarale, Guilherme Bueno e Denise Cathilina.  Participou de duas exposições coletivas na Muv Gallery, uma com curadoria de Daniela Labra, e fez residência artística em Berlim, quando foi selecionada para o 4o prêmio Belvedere de arte contemporânea e para o Salão de Artes de Fortaleza, em Abril de 2014. Sua pesquisa gira em torno de questões sobre a memória, a infância e o tempo. Seus trabalhos são uma constante tentativa de costurar o passado e uma luta contra o esquecimento. Na mostra que apresentará seis obras inéditas, Piti fala da infância, do desaparecimento e luta contra o esquecimento da memória. A artista trabalhou em cima de fotos que vem de diversos lugares e feiras de antiguidades, dando para este material um novo significado. São impressões sobre as folhas, com folhas desmembradas de livros médicos, dicionários estrangeiros, fazendo um jogo de palavras com as imagens, introduzindo objetos tridimensionais, sempre lembrando ausência e a memória, ou falta dela nas pessoas. “Esta série narra pequenas biografias a partir de questões em torno da formação de identidade. São narrativas sobre uma infância perdida, sobre o abandono, a solidão, o esquecimento e, em última instância, a morte. Me aproprio de imagens e objetos para construir a história desses personagens, reiterando ou dando novo sentido a esses materiais. Através dessas vidas inventadas, construo um universo contra o esquecimento e tento dar conta do meu próprio passado”, finaliza Piti Tomé.

 

 

Sobre o nome da galeria

 

O nome – MUV Gallery – é inspirado na sigla de Movimento Uniformemente Variado da física. MUV é todo movimento com aceleração constante. Nossa galeria nasce desse conceito e já surge em movimento, sempre acompanhando as possibilidades que a internet proporciona e as novas mudanças que a vida contemporânea apresenta.

 

 

De 05 de junho a 08 de agosto