Marcelo Guarnieri exibe Iolanda Gollo Mazzotti

30/set

 

A Galeria Marcelo Guarnieri, Jardins, São Paulo, SP, apresenta até 03 de novembro, “Luz que emana”, primeira mostra na unidade de São Paulo da artista Iolanda Gollo Mazzotti. A exposição reúne pinturas, esculturas e frotagens produzidas durante os anos de 2021 e 2022 e conta com texto crítico do curador Ricardo Resende.

Iolanda Gollo Mazzotti nasceu em 1952, em Caxias do Sul, RS, einiciou sua produção ainda na década de 1990, exibindo seu trabalho em museus como MAM São Paulo; MAM Rio de Janeiro; Paço Imperial do Rio de Janeiro; MAC Paraná; MAC Rio Grande do Sul e Itaú Cultural de São Paulo. Em sua pesquisa, a artista investiga questões relacionadas à luz e ao poder da imagem, através de uma aproximação com o universo da estatuária religiosa e da experimentação com a técnica da gravura em um campo expandido.

Filha e neta de artesãos marceneiros de altares e santos, Iolanda Gollo Mazzotti cresceu rodeada de figuras religiosas, que, ao seu olhar, pareciam sempre perfeitas e inalcançáveis, distanciadas do plano terreno. Movida por essa inquietação e interessada pelos aspectos plásticos daqueles objetos escultóricos, a artista deu início a um trabalho – que já dura mais de vinte anos – de distorção e desmanche da Nossa Senhora da Luz, uma santa da Igreja Católica tradicionalmente invocada por pessoas com deficiência visual, que em sua imagem original carrega uma lamparina.

Sua curiosidade pelas questões do invisível a levou a associar a sua pesquisa sobre a imagética religiosa ao campo das percepções sensoriais, questionando a importância que havia sido socialmente atribuída ao sentido da visão para a experiência humana. Em meados da década de 90, Iolanda Gollo Mazzotti acompanhou de perto o trabalho da APADEV – Associação dos Pais e Amigos dos Deficientes Visuais de Caxias do Sul, trocando experiências e reflexões com os associados em torno das potencialidades e limitações das pessoas videntes e das pessoas não-videntes. Essa vivência permitiu à artista refletir que nem sempre a luz possibilita uma apreensão da realidade, já que pode inibir outros sentidos e, quando em excesso, pode cegar. Retirando a lamparina das mãos da santa em seu trabalho, Iolanda Gollo Mazzotti ressignifica a imagem da Nossa Senhora da Luz como uma maneira de explorar questões não somente filosóficas, como também plásticas. “Em meu trabalho, essa imagem tem a mão vazia porque a luz agora se apresenta de diferentes formas. Modelando, delimitando e se diluindo para gerar diferentes intensidades de sombras.”, diz Iolanda.

Iolanda Gollo Mazzotti apresenta esculturas, pinturas e objetos que se constroem por meio de técnicas como a frotagem, a moldagem e a costura, e materiais como o carvão, a seda e o gesso. Todas essas obras são provenientes de uma única matriz: a escultura de uma Nossa Senhora da Luz. Para produzir um dos trabalhos, são retiradas dessa matriz impressões frotadas em seda com carvão e gesso que geram imagens fragmentadas da santa, como se fossem registros imperfeitos de um corpo sagrado, suspensos pelo teto. Outro conjunto de peças apresentadas se aproxima um pouco mais do campo tridimensional, embora ainda se relacionem com o ato de gravar e com o interesse da artista pela linguagem da gravura. Moldadas sobre tecido, compõem corpos deformados da santa cujos aspectos podem ser percebidos através de um efeito de drapeado. A artista explica que “a santa nunca se reconstrói totalmente, apenas dá indícios de sua totalidade”.

Indo além no exercício de desmanchar tal figura, Iolanda Gollo Mazzotti exibe também os moldes de silicone e as camas de gesso, não mais suspensas e aéreas, mas dispostas no chão, em contato com o solo: “As camas que acolhem os moldes contém a força de uma forma impregnada de conceitos e limitações, mas agora descansam sob uma luz tênue que se desprende da estrutura rígida da matéria.” Outros moldes menores feitos de gesso, resina e cera são apresentados, mas o que se vê são apenas suas cavidades interiores iluminadas por pequenas lâmpadas de baixa voltagem. Duas máquinas em paredes opostas riscam a superfície com carvão – uma linha na horizontal e outra na vertical – e compõem uma cruz desmembrada, deixando também no chão o registro da ação em forma de Galeria Marcelo Guarnieri.

 

 

Claudia Jaguaribe exposição e livro

24/ago

 

 

A exposição de fotografias de Claudia Jaguaribe “Quando eu vi a Flor do Asfalto”, até 24 de setembro na Galeria Marcelo Guarnieri, Jardins, São Paulo, SP, faz uma investigação sobre a  a natureza e a sociedade na atualidade. O livro da artista  “Asphalt Flower”, editado pela Éditions Bessard, encontra-se à venda na galeria.

 

Claudia Jaguaribe

 

A relação entre a natureza e a humanidade é uma das questões mais importantes do século XXI. A incerteza do nosso futuro e os desafios para a nossa sobrevivência física e psíquica na Terra levantam questões ecológicas, sociais e artísticas que demandam uma urgência no seu tratar. O Brasil, país de dimensões continentais, possui características e estruturas de alto contraste que tornam tal situação ainda mais agravante. Se por um lado habitamos um território composto por grandes extensões de biomas preservados, por outro, testemunhamos o aceleramento de sua devastação.

 

Desde 2008 Claudia Jaguaribe vem abordando tais questões por meio de sua obra. A necessidade de expandir as possibilidades da linguagem fotográfica fez com que o trabalho ganhasse consistência ao longo de sua trajetória. Sua produção contempla assim uma diversidade de meios como a fotografia, a foto escultura, o vídeo e o livro. Na exposição “Quando eu vi a Flor do Asfalto”, que se realizará na Galeria Marcelo Guarnieri em São Paulo em agosto de 2022, serão exibidas as séries “Flor do Asfalto” (2020) e “Jardim Imaginário” (2019), além de “Asphalt Flower” (2022), livro inédito publicado pela editora francesa Éditions Bessard. O lançamento do livro ocorrerá durante a abertura da exposição. Também será apresentada uma seleção de fotografias de séries anteriores em que Jaguaribe explorou a ideia de emaranhamento entre natureza e cultura.

 

“Flor do Asfalto” (2022) revisita a ideia de paisagem como um jardim, um espaço de conexão entre homem e natureza onde é possível observar a dinâmica dos ciclos da vida (crescimento, floração e declínio) como um reflexo da sociedade que o molda. As imagens de flores sobrepostas que integram-se simbioticamente às formas asfálticas nos mostram uma superfície que encapsula a natureza desde os tempos bíblicos e que não pode mais ser separada dela. O trabalho possui o formato de uma frisa composta por partes que, unidas, formam uma única imagem. Nesta exposição será apresentado também “Asphalt Flower”, fotolivro publicado pela editora francesa Éditions Bessard que tem o formato leporello em alusão à obra.

 

“Jardim Imaginário” (2019) é uma série de fotografias constituídas por planos sobrepostos que produzem encontros entre flores exuberantes e paisagens urbanas. As imagens que formam a base real sobre a qual Jaguaribe cria o imaginário foram produzidas em reservas ambientais e jardins brasileiros emblemáticos, tais como o Parque Inhotim e o Sítio Roberto Burle Marx. As plantas tropicais sobrepostas são emolduradas ora por fotografias de fragmentos de construções arquitetônicas, ora por registros de devastações produzidas por queimadas, criando imagens que mostram a interseção e o diálogo inevitável entre uma visão idílica da nossa natureza e o testemunho das enormes mudanças que vem ocorrendo. As esculturas apresentadas na exposição também fazem parte desta pesquisa e introduzem, na fotografia, elementos escultóricos presentes nos jardins de Burle Marx, gerando assim um diálogo entre fotografia, paisagem e arquitetura que se realiza no campo tridimensional. Uma forma que ganha uma paisagem ou uma paisagem que ganha uma forma.

 

As outras obras que integram a exposição são, de alguma maneira, a gênese e origem desta pesquisa. “Quando eu vi” (2008) pode ser definida como uma paisagem em construção. As bibliotecas de Jaguaribe são obras icônicas deste período de sua produção que buscava por formas simbólicas de preservação de uma natureza então ainda intacta. A realização de “Pau Mulato”, uma das fotografias da série, marca o primeiro momento em que a abstração de uma forma vegetal levou à criação de peças escultóricas. Já “Aba katu” (2014) é um ensaio poético sobre a visão dos naturalistas viajantes do século XIX que tinham a flora e a fauna como objetos de um escrutínio “científico”.

 

A série “Confluência” (2019), leva a fotografia para o campo da abstração, dando seguimento a sua relação com a natureza através de uma investigação sobre as suas qualidades pictóricas. Nela, estão representados os rios Tocantins, Paraná, Solimões e Iguaçu que se mesclam, assumindo um novo corpo como num processo de metamorfose.

 

Na série “Jardim de Lina” (2018) há uma espécie de embate e complementaridade entre arquitetura e natureza. Nas imagens, o jardim parece invadir a arquitetura modernista da Casa de Vidro, tornando difícil a distinção entre os limites do espaço interior e do exterior. A partir do desejo de tensionar ainda mais esses limites entre o dentro e o fora, entre a fotografia e a escultura, a artista intervém nas imagens com desenhos de círculos que remetem ao vocabulário da arquitetura modernista de Lina Bo Bardi que tinha nas formas da natureza uma fonte de inspiração.

 

“Quando eu vi a Flor do Asfalto” permitirá ao público revisitar a trajetória de Claudia Jaguaribe que há 30 anos dedica-se a produzir uma obra original e potente na qual a denúncia se faz não por uma abordagem jornalística, mas por um olhar artístico que nos reinsere na beleza misteriosa e complexa da vida e do mundo.

 

 

Duas exposições na Marcelo Guarnieri SP

14/jul

 

 

A Galeria Marcelo Guarnieri, Jardins, São Paulo, SP,  apresenta, de 16 de julho a 13 de agosto, na sede de São Paulo, “Guima”, exposição individual do artista paulista e “Gabinete”, exibição coletiva com obras de Alfredo Volpi, Alice Shintani, Antonio Lizárraga, Elisa Bracher, Eleonore Koch, Flávio de Carvalho, Gerty Saruê, Helena Carvalhosa, Iberê Camargo, Ismael Nery, Ivan Serpa, LIUBA, Luiz Paulo Baravelli, Marcello Grassmann, Maria Leontina, Mira Schendel, Niobe Xandó, Paola Junqueira, Pedro Correia de Araújo, Roberto Magalhães, Tarsila do Amaral e Waltercio Caldas. Na Sala 1 serão apresentadas pinturas do taubateano GUIMA (1927-1993) produzidas durante as décadas de 1960 e 1970 e na Sala 2 serão apresentados desenhos, sejam eles obras ou estudos preparatórios, produzidos entre os anos de 1920 e 2020 por artistas brasileiros de diversas gerações.

 

Sobre o artista

 

GUIMA é Luis Moreira Castro Toledo de Souza Guimarães. Nascido em Taubaté em 1927 e formado como artista no Rio de Janeiro em tradicionais centros de estudos de artes como o MAM RJ e a Escola do Povo (fundada por Portinari, Oscar Niemeyer e Quirino Campofiorito), dedicou-se à gravura, ao desenho e à pintura de marinhas e paisagens rurais desertas, muitas vezes habitadas por seres fantásticos e monstruosos. Tais figuras – peixes alados, dragões e outros híbridos gigantes – surgem de influências diversas, tais como o Apocalipse bíblico, as imagens do inconsciente exploradas pelos Surrealistas e o bestiário de Marcello Grassmann, artista que foi também seu professor de gravura. As pinturas de GUIMA variam entre a calmaria silenciosa dos verdes campos do Vale do Paraíba, os ambientes soturnos de pesadelos madrugais e o sentimento trágico das tempestades em alto mar. GUIMA participou da IX Bienal de São Paulo (1967), da coletiva “O Monstro na Arte Moderna” (1967), das 17ª, 18ª, 19ª e 22ª edições do Salão Nacional de Arte Moderna (1968, 1969, 1970, 1973), do 25º Salão Paranaense (1968) e da 16ª Arte e Pensamento Ecológico (1978), dentre outras.

 

A coletiva

 

“Gabinete” reúne obras em desenho produzidas por vinte e dois artistas em diferentes momentos da história da arte brasileira em um período de cem anos. O conjunto de trabalhos permite observar modos distintos com os quais os artistas exploraram o rastro do atrito sobre o papel, seja através das modalidades clássicas da linguagem como o desenho de observação – modelo vivo, paisagem, natureza-morta -, seja através da investigação de seus elementos plásticos e estruturais – o traço e a geometria, por exemplo – ou mesmo através de seu uso como ferramenta para estudos e projetos.

 

 

Hipocampo, individual de Silvia Velludo

10/mai

 

 

A Galeria Marcelo Guarnieri, Jardins, apresenta, entre os dias 14 de maio e 25 de junho, “Hipocampo”, segunda exposição individual de Silvia Velludo no endereço de São Paulo. Além das pinturas da série “Hipocampo”, realizadas entre 2016 e 2022, a mostra reúne algumas das obras produzidas pela artista durante a década de 2000, como as pinturas das séries “Penumbras” (2003-2004), “Divisas” (2007-2012), o livro-objeto em letreiro digital “Ida” (2012) e a videoinstalação “Projeto de Aurora” (2002). A exposição conta com texto assinado por Fernando Cocchiarale.

 

 

Formada por mais de 300 pinturas, a série “Hipocampo” dá continuidade à investigação de Silvia Velludo sobre a produção e a reprodução de imagens através da pintura. A artista faz uso de um extenso acervo de fotografias de celular, de notícias de jornal, cenas de filmes e posts de redes sociais para refletir sobre a aparente banalidade dessas imagens e o ritmo acelerado em que são difundidas, traduzindo os códigos da linguagem fotográfica digital para a linguagem pictórica. O título remete à estrutura cerebral responsável pelo armazenamento da memória e faz uma alusão ao registro involuntário que fazemos das imagens que nos rodeiam e as infinitas associações inconscientes que podem ser estabelecidas entre elas. O conjunto de pinturas de tamanhos variados é distribuído por toda a extensão das paredes da galeria, formando um grande painel diagramático de retratos do cotidiano, intercalados ora com telas recobertas por pigmentos metálicos, ora com placas reflexivas de aço, bronze, cobre e latão que, ao espelharem a imagem do espectador, interrompem o fluxo do “scrolling” visual e servem como zonas de respiro.

 

 

“A visão panorâmica de tantas imagens em fluxo nos conecta diretamente à experiência de navegação digital nas telas dos celulares e nas redes sociais, profusão que nos chega diariamente produzindo histórias descontínuas e quebras de narrativa. A dinâmica das imagens digitais já não nos permite saber a origem e a história de cada momento, local ou encontro, em seus respectivos tempos e lugares, diante da acelerada produção, difusão e consumo de informações pelas redes. O panorama de cenas de Silvia Velludo propõe uma reflexão em torno da saturação de imagens nos meios digitais e a busca por permanência e sentido que uma obra artística idealmente almeja em sua essência.”, observa o crítico Fernando Cocchiarale.

 

 

A reapresentação das séries “Penumbras” (2003-2004) e “Divisas” (2007-2012) propicia ao público um reencontro com as origens da pesquisa de Silvia Velludo sobre a formação da imagem através da pintura. Ao longo da década de 2000, a artista estava menos interessada pela imagem como representação figurativa do que por sua constituição enquanto fenômeno físico. Em “Penumbras” a artista trabalha a dispersão da luz através do embate entre pequenos pontos de cor, formando, em cada tela, estruturas reticuladas que podem remeter à imagem granulada dos televisores de tubo. Se nessa série Silvia Velludo explora efeitos ópticos através do uso da tinta acrílica e das diferentes combinações e tonalidades possíveis de serem alcançadas pelo material, em “Divisas” ela escolhe trabalhar com as propriedades inerentes das contas de vidro. O caráter cintilante do vidro colorido é intensificado nestas pinturas pelo agrupamento de uma grande quantidade de pequenas esferas coladas em uma superfície de 4m², causando aos olhos a impressão de que há uma desintegração da cor em milhares de pontos de luz. Anterior a essa investigação desenvolvida por Silvia Velludo através da pintura sobre a formação da imagem como um fenômeno óptico, é a sua produção de videoinstalações. A videoprojeção surgia para a artista como uma linguagem que lhe permitia trabalhar com a materialidade da própria luz, explorando a variação de cores, formas e palavras a partir dos recursos da imagem em movimento. “Projeto de Aurora” (2002) consiste em uma sequência de cores projetadas em uma superfície quadrada formada por cerca de 30 kg de sal grosso. Similar ao interesse de Silvia Velludo pela incidência da luz na matéria vítrea é o interesse pela incidência luminosa na estrutura cristalina do sal e sua alta capacidade de reflexão. As cores projetadas fazem referência às cores produzidas pelas Auroras Polares, fenômenos físico-químicos que resultam de interações entre o campo magnético terrestre e o plasma solar e que podem ser observados pela emissão de luzes coloridas que se movem pelo céu.

 

 

“Ida” (2012) é um livro-objeto em formato de letreiro digital que reúne diversos escritos produzidos pela artista ao longo de doze anos a partir daquilo que ocorria ao seu redor – em espaços públicos, privados ou mesmo na televisão. O trabalho foi apresentado pela primeira vez na exposição “Há mais de um poema em cada fotograma” em 2012, onde a artista ocupou todas as paredes da galeria com centenas de detalhes ampliados de fotografias realizadas durante dez anos em uma operação similar, registrando excessivamente as imagens de seu entorno. Se em “Ida” a artista escolhe a palavra como ferramenta para dar conta desse registro e em “Há mais de um poema em cada fotograma” ela escolhe a fotografia digital, em “Hipocampo” Velludo executa um procedimento já iniciado em sua exposição anterior “Autorretrato com Iphone 5C”, traduzindo o registro fotográfico para a linguagem da pintura. A noção de velocidade é uma questão que perpassa todos esses trabalhos, tanto no embate entre o ritmo ágil de uma escrita de observação baseada na associação livre e a leitura regulada pela lentidão do letreiro, como no embate entre a rapidez da captação da fotografia e o moroso feitio de uma pintura figurativa.

 

 

Fernando Cocchiarale

 

Março de 2022

 

 

A crescente presença dos meios digitais em nossa era definiu novas práticas e questões aos artistas que se utilizam das imagens como meio de criação poética. Como uma contraposição crítica à natureza funcional e pragmática da economia da imagem, muitos artistas têm buscado diferentes modos de refletir sobre a sociedade tecnológica contemporânea. Embora a origem artesanal da imagem tenha sido gradualmente substituída por meios técnicos como a fotografia, com a expressividade da mão cedendo lugar à objetividade das lentes e à rapidez e acessibilidade das câmeras, a reprodução manual de imagens de origem fotográfica ou digital em pintura é uma operação que investiga e reavalia de modo amplo o processo evolutivo dos meios técnicos e tecnológicos e suas possíveis rearticulações. A reunião de pinturas que Silvia Velludo apresenta nesta exposição tem por origem a coleção de inúmeros arquivos de imagem de internet e fotos digitais de celular que a artista seleciona e reproduz em suas obras como repertório visual para o seu fazer poético. Silvia se utiliza da mídia digital como um caderno de notas em que pessoas, lugares e momentos a serem lembrados são guardados em imagem e posteriormente trabalhados em tinta sobre tela. Suas pinturas retratam cenas e acontecimentos que espelham um panorama imagético próprio do universo da cultura digital e da dinâmica das redes sociais em sua profusão de temas, recortes e registros, situando-se entre o memorável e o comum, o admirável e o banal, o insólito e o corriqueiro. As pinturas a partir de arquivos de imagens digitais remontam à última exposição individual realizada por Silvia, Autorretrato com iPhone 5c, em 2016, quando voltou a se dedicar à pintura de observação. As múltiplas cenas do trabalho atual resultam das constantes temporadas de viagem de Silvia Velludo entre sua cidade natal, Ribeirão Preto, e São Paulo, onde também reside e trabalha, e outras localidades em que, acompanhada de pincéis, tintas e telas portáteis, a artista registra suas pinturas diretamente em cada lugar de estadia, justificando a escala diminuta de suas obras. As 295 pinturas realizadas por Silvia Velludo ao longo de seguidas temporadas de viagem estão dispostas por todas as paredes do espaço de maneira a compor uma extensa rede de campos visuais em frações irregulares. Com o aspecto de um diagrama descontínuo, suas cenas deslizam visualmente em séries horizontais, verticais e diagonais que, também em saltos, se remetem a outras cenas por proximidade, semelhança ou oposição, um fluxo de imagens que forma narrativas sequenciais, cruzadas ou aleatórias em associação direta com a observação do espectador. Silvia articula diferentes níveis de significação para as suas imagens. Entre formas e cores sortidas de centenas de pequenas telas de pintura figurativa esmerada, um visitante atento notará a presença de retratos e olhares que parecem dialogar em silêncio com o observador, formando uma narrativa paralela; em outro momento, cenas frugais de crianças e animais de estimação se impõem pela força afetiva, doméstica e familiar que evocam, ainda que seja a intimidade anônima e distante das imagens da internet. Cenas de peixes nadando em círculos parecem estar em ação, como se a pintura guardasse a memória do movimento e capturasse a atenção do espectador. Bonecas, brinquedos e obras de arte se alternam entre paisagens, fruteiras e personagens obscuros das redes sociais e do noticiário em busca de uma contextualização plausível e de sentidos inteligíveis. As pinturas aqui reunidas por Silvia Velludo adquirem sentido pela noção de conjunto que toda coleção estabelece. As diversas situações pintadas sobre tela se interpõem enquanto campos espaciais e planos figurativos, condição aberta que possibilita inúmeras combinações narrativas por justaposição, deslocamento e associação livre. O passeio visual que este dispositivo pictórico propõe reconstitui uma dimensão temporal fílmica da imagem, tanto pela sugestão de movimento contínuo das cenas pintadas – peixes em círculos, olhos em órbita -, como pela ação do próprio olhar que percorre as superfícies das pinturas à procura de novos estímulos e significações. Estas pinturas parecem propor, repetidas vezes, um jogo de adivinhação em torno da identificação das cenas escolhidas pela artista. Como em um desafio ou charada, tentamos reconhecer quais entre aquelas imagens referem-se a notícias, personagens e momentos que lembramos – ou ignoramos. Ou como estas cenas se recombinam em histórias particulares, eventos públicos ou acontecimentos desprovidos de informação alguma enquanto somos levados a imaginar situações, relações e desfechos entre os episódios retratados. Diante desta grande reunião de pinturas somos tomados por um labirinto narrativo de notas cifradas, imagens privadas e públicas, todas fadadas à efemeridade de postagens perdidas e noticiários esvaziados. A visão panorâmica que Silvia nos propõe para estas imagens aponta para uma solução original. A plural diversidade de assuntos exibidos se entrelaça com as inúmeras associações possíveis formadas pelos encadeamentos das cenas como campos de leitura. À maneira de um jogo de palavras-cruzadas composto por imagens em desdobramento visual contínuo, nosso olhar é levado a rastrear superfícies, identificar sinais e construir nexos a partir de um caleidoscópio de fragmentos da realidade. A disposição das telas é alternada por quadros metálicos luminosos e brilhantes em aço, bronze, cobre e latão que provocam um rebatimento do olhar imersivo da pintura e emprestam ritmo ao intenso fluxo de imagens. Como zonas de respiro e contemplação, abrem um intervalo de tempo que parece condensar as vivências imagéticas em um plano de emanações reluzentes e silenciosas. A ágil circulação das imagens digitais nas mídias eletrônicas desvela, por sua vez, sua natureza temporal efêmera que as conduz tanto ao desaparecimento quanto à obsolescência. Em seu pensamento poético, Silvia apropria-se de cenas cotidianas aparentemente comuns e as transfere do meio digital ao suporte material, artesanal e analógico da pintura, meio que empresta um sentido de permanência e duração às imagens. A visão panorâmica de tantas imagens em fluxo nos conecta diretamente à experiência de navegação digital nas telas dos celulares e nas redes sociais, profusão que nos chega diariamente produzindo histórias descontínuas e quebras de narrativa. A dinâmica das imagens digitais já não nos permite saber a origem e a história de cada momento, local ou encontro, em seus respectivos tempos e lugares, diante da acelerada produção, difusão e consumo de informações pelas redes. O panorama de cenas de Silvia Velludo propõe uma reflexão em torno da saturação de imagens nos meios digitais e a busca por permanência e sentido que uma obra artística idealmente almeja em sua essência. O jogo poético firmado entre o universo particular de suas imagens e as notícias e postagens das redes sociais tensiona a nossa percepção do real. Tal qual um dispositivo expositor de memórias e lembranças, somos seduzidos pela curiosidade e pelo espírito imaginativo que tantas imagens reunidas são capazes de estimular. A instalação de pinturas de Silvia revela-se, assim, um inventário de vivências a serem reconstituídas que, como cápsulas de tempo, retém uma dimensão existencial que as imagens resistem em desvelar. A proposição artística de Silvia Velludo nos proporciona, assim, uma experiência contrária àquela celebrada pelo frenesi do mundo digital: a desaceleração intuitiva que reestabelece correlações poéticas entre o real e suas representações a partir da apropriação afetiva e artesanal das imagens. A contemporaneidade de suas pinturas e questões entrecruza-se com a dominante e frágil onipresença das imagens digitais em nosso cotidiano.

 

 

Francisco Rebolo: Viver a paisagem

08/mar

 

 

 

A Galeria Marcelo Guarnieri, Jardins, São Paulo, SP, apresenta, entre 19 de março e 30 de abril, “Viver a paisagem”, exposição de obras de Francisco Rebolo (1902-1980). A exposição marca a comemoração dos 120 anos do nascimento do artista.

“Viver a paisagem”, mostra organizada em colaboração com o Instituto Rebolo,  reúne cerca de 30 pinturas produzidas entre as décadas de 1940 e 1970 que refletem o interesse do artista por uma integração entre a paisagem, sua obra e seu modo de vida. Nascido e formado em bairros de classe operária imigrante da zona leste de São Paulo, onde se concentravam as atividades fabris do início do século vinte, Francisco Rebolo transferiu-se na década de 1940 para o ainda bucólico bairro do Morumbi e ali “começa a traçar o caminho de se tornar um dos maiores paisagistas da arte brasileira, vivendo intrinsecamente na maior e mais importante fonte de inspiração de toda a sua obra”, como afirma Sergio Rebollo. Além das pinturas de paisagens suburbanas, marinhas e naturezas-mortas, a exposição contará com fotografias de arquivo e objetos que fizeram parte do ateliê do artista.

A vida no então distante Morumbi não impediu Francisco Rebolo de ter uma participação ativa na organização da classe artística em São Paulo. Em meados da década de 1930, ainda dividindo suas funções entre a pintura decorativa e a pintura de cavalete, passa a receber em seu ateliê/escritório no Palacete Santa Helena artistas como Mario Zanini, Alfredo Volpi, Clóvis Graciano, Aldo Bonadei, Fulvio Penacchi e Alfredo Rizzotti. O grupo, que seria batizado pela crítica da época de Grupo Santa Helena, era formado por descendentes de imigrantes de origem popular e operária que traziam com suas telas a imagem de uma modernidade diferente daquela reivindicada pelo grupo de 1922. Preocupados pelos aspectos técnicos e artesanais da pintura, retratavam o cotidiano da São Paulo suburbana. Rebolo foi um dos fundadores do Sindicato dos Artistas e Compositores Musicais, além de ser um dos criadores do Clube dos Artistas e Amigos da Arte (o Clubinho) em 1945. Anos mais tarde, fez parte do grupo que trabalhou para a criação do Museu de Arte Moderna (MAM-SP) e da sua Bienal de São Paulo, onde expôs e foi membro do júri.

Francisco Rebolo, “um mestre do meio-tom” segundo Sérgio Milliet, testemunhou um período de profundas transformações na paisagem urbana de São Paulo que, naquele momento, passava de província a metrópole. O processo de demolição de casas e construção de arranha-céus que hoje a cidade vivencia em ritmo acelerado, apenas se iniciava, e um modo de vida cada vez mais distanciado da natureza ia se configurando. No conjunto de pinturas apresentadas em “Viver a paisagem”, é possível observar o movimento inverso de Rebolo, que ia em direção ao campo, às montanhas e ao mar; um movimento que o permitiu compreender, durante quatro décadas, os aspectos daquelas paisagens através de sua prática pictórica. A busca do artista pela simplicidade da forma e por uma geometrização sutil se manifestou de maneiras diversas ao longo dos anos de produção, resultado de uma investigação plástica que incorporava soluções experimentadas em outras técnicas, como a xilogravura, por exemplo. A discreta paleta de cores da qual se utilizava e as cenas silenciosas compostas por árvores e casarios, revelam em Rebolo a visão otimista de uma relação harmônica com a natureza. Agradecimentos: Sergio Rebollo, Lisbeth Rebollo Gonçalves, Antonio Gonçalves de Oliveira e Olívio Tavares de Araújo.

 

Salão Nacional, a coletiva

22/nov

 

 

 

A Galeria Marcelo Guarnieri, Jardins, São Paulo, SP, tem o prazer de apresentar, entre 27 de novembro a 29 de janeiro de 2022, “Salão Nacional”, exposição coletiva que reúne trabalhos de Alex Vallauri, Amelia Toledo, Brancusi, Boi, Carlos Fajardo, Cassio Michalany, Claudio Kuperman, Claudio Tozzi, Dudi Maia Rosa, Fábio Miguez, Flávia Ribeiro, Guto Lacaz, Ivald Granato, José Resende, Leda Catunda, Luiz Paulo Baravelli, Marisa Bicelli, Siron Franco, Thomaz Ianelli e Zé Bico.

 

“Salão Nacional” é uma exposição que parte da obra de mesmo título realizada em 1986 por Guto Lacaz. Na peça de Lacaz, uma exposição é montada com miniaturas de obras de diversos artistas atuantes naquele momento. A exposição “Salão Nacional” reencena esse projeto em escala humana com as obras dos mesmos artistas, expandindo-o a partir da inclusão de outros artistas daquela mesma geração.

 

O modelo do Salão Nacional foi criado no Brasil na primeira metade do século XIX pela Missão Artística Francesa, fundadora da Academia Imperial de Belas Artes, posteriormente Escola Nacional de Belas Artes. O “Salão Nacional de Artes Plásticas” surge em 1933 sob o nome de “Salão Nacional de Belas Artes”. Para dar conta de uma produção cada vez menos acadêmica, cria-se, em 1951, uma sessão de arte moderna, dando origem ao “Salão de Arte Moderna”. Durante as décadas de 1960 e 1970, período da ditadura militar, os salões vão perdendo o prestígio que possuíam até então, sendo extintos em 1978 e reintegrados pela Funarte sob o título de “Salão Nacional de Artes Plásticas”. Na década de 1980, o Salão adquire um papel fundamental dentro do circuito de arte. Sendo um dos poucos lugares de projeção para artistas em início de carreira, dispunha também da premiação em duas modalidades: Viagem ao País ou Viagem ao Exterior. A mostra, que possuía um processo seletivo concorrido, servia como uma espécie de vitrine que aproximava a produção do jovem artista não somente ao público, mas também aos próprios componentes do júri, que eram curadores, artistas e marchands respeitados. Na década de 1980, período de abertura política e gradual redemocratização, participar do Salão Nacional significava dar um passo importante à integração em um circuito que começava a se fortalecer economicamente através da constituição e profissionalização de um mercado de arte.

 

O “Salão Nacional” de Guto Lacaz foi exibido pela primeira vez em “Muamba”, exposição realizada em 1987 na Subdistrito Comercial de Arte, galeria paulistana que reunia em seu programa expositivo os principais nomes da pintura daquele momento. Além de ter participado pela segunda vez consecutiva da Bienal de São Paulo com suas performances e instalações, Lacaz embarcaria no ano seguinte para a França, onde participaria da exposição “Modernidade – A arte brasileira no século XX” no Museu de Arte Moderna de Paris. Embora o mercado estivesse, naquele momento, se alimentando da pintura, os objetos low-tech e bem-humorados de Guto, que referenciavam desde a história da arte até o mito do progresso, circulavam com uma certa fluidez pelo circuito mais institucional. Suas “máquinas inúteis” propunham um jeito menos protocolar de se relacionar com o objeto de arte, em que a sisudez dava lugar ao riso, incorporando em suas propostas um espírito dadaísta, como em “Rádios Pescando”, conjunto de oito rádios cujas antenas eram transformadas em varas de pescar. Ainda em referência a Duchamp e ao seu “Nu descendo uma escada, nº2″, propõe uma abordagem sintética e irônica em sua experimentação com a pintura em “Homem na escada” obra que, além de integrar aquela exposição na Subdistrito Comercial de Arte, havia participado de sua instalação na 18ª Bienal de São Paulo e que pode ser vista atualmente na Pinacoteca de São Paulo na exposição “A máquina do mundo: Arte e indústria no Brasil 1901 – 2021”. Em sua versão de Salão Nacional, Lacaz apresenta outras obras de artistas que participaram de edições anteriores da mostra, como Flávia Ribeiro, Carlos Fajardo, Luiz Paulo Baravelli, Dudi Maia Rosa, Cassio Michalany e Fabio Miguez. E faz algumas homenagens: ao ator, ilustrador e cenógrafo Patricio Bisso, grande figura da cena paulistana da década de 1980, através da inclusão da fotografia de Marisa Bicelli; ao artista Alex Vallauri, falecido naquele mesmo ano, pioneiro do grafite no Brasil, com quem participou da Bienal de São Paulo em 1985; à revista Around; ao mestre da escultura Constantin Brancusi e à Leda Catunda, que surge representada por uma fotografia publicada na imprensa onde foi descrita de maneira sexista como dona dos “mais belos joelhos da arte brasileira”. Lacaz reforça o tom irônico de sua peça, incluindo outros dois trabalhos sem autoria, como o de “um artista hippie que entrou no salão por engano”. Neste conjunto de treze trabalhos, há outro que nunca havia existido fora daquela maquete: uma “Cara” de Luiz Paulo Baravelli. A partir do convite para a realização desta exposição na Galeria Marcelo Guarnieri, a pintura ganha o corpo de quase dois metros de altura, 35 anos depois de ter sido desenhada: “Cara para Guto”. Baravelli executa, em acrílica e encáustica sobre compensado, a obra que Guto Lacaz havia projetado em miniatura como se fosse mais uma da série “Caras” que seu amigo havia exibido na Bienal de Veneza em 1984. Para esta exposição, além das obras referenciadas do trabalho de Guto Lacaz, são apresentadas também pinturas e esculturas da época produzidas por artistas atuantes naquele mesmo período como Boi, que expunha com frequência na Subdistrito Comercial de Arte, Amelia Toledo, Siron Franco, Ivald Granato, Claudio Tozzi, Claudio Kuperman, Thomaz Ianelli, José Resende e Zé Bico, nomes importantes da produção artística da década de 1980.

 

 

 

 

 

 

Victor Mattina: ponto-zero/ponto-nulo

20/out

 

 

 

A Galeria Marcelo Guarnieri, Jardins, São Paulo, SP, tem o prazer de apresentar, entre os dias 23 de outubro e 22 de novembro, “ponto-zero/ponto-nulo”, primeira exposição individual de Victor Mattina em São Paulo, que conta com a curadoria de Luisa Duarte.

“ponto-zero/ponto-nulo” reúne dezessete pinturas desenvolvidas pelo artista entre os anos de 2020 e 2021 a partir de sua pesquisa sobre a condição da imagem digital, que na contemporaneidade, perde sua função de mediadora para assumir a função de produtora da realidade. Por meio da linguagem pictórica, Mattina resgata o poder da representação visual e a utiliza como uma ferramenta capaz de perturbar o sistema sensorial do sujeito contemporâneo, cada vez mais anestesiado pela saturação e hiperestimulação imagética.  O artista propõe a retomada da experiência estética a partir do que ele chama de “contemplação do obstáculo”, produzindo intervalos entre as imagens e seus referentes. Suas composições se mostram à primeira e rápida vista como enigmas, cenas que, para serem decifradas, resistem, exigindo maior atenção daquele que vê. O uso de tons rebaixados, não correspondentes à saturação de cores que o olho humano está condicionado a associar aos objetos ao seu redor, provoca um primeiro estranhamento, amplificado pelos títulos dos trabalhos que são formados por palavras provenientes do vocabulário técnico e científico. Fragmentos de corpos animais e vegetais são retratados em enquadramentos inusuais, compondo situações por vezes absurdas, possíveis apenas na realidade da pintura.

 

 

Para dar forma e nome às suas composições, Mattina recorre ao campo da medicina e da biologia, atravessa corredores de hospitais e salas de diagnóstico por imagem e se apropria da linguagem compartilhada nesses ambientes. O artista explora o caráter insuspeito da linguagem científica para criar imagens incompletas, ou mesmo opacas, desmontando a ideia de que a obra de arte é a perfeição da ilusão de uma realidade sui generis e afirmando que “na pintura, o esforço deve ser pelo efeito contrário – a imagem deve conter o mundo e procurar escapar dele simultaneamente”. Sua pesquisa sobre o poder da representação visual percorre não somente o pensamento de autores como Susan Buck-Morss, Vilém Flusser e Édouard Glissant, mas também a metodologia de trabalho de ilustradores científicos que se utilizam de softwares de computação g ráfica para criar identidades visuais de microorganismos, como os vírus. Interessado pela semiótica das imagens computadorizadas, elabora suas pinturas como se estivesse em um laboratório, compondo suas cenas minuciosamente, considerando os significados simbólicos, filosóficos e conceituais de suas escolhas através do entrecruzamento de questões relacionadas à síntese em imagens e em organismos vivos. “Todos estes trabalhos desencorajam os que os fitam a identificá-los como fantasmagorias subjetivas. Em vez disso, desejam estar mais conceitualmente próximos de ‘vedações’ capazes de nos devolver o sistema sinestésico ou, pelo menos, espelhar nossa consciência durante seu processo de reaterramento”, defende o artista.

 

 

Sobre o artista

 

 

Victor Mattina nasceu em 1985, Rio de Janeiro. Vive e trabalha no Rio de Janeiro, Brasil. Bacharel em Design pela ESPM-RJ. Em 2020 foi um dos vencedores da Bolsa de Residência Artist Opportunity do Vermont Studio Center em Vermont, EUA; em 2019 participou da 2ª Residência Artística Soy Loco Por Ti Juquery no Complexo Hospitalar do Juquery em São Paulo, Brasil e em 2016 participou da 6ª Edição da Bolsa Pampulha no Museu de Arte da Pampulha em Belo Horizonte, Brasil. Desde 2012 participa de exposições em instituições públicas e privadas. Em 2017 apresentou a individual “Antes do Fórum”, com curadoria de Evangelina Seiler, no Paço Imperial, Rio de Janeiro; no mesmo ano integrou a exposição coletiva “A Luz que Vela o Corpo é a mesma que Revela a Tela” com curadoria de Bruno Miguel na Caixa Cultural, Rio de Janeiro; em 2016 participou de “x4″ com curadoria de Marcelo Campos e Efrain Almeida no Solar Grandjean de Montigny, PUC-Rio, Rio de Janeiro.

 

 

 

 

 

 

 

 

Alice Shintani, Mata À VENDA

15/set

 

 

 

A Galeria Marcelo Guarnieri, Jardins, São Paulo, SP, anuncia “Mata À VENDA”, proposição imersiva de Alice Shintani que surge como um desdobramento de “Mata”, série de guaches em papel que integra a Bienal de São Paulo, Faz Escuro Mas Eu Canto.

 

 

“Mata À VENDA” é composta por dezessete pinturas em grande formato que atravessam as instalações físicas da galeria, entre quinas, portas, colunas e paredes. Metaforicamente, das dezessete obras propostas, nem todas são totalmente visíveis e, algumas, completamente invisíveis. Independentemente do tamanho ou visibilidade, todas as pinturas serão comercializadas pelo mesmo valor. Essa possibilidade faz das pinturas um instrumento de reflexão sobre os limites de nossa percepção estética e política no conhecido contexto de intensa mercantilização da linguagem pictórica.

 

 

Como observado no texto curatorial de “Vento”, mostra antecipatória da 34ª Bienal, “Mata trata-se de uma série produzida a partir de uma leitura livre de imagens da flora e fauna brasileira, sobretudo amazônica. A escolha de um sujeito pictórico clássico e a iconografia convidativa e plana parecem sugerir um trabalho autorreferenciado e pacificado, mas a maioria dos elementos explícita ou implicitamente retratados está em risco de extinção. O fundo intensamente negro, nesse sentido, contribui para ressaltar a luminosidade das cores empregadas pela artista para representar a vivacidade de algo, mas também pode ser lido como uma metáfora do estágio de incerteza e opacidade que caracteriza os dias atuais, de um ponto de vista ecológico, social e político”. Mata À VENDA propõe uma reflexão complementar, ética e econômica, sobre o atual estágio das relações entre espaços ditos comerciais e institucionais de arte, a autodeterminação de seus atores e as possibilidades de resiliência da prática artística.

 

 

Na antessala da galeria, Alice Shintani apresenta um ambiente de escuridão total com duas interferências: “Perus, 31 de março” (2019) é um vídeo em loop que captura uma cena de melancolia e ternura do dia 31 de março de 2019, no terreno de um cemitério que compõe um dos capítulos mais tenebrosos da nossa história. O áudio original captado na cena talvez nos recorde que, inaugurado em 1970, o Cemitério Municipal Dom Bosco foi utilizado como local de desova de corpos de vítimas da repressão da ditadura cívico-militar; em diálogo, um segundo pequeno vídeo, também em loop: “Zika” (2015), precursora da presente série Mata, é uma animação em gif de um dos exercícios em guache realizados a partir do entrecruzamento entre as leituras da artista sobre o Brasil de 2015 e as leituras de “Thought Forms” da escritora, teósofa e ativista Annie Besant. Em “Thought Forms”, livro de 1905 que teve grande influência sobre artistas como Kandinsky e Klee, Besant defende a ideia de que os pensamentos emitem vibrações dotados de cores e formas que podem ser apreendidos por meio de intensa consciência, meditação e atenção. Na antessala, por meio de sons, formas e cores em movimento, somos convidados a pensar sobre as possibilidades de percepção da passagem do tempo, das imagens e narrativas históricas, suas repetições e apagamentos em meio à atual onda de mercantilização da produção artística de explícita crítica social e política. Os dois vídeos da antessala seguem disponíveis gratuitamente nas redes sociais da artista, além de via QR code no local.

 

 

Alice Shintani opera na intersecção entre o fazer artístico e a vida cotidiana, por vezes questionando práticas naturalizadas nessa relação. Como observado em Faz Escuro Mas Eu Canto, “não se trata da arte que comenta as notícias dos jornais, nem da arte que se impõe no tecido urbano como monumento inerte, e sim a vivência próxima dos afetos e violência diários que têm como contraponto o fazer gradual que envolve cores, formas e luminosidades”.

 

Sobre a artista 

 

 

Alice Shintani nasceu em 1971, São Paulo, SP cidade onde vive e trabalha. Alice Shintani desenvolve em seu trabalho exercícios de aproximação com o outro a partir da pintura e de seus desdobramentos. A pesquisa, motivada pelas possibilidades da experiência estética, explora a ideia da “pintura expandida” e se desenvolve em ações que vão desde o preenchimento total do espaço pela cor e pela luz, criando ambientes imersivos, até a proposição de refeições coletivas em que receitas, texturas, sabores, talheres, pratos e bandejas produzem significados e instigam camadas da percepção. Por meio da fricção entre questões formais, conceituais, sociais e mercadológicas, Shintani se debruça sobre as noções de visualidade e visibilidade de maneira a problematizá-las, quando se utiliza, por exemplo, de tons rebaixados de cor e formas abstratas para dar vida à pinturas que abordam narrativas de fantasmas, sombras e camuflagens, originárias da cultura japonesa; ou até mesmo quando infiltra em seus trabalhos elementos das comunidades de imigrantes no Brasil, invisibilizadas em sua maioria. A artista dialoga com a tradição da pintura e da história da arte, situando-as na experiência do presente e do espaço para além do circuito especializado.

 

 

Alice Shintani foi incluída na publicação “100 painters of tomorrow”, da editora Thames & Hudson (2014) e contemplada com o prêmio-aquisição no “II Prêmio Itamaraty de Arte Contemporânea” (2013). Participou de diversas exposições individuais e coletivas, destacando-se as seguintes instituições: Museu de Arte Contemporânea da USP, São Paulo, Brasil; Paço Imperial, Rio de Janeiro, Brasil; Centrum Sztuki Wspólczesnej, Poznán, Polônia; Centro Cultural São Paulo, Brasil; Instituto Itaú Cultural, São Paulo, Brasil; Centro Cultural Banco do Brasil, Rio de Janeiro, Brasil; Museu Rodin, Salvador, Brasil; Museu Oscar Niemeyer, Curitiba, Brasil; Instituto Tomie Ohtake, São Paulo, Brasil; Instituto Figueiredo Ferraz, Ribeirão Preto, Brasil. Durante a edição da sp-arte/2017, Alice Shintani foi vencedora do Prêmio de Residência com a instalação “Menas” e passou três meses na Delfina Foundation, em Londres (Reino Unido). Atualmente a artista é uma das convidadas para integrar a 34ª Bienal de São Paulo – Faz Escuro Mas Eu Canto, 2021.

 

 

Período de exposição:  18 de Setembro à 16 de Outubro.

 

 

 

 

 

 

 

Ricardo Ribeiro : Exposição e lançamento de livro

26/fev

 

A Galeria Marcelo Guarnieri, Jardins, apresenta a partir do dia 27 de fevereiro, na sede de São Paulo, “Puxirum”, exposição do artista Ricardo Ribeiro que contará com lançamento de livro homônimo. A visitação neste dia poderá ser realizada das 10h às 18h, respeitando todas as recomendações das autoridades de saúde, como o uso de máscaras e distanciamento social.

As visitas espontâneas serão bem-vindas, mas para a segurança de todos e melhor controle do espaço, recomendamos que agende sua visita. Pedimos que nos envie um e-mail com o seu nome completo indicando o dia e horário de sua preferência

 (Email: info@galeriamarceloguarnieri.com.br – telefone: 11 3063 5410)

A mostra reúne fotografias feitas entre 2016 e 2018 em São Pedro, povoado localizado às margens do Rio Arapiuns, no estado do Pará. A série trata de um olhar poético e político do cotidiano de uma comunidade ribeirinha que organiza seu modo de vida entre as economias de subsistência e mercantil. “Puxirum” foi editada em livro homônimo, impresso em 2020 com o suporte da Pollock-Krasner Foundation.

“Puxirum” é uma palavra de origem tupi que define uma prática social e cultural ainda encontrada em áreas rurais na qual um grupo de pessoas reúne-se por um dia para desenvolver coletivamente um trabalho na roça. Em língua portuguesa pode ser traduzida como “mutirão”. Durante as nove visitas que fez a São Pedro ao longo de dois anos, o fotógrafo Ricardo Ribeiro acompanhou de perto a dinâmica em torno desse trabalho. Em sua primeira visita, ainda em 2016, chegou ao povoado munido apenas de um bilhete, no qual seu amigo Zair pedia a sua mãe Zeneide que o recebesse e o apresentasse aos demais moradores de São Pedro. A partir de então, Ribeiro passou a negociar sua presença naquele lugar através de pequenos serviços que podia oferecer enquanto fotógrafo, restaurando fotografias antigas, corroídas pela umidade, ou fazendo retratos das crianças em trajes de festa.

Enquanto aprendia a observar o seu entorno e a conviver não somente com aquele grupo de pessoas, mas também com a própria natureza, sob um ritmo de vida bem mais desacelerado ao que estava habituado, Ribeiro fotografava. Não pretendia desenvolver ali qualquer tipo de trabalho antropológico, a sensação de estranhamento e o estado de deslocamento lhe permitiriam, afinal, entregar-se ao desenvolvimento de sua linguagem poética. Esse exercício, no entanto, não era imune às problemáticas que configuravam o contexto em que estava inserido, e acabava por traduzir, em imagens, as percepções do fotógrafo. “Isolada pela paisagem e pela falta de eletricidade, a cultura está à beira de uma ruptura com um passado baseado na família, religião, costumes e trabalho comunitário. Os jovens que se beneficiaram dos programas governamentais bem-sucedidos nas últimas duas décadas para reduzir a fome, agora, rejeitam tradições estabelecidas há muito tempo e não se resignam mais às perspectivas limitadas de seus pais”, escrevia Ribeiro em seu diário.

Em “Puxirum”, Ricardo Ribeiro retrata essa sensação de um tempo vagaroso com a ajuda de sua câmera Hasselblad, em um processo totalmente analógico. Por meio de cores pouco saturadas e da baixa luz, suas fotografias transmitem a atmosfera melancólica que envolve a vila de São Pedro, através, por exemplo, do registro de seus habitantes em momentos de introspecção. Em uma delas, retrata a cena ao redor de uma jovem repousando em uma rede azul após ter sido atingida por um raio. “Tampouco havia zum zum zum”, escrevia o fotógrafo, “havia silêncio, um compasso de espera pelo que o tempo haveria de dizer”. Tal vagarosidade, que também o acompanhava durante o trajeto de dez horas que tinha que percorrer desde Santarém até São Pedro, é novamente abordada em “Novo Relógio Velho”, filme que também integra a exposição.

Muitas das fotografias que fez em São Pedro foram expostas pela primeira vez na própria comunidade, distribuídas em espaços públicos da vila e exibidas em diversos formatos. Reuniu no Barracão Comunitário 32 fotos em uma exposição, e na noite da abertura preparou um telão na quadra de futebol onde foram projetadas outras tantas imagens. Na escola indígena e na escola regular montou varais de fotos com cinco cópias de cada, permitindo que cada criança pudesse levar para casa aquelas que mais gostassem. Ao ar livre, em pontos onde as fotografias haviam sido captadas, montou alguns painéis das imagens impressas em lona, material resistente às chuvas e à umidade típicas da região. Ainda na casa onde funcionava a retransmissora local, montou uma videoinstalação com a projeção de “Filha Ausente”, filme que fez sobre os filhos que se vão de São Pedro. O título faz referência à música homônima composta por Sr. Riso (cancioneiro local), dedicada a um de seus oito filhos. Ao retornar para São Paulo pela última vez em 2018, Ribeiro deu início a edição do livro “Puxirum”, que além das imagens, reúne fragmentos do diário que escreveu no período em que esteve na vila paraense.

Sobre o artista

Ricardo Ribeiro nasceu em 1978 em São Paulo, onde vive e trabalha. Fotógrafo e artista visual, concluiu em 2016 o programa de Práticas Criativas do International Center of Photography – ICP em Nova York. Seu projeto “Puxirum” foi exibido in loco, em São Pedro, comunidade situada às margens do Rio Arapiuns, no oeste do Estado do Pará, onde foi fotografado entre 2016 e 2018, em mostra concebida e organizada em parceria com os residentes locais. O mesmo trabalho foi premiado, em 2019, pelo 7o Prêmio Nacional de Fotografia Pierre Verger, e, em 2018, pelo 9o Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia. Também exibido em Salvador-BA, Belém-PA, Porto Alegre-RS e Santos-SP. Seu mais novo projeto, “Norte-Sul Esquerda-Direita”, ainda em andamento, foi escolhido e é hoje financiado pela Fundação Pollock-Krasner (Pollock-Krasner Foundation) , com sede em Nova York, EUA

Até 27 de março.

Ecolines

04/ago

A exposição da artista Maureen Bisilliat poderá ser visitada a partir de 05 de agosto a 03 de outubro na unidade Jardins, São Paulo, SP, respeitando todos os protocolos e recomendações das autoridades de saúde, com visitas mediante agendamento pelo email: info@galeriamarceloguarnieri.com.br, ou pelo telefone:  11 – 3063 5410.

 

A Galeria Marcelo Guarnieri tem o prazer de apresentar ECOLINES, primeira mostra em nossa unidade de São Paulo da fotógrafa Maureen Bisilliat, que passa a ser representada pela galeria. A exposição será a primeira a ser realizada em circuito comercial e contará com obras das séries “Ecolines” (1960-2020) e “Sertões” (1960- 2020), de tiragem limitada. Na série “Ecolines”, Bisilliat apresenta fotografias feitas na década de 1960 em viagens pelo Brasil posteriormente modificadas por intervenções feitas com a tinta Ecoline. O processo consistia em ampliar as fotografias em preto e branco e “tintá- -las” através de um método intuitivo, retomando a prática de pintura que desenvolvia em suas aulas no Arts Students League, durante a década de 1950 em Nova York. As fotografias, que ficaram em pausa durante sessenta anos nos arquivos da artista, foram reencontradas no último ano e passaram por uma série de processos antes de se apresentarem como se vêem na exposição. Elas foram digitalizadas, impressas em tamanho reduzido, fotografadas novamente e finalmente impressas em uma escala maior à que originalmente havia sido ampliada. Essas “tintagens” e “refotografias” acabam produzindo ambiguidades na estrutura da imagem enquanto tal: entre os elementos da composição – pelo jogo de luz e cores –, assim como entre o limite da imagem como superfície e como objeto, remetendo à materialidade da fotografia analógica. Para Bisilliat, tais processos, posteriores ao registro fotográfico, constituem um momento particular de reflexão e construção do trabalho, onde se entrecruzam temporalidades múltiplas: “o instante da foto / o tempo do acontecer / a memória do fato / a reinvenção da imagem / os processos editoriais / o cotidiano / o originário / o sem fim…”.

 

Todos esses processos, incluindo a composição dos conjuntos durante a montagem, contaram com o envolvimento de diversas pessoas, que com saberes e maneiras distintas de atuação, foram de fundamental importância para dar origem à nova forma de vida dessas imagens. A série “Sertões” é composta por fotografias feitas entre os anos de 1967 e 1972 em aldeias e lugares santos dos municípios de Canindé, Juazeiro do Norte e Bom Jesus da Lapa, nos estados do Ceará e da Bahia e contou com o incentivo de uma Bolsa do Guggenheim.

 

Algumas das imagens dessa série deram origem à publicação “Sertões: Luz & Trevas”, de 1982, que combina trechos do clássico “Os sertões” de Euclides da Cunha aos seus registros fotográficos, produzindo diálogos, justaposições e dissonâncias. Os conjuntos apresentados na exposição misturam fotografias em cores e fotografias em preto e branco modificadas por intervenções de cor.

 

Sobre a artista

 

Nascida na Inglaterra em 1931 e radicada no Brasil, Maureen Bisilliat é responsável por uma investigação fotográfica de mais de cinquenta anos. Viajou intensamente quando criança, uma vida desenraizada que levou à busca de raízes que caracteriza o seu trabalho. Após estudar artes plásticas na França e nos Estados Unidos, estabeleceu-se na cidade de São Paulo na década de 1950, atuando inicialmente como fotojornalista nas revistas Realidade e Quatro Rodas a partir de 1962. Durante os dez anos que trabalhou para a Editora Abril, pôde fotografar em contextos diversos do Brasil, produzindo ensaios que ficaram célebres, dentre eles “Caranguejeiras”, no qual retrata mulheres catadoras de caranguejos na aldeia paraibana de Livramento.

 

A curiosidade por um Brasil ainda desconhecido durante a década de 1960 se associa ao fascínio por obras literárias brasileiras e resulta em um projeto de longa duração que Bisilliat classificou como de “equivalências fotográficas” com a literatura. Produz, entre as décadas de 1960 e 1990, uma série de livros de fotografias que dialogam com as obras de Jorge Amado, Guimarães Rosa, Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Ariano Suassuna, Adélia Prado e Euclides da Cunha. Em 1985 expõe em uma sala especial da XVIII Bienal de São Paulo um ensaio baseado no livro “O turista aprendiz” de Mário de Andrade. Na década de 1980, começa a dedicar-se também ao audiovisual, lançando em 1981 o documentário “Xingu/ Terra”, filmado com o diretor de fotografia Lúcio Kodato, na aldeia Mehináko do Alto Xingu. Foi curadora da Sala Especial XINGU TERRA, instalada na XIII Bienal de São Paulo (1975). Seu olhar devota uma especial atenção ao fator humano, interesse que pode ser observado na multiplicidade de retratos que compõem a sua obra e no registro das manifestações culturais dos retratados, seja através da vestimenta do sertanejo, da pintura corporal da indígena, da rede do pescador ou da fantasia da carnavalesca. A ideia de equivalência que utilizou para definir seu trabalho com a literatura, norteia também a sua prática através da relação de cumplicidade e troca que constrói com aqueles que retrata enquanto filma ou fotografa. “Forma-se uma cumplicidade natural. Eu não gosto da solidão. Não gosto de trabalhar sozinha”, afirma Maureen .

 

Maureen Bisilliat foi bolsista da Fundação Guggenheim, do CNPq (1981-1987) e da Fapesp (1984-1987). Em 2010 foi vencedora dos prêmios Porto Seguro de Fotografia, Ordem do Ipiranga, Ordem do Mérito Cultural e a Ordem do Mérito da Defesa. Desde fevereiro, Bisilliat apresenta na sede de São Paulo do IMS “Agora ou nunca – Devolução: paisagens audiovisuais de Maureen Bisilliat”, exposição que percorre seu vasto acervo audiovisual, concebida em colaboração com Rachel Rezende. O Instituto é detentor do acervo fotográfico de Bisilliat desde o ano de 2003.