Debate de Ideias

24/mai

 

 

A Aliança Francesa Porto Alegre, em parceria com a Fundação Iberê Camargo e o Centre Intermondes de La Rochelle, promove o segundo “Debate de Ideias” do ano, sobre a importância da residência artística nas artes visuais. O evento ocorre nesta quinta-feira, 26 de maio, a partir das 19h, no auditório da Fundação Iberê Camargo, com transmissão pelo YouTube da AFPOA. Antes, às 18h, será realizada uma visita mediada às exposições em cartaz:  “Magliani,  (4º e 3º andares), “Antes que se apague: territórios flutuantes” (2º andar), de Xadalu Tupã Jekupé, e “Iberê e Porto Alegre – No andar do Tempo” (Átrio). O debate será mediado pelo jornalista Roger Lerina. O evento será em português, com tradução consecutiva, realizada por Mélanie Le Bihan, diretora da Aliança Francesa.

 

Os convidados desta edição são David Ceccon, Leandro Machado, Letícia Lopes e Xadalu, artistas premiados pelo Prêmio Aliança Francesa de Arte Contemporânea, que participaram de uma residência artística no Centre Intermondes, em La Rochelle, na França, e Edouard Mornaud, diretor do Centre Intermondes (Residência Artística Internacional), ligado à Direção da Cultura e do Patrimônio da Prefeitura da cidade de La Rochelle. O debate será mediado pelo jornalista Roger Lerina.

 

Sobre os convidados

 

Edouard Mornaud tem 25 anos de experiência em funções de liderança cultural, incluindo o Departamento Cultural do Ministério dos Negócios Estrangeiros francês (Paris), como chefe do Executivo da Alliance Française em Melbourne (Austrália), adido cultural da Comissão Europeia no Sudeste Asiático, vice-curador da AFAA/ Culturesfrance (atualmente Institut Français) e, desde 2008, atua como diretor do Programa de Residência Internacional de Artes do Centro Intermondes em La Rochelle. Desde os seus primeiros trabalhos como oficial cultural, tanto para a Aliança Francesa em Bangcok, como para o Oficial Cultural Francês em Nazaré (Israel), constrói metodicamente uma carreira em torno do desenvolvimento e entrega de programas culturais complexos, com enfoque específico nas relações transculturais.

 

David Ceccon é formado em Artes Visuais pela UFRGS. Artista multidisciplinar, sua prática artística reflete sobre as existências biológicas, culturais, reais e virtuais dos sujeitos na sociedade contemporânea. Realizou seis exposições individuais e participou de diversas coletivas nacionais e internacionais. Também desenvolveu e participou de diferentes projetos na área de artes visuais, incluindo projetos gráficos e cenográficos. Ganhou o prêmio IEAVI (2016), o Prêmio Açorianos nas categorias Artista Revelação e Destaque em Gravura (2016) e o Prêmio Aliança Francesa de Arte Contemporânea (2018) – com o qual recebeu uma residência artística na França. É cocriador e artista-colaborador da Revista Fracasso (@revistafracasso), indicada ao Prêmio Açorianos (2021). Atualmente, é representado pela Galeria AURA (SP). Atua também como assistente executivo na CoCreate TH partnered with Art Sense em Londres (UK).

 

Leandro Machado é bacharel em Artes Visuais pela UFRGS. Realizou mostras individuais, como Arqueologia do Caminho (2019), no Centre Intermondes, em La Rochelle, na França, e Desenhos Esquemáticos (2018), na Pinacoteca Aldo Locatelli, em Porto Alegre.

 

Letícia Lopes é formada em Artes Visuais pela UFRGS. Desenvolvendo sua pesquisa principalmente através da pintura, a artista investiga espaços de ambiguidade e mistério entre realidade e representação, explorando o suporte e a montagem do trabalho como ferramentas para propor novos significados. Desde 2013, participa de mostras coletivas em São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Rio Grande do Sul, Pernambuco, França e República Checa. Em 2022, realizou sua 8ª individual, Anima, na Galeria Verve (SP), com texto de Agnaldo Farias, e, em 2019, foi a vencedora do 3º Prêmio de Arte Contemporânea da Aliança Francesa, o qual rendeu-lhe sua primeira individual fora do país, I want to be adored (La Rochelle/FR). Ainda em 2019 e  em 2021, foi indicada ao Prêmio PIPA.

 

Xadalu Tupã Jekupé é um artista mestiço que usa elementos da serigrafia, pintura, fotografia e objetos para abordar em forma de arte urbana o tensionamento entre a cultura indígena e ocidental nas cidades. Sua obra, e as conversas com sábios em volta da fogueira, tornou-se um dos recursos mais potentes das artes visuais contra o apagamento da cultura indígena no Rio Grande do Sul. O diálogo e a integração com a comunidade Guarani Mbyá permitiram ao artista o resgate e reconhecimento da própria ancestralidade. Em 2020, sua obra Atenção Área Indígena foi transformada em bandeira e hasteada na cúpula do Museu de Arte do Rio. Meses depois, venceu o Prêmio Aliança Francesa com a obra Invasão Colonial: Meu Corpo Nosso Território, que o levou a uma residência artística na França, no Centre Intermondes em 2021.

 

Sobre o mediador

Roger Lerina é jornalista e crítico de cinema, integrante da Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema). Foi vice-presidente da Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (ACCIRS), entre 2008 e 2010, e presidente, de 2010 a 2012. É editor do site Roger Lerina, uma plataforma dedicada a notícias, artigos e vídeos sobre cinema, artes cênicas, música, artes visuais e eventos culturais. Desde 2019, integra o conselho artístico do evento Noite dos Museus e a comissão de seleção das atrações musicais da Virada Sustentável em Porto Alegre. Curador da Mostra de Longas-Metragens do Festival Internacional de Cinema da Fronteira em 2018 e 2019 e dos projetos Meu Filme Favorito e Adaptação: entre a Literatura e o Cinema – ambos realizados no Instituto Ling. Também atua como repórter e crítico de cinema no Canal Brasil e programador das três salas do Cine Grand Café, no Shopping Nova Olaria, em Porto Alegre.

Conversa com Xadalu

09/mai

 

 

Seguindo a parceria com a Fundação Iberê Camargo, o artista visual Xadalu Tupã Jekupé e o curador de arte Cauê Alves se reúnem, aqui no Instituto Ling, Porto Alegre, RS, para conversar com o público sobre a exposição “Antes que se apague: territórios flutuantes”, que estará em cartaz na Fundação Iberê a partir do dia 14 de maio. A mostra aborda a questão do apagamento da cultura indígena na região oeste do Rio Grande do Sul, onde diversas etnias foram dizimadas. Restaram algumas poucas escritas em livros históricos. Das 19 obras, 14 foram produzidas para a exposição. A atividade é gratuita e acontece nesta quinta, às 19h, em formato híbrido, online pelos canais no Youtube de ambas as instituições e presencial no Instituto Ling. Com vagas limitadas no presencial, a distribuição de senhas iniciará uma hora antes da atividade.

 

 

Fundação Iberê exibe Xadalu Tupã Jekupé

05/mai

 

 

Fundação Iberê aborda o apagamento da cultura indígena

 

 

“Vamos caminhar sobre os raios do sol

Vamos caminhar sobre o som do trovão

Vamos caminhar sobre as palavras no tempo

Vamos caminhar sobre a bruma de fumaça

Vamos caminhar todos juntos

Vamos caminhar todos juntos

Ao alcançar a terra sem males todos iremos nos alegrar

Todos iremos nos alegrar”

Xadalu Tupã Jekupé

 

 

No dia 14 de maio, sábado, a Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, RS, inaugura uma exposição inédita de Xadalu Tupã Jekupé, “Antes que se apague: territórios flutuantes”. Com curadoria de Cauê Alves, curador-chefe do MAM de São Paulo, a primeira individual do artista na instituição é, também, mais do que arte; aborda a questão do apagamento da cultura indígena na região oeste do Rio Grande do Sul, onde diversas etnias foram dizimadas. “O trabalho de Xadalu nos abre uma perspectiva da história a partir da visão dos que perderam as batalhas. Não apenas a Guerra Guaranítica, mas também as pequenas batalhas cotidianas, aquelas que silenciosamente vão sendo travadas e talvez nem sejam percebidas como uma batalha por quem venceu. Contribui para que outro modo de vida ganhe visibilidade e possa se tornar possível. Numa época em que as mudanças climáticas afetam a todos, a promessa de uma nova relação com a terra, antes que ela se apague completamente, só se cumprirá quando os saberes dos povos originários forem respeitados”, destaca Cauê.

 

 

“Antes que se apague: territórios flutuantes” apresenta 19 obras, que ocuparão o segundo andar da Fundação. Quatorze delas foram produzidas para esta mostra. Além do tamanho, que vem justamente para impactar, elas são memórias da infância de Xadalu Tupã Jekupé, bem como de sua mãe, de sua avó e de sua bisavó, na antiga Terra Indígena Ararenguá, na beira do Rio Ibirapuitã, em Alegrete. Memórias da casa de barro, sem luz elétrica, do fogo de chão e da pesca. Memórias das águas geladas que atravessavam todos os dias em busca de alimento e das infinitas noites escuras, apenas iluminadas pelas estrelas.

 

 

Como escreve Cauê para o catálogo da exposição: “Quando Xadalu demarca Porto Alegre, com seus adesivos, cartazes, pinturas ou bandeiras, como “área indígena”, está completamente correto do ponto de vista histórico. Todo o Brasil já foi território indígena. Mais do que a reinvindicação do direito ao território, trata-se de uma reocupação simbólica dele. Uma espécie de reconquista que não é como a conquista colonial, que explora e destrói a terra, seja pelo garimpo, a monocultura ou a construção de cidades e monumentos, mas de modo singelo, chamando atenção para quem sempre esteve ali, sentado, resistindo, mas que foi praticamente apagado, como se os indígenas tivessem perdido sua visibilidade. É inegável que os lambes de Xadalu tencionam o espaço urbano ao agir sobre a noção de pertencimento, exclusão e demarcação simbólica da cidade.” Segue ele: “O trabalho de Xadalu Tupã Jekupé contribui para que outro modo de vida ganhe visibilidade e possa se tornar possível. Numa época em que as mudanças climáticas afetam a todos, a promessa de uma nova relação com a terra, antes que ela se apague completamente, só se cumprirá quando os saberes dos povos originários forem respeitados”.

 

 

Sobre a curadoria

 

 

Cauê Alves é doutor em Estética e Filosofia da Arte e, desde 2020, curador-chefe do MAM São Paulo. Professor do Departamento de Artes da Faculdade de Filosofia, Comunicação, Letras e Artes da PUC-SP, onde também foi coordenador do curso de Arte: História, Crítica e Curadoria. Durante 11 anos, também foi professor do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo.

 

 

Prêmio PIPA 2022

 

 

Pela primeira vez, Xadalu Tupã Jekupé é indicado ao Prêmio PIPA 2022, um dos mais relevantes prêmios brasileiros de artes visuais. Neste ano, fazem parte do Comitê de Indicação 25 nomes, formado por críticos e curadores, artistas, colecionadores e professores de todas as regiões do país.

 

 

Exibição de documentário em diálogo com a exposição

 

 

No dia 14 de maio, sábado, às 16h30, a Fundação Iberê Camargo exibe o episódio de Xadalu Tupã Jekupé para o documentário “Misturados”, seguido de um bate-papo sobre a produção com os diretores Luiz Alberto Cassol e Richard Serraria, o artista e Cauê Alves, curador da exposição “Antes que se apague: territórios flutuantes”.

 

 

A web série fala das influências e das trocas culturais presentes na vida e na obra de sete artistas nas áreas da música, do cinema, da literatura e das artes visuais que vivem no Rio Grande do Sul. A concepção de diversidade contida neste projeto é viva e inovadora, pois reconhece a equidade de etnias e de gênero e destaca significativas contribuições do patrimônio histórico e cultural do Estado, sem separar as culturas “em caixinhas” e sem manter os artistas em territórios isolados. A realização de “Misturados” é da Leososamusica Produções Musicais, com roteiro e direção de Luiz Alberto Cassol, Ricardo Almeida e Richard Serraria. A produção executiva é de Leo Sosa e a produção-geral de Ricardo Almeida.

 

 

A Fundação Iberê tem o patrocínio de Crown Brand-Building Packaging, Grupo Gerdau, Renner Coatings, Grupo Iesa, Grupo Savar, Grupo GPS, CEEE-D Equatorial Energia, DLL Group, Lojas Renner, Sulgás e Unifertil, e apoio de Instituto Ling, Ventos do Sul Energia, Dell Technologies, Digicon/Perto, Golden Lake Multiplan, Laghetto Hotéis, Coasa Auditoria, Syscom e Isend, com realização e financiamento da Secretaria Estadual de Cultura/ Pró-Cultura RS e da Secretaria Especial da Cultura – Ministério da Cidadania / Governo Federal.

 

 

De 14 de maio a 31 de julho.

 

Três eventos

28/mar

 

 

Uma experiência compartilhada: Ateliê de Gravura da Fundação Iberê Camargo

A partir 29 de março, o público poderá visitar a nova exposição na galeria do Instituto Ling, Porto Alegre, RS. Trata-se de um recorte da “Coleção Ateliê de Gravura da Fundação Iberê Camargo”, resultado do projeto Artista Convidado, em atividade na instituição desde o ano de 2001, sob a coordenação do curador desta mostra, Eduardo Haesbaert, que foi assistente e impressor de Iberê Camargo (1914-1994). Em forma de residência, artistas de projeção nacional e internacional experimentaram a gravura, muitos deles pela primeira vez, e produziram obras inéditas criadas a partir de suas poéticas. A tradução dessa experiência é, agora, compartilhada, numa parceria entre o Instituto Ling e a Fundação Iberê Camargo, que apresentam vinte e sete artistas desse acervo, incluindo o próprio Iberê Camargo. As visitas acontecem com ou sem mediação. Em 29 de março, 10h30min.

 

Ciclo de debates

O Museu Depois

Ling aquece Noite dos Museus

No último encontro do ciclo de debates “O Museu Depois: qual será o papel das instituições culturais no pós-pandemia?”, o pesquisador e crítico de arte Paulo Herkenhoff e a diretora do IEAVi e do MACRS, Adriana Boff, serão os convidados para falar sobre as instituições culturais de hoje e amanhã. A mediação será do jornalista cultural Roger Lerina. O bate-papo será aberto ao público, no auditório do Instituto Ling. Para participar, basta fazer um breve cadastro em nosso site. As vagas são limitadas, de acordo com a capacidade do espaço. O encontro faz parte da programação “Ling Aquece Noite dos Museus”. Outras atividades já estão previstas nosso calendário da instituição. A entrada é sempre gratuita. Em 30 de março, 19h.

 

Guilherme Dable e Ricardo de Carli/Performance Sonora

Dentro da programação “Ling Aquece Noite dos Museus”, Guilherme Dable e Ricardo de Carli apresentam uma performance sonora inédita. Usando baixo, bateria, sintetizadores e outros objetos, a intervenção foi pensada especialmente para a galeria do Instituto Ling e dialogará com a exposição em cartaz. A atividade será aberta ao público. Para participar, basta fazer um breve cadastro no site do Ling. As vagas são limitadas, de acordo com a capacidade do espaço. O encontro faz parte da programação “Ling Aquece Noite dos Museus”. Entrada gratuita. 01 de Abril, 20h30min.

Seminário para Magliani

15/mar

 

 

A trajetória e a obra da artista plástica, pintora, desenhista, escultora e gravadora Maria Lídia Magliani (1946 – 2012) serão temas de dois encontros, uma parceria entre o Instituto Ling e a Fundação Iberê Camargo, ambos em Porto Alegre, RS. A programação acontece entre os dias 19 e 21 de março, com transmissão pelos canais do YouTube das duas instituições. Foram convidados da exposição “MAGLIANI”, dentre outros, diversas personalidades da vida cultural local e nacional como palestrantes dos encontros como a curadora Denise Mattar, a jornalista cultural Angélica de Moraes, a artista plástica mineira Maria José Boaventura, os jornalistas Paulo Gasparotto, Juarez Fonseca, Omar Filho e Antônio Hohlfeldt, o marchand Renato Rosa, a pintora Romanita Disconzi, o diretor teatral Luís Artur Nunes e o dramaturgo Julio Zanotta Vieira. Este seminário faz parte da programação da exposição em homenagem à Magliani, em cartaz na Fundação Iberê Camargo em cartaz a partir do dia 19 de março.

 

Magliani, restrospectiva na Fundação Iberê Camargo

10/mar

 

 

A artista visual Maria Lidia Magliani será homenageada pela Fundação Iberê Camargo com uma grande exposição que aborda 50 anos de produção.

“Não separo a artista da pessoa. Sou toda um mesmo nó – minha escolha é pintar, não saberia como ser de outro modo. Aparentemente fiz e faço muitas outras coisas, na verdade, todas partes de uma só, a pintura.” (1987)

No dia 19 de março, sábado, às 14h, a Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, RS, inaugura uma grande e inédita exposição de Magliani (1946-2012). “Magliani” reunirá cerca de 200 obras provenientes de mais de 60 coleções, incluindo os principais museus do Brasil como Museu de Arte do Rio, Museu Afro Brasil, Pinacoteca do Estado de São Paulo, Museu de Arte Moderna de São Paulo, MAC-USP, MAC-RS, Museu de Arte de Santa Catarina, MARGS, Museu de Arte Leopoldo Gotuzzo (Pelotas) e Fundação Vera Chaves Barcellos (Viamão). Com curadoria de Denise Mattar (SP) e de Gustavo Possamai (RS), a mostra inclui trabalhos desde a época de estudante – início dos anos 1960 – até 2012, ano de seu falecimento.

“A obra de Magliani é um desafio. Não é uma arte fácil, é feita para incomodar, para fazer refletir. A artista estava interessada nas questões humanas, nas relações entre os seres, nos problemas e no sofrimento inerente à existência: o desencontro, o desamor, a hipocrisia da sociedade, o medo da solidão. A apresentação de seu trabalho na Fundação Iberê Camargo, torna inevitável o paralelo com o pintor. Em 1993, Iberê disse: “Eu não nasci para brincar com a figura, fazer berloques, enfeitar o mundo. Eu pinto porque a vida dói”. Uma frase que poderia ser de Magliani, que, em 1997, escreveu: “Eu gostaria de dizer às pessoas que veem os meus quadros: !Sinto muito senhores, não é agradável’”, destaca Denise Mattar, que conheceu Magliani em 1987 quando era diretora técnica do Museu de Arte Moderna de São Paulo, e a artista participara do Panorama de Arte Atual Brasileira. Mais tarde, em 2004, a curadora reencontrou a artista no Rio de Janeiro, onde fez a apresentação da exposição “Trabalho Manual”.

Como lembra Gustavo Possamai, responsável pelo acervo da Fundação Iberê Camargo: “Magliani foi uma artista rara e merece todo reconhecimento. Por isso, garimpamos e reunimos o máximo de obras possível, sem medir esforços. Promovemos a restauração de muitas delas, reunimos escritos e depoimentos seus e de quem escreveu sobre seu trabalho, revisamos e ampliamos sua cronologia. É nossa forma de contribuição para a redescoberta de seu trabalho.” Possamai conta que, durante o processo de pesquisa, foi encontrada uma carta de Iberê Camargo para Magliani, datada de 1992, na qual o pintor escreveu: “Nós dois temos a mesma meta, o mesmo ideal, a mesma devoção. Haveremos de deixar nossos rastros neste chão em que nascemos.” Um depoimento precioso que reitera a oportunidade dessa exposição.

“…pinto a solidão no meio da cidade… a solidão do consumo”

Nascida em 25 de janeiro de 1946, em Pelotas, RS, Magliani passa a residir com a família em Porto Alegre, com 4 anos de idade. As informações sobre a família são esparsas. Seu avô era italiano, decorador de paredes; o pai servidor público e a mãe era do lar. A artista, apesar das dificuldades financeiras enfrentadas pela família, desde a adolescência gostava de ler, ouvir música, cinema, teatro, desenhar e de pintar.

Magliani formou-se em Artes Plásticas pelo Instituto de Artes da UFRGS, mas se autodenominava pintora: “…artista plástico faz muita coisa; eu só pinto, desenho, gravo, tudo derivado da pintura”. Apesar da afirmação, ainda na década de 1960, trabalhou em teatro, ilustrando capas de programas, fazendo cenografia e atuando em peças, como “As Criadas” (1969), de Jean Genet, “A Celestina” (1970), de Fernando Rojas, e “O Negrinho do Pastoreio” (1970), de Delmar Mancuso, nesta última como protagonista. A artista também se interessava por moda, e apreciava customizar, costurar e tricotar o que vestia.

Outra área de atuação foram os jornais, onde trabalhou, nos anos 1970, como diagramadora e ilustradora, ofício retomado em algumas mudanças de cidade posteriormente. Os jornais foram Folha da Manhã, Diário de Notícias, Zero Hora e Folha de São Paulo, entre outras participações e ilustrações.

Magliani deixou de residir em Porto Alegre em 1980, morou em São Paulo, em Tiradentes, Cabo Frio e no Rio de Janeiro, mas nunca se desligou nem de Porto Alegre e nem de sua terra natal, Pelotas, realizando regularmente exposições nessas cidades.

Sua produção é intensa e vigorosa e a exposição apresenta um panorama bastante consistente de seus trabalhos. A mostra é complementada por uma publicação dividida em dois volumes: o primeiro concebido como um catálogo de obras, e o segundo reunindo entrevistas e textos de Magliani, cartas, textos sobre ela de autores como: Carlos Scarinci, Teniza Spinelli, Celso Marques, Angélica de Moraes, Maria Amélia Bulhões, entre outros.

Reunindo um volume significativo de obras, a exposição apresenta trabalhos de todo o percurso de Magliani, organizados de forma cronológica e mostrando as alterações que sua obra foi sofrendo ao longo dos anos. Para compartilhar com o público a instigante personalidade da artista e sua multiplicidade, o trajeto da mostra é complementado com algumas frases e fotos da artista em vários momentos de sua vida. Na sequência são apresentadas pinturas do início de sua carreira, de 1964 a 1967, caracterizadas por um clima melancólico e lírico, com a inserção das frases poéticas riscadas sobre a tinta: “A espera do canto”, “O mesmo corpo com som de primavera”, “Autoretrato na nuvem”, “Eu tenho a flor”, e “Eu sou a inútil pureza nascida de dois silêncios” são algumas delas.

Em 1968 há uma mudança significativa na obra da artista, na qual ela se descreve como uma “delatora do desencontro”. É uma fase de passagem, influenciada pela pop art com trabalhos, como “Segundo canto para o amigo triste” e “As portas fechadas da cidade”. Um período difícil da Ditadura militar e a convivência com a Censura nas redações influencia a obra de Magliani. Seu repertório torna-se mais drástico, e, em 1976, ela faz a exposição “Anotações para uma história”, no MARGS. Foi um choque! A sociedade gaúcha não estava preparada para o que viu. No ano seguinte, levou ainda mais longe sua proposta realizando a série “Ela”, com grotescas mulheres seminuas, imensamente gordas, que ela considerava uma espécie de retrato interior da humanidade, e dizia: “Minha intenção é fazer a figura sair da tela, se derramar por cima da gente, sufocando”. A série, muito bem representada na retrospectiva, chamou a atenção dos críticos Jacob Klintowitz e Marc Berkowitz e foi determinante para a mudança da artista para São Paulo. Antes de ir embora, realizou na Galeria Independência, em Porto Alegre, a exposição “Brinquedo de armar”, reunindo desenhos e pinturas, sobre as quais dizia: “Acho que a mulher é o brinquedo mais armado e desarmado constantemente. Mas considero que todo mundo é, ou pode ser, um brinquedo de armar.”

O período de 1980 a 1988, o mais marcante da carreira da artista, coincide com o tempo em que ela residiu em São Paulo. Lá produziria as séries “Retratos falados”, “Crônica do amanhecer” e “Discussões com Deus”. Abandonando os tons sépia, passa a usar cores vibrantes e ácidas; mescla lápis de cor, de cera, pastel, grafite e até materiais de maquiagem, como corretivo e delineador, e muda o tratamento da pintura, usando a tinta acrílica e adotando pinceladas ágeis e gestuais, como traços de desenho, num processo que imprime movimento ao trabalho. É um momento no qual a obra de Magliani conversa de perto com a de Francis Bacon, atingindo o ápice de contundência e visceralidade da pintora. Retorcidos e distorcidos, corpos e rostos se desfazem e refazem, em movimentos bruscos.

Seus trabalhos são apresentados no Panorama do Museu de Arte Moderna de São Paulo, Bienal Internacional de São Paulo, e, em 1987, Evelyn Ioschpe promove no MARGS uma mostra de caráter retrospectivo: “Auto-retrato dentro da jaula”. Dez anos depois Magliani foi acolhida pelo público de sua cidade como uma estrela, a mais importante artista gaúcha de sua geração. O público poderá ver novamente todas essas séries, hoje integrando coleções de museus como Pinacoteca do Estado de São Paulo, MAM-SP e MAC-USP.

Em 1989, ela já estava cansada da violência e da poluição e queria fazer pinturas em um lugar mais tranquilo. Escolheu a pequena e histórica Tiradentes, MG. Lá, suas pinturas revelaram a solidão das montanhas, retomando os tons terrosos, nas séries “Em Gerais”, “Madrugada insone” e “Acumulações”. A artista também desenvolve, nesse período, uma série de cabeças, que são esculturas em madeira e papier machê.

Em 1997, mais uma mudança, agora para o Rio de Janeiro, mais especificamente o bairro de Santa Tereza. Passou a frequentar o Estudio Dezenove, onde conhece o artista Julio Castro.

Em 1999, Magliani retornou a Porto Alegre, onde ministrou algumas aulas e oficinas de pintura e papier machê. A passagem pela capital gaúcha durou um ano. No ano 2000 voou para o Rio de Janeiro. Com tantas mudanças a produção de Magliani diminui, mas há séries marcantes nesse período: “Acumulações” e “Alfabeto”, trabalho que deriva para as figuras recortadas das séries “Retratos de Ninguém” e “Todos”. A partir de 2009 é intensa sua produção de gravuras, impressas no Estudio Dezenove. “Um dos sonhos”, “Fábula”, “Da noite” e “O poeta” são algumas delas. Curiosamente, ao lado desse mergulho no universo monocromático, denso e expressionista da gravura, Magliani desenvolve a série mais colorida e lúdica de toda a sua carreira. São pinturas realizadas em estridentes cores acrílicas, recortes em madeira e objetos. Uma parte desse conjunto, sob o título “My baby just cares for me”, apoiada em gravação da cantora Nina Simone, foi apresentada em exposição individual no Museu Imaginário, em Bruxelas, Bélgica.

Todos esses momentos, apresentados em conjunto, revelam com clareza a excelência da obra de Maria Lídia Magliani, que começa a ser redescoberta também internacionalmente.

Magliani humanista

Apesar de pessoalmente engajada na luta pelos direitos humanos, Magliani não admitia que sua obra fosse interpretada como política ou identitária. Era intransigente nessa questão. São muitas as declarações dela a esse respeito. “Meu interesse é pelo que as pessoas sentem, não pelo que elas pensam […] Tenho preocupação com a vida, com a humanidade em geral. Nada a ver com raça específica, religião, nada. Uma coisa que é comum a todo mundo. A essência humana é igual para todos. O que interessa é isso. Todos os outros acréscimos: nacionalidade, cor, ideologia, credo, preferência sexual, time de futebol, tudo isso é acessório.”

Dentro dessa atitude de defesa da autonomia da sua obra, acima de qualquer circunstância, está também a rejeição a todo tipo de abordagem referenciando seu trabalho à Negritude. “Por que sempre me perguntam como é ser negra e ser artista? Ora, é igual ao ser de qualquer outra cor. As tintas custam o mesmo preço, os moldureiros fazem os mesmos descontos e os pincéis acabam rápido do mesmo jeito para todo mundo.”  A posição de Magliani sempre foi candente nessa questão, e ela afirmava, desassombradamente, que era contrária a guetos. Na publicação da UFRGS, “Nós, os afro-gaúchos”, de 1997, fez a seguinte declaração, quase um manifesto: “Sou brasileira, nascida no Rio Grande do Sul. Isto é o bastante. Não quero escolher uma raça em função da cor da minha pele. Não quero ser fatiada, dividida em porções, me aceito como soma.”

Uma lutadora, sem medo de desafios, que, entre divertida e séria, dizia: “Minha mãe falava: ‘Não se pode dar um passo maior que as pernas.’ Então vou ficar sentada, não vale a pena caminhar? Qual é a graça? Dar um passo maior que as pernas sempre. Romper expectativas, e os estereótipos principalmente.” Maria Lídia Magliani faleceu em de 21 de dezembro de 2012, no Rio de Janeiro, vítima de uma parada cardíaca.

 

As cores de Paulo Pasta

22/nov

 

 

A Galeria Millan apresenta “Correspondências”, a quinta individual de Paulo Pasta na galeria, que marca também o lançamento de sua nova publicação. A mostra materializa a ideia originada na troca entre Pasta e o curador Ronaldo Brito, ocorrida entre abril e setembro de 2020, em plena pandemia mundial de Covid-19. A publicação registra tal troca, revelando a matriz do pensamento que organiza a exposição. Entre grandes e pequenos formatos, os cerca de 20 trabalhos reunidos na exposição trazem à luz a tarefa do pintor e as reflexões do crítico, fruto da tentativa de encontrar um refúgio em meio aos efeitos adversos de uma crise política e sanitária.

Ao longo daqueles meses, artista e curador trocaram uma série de e-mails, em que Pasta compartilhava fotografias de trabalhos e registros sobre seus processos, enquanto Brito o respondia com formulações, pensamentos e poemas. Nesse processo, intercorreram-se textos, pinturas, desenhos, referências e aproximações com trabalhos de diferentes autores – da pintura à literatura -, uma forma encontrada por ambos de vislumbrar o “futuro em meio à escuridão”. Pouco a pouco, desenvolveram a ideia de realizar uma publicação que registrasse o percurso dos pensamentos nas mensagens trocadas junto de uma exposição que pudesse, segundo Pasta, “mostrar os pequenos movimentos” que ocorrem em seus trabalhos.

Nas telas, a construção de movimentos próprios e internos à pintura coexiste com a sensação de um congelamento do tempo real vivido em confinamento e representa, por isso mesmo, um ato de resistência e tenacidade da pintura. De maneira singular, este caráter do trabalho de Pasta se mostra, nas palavras de Brito, como “um manifesto discreto contra o imediatismo e o oportunismo”. Para ele, a conformação da pintura de Pasta produz uma espécie de topologia das cores em que essas se interpenetram.

Na seleção apresentada, as formas e combinações cromáticas formam estruturas de pórticos, elementos que constituem o que Ronaldo Brito designa, em uma de suas correspondências, como “abstração existencial”. Tal formulação de Brito é capaz de revelar uma nova compreensão sobre o trabalho de Paulo Pasta. Para o crítico, Pasta é capaz de conduzir este gênero à sua versão contemporânea, ao pintar o mistério – “um dos poucos sentimentos pictóricos autênticos” – através de um colorismo mais aberto. Nas palavras do próprio artista, essa “existência abstrata” combina seu interesse simultâneo pela abstração e pelo figurativo.

O intuito da pintura de Paulo Pasta é de instigar uma transcendência através da cor; uma experiência sensorial, como também intentavam Matisse e Cézanne. Há, por exemplo, como analisa o crítico, o uso de um vermelho que se eleva sobre a superfície do mundo ou de um ocre esverdeado que se perde com o entorno cotidiano e, de repente, parece estar fora da tela. Tais cores partem da geometria para criar consigo uma outra poética do mundo. Com esta autonomia cromática, Pasta retém o tempo presente, sempre carregado pelos fantasmas do futuro -faíscas que resistem aos tempos obscuros da realidade.

 

Sobre o artista

 

Ariranha, São Paulo, SP, 1959, Doutor em artes plásticas pela Universidade de São Paulo, SP (2011), Paulo Pasta realizou exposições individuais em diversos espaços, como Museu de Arte Sacra de São Paulo, SP (2021); Instituto Tomie Ohtake e Anexo Millan, São Paulo, SP (2018); Instituto Figueiredo Ferraz, Ribeirão Preto, SP (2018); Paulo Darzé, Salvador, BA (2017); Palácio Pamphilj, Roma, Itália (2016); Galeria Millan e Anexo Millan e Museu Afro Brasil, São Paulo, SP (2015); Sesc Belenzinho, São Paulo, SP (2014); Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, RS (2013); Centro Cultural Maria Antonia, São Paulo, SP (2011); Centro Cultural Banco do Brasil, Rio de Janeiro, RJ (2008); Pinacoteca do Estado de São Paulo, SP (2006); entre outros. Também participou de importantes exposições coletivas, entre elas: Vício impune: o artista colecionador, Galeria Millan e Galeria Raquel Arnaud, São Paulo, SP (2021); 1981/2021: Arte Contemporânea Brasileira na Coleção Andrea e José Olympio Pereira, Centro Cultural Banco do Brasil, Rio de Janeiro, SP (2021); Pinacoteca: acervo, Pinacoteca de São Paulo, SP (2020); MAC-USP no Século XXI – A Era dos Artistas, Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, SP (2017); Clube de Gravura – 30 Anos, Museu de Arte Moderna de São Paulo, SP, e Os Muitos e o Um, Instituto Tomie Ohtake, São Paulo, SP (2016); 30 x Bienal, Pavilhão da Bienal, São Paulo, SP (2013); Europalia, International Art Festival, Bruxelas, Bélgica (2011); e Matisse Hoje, Pinacoteca do Estado de São Paulo, SP (2009). Suas obras integram diversas coleções, entre as quais: Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofia, Madrid, Espanha; Pinacoteca do Estado de São Paulo, SP; Museu de Arte Moderna de São Paulo, SP; Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, RJ; Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, SP; Museu de Belas Artes do Rio de Janeiro, RJ; Instituto Figueiredo Ferraz, Ribeirão Preto, SP; e Kunsthalle, Berlim, Alemanha.

Exibição de esculturas de José Resende

08/nov

 

No dia 13 de novembro, às 14h, a Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, RS, abrirá sua nona e última exposição de 2021, “Na membrana do mundo”. Com curadoria de Luisa Duarte, Porto Alegre recebe, pela primeira vez, um conjunto significativo de obras – produzidas entre 1974 e 2018 – que marca a trajetória de José Resende.

Em mais de 50 anos dedicados às artes plásticas, uma das principais características de Resende é a apropriação de materiais comuns e ressignificação em instalações com uma forte densidade poética e grande potência visual. Ao todo, serão apresentadas 18 esculturas de grandes dimensões misturando diversos materiais, como parafina, feltro, aço, ferro, chumbo, latão, cobre, madeira, pedra, borracha, que têm ao mesmo tempo o desafio de fazer um trabalho com humor, tensão, oposições de sentido e movimento latente.

 

Até 06 de março de 2022.

Lucas Arruda e Iberê Camargo

04/nov

 

O lugar da pintura de Lucas Arruda e Iberê. Curadora apresenta as relações entre as mostras “Lugar sem lugar” e “Tudo te é falso e inútil”, duas exposições na Fundação lberê Camargo.

 

Pode-se dizer, grosso mo­do, que o artista paulista Lucas Arruda vem há dez anos depurando de maneira quase ritualística um mesmo tema: a paisagem como construção do olhar. É o que se pode verificar na exposição “Lucas Arruda: lugar sem lugar”, em cartaz na Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, RS. (*)

 

As pinturas de Arruda nos permitem ver, ao mesmo tempo, um pouco além da abstração e antes da figuração. Construídas a partir de camadas de tinta sobrepostas, escovadas, arranhadas, esfregadas, são obras que invocam o gênero paisagem usando por vezes tão somente a sugestão de uma linha de horizonte. E ela, afinal, que constitui recurso fundamental dessa tradição pictórica, uma espécie de menor denominador comum da composição paisagística, já que, como espectadores, tendemos a atribuir sentido a qualquer marquinha num espaço aberto, a imediatamente interpretar uma linha horizontal como um horizonte, a enxergar nuvens nas mudanças de direção de pinceladas, a ver um chão de terra numa camada grossa de impasto.

 

Os trabalhos da série “Deserto-Modelo”, presentes na mostra, sugerem lugares desprovidos de referências geográficas, mas que se edificam na memória e evocam vistas da natureza, marinhas e de matas. Nossa experiência diante dessas pinturas – embora certamente permeada por memórias, associações pessoais, narrativas indiretas e conotações artísticas históricas – nos remete, sobretudo, ao fenômeno sensual e sensorial da pintura.

 

A insistente frontalidade e a paleta contida de Arruda estão presentes nos vários trabalhos reunidos na mostra. A seleção abrange quatorze anos da produção do artista, incluindo desde pinturas do início da carreira àquelas realizadas em 2021, além de obras em outros suportes, como vídeo e instalação de luz. São obras silenciosas, caracterizadas por uma luminosidade insólita e sutil que se revela aos poucos, recompensando a observação prolongada. Entre o devaneio e a tatilidade da aplicação da tinta, evidencia-se a habilidade extraordinária do pintor. A incansável experimentação pictórica de suas pinturas é comovente, em especial quando vistas ao vivo.

 

Paralelamente, é apresentada a mostra “Iberê Camargo: tudo te é falso e inútil”, uma seleção de obras do artista gaúcho, concebida juntamente com Arruda, pertencentes ao acervo da Fundação Iberê. Oferece-se aqui uma experiência imersiva nas últimas criações de Iberê, a partir das cinco célebres pinturas da série “Tudo te é falso e inútil”, reunidas pela primeira vez na Fundação. Pretende-se dessa forma explorar momentos de intersecção e diálogo entre os trabalhos de Arruda e Iberê, sugerindo pontos de acesso ao entendimento de questões compartilhadas por ambos.

 

“Tudo te é falso e inútil” parece ser para onde converge – e de certa forma submerge – toda a trajetória artística de Iberê Camargo. Elementos constitutivos do léxico singular do pintor – carretéis, manequins, caixas d’água, bicicletas – compartilham com figuras débeis e pesadas, quase andrógenas, o lugar elusivo e movediço demarcado pelas pinturas e desenhos. A seleção – onze pinturas e trinta e cinco desenhos das séries “Ciclistas” e “Idiotas”, além da série completa e esboços preparatórios para “Tudo te é falso e inútil” – busca explicitar justamente o processo obsessivo desse “retorno das coisas que adormeceram na memória”, como definiu o próprio Iberê, no qual a re-emergência dos mesmos elementos oferece ao espectador uma imersão profunda no imaginário singular do artista.

 

Na obra de Iberê, como na de Arruda, há um contínuo retrabalhar de certas imagens. Ambos, ao invés de se intimidar diante da repetição, a abraçam como recurso de decantação e depuração de ideias que, em última análise, nos levam para além do tema e de volta à pintura.

 

Cumpre dizer que, desde o primeiro encontro de Lucas Arruda com a série “Tudo te é falso e inútil”, há sete anos, no Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo, essas pinturas se tornaram uma forte referência para seu trabalho. O artista conta que voltou repetidas vezes à exposição para observar as pinturas: “O que mais me impressionou foi o perfeito alinhamento entre a execução e o assunto do trabalho. O drama daquelas imagens não reside somente no conteúdo, mas em como Iberê as construiu, no modo como a tinta é posta e raspada, riscada, depositada e removida múltiplas vezes, resultando na fantasmagoria das figuras. A angústia do tema é expressa na própria carne da pintura. Parece existir uma ansiedade no fazer, estreitamente conectada ao assunto, que traz uma potência muito grande para o trabalho. Essa qualidade da pintura do Iberê foi uma das coisas que mais me chamou a atenção”. Em “Tudo te é falso e inútil”, resume Arruda, “Iberê tenta captar esse momento em que as coisas perdem sentido”. No entanto, a despeito da atmosfera distópica, “da evidente falta de otimismo manifesta nas pinturas, é notável a capacidade do trabalho de gerar um consolo à inquietação existencial do ser humano”, conclui.

 

Tanto na série “Tudo te é falso e inútil”, de Iberê, quanto na “Deserto-Modelo”, de Arruda, há uma suspensão de referências de espaço e tempo que torna possível dizer que “o lugar sem lugar” onde opera o primeiro e equivale ao deserto do segundo. Este, nas palavras de Arruda, “não tem data, pode vir antes de tudo ou depois de tudo. Você não sabe se o deserto é um momento de formação ou do fim das coisas. E, ao memo tempo, gênese e apocalipse. E algo que busco nas minhas pinturas, essa atemporalidade”. Palavras que poderiam descrever também o espaço ambíguo criado por lberê.

 

Os dois artistas constroem pinturas compostas de inúmeras superposições de marcas, acidentes e camadas que muitas vezes resultam em superfícies onde se vê quase nada. Como bem articulou o colega de oficio Paulo Pasta, é “o emprego de um esforço monumental para expressar a inutilidade de qualquer esforço”. Uma perfeita analogia tanto da arte quanto da vida.

 

Lilian Tone (*)

 

“Lucas Arruda: Lugar sem lugar – Até 16 de janeiro de 2022.

 

“lberê Camargo: Tudo te é falso e inútil” – Até 13 de fevereiro de 2022.

 

Agendamento: bileto.sympla.com.br

(*) Curadora das mostras ”Lucas Arruda: Lugar sem lugar” e “Iberê Camargo: Tudo te é falso e inútil”. Curadora independente que, até recentemente, integrava o Departamento de Pintura e Escultura do Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA).

 

Fontes: Fundação Iberê Camargo-Correio do Povo

Paulo Pasta: LUZ

03/set

 

 

O Museu de Arte Sacra de São Paulo – MAS / SP, instituição da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, abre “Paulo Pasta: Luz”, exposição do artista plástico Paulo Pasta, sob curadoria de Simon Watson. A mostra apresenta 19 telas dos últimos 10 anos, com dimensões que oscilam entre mural e laptop. “Pasta cria pinturas que são meditações físicas sobre a metafísica e mais palavras e emoções quando sabemos o que estamos mostrando …”, define o curador.

 

 

“Paulo Pasta: Luz” é a vigésima mostra individual institucional do artista e a primeira após a “Projeto e Destino”, no Instituto Tomie Ohtake de 2018, com curadoria de Paulo Miyada. Desde a sua primeira individual em 1983, Paulo Pasta faz exposições continuamente e suas obras são aceitas e abraçadas por instituições públicas e coleções privadas. Ao longo dos anos, sua prática de pintura evoluiu para uma meditação silenciosa sobre cor, espaço e luz. Poucas opções de cor – de três a seis matizes por tela, todos com valores tonais semelhantes – seus campos de composição sugerem um enquadramento com pilares arquitetônicos, entablamentos e vigas. Os contrastes sutis entre cores semelhantes fazem com que vibrem e se movam sutilmente para a frente e para trás no espaço. Eles sugerem elegantemente a captura de luz e alude às formas como a luz muda suas características ao longo do dia.

 

O aspecto formal das telas de Paulo Pasta sugere um diálogo permanente com Giorgio Morandi e Alfredo Volpi, bem como com Old Masters onde, de uma forma semelhante, possuem uma consciência populista. Eles nos levam para a rua. Eles nos convidam a conhecer o mundo ao nosso redor, de paredes e fachadas pintadas em cores vivas que podem ser encontradas no dia a dia e em todos os locais no Brasil. Exuberantes em cores e serenas em estrutura, as pinturas de Paulo Pasta são profundamente meditativas e afirmativas da vida.

 

 

Destacada por uma instalação mínima e iluminação dramática, a exposição “Paulo Pasta: Luz” é composta por quatro grandes pinturas em escala muralista (duas verticais e duas horizontais), cada uma ladeada por pinturas de tamanho médio que dialogam com suas cores e composições. A segunda, no espaço do claustro, são instalações do próprio estúdio do artista, onde em uma parede corrida você encontra um salão de meditação que interage de forma alegre a íntima.

 

“As pinturas de Paulo Pasta são uma manifestação física da presença da luz, como em um reflexo durante um passeio matinal. São também etéreas, sugerindo a imaterialidade da luz. Luz do espírito e da imaginação, luz que irradia e eleva.”

 

 

Simon Watson

 

 

Projeto LUZ Contemporânea

 

 

LUZ Contemporânea é um programa de exposições de arte contemporânea que se desdobra em eventos e ações culturais diversas, públicas e privadas. Desenvolvido pelo curador Simon Watson, o projeto, atualmente, encontra-se baseado no Museu de Arte Sacra de São Paulo. Nesse espaço, LUZ Contemporânea apresenta exposições temáticas de artistas convidados, de modo a estabelecer diálogos conceituais e materiais com obras do acervo histórico da instituição. Embora fortemente focada no cenário artístico brasileiro atual, LUZ Contemporânea está comprometida com uma variedade de práticas, cultivando parcerias com artistas performáticos e organizações que produzem eventos de arte.

 

 

O primeiro ano de programação de LUZ Contemporânea, no Museu de Arte Sacra, foi concebido como uma trilogia que visa responder à pandemia. O ciclo teve início com João Trevisan: Corpo e Alma, sendo seguida por Esperança, coletiva com 12 artistas, e culmina com Paulo Pasta: Luz. A trilogia vai do escuro ao claro, dos noturnos de João Trevisan à meditação de Paulo Pasta sobre a luz.

 

 

Sobre o artista  

 

 

Paulo Pasta nasceu em Ariranha/SP, 1959.  Doutor em artes visuais pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo – ECA / USP (SP). Recebeu a Bolsa Emile Eddé de Artes Plásticas do MAC/USP (SP) em 1988. Dentre as exposições realizadas, destaque para individual na no Centro Cultural Maria Antonia, em 2011, para o Panorama dos Panoramas, no Museu de Arte Moderna de São Paulo, em 2008, e para individual na Pinacoteca do Estado de São Paulo, em 2006. Como professor, lecionou pintura na Faculdade Santa Marcelina – FASM, entre 1987 e 1999, e desenho na Universidade Presbiteriana Mackenzie, entre 1995 e 2002. É professor da USP desde 2011 e, da FAAP, desde 1998. Realizou exposições individuais em diversos espaços, como Instituto Tomie Ohtake e Galeria Millan, São Paulo, SP (2018); Galeria Carbono, São Paulo, SP, e Paulo Darzé, Salvador, BA (2017); Embaixada do Brasil, Roma, Itália (2016); Galeria Millan e Museu Afro Brasil, São Paulo, SP (2015); SESC Belenzinho, São Paulo, SP (2014); Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, RS (2013); Centro Cultural Maria Antonia, São Paulo, SP (2011); Centro Cultural Banco do Brasil, Rio de Janeiro, RJ (2008); e Pinacoteca do Estado de São Paulo, SP (2006), entre outros. Também participou de importantes exposições coletivas, entre elas: MAC-USP no Século XXI – A Era dos Artistas, Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, SP (2017); Clube de Gravura – 30 Anos, Museu de Arte Moderna de São Paulo, SP, e Os Muitos e o Um, Instituto Tomie Ohtake, São Paulo, SP (2016); 30 x Bienal, Pavilhão da Bienal, São Paulo, SP (2013); Europalia, International Art Festival, Bruxelas, Bélgica (2011); Matisse Hoje, Pinacoteca do Estado de São Paulo, SP (2009); Panorama dos Panoramas, MAM-SP, SP (2008); MAM(na)Oca, Oca, São Paulo, SP (2006); Arte por Toda Parte, 3ª Bienal do Mercosul, Porto Alegre, RS (2001); Brasil + 500 – Mostra do Redescobrimento, Pavilhão da Bienal, São Paulo, SP (2000); e III Bienal de Cuenca, Equador (1991), entre outras. Suas obras integram diversas coleções, entre as quais: Pinacoteca do Estado de São Paulo, SP; Museu de Arte Moderna de São Paulo, SP; Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, RJ; Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, SP; Museu de Belas-Artes do Rio de Janeiro, RJ; Colección Patricia Phelps de Cisneros, Nova York, EUA; e Kunsthalle, Berlim, Alemanha.

 

 

Sobre o curador

 

 

Simon Watson, nascido no Canadá e criado entre Inglaterra e Estados Unidos, Simon Watson é curador independente e especialista em eventos culturais baseado em Nova York e São Paulo. Um veterano com trinta e cinco anos de experiencia na cena cultural de três continentes, Watson concebeu e assinou a curadoria de mais de 250 exposições de arte para galerias e museus, e coordenou programas de consultoria em colecionismo de arte para inúmeros clientes institucionais e particulares. Nas últimas três décadas, Watson trabalhou com artistas emergentes e os pouco reconhecidos, trazendo-os para a atenção de novos públicos. Sua área de especialização curatorial é identificar artistas visuais com potencial excepcional, muitos dos quais agora são reconhecidos internacionalmente na categoria blue-chip e são representados por algumas das galerias mais famosas e respeitadas do mundo.

 

 

Sobre o museu

 

 

 

O Museu de Arte Sacra de São Paulo, instituição da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, é uma das mais importantes do gênero no país. É fruto de um convênio celebrado entre o Governo do Estado e a Mitra Arquidiocesana de São Paulo, em 28 de outubro de 1969, e sua instalação data de 29 de junho de 1970. Desde então, o Museu de Arte Sacra de São Paulo passou a ocupar ala do Mosteiro de Nossa Senhora da Imaculada Conceição da Luz, na avenida Tiradentes, centro da capital paulista. A edificação é um dos mais importantes monumentos da arquitetura colonial paulista, construído em taipa de pilão, raro exemplar remanescente na cidade, última chácara conventual da cidade. Foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, em 1943, e pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Arquitetônico do Estado de São Paulo, em 1979. Tem grande parte de seu acervo também tombado pelo IPHAN, desde 1969, cujo inestimável patrimônio compreende relíquias das histórias do Brasil e mundial. O Museu de Arte Sacra de São Paulo detém uma vasta coleção de obras criadas entre os séculos 16 e 20, contando com exemplares raros e significativos. São mais de 10 mil itens no acervo. Possui obras de nomes reconhecidos, como Frei Agostinho da Piedade, Frei Agostinho de Jesus, Antônio Francisco de Lisboa, o “Aleijadinho” e Benedito Calixto de Jesus, entre tantos, anônimos ou não. Destacam-se também as coleções de presépios, prataria e ourivesaria, lampadários, mobiliário, retábulos, altares, vestimentas, livros litúrgicos e numismática.

 

 

Até 08 de Novembro.