DUAS VISÕES

30/jan

Com exposições simultâneas no Centro de Arte Hélio Oiticica, Rio de Janeiro, RJ, os artistas  Armando Queiroz, inspirado em Serra Pelada, e Alessandra Bergamaschi, sob o fascínio do Morro da Viúva, apresentam trabalhos que transitam entre a transformação de espaços naturais, destruição e beleza.

 

De um lado, o olhar retrospectivo sobre o estrago ecossocial operado em Serra Pelada pela exploração desordenada do ouro, nos anos 1970; de outro, a visitação consentida de um espaço emparedado pelas transformações urbanas no Rio de Janeiro. Duas histórias distintas, aproximadas pela poética e pelos suportes da fotografia e do vídeo. Dois olhares argutos a contar histórias que não se parecem, mas se irmanam. Assim são as exposições “Visitas”, de Alessandra Bergamaschi, e “Midas”, de Armando Queiroz.

 

 

A natureza oculta pelo concreto

 

Os mistérios de um espaço natural encoberto – o Morro da Viúva, de quem todo mundo ouviu falar, mas que ninguém vê – motivaram Alessandra Bergamaschi a criar o projeto “Visitas”, quando foi morar naquela área, em 2008. O morro acabou escondido pelas construções feitas no seu entorno, de cujas janelas é possível divisar paisagens impensáveis: floresta densa no topo, rasteira nas bordas, voo de falcões e até visitas de respeitáveis corujas.

 

Alessandra teve a ideia de enviar uma carta aos moradores dos prédios que circundam o morro, pedindo para marcar uma visita e fotografar a grande montanha de pedra de suas janelas. Com a aquiescência e a colaboração dos quinze destinatários que responderam, a artista fez as fotos em preto e branco com máquina analógica e realizou reproduções com superposição de imagens, seguindo um exercício matemático que lhe permitia registrar pequenas, porém significativas transformações – e gerar, com isso, imagens que, na realidade, são “visões” que interpretam o real.  Os negativos também foram usados para produzir dois vídeos que dão ritmo às várias visões do espaço (quase) secreto, mas num processo inverso: enquanto as ampliações analógicas refletem tempos de espera em que os elementos reagem, os negativos – traduzidos em píxeis – são cirurgicamente recortados e manipulados em tempo real criando uma nova dinâmica de visibilidade.

 

De quebra, a partir de uma pergunta (Pode me descrever a visão da janela que fotografei?), Alessandra colecionou ricos depoimentos dos moradores visitados, que compartilharam com ela suas fantasias e afetos pelo encantado lugar que avistam todos os dias, como o de Gianluca Manzi:

 

“O magnífico exemplar de falcão carijó que vejo frequentemente das minhas janelas, diversamente de nós, prefere vigiar quase que exclusivamente o seu território, chamando de tanto em tanto a companheira, escondida sob as copas na mata ou protegendo-a, enquanto choca, entre as folhas secas sobre a rocha […]. Vigio-os com meus binóculos do mesmo modo que acompanho o crescimento das sarças, dos cactus e até mesmo das árvores na íngreme parede rochosa que dir-se-ia esboçada e cinzelada por um mestre impaciente.”

 

Na exposição, Alessandra apresenta onze reproduções fotográficas e dois vídeos digitais, realizados a partir dos registros feitos das janelas dos apartamentos visitados.

 

 

Armando Queiroz e o triste caminho do ouro

 

Miséria, hanseníase e abandono espreitam Serra Pelada quase trinta anos depois do início da ‘febre do ouro’. Restaram casebres abandonados, pessoas perambulando, quais mortos-vivos, numa cidade fantasma ao redor de um grande lago contaminado de mercúrio, o oco. Restaram velhos aposentados, mulheres e a prostituição infantil. O índice de HIV é altíssimo. O gigante ameaçador, percebido no clima tenso do local, está presente a todo o momento. O gigante quer terra, o gigante quer expulsão, o gigante tem papéis e advogados, o gigante tem anuência do poder constituído. (Armando Queiroz)

 

Nas telas das tevês no meio da desolação, o artista expõe, em fotos e vídeos, as vísceras de Serra Pelada e as pegadas de seus solitários e tristes habitantes na trilha da miséria e da degradação social – sempre assombrados pelo perigo de serem desalojados do pouco que ainda lhes resta.

 

– O garimpeiro tem apenas uma amarfanhada carteirinha de autorização para exploração de minério, e muita tristeza da sua atual situação – conta o artista. – O garimpeiro tem ao lado de si muitas cooperativas, nem todas bem intencionadas. Muitos não deixam o local simplesmente por vergonha; não teriam condição de encarar seus familiares tantos anos depois, sem nada nas mãos.

 

Para Armando, registrar em fotografia e vídeo essa chaga social brasileira é “uma ode aos primeiros vermes-insetos que irão comer nossas carnes frias”.

 

As fotos e vídeos serão exibidos em 15 televisores e DVDs interligados, fora de sincronia, de modo a ampliar a intensidade das cenas e criar uma sensação que reflita o drama real do esquecido lugar.

 

 

Os artistas

 

Alessandra Bergamaschi, nasceu em Lorena, SP, 1978.  Artista visual, graduada em Comunicação pela Universitá di Bologna, Itália, e pós-graduada em Escritura Criativa pela Accademia di Comunicazione, Milão, Itália. Estudos em fotografia e arte incluem cursos livres na Accademia di Belle Arti, Bologna, na Escola de Artes Visuais Parque Lage e no grupo de estudo do Prof. Charles Watson, Rio de Janeiro. Participou de projetos internacionais, Arte Laguna International Art Prize, Arsenal, Tesedi San Cristoforo/Veneza, residência no Teatro Monty/Antuérpia e coletiva Art Transponder Gallery/Berlim.  Em 2011 ganha menção honrosa no festival de documentários “É tudo verdade”. Vive e trabalha no Rio de Janeiro.

 

Armando Queiroz, nasceu em Belém, Pará, 1968. Expõe desde 1993 e participou de diversas mostras coletivas e individuais no Brasil e no exterior. Integrou, dentre outros, os projetos Macunaíma, Rio de Janeiro, 1997 e Prima Obra, Brasília, 2000. Participou do Salão Arte Pará como artista convidado em 1998 e de 2005 a 2008. Foi bolsista do Instituto de Artes do Pará, IAP, em 2003 e 2008. Conquistou bolsa de pesquisa em arte do Prêmio CNI/SESI Marcantonio Vilaça, 2009-2010 e o 2o Grande Prêmio do 28o Arte Pará 2009, com o site-specific “Tempo Cabano”. No ano seguinte, como homenageado, recebeu Sala Especial no 29o Arte Pará. Coletivas internacionais: Festival de L’oh, Maison-Alfort, Paris, França. 2003; coletiva em Wiesbaden, Alemanha, 2005, promovida pela Kunsthaus da cidade e pela Associação de Artistas Plásticos do Pará/AAPP. Vive e trabalha em Belém.

 

 

De 04 de fevereiro a 06 de abril.

 

Fachadas cariocas

28/jan

O Centro Cultural Correios, Centro, Rio de Janeiro, RJ,  inaugura “O Rio que o Rio não vê — a ornamentação simbólica na fachada carioca”, uma exposição de 36 fotos, assinadas pelo fotógrafo, designer gráfico e historiador Luiz Eugênio Teixeira Leite. Trata-seda exibição de ornamentos simbólicos das fachadas de construções civis – instituições públicas e privadas do centro do Rio, área escolhida por ser a interseção arquitetônica de uma cidade que dali se expandiu. Nas legendas, haverá minifotografias da fachada inteira, para que o visitante se familiarize com o imóvel no qual está inserido o ornamento e possa visitá-lo e apreciar ao vivo o detalhe que as fotografias da exposição destacam.

 

Desde 2000, Teixeira Leite realiza esta pesquisa iconográfica que chega hoje a 974 ornamentos mapeados, catalogados, minuciosamente descritos e com endereço, uso original, nome do projetista, data do projeto da fachada, uso atual, autor do ornamento, técnica e data da execução. A pesquisa resgata nomes de artistas e artesãos executantes dos ornamentos, bem como dos arquitetos e projetistas de fachada. A partir de 2013, o autor vem estendendo o levantamento a outros bairros cariocas, incluindo portas e gradis, além decoração escultórica dessas construções.

 

Luiz Eugênio reuniu parte desta pesquisa no livro ”O Rio que o Rio não vê – os símbolos e seus significados na arquitetura civil do centro da cidade do Rio de Janeiro”, lançado em 2012, e avaliado pela Associação Brasileira de Críticos de Arte (ABCA) como o primeiro livro de arte do gênero no país e indicado e indicado pelo IPHAN como representante fluminense ao XXVI Prêmio Rodrigo Mello Franco de Andrade, entre outras indicações para prêmios.

 

A mostra é acompanhada de catálogo com reprodução de todas as fotos expostas e texto de Joaquim Marçal Ferreira de Andrade, mestre em design pela PUC Rio, doutorando em história social na UFRJ e autor de História da fotorreportagem no Brasil: a fotografia na imprensa do Rio de Janeiro de 1839 a 1900 (Campus, 2003). O lançamento do catálogo acontece no dia 8 de março, com visita guiada à mostra por Luiz Eugênio Teixeira Leite, aberta ao público.

 

A palavra do fotógrafo e pesquisador

 

A decoração aplicada à arquitetura, isto é, a forma pela qual se idealiza um programa ornamental para a fachada de uma construção, já teve papel de destaque na História da Arquitetura. A partir de determinado momento entrou em declínio, chegando a ser tratada com repulsa. Disso resultou um quase total abandono pelo estudo das artes da ornamentação. O Ecletismo, estilo que mais se valeu da ornamentação para fundamentar seu discurso arquitetônico, acabou por herdar, por tabela, essa repulsa, e tem ficado, desde há muito, esquecido pela historiografia da arte nacional.

 

Até 16 de março.

Ernesto Neto no Guggenheim Bilbao

22/jan

A partir de fevereiro, o museu Guggenheim Bilbao, Bilbao, Espanha, vai dedicar uma exposição ao artista brasileiro Ernesto Neto. A exibição ganhou o título de “The Body that Carries Me” e o artista, que se autodefine escultor, cria seus trabalhos para que sejam percorridos, habitados e sentidos, permitindo que o espectador, ao contemplá-las, experimente seu próprio corpo e sensações através da obra e vice-versa. Ao interagir com as obras e com as outras pessoas, os visitantes se veem imersos em uma fusão de escultura e arquitetura. Nelas, Ernesto Neto explora a sensualidade e a corporalidade, nos aspectos comuns das relações interpessoais. A exposição no Guggenheim Bilbao ocupará o átrio central e oito galerias do segundo andar do prédio. Cada uma delas oferecerá uma experiência diferente, que exigirá um ritmo distinto para sua consequente visão ou participação.

 

Segundo o Guggenheim Bilbao, a mostra foi desenvolvida em parceria com o artista. Suas obras exploram os sentidos, como olfato, visão, linguagem e outros aspectos sensoriais. Para Ernesto Neto, a mostra é um local para a poesia, onde os visitantes podem escapar da rotina. Ao todo, serão exibidos cerca de 25 trabalhos  que marcaram a trajetória do artista. A curadoria é de Petra Joos, um nome de referência no circuito artístico europeu.

 

 

A palavra do artista

 

“Estamos sempre recebendo informação, mas na exposição o meu desejo é fazer com que as pessoas parem de pensar e encontrem um refúgio na arte. Eu acho que não pensar é bom, porque isso nos dá um respiro da vida”.

 

De 13 de fevereiro a 18 de maio.

Coletiva na Galeria Laura Marsiaj

A Galeria Laura Marsiaj, Ipanema, Rio de Janeiro, RJ, apresenta a exposição coletiva “JUNTOS, APOLO e DIONISIO”, sob a curadoria da crítica de arte Ligia Canongia. A curadoria elencou os seguintes artistas (em ordem alfabética): Angelo Venosa, Antonio Dias, Daniel Senise, Fábio Miguez, José Damasceno, José Resende, Kilian Glasner, Laura Vinci, Marcos Chaves, Paulo Pasta e Paulo Vivacqua. A proposta da curadoria foi reunir artistas que fundem a bipolaridade entre as formas apolíneas e as dionisíacas, isto é, aquelas que primam pela definição de uma estrutura precisa e aquelas que carregam uma pulsão mais vital e romântica.

 

 

A palavra da curadora

 

“Essa tensão bipolar sempre esteve enraizada na civilização ocidental, como uma esquizofrenia crônica, gerando programas artísticos que pendiam ora para a grade matemática, ora para a prática mágica ou orgíaca.”

 

“A ideia da exposição é exatamente revelar como os artistas contemporâneos romperam essa dicotomia, fundindo os dois polos de sua oposição, e imiscuindo a energia dionisíaca no seio mesmo do equilíbrio apolíneo.”

 

“Os artistas escolhidos parecem impermeáveis às dicotomias que nortearam a tradição histórica da arte, propondo obras que entrelaçam o cogito com as experiências sensoriais, na busca de espacialidades mais complexas e dissonantes.”

 

 

De 28 de janeiro a 13 de março.

 

Inos Corradin no Espaço Citi

15/jan

O Espaço Cultural Citi, Paulista, São Paulo, SP, inaugura exposição do pintor Inos Corradin. A curadoria é do crítico de arte Jacob Klintowitz que também assina a apresentação do artista. O artista exibe seu conhecido universo poético e geometrizado povoado de músicos, malabaristas, jogadores, paisagens que ganhou o sugestivo título “Inos Corradin. No percurso da arte, o artista na estrada”.

 

 

A palavra do curador

 

É espantoso como os fios que o pintor Inos Corradin urde criam personagens tão vivos, atuais e dotados do encantamento lírico que quinhentos anos de história agregaram ao nosso psiquismo. Os seus mágicos, equilibristas, músicos, cantores, mímicos, artistas itinerantes sem pouso e que percorrem estradas apenas pressentidas, são quase os mesmos que no século XV andavam pelo interior da Itália e que criaram a lendária Commedia d’ella Arte. Hoje estes artistas ambulantes e a sua arte impregnada de improviso são o emblema da cultura antiacadêmica e o antípoda do naturalismo. O mundo contemporâneo ama e anseia por esta ação artística filha do eterno presente.

 

O nosso espaço é limitado, mas como não recordarmos da “Família de saltimbancos”, de Pablo Picasso, feita em 1905? Ou do casal de artistas ambulantes, na sua carroça, no “Sétimo Selo”, de Ingmar Bergman, no seu confronto com a morte e a fugacidade da vida, onde o símbolo da continuidade é o jovem casal itinerante e o seu bebê? Neste contexto, talvez seja pecado não citar “La Strada”, de Federico Fellini, de 1954, centrado num artista circense e na mais doce e evanescente musa inventada pela arte, Gelsomina- Giulietta Masina. Ou o mito americano do horizonte libertário, núcleo do épico no cinema do faroeste e raiz da literatura on the road. Esses e centenas de outros artistas buscaram os fios no mesmo tear que alimentou Inos Corradin.

 

A produção de Inos Corradin, aos 85 anos, é esfuziante e certamente ele é um exemplar raro do artista que cria por prazer. O seu domínio do ofício é também raro, pois ele pinta à semelhança dos mestres. É curiosa uma época na qual temos que destacar como virtude o que parece a obrigação mínima de qualquer profissional. A iconografia do artista está centrada na figura humana travestida na sua função poética, o que explica a quantidade de trajes característicos, instrumentos musicais, cenas teatrais. A partir desta proposta essencial, o artista se detém nas vilas e casarios e nas paisagens e nelas, antes de tudo, temos o espaço aéreo, o céu, como personagem. De certa maneira, o conceito de elevação simbolizado pela ação artística, pelos artistas, pelos emblemas populares como as bandeiras, os pequenos núcleos de moradia, a paisagem dominada pelo céu, é o que determina a pintura e a escultura de Inos Corradin. Refinamento pela poética da ação artística e o espaço celeste marcante como ascenção.

 

É possível que Inos Corradin, como parte da melhor arte da nossa época, possa ser entendido como um momento anárquico de rejeição de padrões institucionais marmóreos e estáticos, mas é, antes de qualquer outra coisa, um gesto pessoal de fidelidade à arte como poética e a certeza de que a humanização do ser humano não pode prescindir da vivência estética.

 

 

De 20 de janeiro a 21 de março.

José Patrício na Chácara do Céu

13/jan

O Museu da Chácara do Céu, Santa Teresa, Rio de Janeiro, RJ, exibe a última edição do projeto Os Amigos da Gravura. Desta vez os trabalhos apresentados são do artista José Patrício e convidam o público a um mergulho em sua obra recente. José Patrício criou especialmente para Os Amigos da Gravura a obra “Vertigo”, cujo título remete a um dos mais famosos filmes de Alfred Hitchcock, no Brasil chamado “Um corpo que cai”, e conduz o olhar do expectador a um labirinto ao revés, um efeito inventado por Hitchcock que simula uma espécie de vertigem, na época chamado de contra zoom. Patrício também vai mostrar a série “Afinidades Cromáticas”,  de 2012, que será exposta pela primeira vez no Rio. São sete trabalhos nos quais o artista utiliza botões coloridos costurados sobre tela.

 

Segundo o crítico Paulo Sérgio Duarte “se nos detivermos nas Afinidades cromáticas somos levados à memória do jogo numérico de trabalhos anteriores de José Patrício com os dominós. Aqui o protagonista do jogo é mais prosaico e lidamos com ele todos os dias: o botão. Os botões são vários nos tamanhos e nas cores, mas nunca grandes demais, são comuns. Todo botão espera uma casa para cumprir sua função: abotoar, manter presas duas superfícies de tecido. Mas aqui sua utilidade está banida. Costurados na superfície com regularidade geométrica constituem uma multidão aprisionada, cada indivíduo em seu lugar, para se transformarem em superfície de uma obra de arte. O resultado é evidente, estão presos para nos prender, nos deter na trama vertiginosa de suas sutis variações de forma e cor. Na sua banalidade de coisa comum, juntos se erguem e se emancipam na “coisa” arte.”

 

As obras de Patrício se caracterizam pela preocupação com a forma e, ao mesmo tempo, pelos resultados inesperados de suas composições geometricamente organizadas.  O artista já trabalhou anteriormente com papel, produzido artesanalmente, ainda no início de sua trajetória, depois passou a explorar objetos prontos, feitos em série, passando para os dominós, até chegar aos botões de Afinidades Cromáticas. A exposição ocupa as duas salas expositivas do 3º andar do museu. A tiragem limitada da gravura “Vertigo” está sendo vendida na loja do próprio museu.

 

 

Sobre o projeto Os Amigos da Gravura

 

Raymundo de Castro Maya criou a Sociedade dos Amigos da Gravura no Rio de Janeiro em 1948. Na década de 1950 vivenciava-se um grande entusiasmo pelas iniciativas de democratização e popularização da arte, sendo a gravura encarada como peça fundamental a serviço da comunicação pela imagem. Ela estava ligada também à valorização da ilustração que agora deixava um patamar de expressão banal para alcançar status de obra de arte. A associação dos Amigos da Gravura, idealizada por Castro Maya, funcionou entre os anos 1953-1957. Os artistas selecionados eram convidados a criar uma obra inédita com tiragem limitada a 100 exemplares, distribuídos entre os sócios subscritores e algumas instituições interessadas. Na época foram editadas gravuras de Henrique Oswald, Fayga Ostrower, Enrico Bianco, Oswaldo Goeldi, Percy Lau, Darel Valença Lins, entre outros. Em 1992 os Museus Castro Maya retomaram a iniciativa de seu patrono e passaram a imprimir pranchas inéditas de artistas contemporâneos, resgatando assim a proposta inicial de estímulo e valorização da produção artística brasileira e da técnica da gravura. Este desafio enriqueceu sua programação cultural e possibilitou a incorporação da arte brasileira contemporânea às coleções deixadas por seu idealizador. A cada ano, três artistas plásticos são convidados a participar do projeto com uma gravura inédita. A matriz e um exemplar são incorporados ao acervo dos Museus e a tiragem de cada gravura é limitada a 50 exemplares. A gravura é lançada na ocasião da inauguração de uma exposição temporária do artista no Museu da Chácara do Céu. Neste período já participaram 44 artistas, entre eles Iberê Camargo, Roberto Magalhães, Antonio Dias, Tomie Ohtake, Daniel Senise, Emmanuel Nassar, Carlos Zílio, Beatriz Milhazes e Waltercio Caldas.

 

 

Sobre o artista

 

José Patrício nasceu em Recife, Pernambuco, em 1960, onde vive e trabalha até hoje. Quando jovem, estudou na Escolinha de Arte do Recife. Mais tarde, graduou-se em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Pernambuco. Já participou de diversas bienais, como a 22ª Bienal de São Paulo, São Paulo, SP, 1994; a 3ª Bienal de Artes Visuais do Mercosul, em Porto Alegre, RS, 2001; e a 8ª Bienal de Havana, Cuba, 2003. Suas mais recentes mostras individuais são: “A espiral e o labirinto”, Galeria Nara Roesler, São Paulo, SP, 2012; “José Patrício: o Número”, Caixa Cultural, Rio de Janeiro e no Centro Cultural Banco do Nordeste, Fortaleza, CE, 2010; “Expansão múltipla”, Pinacoteca do Estado de São Paulo, São Paulo, SP, 2008; e “Connections”, no Pharos Centre for Contemporary Art, Nicosia, Chipre, 2008. José Patrício é representado pela Galeria Nara Roesler, São Paulo, desde o ano 2000. Em 2013, tornou-se artista convidado a participar do projeto Amigos da Gravura no Museu da Chácara do Céu – Museus Castro Maya.

 

Até 10 de março.

Na Caixa Cultural – SP

08/jan

A artista plástica paulistana Bel Falleiros, apresenta “Sobre ruínas, memórias e monumentos”, sua primeira individual, já em um dos grandes espaços expositivos da cidade, a CAIXA Cultural São Paulo, Praça da Sé, Centro, São Paulo, SP. Com curadoria de Paulo Miyada e texto crítico de Jacopo Crivelli Visconti, a exposição traz cerca de 20 colagens, 04 grandes pinturas, além de instalações, fotografias e objetos coletados durante a fase de concepção do projeto.
Arquiteta de formação, Bel Falleiros tem a relação com a cidade como um dos temas centrais em seu trabalho. E não apenas São Paulo, mas também Berlim e Nova Iorque, metrópoles onde morou recentemente, e a pequena Ituverava, cidade natal de seu pai no interior paulista, que faz parte de suas memórias afetivas. Ao ser selecionada pelo edital, a artista se propôs a realizar quatro percursos em direção às fronteiras da capital paulista, sempre partindo do antigo marco zero da Sé, e tendo os pontos cardeais como referencial de direção. Para Crivelli Visconti, ao realizar tal ação, a artista retoma o processo criativo iniciado pelo movimento dadaísta, em Paris, no início do século passado. Em suas palavras: “Ao colocar como metas utópicas das suas andanças os lugares, correspondentes aos quatro pontos cardeais, onde a cidade de São Paulo teoricamente acaba, ela situou-se, ao mesmo tempo, na periferia da metrópole e no cerne da linhagem das derivas artísticas… Sua viagem aos confins da cidade aconteceu paralelamente no âmbito físico e no imaginário, considerando que os elementos da realidade ao redor dela eram constantemente comparados com lembranças de Ituverava, onde nasceu seu pai e onde por primeira vez ela vivenciou a sensação de chegar até a extremidade de uma cidade. O deslocamento que qualquer deriva pressupõe, consequentemente, era duplicado aqui pelo fato da viagem acontecer simultaneamente na imaginação e na realidade”, conclui o crítico.

 

Para cada uma das quatro longas caminhas, a artista realizou uma pintura de grande proporção. As quatro obras são apresentadas em uma única sala. Segundo Paulo Miyada, “O surpreendente é que nelas não há espaço para o acúmulo de papéis, texturas e gestos, como outrora nas produções resultantes de leituras urbanas. Há um imenso vazio quase informe, um terreno indistinto e estranhamente desprovido de profundidade. Aqui e ali, dois ou três elementos povoam as paisagens… Estão presentes o primeiro Marco da Independência no Ipiranga, o Farol do Jaguaré, a Ponte Grande e a Serra da Cantareira. Mas eles ocupam um vazio atemporal e sem muitas referências, descolado do skyline paulistano. Mais ainda, convivem com alguns símbolos importados de outra paisagem mnemônica da artista, a cidade de Ituverava, no interior do Estado”. Crivelli Visconti esclarece que “Para além da força inegável dos painéis, é interessante notar que um projeto que foi concebido como uma deriva urbana, e de cunho efetivamente urbanístico, considerando o objetivo (vagamente utópico) de encontrar os limites de uma metrópole, transformou-se numa excursão no campo, rica de reminiscências pessoais”, enquanto Miyada conclui que “para nós, resta a tarefa de encontrar possíveis conexões entre monumentos e ruínas, enquanto nos perdemos no espaço sem tempo da claridade dos desenhos”.

 
Sobre a artista
Bel Falleiros, nasceu em São Paulo, 1983, vive e trabalha na capital paulista. Bacharel em Arquitetura pela FAU-USP, a artista é uma das fundadoras do Aurora, misto de atelier e espaço expositivo localizado no centro da cidade. Foi assistente dos artistas Héctor Zamora e Andrés Sandoval e desde 2012 participa ativamente do Atelier Fidalga. Já realizou uma série de colaborações como ilustradora para o caderno Ilustríssima, da Folha de São Paulo, além de ilustrar livros para diferentes editoras. Já participou das coletivas: Laço, no subsolo do Paço das Artes, São Paulo, 2012; 3 artistas, na Interaction Gallery, Berlim, 2011; Portfólio | Charivari, no SESC Santos, 2011 e Collective Exhibition, no Bushwick Project for the Arts, Nova Iorque, 2010. “Sobre ruínas, memórias e monumentos” é sua primeira exibição individual.

 

 

Atividades extras:

 

18 de janeiro: Conversa com Paulo Miyada e lançamento de catálogo, às 11h.
25 de janeiro: Oficina com Bel Falleiros, às 11h.

 

 

De 11 de janeiro a 16 de fevereiro.

 

 

Antonio Manuel no MAM-Rio

06/jan

O MAM-Rio, Parque do Flamengo, Centro, Rio de Janeiro, RJ, apresenta 21 obras de Antonio Manuel. Radicado no Brasil desde a infância, o artista português construiu aqui uma carreira marcada pela versatilidade: já enveredou por pintura, gravura, escultura, vídeo, desenho, performance. Essa multiplicidade de interesses se reflete na individual no MAM. Logo na entrada, assoma a recriação de um trabalho de 1998, “Ocupações/Descobrimentos”, formado por três grandes paredes de tijolos com um buraco em cada uma, convidando a uma espiada. Há uma inevitável sugestão de diálogo entre essa criação e uma série de bonitas pinturas em que Antonio Manuel faz furos na tela. Há ainda produções em técnica mista, um óleo sobre tecido e um vídeo, mas o que chama mesmo atenção são as instalações penetráveis a exemplo de “Fantasmas”, um cômodo repleto de pedaços de carvão suspensos por fios, dando a impressão de que estão flutuando.

 

 

A formação e o desenvolvimento da obra de Antonio Manuel se deram em estreita relação com o Museu de Arte Moderna. Há mais de 15 anos sem uma exposição institucional na cidade, trazê-lo agora ao museu é uma espécie de compromisso simbólico: com a sua própria história e com a arte brasileira. Não se trata de uma exposição retrospectiva, sua orientação não é para o passado, mas focada na atualidade de sua produção, tendo em vista articulações com o que já foi e projeções em direção ao que ainda está por vir. Acima de tudo, esta exposição aposta na coerência poética de uma produção múltipla e diversificada. O conceito de polifonia, extraído da teoria literária -significando uma multiplicidade de vozes agindo no interior de um mesmo romance – parece-me interessante para pensarmos a obra de Antonio Manuel. Nela percebemos muitas entonações afetivas e plásticas intensificando-se sem se fragmentarem. Nada menos apropriado para lidar com sua trajetória do que separá-la em duas fases: a político-performativa e a pictórico-formal. A opção em articular a exposição através das instalações foi para evidenciar o quanto o pensamento da forma reverbera na realidade, na vida, sendo esta disseminação sempre política: pelo que diz e pelo que silencia.

 

 

A relação cromática dos “muros” com a paleta solar e mondrianesca de muitas pinturas, a ação de quebrá-los, a explicitação do tijolo, o movimento do corpo ao atravessá-lo, tudo fala de uma experiência ampliada no espaço: do museu e da cidade. As faces marcadas dos presos de “semiótica” e os carvões pendurados no “fantasma” são cicatrizes de uma mesma crise social em momentos históricos distintos. A forma flutuante a as cores primárias dos “frutos do espaço” se projetam para dentro e para fora dos planos chapados na superfície das telas. O líquido que pinga sobre a imagem, apagando a informação, contaminando-a, deslocando-a, liga esta última e inédita instalação aos “flans” do final dos anos 1960. Enfim, uma obra em movimento que segue atualizando-se enquanto exercício experimental de liberdade: como afirmou Pedrosa na noite de 1970 em que Antonio Manuel, neste mesmo museu, transformou corpo em obra. Uma espécie de síntese da máxima construtiva de que menos é mais.

 

 
Até 16 de fevereiro.

 

 

Cildo, Restiffe e Warchavchic no Maria Antonia

20/dez

Funcionando regularmente desde 1999, o programa de exposições do Centro Universitário Maria Antonia da USP, Vila Buarque, São Paulo, SP,  orienta-se por um conceito abrangente de formação, tendo como diretriz geral reunir artistas de gerações diversas. Procura dar espaço às mais diferentes técnicas e poéticas, com especial atenção a propostas de reavaliação de artistas e movimentos atuais e do passado recente, além de mostras de design e arquitetura. No momento o Maria Antonia apresenta  três exposições com a assinatura dos curadores João Bandeira com a instalação “4/4” de Cildo Meireles;   José Tavares Correia de Lira com “Warchavchik – metrópole, arquitetura” e  Agnaldo Farias com “Interseção” de Mauro Restiffe.

 

 

A palavra dos curadores

 

Cildo Meireles – 4/4

 

Percebe-se um recinto por dentro. Não apenas a olho, não só porque nos rodeia. Por dentro também do nosso corpo. Sua existência se realiza na medida em que sentimos a nossa nele. Se for uma sala qualquer e que esteja, em princípio, vazia, não haverá muito mais a fazer. Sendo, no entanto, um espaço de exposições em que se espera encontrar arte, tudo pode mudar de figura. E se ali parece não haver de fato coisa alguma, é bem provável que nossa mente, na hora, relute.

 

Mas se ao nos movermos por esse espaço detectamos alterações meio estranhas, em nós mesmos como na sua arquitetura? Ainda que oco, o espaço agora é um lugar – revela qualidades mais específicas. Lugar inventado por Cildo Meireles, onde alguma coisa discretamente acontece, chama e recua. É difícil dar nome certo a isso que desde dentro, sem sair do aqui-agora, cede também no tempo (pouco a ver com o vácuo mítico de Yves Klein; quem sabe uma volta a mais no parafuso daqueles Cantos, do próprio Cildo), como um golpe por subtração, uma esquiva às palavras rodando na consciência.

 

Pouco vaza, em direção ao vértice de algum futuro, pelos quatro cantos dessa instalação, que se rebatem cruzados, costurando de modo inusitado piso e paredes, dentro e fora. E, paralelamente, não muito mais do que um sinal parece ser captado ali, vindo de mais longe, do mais básico que nos toca como instabilidade de todo abrigo. Num caso e no outro, tudo agora se adensa se lembrarmos que 4/4 está precisamente no mesmo local que desde a terceira década do séc. XX, guardada quase a mesma volumetria, foi parte de uma residência, de uma escola privada, de uma universidade pública, dependência de órgãos do Estado, incluindo escritórios de seu sistema prisional, no período da ditadura militar de 64, até ser devolvido à mesma universidade, expulsa dali naquele período. Que finalmente o destinou, passando por mais outros usos, a abrigar as exposições de artes do Centro Universitário Maria Antonia.

 

A Física moderna permite imaginar que a torções no espaço correspondem outras no tempo, variando vis-à-vis conforme a referência. Empregando livremente essa ideia, seria possível considerar, lado a lado, o projeto arquitetônico de restauro e reforma desenvolvido para essa instituição – que deixa à mostra partes antigas no que foi recém-construído e cria vazios (retirada de muros, extensão da calçada numa laje que, por sua vez, leva a uma praça aberta no miolo da quadra, ligando seus dois edifícios), no esforço de reavaliar na prática uma tradição de lugar público – e a instalação de Cildo Meireles, com sua intervenção radical no histórico do espaço expositivo, que mantém ainda em suspenso o desaparecimento da arte nos fluxos do mundo. (João Bandeira)

 

 

Gregori Warchavchik – Warchavchik – metrópole, arquitetura

 

Gregori Warchavchik transcende em muito a figuração genérica do pioneiro isolado que atravessou o século XX. Manifesta lugares chave da arquitetura entre os processos materiais da sociedade e os esquemas mentais associados às técnicas e programas modernos. Arte social, a mais material das artes, sempre produzida coletivamente e referida aos imperativos práticos, injunções da encomenda e do investimento e à recepção distraída das massas, a arquitetura em Warchavchik imbrica-se à experiência metropolitana.

 

Esta exposição pretende flagrar o arquiteto modernista na São Paulo de 1930 aos anos 1960, quando a cidade passa de um núcleo provinciano à metrópole nacional. Até então achatada e esparramada por colinas e várzeas da região, a cidade observou no período a canalização de rios e córregos, a proliferação de loteamentos, avenidas e arranha-céus, o aparecimento de novas formas de habitação, locomoção, espaços comuns, serviços e múltiplas dificuldades. Sob o influxo avassalador da urbanização, da especulação e da construção civil, os arquitetos transformariam tudo isso em matéria de projetos e planos. Conscientemente ou não, passaram a operar na produção da metrópole: de sua imaginação erudita à sua edificação e ecologia, esquadrinhando e modelando situações, reproduzindo divisões e conflitos reais e fomentando novos arranjos sociais.

 

Os projetos de Warchavchik aqui expostos remetem a posições relevantes quanto aos espaços de vida coletiva na metrópole em seus atributos fundamentais de eficiência e monumentalidade, complexidade e especialização, densidade e fluidez. Com eles, propõe-se repensar o papel representacional do desenho em transmutações de outra ordem que não exatamente sua tradução construtiva. Mas como forma de olhar oblíquo para o real, subterfúgio ativo em relação ao peso das soluções imediatas, investigação do mundo edificado, resposta a convenções espaciais, presença crítica e mesmo visionária na cidade. Todos eles integram um acervo precioso, conservado pela biblioteca da FAU-USP, que ilustra um conjunto variado de especulações em torno das alegorias e materiais arquitetônicos. Exibidos em meio a imagens retiradas ao cinema, à imprensa e à publicidade da época visa justamente potencializar os nexos da arquitetura com as impressões da grande cidade. Submetendo suas formas projetuais e estruturas edificadas ao fluxo de fragmentos e detalhes instantâneos, espera-se fazer ressoar os artefatos arquitetônicos na atmosfera das aparências e na vida dos objetos tangíveis a que, sólidos e duradouros, sorrateiramente, e cotidianamente, se reúnem. (José Tavares Correia de Lira)

 

 

Mauro Restiffe – Interseção

 

Já em sua primeira individual, em 2000, Mauro Restiffe sinalizou que pensaria a relação entre arquitetura e fotografia sob ângulos imprevistos. Não que suas fotos tivessem a arquitetura como tema exclusivo. O assunto preponderante era o lugar da fotografia, a plasticidade com que se aproxima e se afasta do mundo. Isso e mais sua problematização como produto do olhar, do fotógrafo e do visitante que, diante de suas fotos, percebe-se percebendo.

 

Desde o princípio, Restiffe resolveu demonstrar que a arquitetura podia converter-se em fotografia, além de lhe servir como tema privilegiado. Como? Na mostra de 12 anos atrás, ele, em lugar de simplesmente pendurar as fotografias, abriu “três janelas” na longa parede situada à esquerda da entrada da sala expositiva, revelando o muro alto e branco que separava, da casa do vizinho, o lote da casa onde funcionava a galeria, o corredor estreito onde jaziam, até então ocultos, despojos das tralhas típicas de montagens de exposições, e finalmente a vista parcial do tronco de uma árvore emparedada. Fechadas com vidro, as aberturas, por efeito de sua transparência e reflexividade, embaralhavam as imagens de dentro e fora.

 

A obsessão pela arquitetura volta nessa mostra de agora sob a forma de imagens extraídas de dois edifícios, a Casa Serralves, o belo exemplar de Art Déco português construída no Porto, de autoria de Charles Siclis e José Marques da Silva, e o Edifício Cícero Prado, obra do introdutor da arquitetura moderna no nosso país, Gregori Warchavchik.

 

A disposição das imagens na sala confirma a importância que Restiffe confere à relação entre fotografia e arquitetura. Na parede principal, sem portas ou janelas, “Vertigem”, a sucessão de imagens com o mesmo formato, todas reverberando os ritmos escandidos da Casa Serralves. Nas outras três paredes, coerente com as perturbações das aberturas, o jogo com tamanhos e ângulos propiciado pelas linhas de fuga verticais do Cícero Prado.

 

Se a arquitetura, como a música, destrava-se no tempo dispendido caminhando-se em seu interior, Restiffe adverte-nos que ela também acontece quando se olha para cima e para baixo; quando se mira torto; quando se mergulha no infinito inventado pelos ocos das escadas; quando se alça ao sublime do teto intangível. Suas fotos convertem arquiteturas em imagens e, impregnadas por elas e pelo espaço em que estão expostas, flexibilizam-se, ficam de frente, de lado, de cabeça para baixo; seus tamanhos expandem-se e contraem-se, com as maiores imantando à distância, com as menores trazendo para perto, convidando a escrutinizar seus detalhes. (Agnaldo Farias)

 

 

Até 23 de fevereiro de 2014.

Luzia Simons na Pinacoteca

18/dez

A Pinacoteca do Estado de São Paulo, Estação Luz, São Paulo, SP, apresenta a exposição “Segmentos”,  individual de Luzia Simons. Realizada especialmente para o” Projeto Octógono Arte Contemporânea”, a instalação é composta de quatro obras, quatro ampliações fotográficas moduladas, recortadas em 12 partes que são posicionadas no espaço com suas costas voltadas para cada uma das entradas. Incomuns em seu efeito claro-escuro, de concepção barroca, os scannogramas de Luzia Simons têm uma sonoridade trazida do silêncio para o rumor barulhento da metrópole, voltando depois ao silêncio.

 

Segundo Luzia Simons, a instalação faz uma alusão aos jardins fechados, tradicionalmente encerrados com tramas metálicas ou cercas de madeira. Alude, ainda, ao próprio Jardim do Éden. Este ambiente, no entanto, não se propõe acolhedor, mas sacramental como os ostensivos jardins ou mesmo os museus. A tulipa é o motivo central da série “Stockage”. Suas inúmeras espécies e criações deixam claro para Luzia Simons o que ela chama de “tingimento” e “transferência de cor” ou seja, o processo de adaptação e transformação. As flores brilham em meio a um escuro difuso, o que pode ser entendido como uma releitura das naturezas-mortas holandesas, mas que também trata do aspecto da fugacidade. Afinal, a tulipa tornou-se um dos motivos centrais da vanitas após o colapso do mercado holandês em fevereiro de 1637. Com isso, a artista construiu uma ponte – do século XVII até os tempos atuais, com os aspectos típicos da nossa época, como globalização, nomadismo cultural e marcas multiculturais. A quantidade de referências metafóricas que explicitamente se debruçam sobre temas atuais de nossa sociedade transformou o conteúdo aparentemente „adorável” da peça floral em uma mídia discursiva surpreendente.  Com fotografias, filmes, performances e instalações a artista, residente em Berlim, vem desenvolvendo um corpo de trabalho, desde os anos 1990, em torno de questões como identidade, memória e globalização. Ela desenvolveu sua linguagem no captar e registrar imagens, que denominou “scannograma”. Feito para a digitalização de documentos, o scanner não possui lente nem foco. ao contrário das imagens produzidas, correntemente, com lentes fotográficas. Nesta técnica os objetos são colocados diretamente sobre um scanner, que capta, minuciosamente por um sistema de linhas e pontos, todos seus detalhes formais e variações cromáticas. Os scannogramas reproduzem uma luminosidade dramática e quando ampliados em grande escala ganham teatralidade.

 

 

 

Sobre a artista

 

Luzia Simons nasceu em 1953, em Quixadá, CE. Vive e trabalha em Berlim e já participou de importantes exposições internacionais como:  Flowers and Mushrooms, Museum der Moderne, Salzburg, Áustria, 2013;  Personificação de Identidades, Bienal de Curitiba, Casa Andrade Muricy, 2013; Wenn Wünsche wahr werden, Kunsthalle Emden, Emden, Alemanha, 2013;  Lost Paradise, Mönchehaus Museum Goslar, Goslar, Alemanha, 2012;  Flowers in photography , Tokyo Art Museum, Tóquio, Japão, 2012; Time, death and beauty, FotoKunst Stadtforum, Innsbruck, Áustria, 2011; Wild Things, Kunsthallen Brandts, Odense, Dinamarca,  2010; Nature forte, Kunstverein Wilhelmshöhe, Ettlingen, Alemanha, 2009; e Garden Eden – A representação do jardim na arte desde 1890, Kunsthalle Emden, Emden, Alemanha, 2007. Suas exposições individuais incluem: Jardins Alheios, Kunstverein Bamberg, Bamberg, Alemanha, 2012; Stockage, Centre d’Art de Nature, Château Chaumont-Sur-Loire, França, 2009; Stockage, Künstlerhaus Bethanien, Berlim, Alemanha 2006; Stockage, Städtische Galerie Ostfildern, Alemanha 2005; Face migration: sichtvermerke, Württembergischer Kunstverein Stuttgart, Alemanha 2002 e Transit, SESC Paulista São Paulo, Brasil 2001. Possui trabalhos em coleções públicas como as de Graphisch Sammlung der Staatsgalerie, Stuttgart, Alemanha; Fonds National d’Art Contemporain, Paris, França; Casa de las Américas, Havana, Cuba; University of Colchester, Collection of Latin American Art, Essex, Inglaterra; Museu de Arte de São Paulo Coleção Pirelli, São Paulo, Brasil: Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, entre outros.

 

 

Até 02 de março de 2014.