Esculturas de Advânio Lessa

08/mar

A Gomide&Co e a Galeria Marco Zero apresentam “Redemoinho não leva pilão”, primeira individual de Advânio Lessa em São Paulo, SP. Com curadoria de Valquíria Prates, a mostra inaugura o programa anual de exposições da Gomide&Co em 2024. Advânio Lessa (1981) nasceu e vive em Lavras Novas, distrito de Ouro Preto (MG). Tanto o seu local de origem, marcado pela herança quilombola, quanto os ofícios de seus pais (cesteira e tropeiro) são partes fundamentais do universo no qual se baseia sua poética como artista e agricultor desde a adolescência. Realizando esculturas em escala humana a partir de troncos de madeira de árvores mortas, raízes e trançados de cipó, o artista vincula os conhecimentos da cestaria e da marcenaria com madeiras e fibras encontradas nas matas da região de Ouro Preto, como cipó-alho, cipó-de-são-joão, candeia, jacarandá, folha miúda e alecrim. É em estreito diálogo com esse repertório que Lessa realiza suas obras, nas quais a natureza é uma espécie de coautora. Em entrevista concedida a Valquíria Prates, pesquisadora de sua obra, o artista afirma: “As sensações impressionantes que eu já tive, seja de estética, de energia, de movimento, de equilíbrio, de textura, eu nunca vi nada mais vibrante que a própria natureza. Então, para mim, tudo já está aí. A gente precisa compreender e ser humilde o suficiente para conectar mais com o que já está aí.” (Valquíria Prates, “Em tudo que é grande, a emenda é pequena: uma conversa caminhada com Advânio Lessa”, 2023).

Sempre interessado na capacidade humana de transformar contextos, lugares, situações e relações, Lessa tem em sua pesquisa artística o foco no trabalho, nos saberes e nas espiritualidades dos povos sequestrados da África e trazidos para o Brasil. Para “Redemoinho não leva pilão”, o artista convida os visitantes a um profundo processo de reflexão em torno de uma das plantas mais importante ligadas à história da Avenida Paulista: o café. A exposição consiste em um circuito composto por seis esculturas, tramas e flores de cipó-de-são-joão, pilões e milhares de grãos de café em côco que se interligam, formando uma grande instalação que pretende abordar os sistemas de produção em torno do cultivo desta que é uma planta tão comum no cotidiano de pessoas que vivem em todo o país. Planta de caráter mágico em algumas tradições religiosas, o café está presente nas mesas de casas, padarias, restaurantes, escritórios, salas de trabalho, além de nas bancas espalhadas pelas calçadas da cidade, movimentando esforços econômicos e interferindo nos ciclos de atenção há séculos, passando pelas mãos de quem planta e de quem bebe e gerando recursos em abundância.

O título da exposição é inspirado no provérbio Yorùbá “Ijì kìí kó gbódó” (O redemoinho não leva o pilão), retirado do livro Òwe – Provérbios, de Mãe Stella de Oxóssi, e que celebra a força dos que não são derrotados mesmo em condições e contextos adversos. Procura assim fazer alusão àqueles que são responsáveis pela construção e geração de riquezas, sob todo tipo de violência, opressão e injustiça, em todas as áreas de atuação humana do país. As esculturas a serem apresentadas de maneira inédita na exposição fazem parte da série Nascimento e vêm sendo trabalhadas por Lessa desde 2010, realizadas com madeiras de árvores e épocas diversas das matas de Lavras Novas, no que carregam em si “as histórias dos minerais, insetos e animais que com elas coexistiram temporariamente, camadas abaixo da terra, sobre ela e debaixo das estrelas e planetas que estão sendo com a gente, agora”, segundo palavras do artista. Encontros e conversas sobre modos de produção do café, a possibilidade de instaurar sistemas de bem viver integrados à produção de comida, além de estudos de caso entre a arte e a agricultura, fazem parte da programação pública da exposição.

A proposta de Advânio Lessa para sua primeira individual em São Paulo é uma continuidade de seu processo de pesquisa sobre sistemas de transformação pelo trabalho entre espécies em contextos específicos, que se iniciou com a exposição Se quiser saber do fim, preste atenção no começo (2023), com curadoria de Valquíria Prates. Apresentada no Museu da Inconfidência, em Ouro Preto, a exposição foi realizada pelo Instituto de Arte Contemporânea de Ouro Preto (IA) no contexto do Programa Raiz, que investiga a arte contemporânea produzida por artistas da região com mais de 20 anos de carreira.

Sobre a curadora

Valquíria Prates é curadora, pesquisadora e educadora. É mestre em Políticas Públicas de Acessibilidade (USP) e doutora em Artes e Mediação Cultural (UNESP). Atualmente, é curadora do Instituto de Arte Contemporânea de Ouro Preto (IA), consultora de Arte e Mediação Cultural do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM SP) e colaboradora em projetos do Pólo Sociocultural Sesc Paraty, do Centro Cultural do Cariri (CE), do Instituto Moreira Salles (SP) e da Fundação Roberto Marinho (RJ).

Sobre o artista

Advânio Lessa nasceu em 1989 e vive até hoje em Lavras Novas, distrito de Ouro Preto (MG). Tanto a sua terra de origem, marcada pela herança quilombola, quanto os ofícios de seus pais (tropeiro e cesteira), são partes fundamentais do universo que irriga a sua poética. Realizando esculturas de grande escala a partir de troncos de madeira de árvores mortas, raízes etrançados de cipó, o artista vincula os conhecimentos da cestaria e da marcenaria com as madeiras e fibras encontradas nas matas da região de Ouro Preto: Cipó Alho, Cipó São João, Candeia, Jacarandá, Folha Miúda e Alecrim. É em estreito diálogo com esse repertório que Lessa, que também é agricultor, realiza suas peças. Nesse sentido, não nos parece enganoso afirmar que a natureza aqui é uma espécie de coautora de suas obras. A produção do artista ganha o mundo munida, a um só tempo, de uma intensa eloquência formal e de uma relevante conotação discursiva. Suas esculturas, cujas escalas se aproximam àquela do corpo humano, atestam uma relação de reciprocidade entre nós e tudo aquilo que é vivo ao nosso redor. Nesse sentido, ressoam uma tendência importante da atualidade: no lugar de epistemologias caras a um modo Ocidental de conceber o mundo, para as quais nós humanos estamos sempre em posição superior, entram em cena cosmologias onde testemunha-se uma relação não hierárquica entre todos os seres vivos. O trabalho de Advânio Lessa foi apresentado, entre individuais e coletivas, em instituições como o Espaço Cultural CEFET – Ouro Preto (Ouro Preto, Brasil, 1998); Galeria Clélia Valadares (Belo Horizonte, Brasil, 2008); Galeria da FIEMG (Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais, Ouro Preto, Brasil, 2010); Galeria Graphos Brasil (Rio de Janeiro, Brasil, 2013); Museu Afro Brasil (São Paulo, Brasil, 2013); Fundação Clóvis Salgado – Palácio das Artes (Belo Horizonte, Brasil, 2015); IA – Instituto de Arte Contemporânea de Ouro Preto e Museu da Inconfidência, com curadoria de Valquíria Prates (Ouro Preto, Brasil, 2023), entre outras. Sua obra compõe a coleção da Pinacoteca do Estado de São Paulo (São Paulo, Brasil).

Até 04 de maio.

Novas pinturas de Helena Carvalhosa

07/nov

A Galeria Marcelo Guarnieri, Jardins, São Paulo, SP, apresenta, de 18 de novembro a 20 de janeiro de 2024, “Tinha uma saia rodada e um galope na cabeça”, segunda mostra da artista Helena Carvalhosa na unidade de São Paulo. A exposição reúne um conjunto de pinturas, objetos e cerâmicas produzidas pela artista durante os últimos anos que dão conta de evidenciar sua íntima relação com a poesia. “Tinha uma saia rodada/E um galope na cabeça/O galope virou trote/E passo a passo/ caminho”. Helena Carvalhosa dá forma às suas imagens também através da palavra, reanimando memórias afetivas e reconstruindo, dentre outras arquiteturas, espaços domésticos e jardins. Suas pinturas de jarros de flores, galhos, cadeiras e passarinhos se confortam nas pequenas dimensões de suas telas, assim como os objetos com os quais escolhe trabalhar, coisas que podem caber dentro das mãos. A artista se vale do ritmo de seus poemas, por vezes também curtos, para pensar em sínteses: figuras que se resolvem em pinceladas soltas, descrições abertas, assemblages que rimam. “Eu pinto um ar que me habita”, define a artista. A inauguração desta exposição marca também o lançamento de seu livro de poemas “Tinha uma saia rodada e um galope na cabeça”, publicação que conta com texto de apresentação do artista Paulo Pasta e posfácio do curador Marcelo Salles.

Em “Tinha uma saia rodada e um galope na cabeça”, um centenar de pinturas compõem o espaço como uma espécie de álbum de recordações, cenas banais que adquirem valor pelo equilíbrio entre a simplicidade da abordagem temática e manejo sofisticado do uso da cor. Como observa Paulo Pasta em seu texto de apresentação “Para isso ela se vale desse lugar indefinido entre a figuração e abstração, entre ser e parecer, como também do emprego de relações cromáticas, vivas e sutis, destacando suas possíveis harmonias, e – com coragem, também suas notas dissonantes. Suas pinturas fazem uso igualmente de um claro sentido planar, matisseano, que, a exemplo do ensinamento do mestre, buscam um olhar novo e fresco sobre as coisas.” Complementado essa extensa coleção de imagens, incorporam-se os seus objetos, arranjos entre elementos aparentemente díspares que, ao serem combinados, ressignificam, convidam a leituras múltiplas enquanto poemas tridimensionais. “E, penso mais, que depois de um tempo o poema de Helena é ainda mais potente. A imagem mental que se constrói é tão poderosa e menos literal que sentimos pena das belas e frágeis contas negras, envoltas numa transparência gelatinosa, emolduradas por tons alaranjados que cumprem uma efêmera existência.”, conclui Marcelo Salles.

Desde o final da década de 1970 Helena Carvalhosa explora o campo tridimensional por meio de uma investigação sobre as formas e os significados gerados a partir de associações improváveis entre objetos encontrados, tais como potes de vidro, pedaços de madeira, peças de ferro retorcido e molas. O interesse da artista por tais objetos passa não somente pela particularidade de sua composição material e visual, seus significados e usos, mas também pelo vínculo afetivo que possui com cada um deles e com a possibilidade de conservarem histórias. A partir da segunda metade dos anos 1980, Helena Carvalhosa desenvolve, em paralelo, um trabalho em pintura, onde explora a ambiguidade das formas a partir da observação do mundo ao seu redor, desde paisagens até cenas interiores.

Sobre a artista

Helena Carvalhosa nasceu em 1938 em São Paulo, onde vive e trabalha. Iniciou seus estudos em artes na Escola Brasil em 1970 e em 1977 formou-se em Artes Plásticas pela FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado). Ainda no final da década de 1970 estudou na New School of Arts, em Nova York e desde os anos 1980 vem fazendo cursos e sendo orientada por artistas como Hélio Cabral, Nelson Nóbrega, Paulo Pasta e Sara Carone. Sua produção transita entre a pintura, a escultura, o desenho e o objeto. O início de sua carreira foi marcado pela participação na “Mostra de Escultura Lúdica” em 1979 no MASP, que contou com artistas como Palatnik, Tomie Ohtake, Leon Ferrari e Guto Lacaz. Na ocasião, a artista expôs “Estruturas Mutantes”, duas peças formadas por tecido, ferro e isopor que remetiam à forma de um casulo e que podiam ser vestidas e transformadas pelo público. A escolha por materiais acessíveis, de uso cotidiano, é ampliada em “O objeto reinventado”, exposição que ocorreu no SESC Pompeia em 1992 e que reuniu assemblages formadas por objetos descartados, já gastos por outros usos. Sobre aquela produção de Carvalhosa, o crítico Pietro Maria Bardi escreveu: “Com o máximo de simplicidade, Helena demonstra, através da combinação de formas, que aquilo que está ao nosso redor pode ser motivo de fruição estética”. No ano seguinte participou da coletiva “Objeto. Objeto-Livro. Fotografia” na Pinacoteca de São Paulo. Segundo a crítica Maria Alice Milliet, em texto de 1993: “Os objetos de Helena pertencem ao universo feminino da sedução, do jogo de aproximações que transforma o banal em inédito, do encantamento surpreendido no arranjo das coisas inúteis cuja gratuidade retém um frescor derivado da fantasia. Atestam a possibilidade de criar a partir do encontrável, do desprezível, de restos e sobras.” Em 1998, Carvalhosa retorna à Pinacoteca para ocupar um dos “vãos livres” do edifício com “O Caminho: Instalação com Flores”, composta por móveis antigos, fotos de família, vasos, quadros e peças em porcelana, propondo uma reflexão sobre as fases da vida e a passagem do tempo. Em paralelo ao seu trabalho com o campo tridimensional, Helena Carvalhosa desenvolve, desde a segunda metade dos anos 1980, uma produção em pintura. Em seus primeiros anos, centrou-se em paisagens e retratos através do uso mais despojado da pincelada, e a partir de 2005 dá início à transição de sua pintura para uma abordagem mais sintética da composição. Segundo o jornalista Antonio Gonçalves Filho, essas pinturas são “quase um diário íntimo sem compromisso com o tempo, como nas composições intimistas de Morandi, feitas de cores sóbrias e perfeito equilíbrio tonal”. Nelas, a artista ainda mantém o seu interesse pelos objetos, agora amalgamando-os, no campo bidimensional, aos outros elementos do quadro, operação que se dá pelo uso da tinta em diferentes cores e texturas. Em texto para o catálogo da exposição “Pulo do Gato”, apresentada no Museu Afro Brasil em 2016, o curador Marcelo Salles escreve: “a artista lida com um fazer que não é orientado por premissas políticas, sociais, mercadológicas; seu interesse reside numa necessidade ancestral, aquela que existia antes de nomearmos todas as coisas e aprisionarmos não somente coisas, mas nós mesmos”. Em mais de quatro décadas de carreira, participou de inúmeras mostras individuais e coletivas, em instituições como: MASP, SESC Pompeia, Pinacoteca do Estado de São Paulo, Museu Afro Brasil, SESC Belenzinho e Centro de Arte Dragão do Mar, em Fortaleza. Desenvolveu curadorias para o SESC São Carlos, SESC Santana e Museu da Casa Brasileira. Possui três livros publicados: Fazenda Pinhal; Ócio: obras de Helena e poesia de Manoel de Barros; e Pulo do Gato.

Novo artista representado

10/out

A Simões de Assis, São Paulo, SP, tem a alegria e o prazer de anunciar a representação de Flávio Cerqueira (São Paulo, 1983). O artista explora a construção de narrativas a partir de figuras humanas em bronze, evocando questões importantes de classe, identidade e raça. A partir de suas esculturas, Flávio Cerqueira é capaz de cristalizar o instante e o fragmento de uma ação, tornando desse modo o espectador um coautor na produção de significados da obra.

Seu trabalho faz parte de relevantes coleções particulares e figura no acervo de importantes instituições, como: Instituto Inhotim, Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (MASP), Pinacoteca do Estado de São Paulo, Universidade de Missouri Kansas City (UMKC); Museu Afro Brasil, Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC-USP) e Museu de Arte do Rio Grande do Sul (MARGS), entre outros.

Coleção Emanoel Araújo

05/set

Em paralelo com a Bienal de São Paulo, a Bolsa de Arte apresenta – desde o dia 06 de setembro – uma exposição e leilão destacando a coleção de Emanoel Araujo (1940-2022), o renomado artista brasileiro que, também foi diretor de museu e curador.
O leilão ocorrerá nas noites de 25 a 28 de setembro, a partir das 20h.
Devido à importância de Emanoel Araújo, esta exposição atrairá colecionadores e diretores de museus de todo o mundo, incluindo os que vieram a São Paulo para participar da feira de arte bienal. Um público altamente qualificado.
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Emanoel Araujo reuniu uma impressionante coleção de mais de 4.000 obras, celebrando a riqueza e a diversidade da cultura brasileira por meio de old masters, pinturas, esculturas brasileiras, design, fotografia, arte sacra, jóias coloniais, cerâmicas e artesanato. No próximo ano, outro leilão será realizado, apresentando peças da coleção do Museu Afro Brasil, fundado por Emanoel Araújo em 2004.
Uma coleção que reflete a riqueza da cultura brasileira
A exposição destaca a coleção de Araújo, oferecendo uma visão mais ampla da riqueza cultural do Brasil. A importância do legado de Emanoel Araújo e de sua coleção transcende as fronteiras da arte.
A coleção de Emanoel Araújo abrange desde representações de Orixás na religião afro-brasileira até representações europeias em bronzes coloniais.

O legado de Emanoel Araujo

30/ago

 

Texto de apresentação da Galeria Jack Shainman que agora representa o legado de Emanoel Araujo!

 

A Galeria Jack Shainman tem a honra de anunciar a representação do Espólio de Emanoel Araújo e a próxima exposição Emanoel Araújo. Esta não será apenas sua apresentação de estreia na galeria, mas também o primeiro grande levantamento de sua obra em Nova York desde os anos 1980. O falecido artista, curador e colecionador brasileiro teve uma carreira que desafiou qualquer categorização; Emanoel Araújo forjou plataformas pessoais e públicas para expressar as nuances da vida e da cultura afro-brasileira – repensando as filosofias da estética moderna, criando espaço para artistas marginalizados exibirem seus trabalhos e preservando a história material de sua herança ancestral em uma época anterior à cultura afro-brasileira. vozes foram defendidas por audiências regionais ou internacionais.

 

Sobre o artista

 

Nascido em 1940 em Santo Amaro da Purificação, Bahia, em uma família modesta de ourives afro-brasileiros, a adolescência de Araújo orbitou a produção criativa – ao longo de sua juventude trabalhando tanto com o marceneiro e entalhador Eufrásio Vargas quanto como designer gráfico para sua Imprensa Oficial da cidade natal. Após sua primeira exposição individual em Santo Amaro da Purificação, em 1959, matriculou-se na Escola de Belas Artes da Bahia, em Salvador. Ainda na escola, estudou gravura – na linha de seus predecessores modernos e contemporâneos Lygia Clark, Hélio Oiticica e Lygia Pape – desenvolvendo uma prática orientada para a expressão comunitária e a abstração geométrica. Desde o início, Emanoel Araújo se preocupou em trabalhar com mídias gráficas e tridimensionais, divergindo da apropriação da abstração da tradição colonial européia – visualizando o Modernismo nascido de um contexto singularmente brasileiro e compreendendo a capacidade da abstração de inflamar o poder político e a transformação social.

 

O trabalho de Araújo funciona em múltiplos registros, mesclando a linguagem formal desenvolvida em seus estudos, o abraço sem remorso de sua identidade queer, negra e brasileira e as intrincadas ideologias de sua vida como curador e colecionador de arte e artefatos afro-brasileiros. Com figuras simplificadas, estruturas primárias e palatos de alto contraste, suas gravuras, relevos e esculturas são montagens de referência: um mosaico de sua criação na capital afro-brasileira, traumas herdados do comércio transatlântico de escravos no Brasil, padrões nigerianos e beninenses têxteis e símbolos iorubás dos espíritos dos orixás. Embutida em seu trabalho está uma crioulização, reunindo segmentos de obras anteriores e objetos encontrados que cortam, interferem, refratam no plano da imagem – refletindo a grande dimensão da sociedade em camadas do Brasil; celebrando a vida cotidiana além dos epicentros internacionais do Rio de Janeiro e desmantelando o racismo sistêmico de dentro do estúdio e da instituição para promover, exibir e colecionar seu trabalho e o de outros artistas afro-brasileiros.

 

No centro da carreira criativa e profissional de Emanoel Araújo estava a ambição de desafiar a si mesmo e ao seu país para superar as adversidades e imaginar uma sociedade mais inclusiva através da arte, em vez de se contorcer ao mercado ou ao establishment. Ao longo de sua vida, suas realizações incluíram transformar a Pinacoteca de São Paulo em um museu de renome internacional, fundar a primeira instituição estabelecida por artistas no Brasil dedicada a promover o trabalho de artistas negros (Museu Afro-Brasil) e acumular um arquivo de cerca de seis mil objetos e quatro mil documentos da diáspora afro-brasileira. Emanoel Araújo era um visionário, afirmando corajosamente sua presença criativa de uma forma grandiosa, totêmica e vibrante; sua vida compreende um retrato de uma nação e geração, e as infinitas complexidades dentro delas.

 

Exposição Christian Cravo na Paulo Darzé Galeria

27/jul

 

 

 

Desde o dia 04 de agosto, com temporada até 03 de setembro, e sob o título “Anima”, a Paulo Darzé Galeria, Salvador, BA, expõe 32 fotografias de Christian Cravo. A apresentação da mostra é assinada por Thaís Darzé.

 

Anima. Palavra de origem latina que designa a parte individual de cada ser humano, a “alma”. Em latim, significava literalmente “sopro, brisa, ar” possivelmente a partir daí adquiriu o sentido de “sopro vital, alma”, já que para a humanidade a alma está relacionada a algo imaterial, intangível e espiritual. Em “Anima” exposição individual de Christian Cravo, o artista que tem como suporte a fotografia, apresenta um novo conjunto de trinta e duas imagens imagens realizadas entre 2015 e 2022.

 

Na elaboração desse projeto, o artista utilizou duas series distintas, porém ambas produzidas em tempos praticamente concomitantes. Passando por longas temporadas no continente africano se dedicando a sua difundida série “Luz e Sombra” que já lhe rendeu três publicações e seis mostras, ao voltar dessas viagens “Anima” vinha nascendo de forma silenciosa e oculta para o público. Durante seus retornos para casa, sua esposa Adriana e suas três filhas, Sofia, Helena e Stela, eram suas musas e fontes de inspiração. Apesar do novo recorte, permanecemos diante das questões da construção da imagem, e seus problemas essenciais de luz, tempo e espaço. A fusão dos dois trabalhos, estabelece um diálogo estético tão harmonioso, consagrando a questão estrutural do corpo na obra de Christian Cravo, “luz, tempo e espaço”.

 

Na psicologia Junguiana, existe uma psique arcaica, possuidora de diversos arquétipos, que é a base de nossa mente individual. Jung (1987) diz que o arquétipo “Anima” é o lado feminino da psique masculina e o arquétipo “Animus” compõe o lado masculino da psique feminina. Partindo da compreensão desses arquétipos, podemos estabelecer uma comparação entre eles e a produção de Christian nos últimos anos. Seu lado masculino, cruza o Atlântico e faz sucessivas viagens ao velho continente, para fotografar a vida animal, a natureza selvagem, imagens marcadas por um distanciamento emocional e ausência de figuração humana (presença marcante em produções anteriores do artista). Para essa mostra em específico, apenas as imagens produzidas nos desertos da Namíbia estão presentes, o que confirma excesso de aridez, uma certa atmosfera de esterilidade das imagens, quando vistas de forma isolada. Partindo do pressuposto de que para a personalidade ficar bem ajustada é necessário equilíbrio entre masculino e feminino, a atmosfera infértil das imagens africanas, ganham novo sentido e nova potência quando acompanhas das imagens produzidas no cotidiano do artista, na presença de suas mulheres, “Anima”, emerge e traz o balanceamento necessário. Nas imagens de família, temos excesso, afeto, acolhimento, gestação, poder do feminino que acolhe e nutre a vida. A figura humana retorna na obra de Christian Cravo, mas a questão da espacialidade permanece, o gesto do corte, que subtrai das figuras e da espacialidade uma fatia do real, pontuado por Lidia Canongia em seu texto “A margem do real”, se preservam com a mesma ênfase, apenas partes dos corpos são enquadrados e a tomada de campos visuais bem restritos se mantém. Em tempos de intolerância, como o que vivemos, que se manifestam atualmente no número alarmante de crimes de ódio baseado por questões de gênero, o artista reconhece a urgência contra essas ações violentas que marcam a sociedade brasileira contemporânea. “Anima” é no mínimo um convite a reflexão e apelo por mais respeito e tolerância a todos os arquétipos que coabitam em cada um de nós”.

 

Sobre o artista

 

Christian Cravo nasceu em 1974, de mãe dinamarquesa e de pai brasileiro. Foi criado num ambiente artístico na cidade de Salvador, Bahia, convivendo com o mundo das artes desde a mais tenra idade. No entanto, só começou suas experiências com a técnica fotográfica aos onze anos de idade, enquanto morava na Dinamarca, lugar onde passou toda sua adolescência. Em 1993, interrompeu suas pesquisas fotográficas para cumprir o serviço militar nas forças armadas dinamarquesas. Com vinte e dois anos, volta ao Brasil, sua terra natal, quando começa a ficar profundamente entrosado com a máquina fotográfica. Ao longo dos últimos vinte anos, Christian conseguiu ver seu trabalho reconhecido, não apenas no nível nacional, mas também internacionalmente, por meio de exposições no Museu de Arte Moderna da Bahia, Throck Morton Fine Art em Nova Iorque, Billed Husets Galery em Copenhague, Ministério da Cultura em Brasília, Instituto Tomie Ohtake e no Museu Afro Brasil, ambos em São Paulo e em exposições coletivas como na Witkin Gallery em Nova Iorque, S.F. Camera Works Gallery na Califórnia, Bienal Fotofest em Houston e no Palais de Tokyo em Paris. Recebeu prêmios do Museu de Arte Moderna da Bahia, e do Mother John International Fund for Documentary Photography. Além de bolsas de pesquisa da Fundação Vitae e da Fundação John Simon Guggenheim para sua pesquisa sobre a água e a fé. Em 2016 foi premiado pela APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) pela melhor exposição fotográfica de 2015. Já foi indicado para prêmios internacionais como o Paul Huff (Holanda 2007) e o Prix Pictet (Suíça/Reino Unido, 2008 e 2015 e 2016). Seu primeiro livro “Irredentos” foi publicado em 2000. Em 2005 o segundo livro “Roma noire, ville métisse”, publicado em Paris, por Autrement. Outros livros de sua autoria são: “Nos Jardins do Éden” 2010, “Exú Iluminado” 2012, “Christian Cravo”, editado pela prestigiada editora Cosac &Naif 2014 e “Mariana”.

 

Para conhecer e debater

20/jul

 

 

O Museu Afro Brasil, Parque do Ibirapuera, Portão 10, São Paulo, SP, tem buscado, ao longo de seus quase dezoito anos de existência, valorizar e promover a herança de matriz africana no Brasil por meio do mapeamento, preservação, pesquisa e difusão de suas diferentes manifestações culturais e das múltiplas criações delas originadas. O histórico de encontros, palestras, congressos e cursos realizados e acolhidos pelo museu desde sua inauguração, em 2004, é vasto e compreende, igualmente, eventos que buscam refletir e discutir sobre as produções no próprio continente africano, tanto as contemporâneas quanto aquelas que refletem diferentes momentos de sua história.

 

Com o objetivo de diversificar ainda mais essa atuação e se consolidar como um espaço de encontro, reflexão e construção coletiva de conhecimento e de partilha de saberes e experiências, o Museu Afro Brasil lançou, no primeiro semestre de 2022, a Escola MAB – Escola do Museu Afro Brasil.

 

Artes Visuais e História da Arte a partir do MAB, no qual serão abordadas e discutidas questões formais e conceituais acerca de obras e coleções que integram o acervo do Museu Afro Brasil, assim como das temáticas que as cercam e que delas emanam, compreendendo as lacunas e ausências em sua constituição. Tais cursos compreenderão também aspectos relacionados às exposições temporárias realizadas no museu.

 

Cursos de aperfeiçoamento técnico voltados à gestão de acervos, sua conservação, documentação e estratégias de difusão, além de montagem de exposições, restauro, entre outros, oferecidos por especialistas e profissionais renomados na área.

 

Cursos na área do Patrimônio material e imaterial africano e afro-brasileiro, contemplando diferentes linguagens e manifestações como a música, a literatura e as artes cênicas. Serão igualmente oferecidos cursos de introdução a idiomas falados no continente africano.

 

E, finalmente, a série O Pensamento de …  oferecerá cursos que abordarão a produção de intelectuais africanas(os) em diferentes áreas de conhecimento, trazendo ao público uma introdução a uma produção ainda pouco conhecida e debatida no Brasil e no mundo.

 

Em seu curso inaugural, “Artistas Africanas – Olhares Contemporâneos”  lançado no mês de maio, a Escola MAB apresentou um panorama contemporâneo do trabalho de oito artistas mulheres, originárias de distintas regiões do continente africano. Da cerâmica à pintura, da performance à instalação, da fotografia ao vídeo, suas obras abarcam múltiplas linguagens e revelam a diversidade da produção artística africana contemporânea.

 

No segundo semestre de 2022, a Escola MAB dará continuidade e aprofundará a reflexão sobre as formas e caminhos pelos quais a produção artística africana e seus artistas se fizeram e se fazem presentes nas instituições museológicas e no circuito artístico do Brasil e do mundo. Serão oferecidos cursos sobre as cenas artísticas em países como Angola, Moçambique e Senegal e as aulas serão ministradas tanto por professores brasileiros quanto do continente africano. O público terá igualmente oportunidade de participar do curso “Introdução à arte africana a partir do acervo do MAB”.

 

Dentro do Eixo Cursos de aperfeiçoamento técnico, os cursos “Gestão de acervos em Museus” (em formato de workshop presencial de um dia e, posteriormente, de curso extensivo virtual) e “Exposição de arte e o olhar do conservador” ampliarão o campo de atuação da Escola, abarcando os diferentes aspectos técnicos envolvidos no trabalho de um profissional de museu.

 

Finalmente, a série “O Pensamento de …”  terá início com uma introdução ao pensamento do intelectual ugandense Mahmood Mamdani, reconhecido como um grande especialista em política africana e internacional, autor de obras que exploram a interseção entre política e cultura, os estudos comparativos do colonialismo, a história da guerra civil e do genocídio na África e a história e teoria dos direitos humanos, dentre outros temas.

 

A Escola MAB oferecerá materiais de apoio aos alunos, assim como certificados aos participantes (mediante comprovação de 75% de frequência às aulas), além de bolsas de estudos a professores da rede pública de ensino e a pessoas pretas, indígenas, trans, travestis e em situação de vulnerabilidade social. Os cursos serão propostos em diferentes modalidades, virtual, presencial ou híbrida,  e em diferentes horários. A carga horária também terá variação de acordo com o programa do curso oferecido.

 

Rubem Valentim na Pinakotheke São Paulo

28/jun

 


A Pinakotheke São Paulo, Morumbi, lançará no dia 02 de julho, às 11h, o livro “Rubem Valentim (1922-1991) – Sagrada Geometria” (pelo selo da Edições Pinakotheke), edição bilíngüe (port/ingl), com 292 páginas, em formato 21 x 27cm, apresentação de Max Perlingeiro, e texto de Bené Fonteles, amigo mais próximo e que acompanhou por duas décadas Rubem Valentim, extraordinário artista, que fez do sagrado sua vida e obra.
O livro que celebra o centenário de Rubem Valentim, contém depoimentos sobre o artista e sua obra escritos por personalidades da arte como Emanoel Araújo, Ferreira Gullar, Giulio Carlo Argan, Roberto Pontual, Clarival do Prado Valladares e Theon Spanudis. Com edição de Camila Perlingeiro e coordenação geral de Luli Hunt, a publicação busca preencher uma lacuna na história da arte sobre este grande artista, e foi possível graças ao patrocínio do Itaú Cultural, a partir da Lei Federal de Incentivo à Cultura (Secretaria de Cultura/Ministério do Turismo). “Rubem Valentim (1922-1991) – Sagrada Geometria” poderá ser encontrado nas sedes da Pinakotheke, em São Paulo, Rio de Janeiro e Fortaleza, nas livrarias e plataformas de livros na internet, o preço é R$ 120,00. Para marcar o lançamento do livro, a Pinakotheke São Paulo realiza a exposição “Rubem Valentim (1922-1991) – Sagrada Geometria”, com cerca de 100 trabalhos do artista, em pinturas e desenhos, e ainda seus “objetos”, em pintura sobre madeira. A curadoria é de Max Perlingeiro com consultoria de Bené Fonteles. Será exibido, em looping, o vídeo “Rubem Valentim (1922-1991) – Sagrada Geometria”, feito especialmente para a ocasião, com 28’15 de duração, direção de Max Perlingeiro, edição de Fabricio Marques, narração de Bené Fonteles e fotografia de Andre Caliento Barone.

 

Ensaio fotográfico de Christian Cravo

 

Estará também na exposição um ensaio fotográfico de Christian Cravo do “Templo de Oxalá”, conjunto com 20 esculturas e 10 relevos criado em 1974 por Rubem Valentim, pertencente ao Museu de Arte Moderna da Bahia, em Salvador.

 

Simbologia Mágica – Tradições populares dos negros da Bahia

 

Nascido em Salvador, em 09 de novembro de 1922, e falecido em São Paulo, em 30 de janeiro de 1991, “Valentim queria essa conexão sagrada em complementação com a estética. Rubem Valentim é um artista essencial para uma melhor compreensão da tradição afro-brasileira; e Bené Fonteles, seu principal estudioso e interlocutor por sua conexão espiritual”, escreve Max Perlingeiro no texto “Um artista sacerdote”, na apresentação do livro. “A pedido do artista, Bené torna-se o Ogã (palavra que vem do iorubá e significa “Senhor da minha casa”) do terreiro de Valentim. Aquele que cuida de sua vida e, em consequência, de sua obra. É mais um caso de amizade que a Pinakotheke torna visível!”, destaca Max, responsável pelo planejamento e organização da publicação e curador da exposição. Giulio Carlo Argan (1909-1992), o grande teórico da arte que conviveu com o artista no início dos anos 1960, durante sua estada em Roma, escreveu sobre ele: “Os seus signos são deduzidos da simbologia mágica que se transmite com as tradições populares dos negros da Bahia. A evocação destes signos simbólico-mágicos não tem, entretanto, nada de folclorístico. É necessário expor, antes, que eles aparecem subitamente imunizados, privados das suas próprias virtudes originárias, evocativas ou provocatórias: o artista os elabora até que a obscuridade ameaçadora do fetiche se esclareça na límpida forma do mito. Decompõe-nos e os geometriza, arranca-os da originária semente iconográfica; depois os reorganiza segundo simetrias rigorosas, os reduz à essencialidade de uma geometria primária, feita de verticais, horizontais, triângulos, círculos, quadrados, retângulos; enfim, torna-os macroscopicamente manifestos em acuradas, profundas zonas colorísticas, entre as quais procura precisas relações métricas, proporcionais, difíceis equivalências entre signos e fundo”. “O que a sua pintura, em última análise, quer demonstrar é que nas atuais concepções do espaço e do tempo os símbolos e os signos de uma experiência antiga, ancestral, conservam uma carga semântica não inferior à geometria pitagórica ou euclidiana”, continua Argan. “O seu apelo à simbologia mágica não é, portanto, o apelo à floresta; é, talvez, a recordação inconsciente de uma grande e luminosa civilização negra anterior às conquistas ocidentais. Por isso, a configuração de suas imagens é também mais claramente heráldica e emblemática do que simbólico-mágica”.

 

Melhor síntese sincrética em todas as Américas afetadas por uma colonização brutal

 

Paraense nascido em 1953, artista plástico e poeta, Bené Fonteles destaca que Rubem Valentim “…talvez seja o artista que fez melhor e mais intensamente a síntese sincrética em todas as Américas afetadas por uma colonização brutal que ainda atormenta a consciência no século 21”. “Artista extraordinário que decodificou, durante cinco décadas, a herança mestiça na busca obsessiva de um fazer sempre leal sua “riscadura e sentir brasileiros”, atravessado por propósitos de uma rigorosa e radical artesania”. Ele comenta que Rubem Valentim afirmava: “Fora do fazer, não há salvação”. “Esta salvação era eivada pela   radicalidade de um artista-sacerdote – como ele queria ser em seu mosteiro-ateliê sonorizado pelos cantos gregorianos ou, ainda, Bach e Mozart”, observa Fonteles. “Seja em Brasília ou São Paulo, desenvolvia seu projeto inspirado por sua vocação construtiva vinda da tradição milenar de nossa arte ameríndia assim como dos povos que atravessaram o Atlântico em meio a toda dor e a redimiram num raro projeto cultural e espiritual sem paralelo no mundo. Valentim é produto vital desse ser mestiço que nos tornamos”.

 

Obras do artista em coleções e locais públicos

 

Em 1963, estava sendo criado o Museu de Arte Moderna de Roma, que adquiriu três obras de Rubem Valentim. Em Roma, a Galleria Nazionalle d’Arte Moderna e o Palácio Doria Pamphili também têm obras do artista. Outras instituições na Europa com trabalhos de Rubem Valentim são o Museu de Arte Moderna de Paris, e o Museu de Arte e História de Genebra, Suíça. O Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), EUA, e Museu de Arte de Ontário, Canadá, têm obras do artista. Na África, há obras de Rubem Valentim no Museu de Arte de Lagos, na Nigéria, e no Museu de Arte de Marrakech, no Marrocos. No Brasil, coleções e locais públicos onde podem ser vistas obras de Rubem Valentim: em São Paulo – Biblioteca Municipal Mário de Andrade, Centro Cultural São Paulo, Museu Afro-Brasil, Museu de Arte Contemporânea da USP, Museu de Arte Moderna de São Paulo, Museu de Arte de São Paulo, Pinacoteca do Estado de São Paulo, Praça da Sé, e Coleção Itaú-Unibanco. Em Brasília: Coleção de Arte do Banco do Brasil, Centro Cultural Banco do Brasil, Palácio do Itamaraty, Palácio do Buriti, Ministério da Educação, e Secretaria da Fazenda do Distrito Federal. Em Salvador: Museu de Arte Moderna da Bahia. No Rio de Janeiro: Museu de Arte Moderna.

Até 30 de julho.

 

 

Paulo von Poser, desenhos de nus

13/mai

 

 

A mostra apresenta obras inéditas produzidas pelo artista durante os últimos 40 anos, refletindo sobre o corpo nu masculino e a plataforma do desenho.

 

A VERVE Galeria, Av. São Luis, 192, sobreloja 06, Edifício Louvre, República, São Paulo, SP, apresenta a exposição “Desenhos nus: 1982-2022”, individual do paulistano Paulo von Poser, com um recorte de trabalhos do artista em suas reflexões sobre o corpo nu masculino. A mostra cobre um arco de 40 anos de produção artística de von Poser, com desenhos, colagens e esculturas, além de um livro de artista dedicado a Hudinilson Jr (1957-2013). A exposição inaugura neste sábado, dia 14 de maio e permanecerá em cartaz até o dia 14 de junho.

 

As obras apresentadas são inéditas, algumas guardadas pelo artista há décadas em seus arquivos, envolvidas por um tom íntimo, observador e confessional. A exposição, que enfatiza o gesto do desenho, as paixões e os trabalhos sobre papel, reapresenta outras narrativas aprofundadas por von Poser, amplamente reconhecido por seus desenhos de rosas e paisagens.

 

Nas palavras de Giancarlo Hannud, curador da exposição, “há mais de quatro décadas, von Poser vem se engajando de forma constante com o desenho, cotidianamente registrando as infinitas possibilidades expressivas do marcar a traços uma dada superfície, à guisa de outra coisa qualquer”. É a partir dos mecanismos do olhar, do admirar e do desenhar que se estrutura a exposição, onde, continua o curador, “seus desenhos do corpo representado falam tão alto quanto seu gesto marcador, desenhador e desenhado, confluindo-se para dar origem a algo novo. Dissolvidos artista e modelo, tornam-se, ambos, desenho, sugestão tátil e imorredoura de um encontro vivido e passado. Como disse o artista: “Se o desenho pode ser considerado amoroso na sua relação com o olhar, essa condição diz respeito ao encontro do traço do carvão com o papel, do encontro do modelo com as outras imagens projetadas do seu corpo, do encontro do artista com seus desejos e medos.” Desses três encontros engendra-se o desenho de von Poser.”, conclui Hannud.

 

Sobre o artista

 

Paulo von Poser (São Paulo, 1960) graduou-se em Arquitetura pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU USP) em 1982. Trabalha sobretudo com desenho, cerâmica, escultura, gravura e ilustração, refletindo sobretudo acerca da cidade, do corpo e das flores. Lecionou, de 1986 a 2018, na Universidade Católica de Santos (Unisantos) e leciona desde 2007 na Escola da Cidade, em São Paulo. Há uma forte relação entre o trabalho de professor e de desenhista, uma vez que as caminhadas com seus alunos alimentam a produção. Paulo von Poser participou de dezenas de exposições individuais e coletivas no Brasil e no exterior, e seus trabalhos integram inúmeras coleções privadas e públicas, como a Pinacoteca do Estado de São Paulo, o Museu de Arte de São Paulo (MASP), o Museu de Arte Contemporânea de São Paulo (MAC USP), o Museu da Casa Brasileira (MCB) e o Museu Afro Brasil.

 

Sobre a galeria

Galeria Verve

 

A Verve é uma galeria de arte contemporânea fundada em São Paulo, em 2013. Nascida do entusiasmo e inspiração que animam o espírito da criação artística, a Verve é abrigo para diferentes plataformas de experimentação da arte contemporânea. A eloquência e sutileza que caracterizam o nome do espaço também estão presentes na cuidadosa seleção de artistas e projetos expositivos. Por entender que as linguagens artísticas compreendem processos contínuos e complementares, a galeria representa novos talentos e profissionais consagrados que transitam livremente entre a pintura, o desenho, fotografia, escultura e a gravura. Dirigida pelo artista visual Allann Seabra e o arquiteto Ian Duarte, a galeria ocupa um espaço no mezanino do histórico Edifício Louvre, em franco diálogo com o patrimônio construído da cidade de São Paulo. Na diversidade de seus espaços expositivos emergem possibilidades de curadoria que vão além do cubo branco, estendendo-se para a rua e cumprindo a função integradora entre a arte, o público e a cidade. A Verve é membro da Associação Brasileira de Arte Contemporânea [ABACT] e integra o Comitê Consultivo da SP-Arte.

 

 

Magliani, restrospectiva na Fundação Iberê Camargo

10/mar

 

 

A artista visual Maria Lidia Magliani será homenageada pela Fundação Iberê Camargo com uma grande exposição que aborda 50 anos de produção.

“Não separo a artista da pessoa. Sou toda um mesmo nó – minha escolha é pintar, não saberia como ser de outro modo. Aparentemente fiz e faço muitas outras coisas, na verdade, todas partes de uma só, a pintura.” (1987)

No dia 19 de março, sábado, às 14h, a Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, RS, inaugura uma grande e inédita exposição de Magliani (1946-2012). “Magliani” reunirá cerca de 200 obras provenientes de mais de 60 coleções, incluindo os principais museus do Brasil como Museu de Arte do Rio, Museu Afro Brasil, Pinacoteca do Estado de São Paulo, Museu de Arte Moderna de São Paulo, MAC-USP, MAC-RS, Museu de Arte de Santa Catarina, MARGS, Museu de Arte Leopoldo Gotuzzo (Pelotas) e Fundação Vera Chaves Barcellos (Viamão). Com curadoria de Denise Mattar (SP) e de Gustavo Possamai (RS), a mostra inclui trabalhos desde a época de estudante – início dos anos 1960 – até 2012, ano de seu falecimento.

“A obra de Magliani é um desafio. Não é uma arte fácil, é feita para incomodar, para fazer refletir. A artista estava interessada nas questões humanas, nas relações entre os seres, nos problemas e no sofrimento inerente à existência: o desencontro, o desamor, a hipocrisia da sociedade, o medo da solidão. A apresentação de seu trabalho na Fundação Iberê Camargo, torna inevitável o paralelo com o pintor. Em 1993, Iberê disse: “Eu não nasci para brincar com a figura, fazer berloques, enfeitar o mundo. Eu pinto porque a vida dói”. Uma frase que poderia ser de Magliani, que, em 1997, escreveu: “Eu gostaria de dizer às pessoas que veem os meus quadros: !Sinto muito senhores, não é agradável’”, destaca Denise Mattar, que conheceu Magliani em 1987 quando era diretora técnica do Museu de Arte Moderna de São Paulo, e a artista participara do Panorama de Arte Atual Brasileira. Mais tarde, em 2004, a curadora reencontrou a artista no Rio de Janeiro, onde fez a apresentação da exposição “Trabalho Manual”.

Como lembra Gustavo Possamai, responsável pelo acervo da Fundação Iberê Camargo: “Magliani foi uma artista rara e merece todo reconhecimento. Por isso, garimpamos e reunimos o máximo de obras possível, sem medir esforços. Promovemos a restauração de muitas delas, reunimos escritos e depoimentos seus e de quem escreveu sobre seu trabalho, revisamos e ampliamos sua cronologia. É nossa forma de contribuição para a redescoberta de seu trabalho.” Possamai conta que, durante o processo de pesquisa, foi encontrada uma carta de Iberê Camargo para Magliani, datada de 1992, na qual o pintor escreveu: “Nós dois temos a mesma meta, o mesmo ideal, a mesma devoção. Haveremos de deixar nossos rastros neste chão em que nascemos.” Um depoimento precioso que reitera a oportunidade dessa exposição.

“…pinto a solidão no meio da cidade… a solidão do consumo”

Nascida em 25 de janeiro de 1946, em Pelotas, RS, Magliani passa a residir com a família em Porto Alegre, com 4 anos de idade. As informações sobre a família são esparsas. Seu avô era italiano, decorador de paredes; o pai servidor público e a mãe era do lar. A artista, apesar das dificuldades financeiras enfrentadas pela família, desde a adolescência gostava de ler, ouvir música, cinema, teatro, desenhar e de pintar.

Magliani formou-se em Artes Plásticas pelo Instituto de Artes da UFRGS, mas se autodenominava pintora: “…artista plástico faz muita coisa; eu só pinto, desenho, gravo, tudo derivado da pintura”. Apesar da afirmação, ainda na década de 1960, trabalhou em teatro, ilustrando capas de programas, fazendo cenografia e atuando em peças, como “As Criadas” (1969), de Jean Genet, “A Celestina” (1970), de Fernando Rojas, e “O Negrinho do Pastoreio” (1970), de Delmar Mancuso, nesta última como protagonista. A artista também se interessava por moda, e apreciava customizar, costurar e tricotar o que vestia.

Outra área de atuação foram os jornais, onde trabalhou, nos anos 1970, como diagramadora e ilustradora, ofício retomado em algumas mudanças de cidade posteriormente. Os jornais foram Folha da Manhã, Diário de Notícias, Zero Hora e Folha de São Paulo, entre outras participações e ilustrações.

Magliani deixou de residir em Porto Alegre em 1980, morou em São Paulo, em Tiradentes, Cabo Frio e no Rio de Janeiro, mas nunca se desligou nem de Porto Alegre e nem de sua terra natal, Pelotas, realizando regularmente exposições nessas cidades.

Sua produção é intensa e vigorosa e a exposição apresenta um panorama bastante consistente de seus trabalhos. A mostra é complementada por uma publicação dividida em dois volumes: o primeiro concebido como um catálogo de obras, e o segundo reunindo entrevistas e textos de Magliani, cartas, textos sobre ela de autores como: Carlos Scarinci, Teniza Spinelli, Celso Marques, Angélica de Moraes, Maria Amélia Bulhões, entre outros.

Reunindo um volume significativo de obras, a exposição apresenta trabalhos de todo o percurso de Magliani, organizados de forma cronológica e mostrando as alterações que sua obra foi sofrendo ao longo dos anos. Para compartilhar com o público a instigante personalidade da artista e sua multiplicidade, o trajeto da mostra é complementado com algumas frases e fotos da artista em vários momentos de sua vida. Na sequência são apresentadas pinturas do início de sua carreira, de 1964 a 1967, caracterizadas por um clima melancólico e lírico, com a inserção das frases poéticas riscadas sobre a tinta: “A espera do canto”, “O mesmo corpo com som de primavera”, “Autoretrato na nuvem”, “Eu tenho a flor”, e “Eu sou a inútil pureza nascida de dois silêncios” são algumas delas.

Em 1968 há uma mudança significativa na obra da artista, na qual ela se descreve como uma “delatora do desencontro”. É uma fase de passagem, influenciada pela pop art com trabalhos, como “Segundo canto para o amigo triste” e “As portas fechadas da cidade”. Um período difícil da Ditadura militar e a convivência com a Censura nas redações influencia a obra de Magliani. Seu repertório torna-se mais drástico, e, em 1976, ela faz a exposição “Anotações para uma história”, no MARGS. Foi um choque! A sociedade gaúcha não estava preparada para o que viu. No ano seguinte, levou ainda mais longe sua proposta realizando a série “Ela”, com grotescas mulheres seminuas, imensamente gordas, que ela considerava uma espécie de retrato interior da humanidade, e dizia: “Minha intenção é fazer a figura sair da tela, se derramar por cima da gente, sufocando”. A série, muito bem representada na retrospectiva, chamou a atenção dos críticos Jacob Klintowitz e Marc Berkowitz e foi determinante para a mudança da artista para São Paulo. Antes de ir embora, realizou na Galeria Independência, em Porto Alegre, a exposição “Brinquedo de armar”, reunindo desenhos e pinturas, sobre as quais dizia: “Acho que a mulher é o brinquedo mais armado e desarmado constantemente. Mas considero que todo mundo é, ou pode ser, um brinquedo de armar.”

O período de 1980 a 1988, o mais marcante da carreira da artista, coincide com o tempo em que ela residiu em São Paulo. Lá produziria as séries “Retratos falados”, “Crônica do amanhecer” e “Discussões com Deus”. Abandonando os tons sépia, passa a usar cores vibrantes e ácidas; mescla lápis de cor, de cera, pastel, grafite e até materiais de maquiagem, como corretivo e delineador, e muda o tratamento da pintura, usando a tinta acrílica e adotando pinceladas ágeis e gestuais, como traços de desenho, num processo que imprime movimento ao trabalho. É um momento no qual a obra de Magliani conversa de perto com a de Francis Bacon, atingindo o ápice de contundência e visceralidade da pintora. Retorcidos e distorcidos, corpos e rostos se desfazem e refazem, em movimentos bruscos.

Seus trabalhos são apresentados no Panorama do Museu de Arte Moderna de São Paulo, Bienal Internacional de São Paulo, e, em 1987, Evelyn Ioschpe promove no MARGS uma mostra de caráter retrospectivo: “Auto-retrato dentro da jaula”. Dez anos depois Magliani foi acolhida pelo público de sua cidade como uma estrela, a mais importante artista gaúcha de sua geração. O público poderá ver novamente todas essas séries, hoje integrando coleções de museus como Pinacoteca do Estado de São Paulo, MAM-SP e MAC-USP.

Em 1989, ela já estava cansada da violência e da poluição e queria fazer pinturas em um lugar mais tranquilo. Escolheu a pequena e histórica Tiradentes, MG. Lá, suas pinturas revelaram a solidão das montanhas, retomando os tons terrosos, nas séries “Em Gerais”, “Madrugada insone” e “Acumulações”. A artista também desenvolve, nesse período, uma série de cabeças, que são esculturas em madeira e papier machê.

Em 1997, mais uma mudança, agora para o Rio de Janeiro, mais especificamente o bairro de Santa Tereza. Passou a frequentar o Estudio Dezenove, onde conhece o artista Julio Castro.

Em 1999, Magliani retornou a Porto Alegre, onde ministrou algumas aulas e oficinas de pintura e papier machê. A passagem pela capital gaúcha durou um ano. No ano 2000 voou para o Rio de Janeiro. Com tantas mudanças a produção de Magliani diminui, mas há séries marcantes nesse período: “Acumulações” e “Alfabeto”, trabalho que deriva para as figuras recortadas das séries “Retratos de Ninguém” e “Todos”. A partir de 2009 é intensa sua produção de gravuras, impressas no Estudio Dezenove. “Um dos sonhos”, “Fábula”, “Da noite” e “O poeta” são algumas delas. Curiosamente, ao lado desse mergulho no universo monocromático, denso e expressionista da gravura, Magliani desenvolve a série mais colorida e lúdica de toda a sua carreira. São pinturas realizadas em estridentes cores acrílicas, recortes em madeira e objetos. Uma parte desse conjunto, sob o título “My baby just cares for me”, apoiada em gravação da cantora Nina Simone, foi apresentada em exposição individual no Museu Imaginário, em Bruxelas, Bélgica.

Todos esses momentos, apresentados em conjunto, revelam com clareza a excelência da obra de Maria Lídia Magliani, que começa a ser redescoberta também internacionalmente.

Magliani humanista

Apesar de pessoalmente engajada na luta pelos direitos humanos, Magliani não admitia que sua obra fosse interpretada como política ou identitária. Era intransigente nessa questão. São muitas as declarações dela a esse respeito. “Meu interesse é pelo que as pessoas sentem, não pelo que elas pensam […] Tenho preocupação com a vida, com a humanidade em geral. Nada a ver com raça específica, religião, nada. Uma coisa que é comum a todo mundo. A essência humana é igual para todos. O que interessa é isso. Todos os outros acréscimos: nacionalidade, cor, ideologia, credo, preferência sexual, time de futebol, tudo isso é acessório.”

Dentro dessa atitude de defesa da autonomia da sua obra, acima de qualquer circunstância, está também a rejeição a todo tipo de abordagem referenciando seu trabalho à Negritude. “Por que sempre me perguntam como é ser negra e ser artista? Ora, é igual ao ser de qualquer outra cor. As tintas custam o mesmo preço, os moldureiros fazem os mesmos descontos e os pincéis acabam rápido do mesmo jeito para todo mundo.”  A posição de Magliani sempre foi candente nessa questão, e ela afirmava, desassombradamente, que era contrária a guetos. Na publicação da UFRGS, “Nós, os afro-gaúchos”, de 1997, fez a seguinte declaração, quase um manifesto: “Sou brasileira, nascida no Rio Grande do Sul. Isto é o bastante. Não quero escolher uma raça em função da cor da minha pele. Não quero ser fatiada, dividida em porções, me aceito como soma.”

Uma lutadora, sem medo de desafios, que, entre divertida e séria, dizia: “Minha mãe falava: ‘Não se pode dar um passo maior que as pernas.’ Então vou ficar sentada, não vale a pena caminhar? Qual é a graça? Dar um passo maior que as pernas sempre. Romper expectativas, e os estereótipos principalmente.” Maria Lídia Magliani faleceu em de 21 de dezembro de 2012, no Rio de Janeiro, vítima de uma parada cardíaca.