Na Athena Contemporânea

18/out

A galeria Athena Contemporânea apresenta, a exposição “Saudade e o que é possível fazer com as mãos”, com obras inéditas da artista mineira Raquel Versieux. Com curadoria de Raphael Fonseca, será apresentada uma grande instalação, composta por cerca de 200 objetos de cerâmica, que ocupará o chão da galeria, além de fotografias, esculturas e vídeos. Raquel Versieux nasceu em Belo Horizonte, em 1984, e possui obras na coleção do Museu de Arte do Rio (MAR), já tendo participado de importantes mostras como “Rumos”, do Itau Cultural, além de exposições no Paço Imperial, na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Centro Cultural Banco do Nordeste, entre outras importantes instituições.

 

As obras que serão apresentadas na galeria Athena Contemporânea foram produzidas este ano, a partir de sua recente experiência na cidade de Juazeiro do Norte, no Ceará, onde é professora de Artes Visuais na Universidade Regional do Cariri, e de uma residência artística na Cidade do México. “Essas experiências fizeram com que a artista travasse contato com novas concepções em torno da relação entre imagem, natureza e cultura”, afirma o curador Raphael Fonseca.

 

No chão da galeria, estará a grande instalação “Quenga coco loco”, composta por cerca de duzentos objetos cerâmicos, feitos a partir da modelagem do barro em contato com cascas de coco-da-baía e de carnaúba, chamadas de “quenga”. A artista coloca o barro dentro dessas cascas e as deixa dentro de seu carro. “Com isso, elas ficam impregnadas desta viagem, vão pegando uma impressão do tempo e destes deslocamentos”, explica Raquel Versieux. O barro depois é queimado em um forno a lenha, “que tem a ver com o contexto local”, e dá origem aos objetos que formam a instalação. Um vídeo desse processo em que os cocos acompanham a artista em seus trajetos de carro também estará na exposição. A escolha do coco é proposital, a artista o utiliza como um “signo de representação da paisagem local”. “É como os coqueiros e as palmeiras, que desde o século XIX são usadas em pinturas e desenhos para representar o Brasil”, ressalta a artista.

 

A exposição terá, também, cinco versões da obra “Coração seguro”, escultura feita em metal com 1,20m de altura. No topo dela há uma pedra vermelha bem característica da região do Cariri, uma rocha sedimentar do tipo “Arenito da Formação Exu”, que tem 96 milhões de anos. Essa pedra é usada no calçamento da cidade, no revestimento de muros, e também está presente na fundação das casas. “A coloração avermelhada me faz lembrar um coração. Criei a escultura de forma que a pedra ficasse na altura do meu coração”, diz a artista. Essas esculturas estarão expostas na mostra e também haverá uma fotografia delas feita por Raquel Versieux, com a chapada do Araripe ao fundo.

 

Na exposição estarão, ainda, oito fotografias, que retratam a paisagem e o uso da terra. A artista destaca que os trabalhos têm uma relação entre si, não só por tratarem da saudade, mas também pela relação entre imagem, natureza e cultura. “A saudade a que me refiro não é só minha, mas também uma saudade do material com o qual trabalho. Penso na saudade que uma pedra é capaz de sentir ao ser quebrada, por exemplo, é uma saudade pré-histórica”, conta a artista. “A forma como observo e reconheço a terra e as práticas que nela acontecem, somada ao estado solitário em um novo contexto geográfico onde predomina a caatinga brasileira, me levaram à reflexão em torno dos sentidos de distância e saudade”, diz.

 

 

Residência artística no México

 

Raquel Versieux está há oito meses morando no Ceará. Durante este período, esteve também em residência artística por duas semanas no México, que foram importantes para ela concretizar tudo o que estava vendo e vivendo no nordeste do Brasil. A escultura “Coração Seguro”, por exemplo, surgiu no México e foi finalizada no Ceará. “Vi um operário construindo uma espécie de cone na Cidade do México, que seria preenchido de concreto e que serviria de base para um poste de luz. Ou seja, depois ele retornaria a terra. Me apropriei da forma, que me fez chegar nesta estrutura. Nela, vejo a relação entre um coqueiro e um poste de luz”, afirma.

 

 

Sobre a artista

 

Raquel Versieux nasceu em Belo Horizonte, em 1984. Dentre suas principais exposições individuais estão a mostra “Antes da última queima”, na Galeria de Arte IBEU, em 2015; “When the houses live”, na Six Galerija, na Croácia, e “A feira da incoerência”, na galeria Athena Contemporânea, ambas em 2013. Dentre suas principais exposições coletivas estão “Pavilhão Casa França-Brasil” (2016); “Aparição” (2015), na Caixa Cultural Rio de Janeiro; “Encruzilhada” (2015) e V Mostra/ Programa Aprofundamento, ambas na EAV Parque Lage; “Em desencanto” (2014), no Museu Mineiro, em Belo Horizonte; “Encontros Carbônicos” (2014), no Largo das Artes; “Imaginário (2013), no Museu de Arte do Rio; “Fronteiras (2013), no Espaço Cultural Sérgio Porto, no Rio de Janeiro; “Convite à viagem: Rumos Artes Visuais 2011 – 2013”, no Paço Imperial, Rio de Janeiro; “Entrecruzamentos” (2013), na Galeria Athena Contemporânea; “Á deriva: Rumos Artes Visuais 2011 -2013”, no Museu de Arte de Joinville, “Deslocamento F(R)Icção” (2012), no Galpão Capanema – Funarte, no Rio de Janeiro; “Perpendicular Fortaleza” (2012), no Centro Cultural Banco do Nordeste, em Fortaleza; “Convite À Viagem: Rumos Artes Visuais 2011-2013”, no Itaú Cultural, em São Paulo; “Mostra Energias na Arte Edp” (2010), no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo; “Hélio Oiticica: Museu É o Mundo”, no Itaú Cultural, em São Paulo, entre outros.

 

De 20 de outubro a 19 de novembro.

Galeria Millan exibe Tunga

13/out

Tunga, um dos mais potentes criadores da arte contemporânea brasileira, morreu precocemente em junho passado, aos 64 anos, deixando pronta aquela que seria a sua próxima exposição. A Galeria Millan, Pinheiros, São Paulo, SP,  dá continuidade aos planos do artista e inaugura, no dia 15 de outubro, em seus dois endereços, a mostra “Pálpebras”, reunindo um conjunto de trabalhos inéditos ou pouco vistos no Brasil.

 

Na sede da Millan poderão ser vistos os “Phanógrafos”, peças derivadas do série “Cooking Crystals” (2010). Pouco exibidas desde então, são caixas que servem como recipiente, ou suporte, para assemblages de diferentes objetos e materiais, como garrafas, cálices, âmbar, pedras ou elementos escatológicos. Objetos que, segundo Tunga escreveu, têm “algo de talismã, se configurando como uma lamparina”.

 

O segundo andar da galeria abrigará também projeções e desenhos, revelando, por exemplo, as conexões entre produções bidimensionais e tridimensionais, e enfatizando a importância da linha no trabalho do artista.

 

No Anexo Millan, novo espaço inaugurado em 2015, será exposta a série “Morfológicas”, esculturas orgânicas que remetem ao corpo, sensuais, por vezes surreais e muitas vezes eróticas – lembrando vulvas, glandes, línguas, bocas, dedos e seios – que se originaram de outros conjuntos de trabalhos (como a série “FromlaVoieHumide”, de 2014) mas nunca foram mostradas independentemente no Brasil, mesmo que respeitando sua posição um tanto indefinida entre estudo de forma (como indica o próprio título) e obra acabada.

 

Um desses projetos começou a ser confeccionado em grandes dimensões para a Feira Internacional de Arte Contemporânea (FIAC), em Paris. A peça, intitulada “A Seus Pés”, tem sete metros e – como é usual em seu trabalho – é composta por diferentes partes. O elemento central é uma forma roliça e longa, com unhas em cada extremidade, como se fossem dedos que apontam para lados distintos. A peça não chegou a ser fundida em versão final e o que o público verá é a prova de artista que há algum tempo habita o ateliê de Tunga.

 

“Pálpebras” não é uma tentativa de síntese ou de olhar retrospectivo, mesmo porque, no caso de Tunga, a noção de retrospectiva não faz sentido. Afinal, seu trabalho parece marcado por um retorno cíclico a um manancial de elementos, físicos e psíquicos, que ressurgem de tempos em tempos, transfigurados em diferentes leituras. É como se testemunhássemos, interagíssemos com fragmentos de alguma história ou ação passada, seja pelo caráter instável de seus arranjos, que permitem infinitas possibilidades de reagrupamento, seja pelas várias camadas de leitura que se sobrepõem, criando um hipnótico enigma.

 

Esses mesmos ecos temporais se fazem sentir nas obras mais recentes. Mesmo que em vários momentos assumam um caráter mais escultórico, os aspectos centrais de seus mais de 40 anos de intensa produção – período no qual Tunga flertou com o surrealismo, se avizinhou da arte conceitual e muitas vezes pareceu agir mais como um xamã ou um cientista – estão novamente presentes.

 

 

De 18 de outubro a 12 de novembro.

Formas de Maria Vasco

06/out

Maria Vasco é uma artista multimídia. Passeia pela poesia e música, mas é nas artes plásticas que sua criatividade transborda, há 49 anos. No dia 13 de outubro, às 19h, numa celebração do seu aniversário, ela apresenta a exposição “INCONES”, na HRocha Galeria, Shopping Cassino Atlântico, Copacabana, Rio de Janeiro, RJ. Os cones, forma geométrica que desde 2002 é peça de resistência em seu trabalho, já deram origem a obras lúdicas de planeta e bichos. Desta vez, confeccionados em tecido pintado e imantados, os cones caminham sobre 13 esculturas geométricas em ferro, produzindo uma obra dinâmica que permite total interatividade do público com as peças.

 

“A obra não é estática. Ela convida o espectador a participar da criação, instiga o olhar. “Volpiniando”, no lugar das bandeirinhas, pirei no cone e criei uma brincadeira que pode agradar crianças de 1 a 100 anos”, explica, com muito humor, a artista. Maria Vasco, que foi a primeira porta-estandarte da Banda de Ipanema, compôs com Luiz Brasil e Ary Dias a música “Tandan” que embala a performance que será apresentada no dia da vernissage, numa interação da atriz Renata Matos com uma instalação de fios elétricos e cone de tecido e já compôs com Paulinho da Viola, Paulo Moura, Armandinho, Moraes Moreira, além de ter lançado um livro de poemas eróticos com capa de Chico Caruso.

 

A mostra é composta por 13 esculturas que permitem uma interatividade do público com as obras. Na vernissage haverá uma performance na qual a atriz Renata Matos irá interagir com uma instalação de fios elétricos e cone de tecido. E a música que embala a performance foi idealizada pela própria artista, em parceria com Luiz Brasil e Ary Dias.

 

 

Sobre a artista

 

Maria Vasco começou sua carreira há 49 anos, pelas mãos de Djanira e estudou composição e desenho com Frank Sheaffer. Seu primeiro trabalho com cones aconteceu por acaso, a partir de um coador de pano, transformado em uma grande escultura. Sua exposição individual mais recente aconteceu no ano passado, na Galeria Cândido Mendes, em Ipanema. Como compositora, é parceira de Paulinho da Viola, Paulo Moura, Armandinho, Moraes Moreira, Luiz Brasil, Ary Dias e Toni Costa, além de já ter lançado um livro de poemas eróticos com capa do amigo Chico Caruso, que, aliás, se intitula “freguês” antigo e escreve sobre a nova exposição: “Maria Vasco, escultora, cada vez melhor.

 

 

De 13 de outubro a 19 de novembro.

Individual de JulioVillani

A galeria Mercedes Viegas Arte Contemporânea, Gávea, Rio de Janeiro, RJ, abriu ao público sua segunda exposição individual de Julio Villani com a mostra intitulada “Collapsible Structures”. Nela, o artista apresenta cerca de 20 obras inéditas de sua produção mais recente (2015- 2016), entre elas pinturas em técnica mista (carvão, acrílica e caulim sobre tela), colagens sobre papel e duas esculturas em alumínio com diversas dimensões.

 

Sua escolha deliberada por esse desdobramento, e a forma construtiva que lhe imprimiu, confere na sua obra uma dimensão dinâmica, que se determina paradoxalmente, pela unidade. Fio, linha, risco, laço, rede, nó, a arte de Julio Villani é habitada pela ideia de vínculo. Ela estrutura todos os trabalhos do artista, lhe é consubstancial. Seu trabalho se caracteriza a partir de polos e contrapontos, se construindo a partir da organização de um ir e vir. É entre os dois – no entre-dois, como diz o artista – que tudo se dá.

 

 

Até 29 de outubro.

O Útero do Mundo

05/set

O MAM, Parque do Ibirapuera, SP, retrata corpos indomáveis e histéricos na exposição “O útero do mundo”. A curadora Veronica Stigger selecionou cerca de 280 obras de 120 artistas contemporâneos em que o corpo aparece como lugar de expressão de um impulso desvairado e que se apresenta transformado, fragmentado, deformado, sem contorno ou definição. São pinturas, desenhos, fotografias, esculturas, gravuras, vídeos e performances do acervo do museu.

 

As obras, pertencentes ao acervo do MAM, mostram a indomabilidade e as metamorfoses do corpo. Com curadoria da escritora e crítica de arte Veronica Stigger, as produções selecionadas – num universo de mais de cinco mil trabalhos da coleção do museu – revelam um corpo que não respeita a anatomia e liberto de amarras biológicas e sociais. Baseada na proposição dos surrealistas de compreender a histeria como uma forma de expressão artística, a apurada seleção da curadora faz um elogio à loucura, ilustrando esse “corpo indomável” que, embora reprimido pela humanidade, manifesta-se no descontrole, na histeria e na impulsividade.

 

Para organizar a mostra, a curadora recorreu a três conceitos extraídos da obra da escritora Clarice Lispector que servem como fios condutores que separam os trabalhos nos núcleos “Grito ancestral”, “Montagem humana” e “Vida primária”. Segundo VeronicaStigger, a autora naturalizada brasileira retomou com brilho o elogio ao impulso histérico. “Clarice organizou um pensamento simultâneo da forma artística e do corpo humano como lugares de êxtase e de saída das ideias convencionais, tanto da arte quanto da própria humanidade”, afirma. São exibidas, conjuntamente, obras de artistas celebrados como Lívio Abramo, Farnese de Andrade, Claudia Andujar, Flávio de Carvalho, Sandra Cinto, Antonio Dias, Hudinilson Jr., Almir Mavignier, Cildo Meireles, Vik Muniz, Mira Schendel, Tunga, Adriana Varejão e muitos outros, além de duas performances de autoria de Laura Lima.

 

 

Grito Ancestral

 

Abrindo a mostra, “Grito ancestral” contém obras que representam uma série de gritos. “É como se esse som, anterior à fala e à linguagem articulada, atravessasse os tempos e rompesse com as próprias imagens”, explica a curadora. “O grito se contrapõe à ponderação e pode ser visto como indício de loucura. Gritar é, em certa medida, libertar-se das frágeis barreiras que delimitam aquilo a que convencionamos chamar de “cultura” em oposição à “natureza” e ao que há de selvagem e indomável em nós”, afirma. Nessa área estão expostos três autorretratos da série “Demônios”, espelhos e máscaras celestiais, de Arthur Omar, artista com trabalhos que demonstram estados alterados de percepção e de exaltação. Também fazem parte a fotografia “O último grito”, de Klaus Mitteldorf; a colagem “Medusa marinara”, de Vik Muniz; fotos de performances de Rodrigo Braga; a gravura “Mulher”, de Lívio Abramo; além de imagens em preto e branco de Otto Stupakoff. Com a série “Aaaa…”, a artista Mira Schendel apresenta uma escrita que não constitui palavras ou frases e em que se percebe a desarticulação da linguagem e uma volta ao estado mais bruto e inaugural.

 

 

Montagem humana

 

Neste nicho são apresentados corpos fragmentados, transformados, deformados e indefinidos, o que prova a indomabilidade do mesmo. Na exposição é percebido como o traço se convulsiona nas obras intituladas “Mulheres”, de Flávio de Carvalho, nos desenhos de Ivald Granato e nas produções de Tunga, Samson Flexor e Giselda Leirner. Nas fotografias, é a falta de foco que borra o contorno da figura nas imagens de Eduardo Ruegg, EdouardFraipont e Edgard de Souza. Com o uso da radiologia, é possível verificar o interior do corpo humano nas obras de Almir Mavignier e Daniel Senise. Destacam-se ainda as fotografias feitas por Márcia Xavier, um desenho de Cildo Meireles e as produções que misturam imagens, couro e madeira de Keila Alaver que representam, literalmente, corpos transformados e fragmentados.

 

 

Vida Primária

 

Este nicho dá vez às formas de vida mais elementares, como fungos, flores e folhagens. “Este tipo de vida desestabiliza a percepção que temos da própria vida porque, de certa maneira, deteriora as coisas do mundo “civilizado”, explana VeronicaStigger. Isso é ilustrado na série “Imagens infectas”, de Dora Longo Bahia, em que um álbum de família é alterado pela ação de fungos. Em “Vivos e isolados”, Mônica Rubinho usa papéis propositalmente fungados em placas de vidro para promover a geração desta espécie. No vídeo “Danäe nos jardins de Górgona” ou “Saudades da Pangeia”, Thiago Rocha Pitta propõe uma leitura mitológica da vida primária. Ainda são exibidas partes do corpo como o coração feito de bronze, de autoria de José Leonilson, e a foto “Umbigo da minha mãe”, de Vilma Slomp. A vagina, porta de entrada e de saída do útero, é mostrada em diversos trabalhos como nas gravuras de Rosana Monnerat e de Alex Flemming, nas fotografias da série “Vulvas”, de Paula Trope e no desenho “Miss Brasil 1965”, de Farnese de Andrade.

 

 

 

Sobre a curadora

 

Veronica Stigger é escritora, crítica de arte e professora universitária. Possui doutorado em Teoria e Crítica de Arte pela USP e pós-doutorados pela Universitàdegli Studi di Roma “La Sapienza”, pelo MAC-USP e pelo Instituto de Estudos da Linguagem da UNICAMP. É professora das pós-graduações em Fotografia e em História da Arte na FAAP, além de coordenadora do curso de Criação Literária da Academia Internacional de Cinema (AIC). Foi curadora de Maria Martins: metamorfoses no MAM São Paulo (2013) e ganhou o Grande Prêmio da Crítica da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) e o Prêmio Maria Eugênia Franco, concedido pela Associação Brasileira de Críticos de Arte (ABCA) de melhor curadoria. Com Eduardo Sterzi, curou “Variações do corpo selvagem: Eduardo Viveiros de Castro”, fotógrafo, no SESC Ipiranga. Entre as publicações, estão Os anões (SP: Cosac Naify, 2010), Delírio de Damasco (SC: Cultura e Barbárie, 2012) e Opisanieświata (SP: Cosac Naify, 2013).

 

 

De 05 de setembro a 18 de dezembro.

Calder e a Arte Brasielira

Em “Calder e a Arte Brasileira”, o Instituto Itaú Cultural, Cerqueira César, São Paulo, SP,lança luz sobre a influência no Brasil da obra do artista norte-americano, pioneiro da arte cinética, e traz à tona a importância de seu papel na formação do neoconcretismo no país.A leveza, movimento e colorido da obra de Alexander Calder em materiais como o metal, o ferro e o arame inundam os três andares do espaço expositivo do Itaú Cultural. Com curadoria de Luiz Camillo Osorio, e em parceria com a Expomus e a Calder Foundation, conduzida por Alexander S. C. Rower, neto do artista, em Nova York, a mostra apresenta 60 peças – 32 do próprio artista, entre móbiles, guaches, maquetes, desenhos, óleos sobre tela e dois audiovisuais. Outras 28 são produções de 14 brasileiros, que revelam a proximidade de seu trabalho ao do artista.

 

Nos anos 40 e 50, experimentalistas como Abraham Palatnik, Lygia Clark, Hélio Oiticica, Willys de Castro, Judith Lauand, Lygia Pape, Waltercio Caldas, Antonio Manuel e Luiz Sacilotto também embarcaram no caminho da arte cinética influenciando gerações até hoje. A influência se detecta em Ernesto Neto, Franklin Cassaro, Carlos Belvilacqua, Cao Guimarães e RivaneNeuenschwander, igualmente presentes na exposição.

 

Segundo Luiz Camillo Osorio, a poética de Calder, cujo rigor construtivo ganha tonalidade lírica, é uma referência para os artistas brasileiros, com quem teve relação estreita, porém ainda pouco afirmada. Existem obras suas em coleções brasileiras desde os anos de 1940, por meio das quais pode se seguir o rastro de sua influência na vanguarda do país. O movimento presente nos móbiles do norte-americano, por exemplo, está também na série de “Bichos”, de Lygia Clark, nos relevos espaciais dos “Parangolés” de Oiticica e nos “Cinecromáticos” de Palatnik.Alexander S.C. Rower relata: “A visita do meu avó ao Brasil teve um impacto duradouro, tanto emocional como intelectual. Ele ficou fascinado pela exuberância e energia da cultura brasileira – ele amou especialmente o samba. No sentido inverso, seus móbiles cativaram os artistas brasileiros e a classe artística. A exposição no Itaú Cultural apesenta esse fascinante diálogo – afirmando mais uma vez a afinidade de Calder com o espírito brasileiro”.

 

O artista norte-americano realizou a sua primeira exposição no Brasil no final da década de 1940. Passados 13 anos, participou da segunda Bienal de São Paulo deixando influências diretas no imaginário poético no país. Sua relação com os arquitetos modernos foi próxima. Também com o crítico de arte Mario Pedrosa, que teve posição determinante para que se realizasse uma retrospectiva de Calder no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, em 1959. “A sua obra inscreveu-se na formação construtiva brasileira, misturando o lúdico e o geométrico e isso merece melhor avaliação histórica”, observa o curador. “É esta relação que pretendemos trabalhar nesta exposição.”

 

A mostra “Calder e a Arte Brasileira”, de acordo com Luiz Camillo Osorio, busca evidenciar essa relação e a sua disseminação no imaginário artístico brasileiro, além de mostrar importantes trabalhos da trajetória do norte-americano. “Apresentamos obras de alguns de nossos artistas que foram, direta ou indiretamente, marcados por ele”, diz o curador.A relação geracional com a tradição concreta e neoconcreta, a vontade comum de concentração e expansão da forma abstrata -no plano pictórico e fora dele -, são conferidas no piso -2.De Calder encontram-se ali, entre outras obras, guaches sobre papel, “Sem título”, de 1946, “Composição”, do mesmo ano e doada pelo artista ao MASP, em 1948. Elas figuram no mesmo espaço que Abraham Palatnik com “Aparelho cinecromático”, 1969/86, “Objeto Cinético”, 1986, e mais um de mesmo nome, de 1990/1991. Lygia Clark, entre outros brasileiros, está presente neste andar com o guache, nanquim e grafite sobre papel “Composição”, 1952. De Hélio Oiticica tem “Mestaesquema”, um de 1957, outro de 1958. Só para citar mais alguns, este andar comporta “Ascenção”, de 1959, de Willys de Castro e, ainda, “Concreto 28”, obra de Judith Lauand, de 1956.

 

No piso -1, a linha curatorial sugere o desdobramento subliminar da influência de Calder na arte contemporânea brasileira. “O ponto que cabe ressaltar aqui é a presença do corpo na ativação da forma, a incorporação do movimento e da geometria atravessados por um contexto social e cultural específico, onde passado e futuro se entrecruzam”, observa o curador. De Calder, estão ali, por exemplo, a maquete “Brasília” (c.a.1959), “Móbile amarelo”, preto, vermelho, branco, de 1946. Dos brasileiros, encontram-se dos “Bichos” de Lygia Clark, dos “Bilaterais” e “Parangolés”, de Hélio Oiticica, às esculturas de Waltercio Caldas, de 1997 e 2002, “NaveMeditaFeNuJardim”, 2015, de Ernesto Neto e “Catamarã Aéreo”, 1997, de Carlos Bevilacqua.Por fim, no primeiro andar, os móbiles desenham-se no espaço, desmaterializam-se, resistem à gravidade. Citando algumas das obras de Calder que ali convivem, estão “Vermelho, Branco, Preto” e “Bronze”, 1934, nunca antes exibida no Brasil, “Digitais Escarlate”, 1945 – obra de extrema importância que não é exposta há mais de 60 anos, nunca esteve no Brasil e sempre foi mantida com a família do artista -, “Bosquet é o Melhor dos Melhores”, 1946, “Trinta e dois discos”, 1951, exibida na Bienal de São Paulo, em 1953-1954. Elas dialogam com produções como “O ar mais próximo”, 1991, de Waltercio Caldas, “Três Cassarinhos Vermelhos na Gaiola”, 2010, de Franklin Cassaro, ou “Sopro”, 2000, de Cao Guimarães e RivaneNeuenschwander.

 

Neto de Calder e condutor da mostra, Alexander S.C. Rower reforça a identidade brasileira do avô relatando que sua visita ao Brasil teve um impacto tanto emocional como intelectual. “Ele ficou fascinado pela exuberância e energia da cultura brasileira”, conta.

 

 

Até 23 de outubro.

Portugal contemporâneo

01/set

O Museu Afro Brasil, instituição da Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo, situado no Portão 10, Parque do Ibirapuera, São Paulo, SP, inaugura a exposição temporária “Portugal Portugueses – Arte Contemporânea”. Considerada a maior exposição de arte portuguesa contemporânea já realizada no país, a mostra integra uma trilogia sobre a mais nova produção artística da África, de Portugal e do Brasil com patrocínio das empresas EDP Brasil, com apoio do Instituto EDP, Banco Itaú e Rainer Blickle, Leonardo Kossoy e Orandi Momesso.

 

“Portugal Portugueses” é a segunda exposição dentro da proposta da trilogia desenvolvida pelo curador da mostra, Emanoel Araujo, responsável por homenagear as principais raízes da cultura brasileira (africana, portuguesa e indígena) à luz de uma leitura contemporânea nas artes visuais. Esta grande mostra sucede “AfricaAfricans”, recentemente eleita pela Associação Brasileira de Críticos de Arte como a melhor exposição do ano de 2015.

 

Uma seleção de mais de 40 artistas, de profundos vínculos com o país lusitano, apresentará trabalhos que contemplam recortes artísticos diversos. Um grande destaque é a participação de artistas modernistas consideradas pelo curador a base da contemporaneidade portuguesa, mulheres que tornaram proeminentes a arte lusitana no circuito internacional através de obras surrealistas, geométricas e que se conectam com Brasil e a África.

 

 

Artistas participantes

 

“Portugal Portugueses” contará com obras de grandes nomes como: Albuquerque Mendes, Ana Vieira, Antonio Manuel, Artur Barrio, Ascânio MMM, Cristina Ataíde, Didier Faustino, Fernando Lemos, Francisco Vidal, Gonçalo Pena, Helena de Almeida, Joana Vasconcelos, João Fonte Santa, João Pedro Vale e Nuno Alexandre, Joaquim Rodrigo, Joaquim Tenreiro, José de Guimarães, José Loureiro, José Pedro Croft, Jorge Molder, Julião Sarmento, Lourdes Castro, Manuel Correia, Maria Helena Vieira da Silva, Michael de Brito, Miguel Palma, Nuno Ramalho, Nuno Sousa Vieira, Orlando Azevedo, Paula Rego, Paulo Lisboa, Pedro Barateiro, Pedro Cabrita Reis, Pedro Valdez, Rui Calçada Bastos, Sofia Leitão, Teresa Braula, Tiago Alexandre, Vasco Araújo, Vasco Futscher e Yonamine.

 

 

A palavra do curador

 

“Por muitas razões a arte portuguesa tem um leque enorme de situações que nos comovem, talvez porque nela existam resquícios da África, do Brasil e dela mesma, naturalmente. Esta exposição celebra uma união inevitável de encontros e desencontros do que foi e do que é a nossa formação como povo, descoberto, colonizado e independente, por um português e um brasileiro, Pedro IV, rei de Portugal, que se tornou Dom Pedro I – Imperador do Brasil, e como esta independência que tão cedo foi, não nos afastou, mas consolidou as raízes profundas dessa invenção. Portugal é muito mais que um país, é uma aventura, como nos outros tempos memoráveis, senhor das conquistas e das descobertas, do Brasil e da África, pelo mundo afora. Portugal foi um terrível escravocrata, e se valeu da escravidão negra para desenvolver suas descobertas na América e na própria África, também foi um colonizador que se miscigenou e espalhou artes e ofícios.”, comenta Emanoel Araujo, fundador e Diretor Executivo Curatorial do Museu Afro Brasil.

 

“… A arte é uma antena para captar e expressar sentimentos aleatórios e arcaizantes. É através dela, e de seus laços no inconsciente coletivo, que manifestações representam os lados triangulares da invenção. E, é nessa invenção que “Portugal Portugueses” se arma para mostrar uma faceta desta arte portuguesa contemporânea, revelando a modernidade e a sua atualidade. Claro que, em se tratando de expressões artísticas, nem sempre as escolhas são totalmente abrangentes. São muitos os artistas seminais de uma grande história da arte portuguesa moderna e contemporânea. Evidentemente, esta exposição não tem um caráter didático e nem esgota o assunto diante da complexidade de tantos autores.”.

 

 

Sobre a exposição

 

O modernismo das artistas Maria Helena Vieira da Silva, Ana Vieira, Helena de Almeida, Paula Rego e Lourdes Castro, formam um núcleo poderoso de mulheres criadoras, que incorporam com suas obras e linguagens, uma valiosa contribuição à arte contemporânea portuguesa. É, a partir delas, que “Portugal Portugueses” se desenha, abrindo espaço, através de diferentes linguagens e estratégias como a geometria, instalações, esculturas, fotografias, desenhos e grandes painéis, reunindo consagrados nomes aos novos talentos que despontam. Dentre eles, podemos citar a instalação de João Pedro Vale e Nuno Alexandre. Feito de collants, tecido, ferro, arame, corda e espuma, “Feijoeiro” é uma instalação de grandes dimensões. Semelhante ao tradicional conto infantil, este enorme pé de feijão chama a atenção de adultos e crianças com suas cores fortes e vibrantes, um convite à interação.

 

Dentre os vários trabalhos selecionados, há aqueles com dedicada atenção aos diálogos entre o Brasil e o continente africano. É o caso do artista português, Vasco Araújo, conhecido no cenário artístico paulistano, seus trabalhos articulam questões políticas às heranças de um passado colonial. “O Inferno não são os outros” é uma obra que provoca a reflexão sobre os limites de nossas decisões e ações, colocando em cheque as barreiras entre aquilo que parece ser da ordem do privado, mas que está repleto de consequências na dimensão política do mundo, principalmente no mundo ocidental.

 

A série “Pau Brasil”, de autoria de Albuquerque Mendes, também compõe a mostra fazendo uma ponte entre Portugal e uma antiga colônia – o Brasil. Nela, o pintor expõe a diversidade de estilos humanos, explorando a miscigenação tanto em nosso país quanto em Portugal. Seus quadros retratam homens e mulheres negros, brancos e indígenas sempre em poses semelhantes, explorando tanto a diversidade étnica quanto propondo as semelhanças entre as pessoas.

 

A exposição traz também jovens artistas como Sofia Leitão e Teresa Braula. Leitão inicia seus primeiros trabalhos em 2003 e desde então mantém um delicado olhar sobre a cultura de seu país por meio de soluções visuais exuberantes. Suas grandes instalações já se destacaram quando foram expostas em cidades portuguesas como Porto e Lisboa. Para a mostra no Museu Afro Brasil, teremos a oportunidade de apreciar “Matéria do Esquecimento”. Já Teresa Braula, expoente artista no circuito europeu, apresenta suas investigações sobre o espaço e o lugar da memória.

 

Dentre os reconhecidos nomes da arte contemporânea portuguesa, o fotógrafo Jorge Molder apresenta a série “Dois Deles”, onde investigações sobre a auto representação se mesclam a própria presença do artista em meio a uma longa sequência de práticas reflexivas, sugerindo um complexo repertório visual.

 

Parcerias com galerias, colecionadores e os próprios artistas portugueses estão sendo importantes para a realização deste projeto, como é o caso da Galeria Filomena Soares, que possibilita conhecer importantes obras. Como a série de grandes painéis fotográficos “Explorers” do artista Didier Faustino e “Lookingback” da artista Helena Almeida, além da intrigante obra em vidro acrílico da artista Lourdes Castro e produções de Joaquim Rodrigo, Paula Rego e os desenhos em grafite de Pedro Barateiro.

 

 

 Homenagens

 

Simultaneamente a “Portugal Portugueses”, acontecerão no museu três homenagens póstumas a importantes personalidades portuguesas: Beatriz Costa, grande atriz de cinema e teatro, sua trajetória teve importante participação no teatro brasileiro; Rafael Bordalo Pinheiro, ceramista e caricaturista que criou importantes revistas no Brasil do século XIX, e também pelos 170 anos de seu nascimento; e Amadeo de Souza Cardoso, um pintor revolucionário, o Museu Afro Brasil apresenta uma reprodução dos desenhos do álbum XX Dessins, editados recentemente na exposição retrospectiva dedicada ao artista, realizada no Grand Palais de Paris.

 

Uma sala especial homenageará a artista portuguesa Maria Helena Vieira da Silva, que viveu no Brasil no período entre 1940 e 1947, convivendo com outros artistas europeus residentes no país, além de intelectuais e pintores brasileiros.

 

 

Encontro com os artistas

 

No dia seguinte à abertura da mostra, a instituição realiza um encontro com alguns dos artistas convidados, para um debate com o público sobre suas produções e questões tratadas pela exposição.

 

 

 

Até 08 de janeiro de 2017.

Ponto Transição

31/ago

O Centro de Artes Visuais da Funarte / MinC realiza, a exposição “Ponto Transição”, que reúne trabalhos de 30 artistas e coletivos contemporâneos de diversas linguagens e tendências, articulados em um circuito de espaços no interior da Fundição Progresso. As obras foram selecionadas pelos curadores artísticos Luiza Interlenghi, Sonia SalcedodelCastillo e Xico Chaves, do Centro de Artes Visuais da Funarte/MinC, a partir do grande universo de artistas que participaram nos últimos doze anos de editais da instituição, em um amplo processo de mapeamento da produção de artes visuais que envolveu críticos de todo o país. “Ponto Transição” integra a programação cultural dos Jogos Paralímpicos no Rio de Janeiro, e os trabalhos expostos compreendem intervenções urbanas, poemas visuais, fotografia, audiovisuais, videoinstalações, esculturas, objetos, trabalhos de coletivos artísticos e outras formas de múltipla expressão.  Haverá ainda uma intensa programação de performances e conversas abertas ao público, com artistas e pensadores.

 

Muitas obras foram feitas especialmente para esta exposição, como é o caso dos artistas Alex Hamburger, Alexandre Dacosta, Ana Muglia, Franklin Cassaro, Helena Trindade, Hugo Houayek, João Modé, Raul Mourão, Ricardo Basbaum, com João Camillo Penna, Thomas Jeferson, Coletivo Vade Retro Abacaxi, Valéria Costa Pinto, Victor Arruda e Wlademir Dias-Pino, com Regina Pouchain. Outros artistas irão recriar trabalhos emblemáticos, como Ana Vitória Mussi, Armando Queiroz, Chang Chi Chai, Eduardo Coimbra, Elisa de Magalhães, Irmãos Guimarães, Marcio Zardo, Marcos Bonisson, Marcos Chaves, Martha Niklaus, Ricardo Aleixo, Ronald Duarte, Suzana Queiroga, Tchellod`Barros e Tina Velho. A Galeria Transparente, projeto com curadoria de Frederico Dalton, terá um território na exposição para uma programação própria de performances, com os artistas Nivaldo Carneiro, TetsuoTakita, Rodrigo Munhoz, Pedro Paulo Domingues, Helena Wassersten, Crioulos de Criação, Coletivo S.T.A.R., Clarisse Tarran& Edu Mariz, Monica Barki, Lilian Amaral e André Sheik.

 

Para Xico Chaves, diretor do Centro de Artes Visuais da Funarte, “…a exposição traduz um momento de transição das artes visuais, que o Brasil representa bem”. “Estamos em uma transição mundial, global. As artes visuais estão acolhendo experimentações que não podem ser realizadas no campo de outras linguagens. Nas artes visuais essas manifestações encontram uma liberdade e um espaço de concepção e amplitude irreversíveis”, afirma. “Neste momento de transição, você vai encontrar uma diversidade múltipla, e não uma sequência de performances similares”. Ele destaca que a Funarte “tem como função estimular o que não está no mercado”. “Institucionalmente tem que atender a esses processos de experimentação”.

 

“Ponto Transição” também coloca em evidência o trabalho curatorial. Xico Chaves acentua que “esta é uma oportunidade de trazer a curadoria de volta à instituição, que conta com profissionais altamente qualificados”. “A Funarte criou um campo de expansão permanente, aceleradíssimo, em que foi tudo incorporado: poesia visual, performances, intervenções urbanas, coletivos, uma nova abordagem sobre o objeto, novas tecnologias, obras que não se classificam de uma forma só, sem excluir as expressões artísticas convencionais.

 

 

 

Arte em campo instável

 

Luiza Interlenghi situa a exposição em um recorte da arte em campo instável, área que pesquisa há quatro anos. “Buscamos mostrar as poéticas de artistas que se posicionam em uma transição, entre espaços tradicionais da arte e os não artísticos, galerias e ruas, subvertendo a relação do trabalho com as instituições”, explica. “Outra discussão que está presente em trabalhos de vários artistas é a liquidez de fluxo, de sociedade de transição, de uma cultura movente, que demanda sempre um posicionamento individual a cada momento”. Ela ressalta que esta é uma discussão já travada nas ciências sociais por ZygmuntBauman e Anthony Giddens, mas “que permite um olhar para esta produção contemporânea que lida com este fato de uma maneira poética, lúdica, às vezes crítica”. “A curadoria acolheu a transição, os processos, as linguagens dos artistas, e dialogou com o espaço da Fundição. Vai haver um espaço de reflexão, de conversa, de estar, uma sala multiuso, com vídeos, publicações de arte, disponíveis para o público”, destaca.

 

 

Poesia expandida

 

Sonia Salcedo acentua que as obras da exposição lidam com essa questão da arte fora do cubo hermético, branco. “Buscamos reunir elementos das artes visuais que tratassem desse aspecto, esta confluência dessas linguagens mais transitórias, que deu origem a esta proposta de ‘Ponto Transição’, ao invés de objetos de arte convencionais”. Ela acentua que a expografia não será apenas uma arquitetura expositiva, e sim “uma extensão, no espaço, do conceito curatorial”. “A exposição lida com essas camadas de um processo de hibridização da arte, no qual as categorias, os modos antes evocados para uma classificação, essas barreiras são destituídas, desmoronam, e nos estilhaços há uma migração de linguagem, meios, suportes, em que se encontra um terreno muito profícuo da poesia expandida, que é pra onde converge meu entendimento do fazer curatorial”, explica. Ela acrescenta que a curadoria buscou “familiarizar o espaço com a poética que cada artista está desenvolvendo”. “Não existe um roteiro, uma circulação linear”, diz.

 

 

De 1º a 18 de setembro.

Na Galeria Marcia Barrozo do Amaral

26/ago

Wilson Piran costuma destacar a riqueza visual da geometria, cuja simplicidade não elimina a intensidade e o encantamento. O artista costuma impactar o visitante fazendo-o refletir sobre a necessidade de recuperar o lúdico e a alegria na arte. Com a série “Volúpias”, Piran comemora 40 anos no cenário da arte contemporânea em mostra inédita na Galeria Marcia Barrozo do Amaral, Copacabana, Shopping Cassino Atlântico, Rio de Janeiro, RJ, com abertura marcada para o dia 13 de setembro. O dicionário define “Volúpia” como o grande prazer dos sentidos e sensações, formas e cores, e é o que Piran vem buscando através de esculturas em aço inox, produzidas com corte a laser, que vem sendo estudadas por ele há alguns anos. Em cores primárias e em aço inox aparente, as 14 peças permitem explorar possibilidades, sem uma posição definitiva.

 

 

Ao longo desse percurso o artista realizou sucessivas pesquisas de materiais, tais como papel, decalques, madeira, tecidos, purpurinas, acrílico, entre outros, apresentando trabalhos de caráter conceitual, mas sempre aliados à matéria. Com estes trabalhos participou de várias exposições coletivas e individuais, recebeu prêmios e tem obras incluídas em coleções importantes, tais como a coleção Gilberto Chateaubriand, coleção Luiz Chrysostomo de Oliveira e a coleção Randolfo Rocha. “Constelação”, obra que integra a coleção Gilberto Chateaubriand no MAM RJ, é emblemática desse período e apresenta nomes dos principais artistas brasileiros, realizados em madeira recoberta de purpurina, num verdadeiro work in progress, pois vem ao longo dos anos incorporando nomes de artistas das novas gerações. “Constelação” foi exposta pela primeira vez, na sua forma original, em 1982, na galeria de Marcia Barrozo do Amaral.

 

 

Novas pesquisas levaram o artista a explorar o papel cartão e o plástico poliestireno, com recortes, dobras e curvas que se entrelaçam em formas sinuosas e sensuais. “Senti a necessidade de procurar um material mais resistente que me permitisse realiza-los de forma mais estruturada. Surgiu o aço inox, e através dele venci o desafio de realizar formas maleáveis, apropriadas para o jogo visual pretendido, de exploração das sinuosidades, dos volumes, dos espaços vazios, das cores”, conta Wilson Piran.

 

 

A palavra do crítico

 

“Artista com forte influência da pop art, Piran acrescenta sensualidade, comunicação e encantamento nessa trigonometria provocante; seus objetos se deslocam diante do nosso olhar, brincam, dançam, tremulam repletos de musicalidade. Curvas niemeyerianas, bichos e trepantes, farfalhantes, eles abraçam o universo popular, cestarias, fuxicos, alma barroca popular brasileira. E assim eles se apresentam ao público: retratos do Brasil, sofisticados e simples, concretos e misteriosos, prenhes de beleza e sedução, brinquedos encantados que traduzam a nossa formação mestiça. E se, hoje, a arte não se proclama mais como a voz da transformação, esses recentes trabalhos de Wilson Piran colaboram para a realização de um presente mais sensível, bonito e verdadeiro”, destaca Marcus de Lontra Costa, que assina o texto da mostra.

 

 

De 13 de setembro a 15 de outubro.

Ofício e engenho

25/ago

A arte popular de Silvio Nunes Pinto,Fundação Vera Chaves Barcellos,Viamão, RS, cuja exposição chamada “Ofício e Engenho”, será inaugurada exposição neste sábado, 27 de agosto, apresentando peças e esculturas do artesão morto aos 65 anos. Ao longo de 40 anos, Silvio Nunes Pinto fez de sua pequena oficina de marcenaria, em Viamão, um universo particular no qual deu forma a uma série de engenhosos objetos em madeira. Quando ele morreu, em 2005, a artista Vera Chaves Barcellos decidiu entrar nesse espaço de criação tão íntimo para ver o quanto dessa produção havia sido ali guardada ao longo do tempo.

 

A surpresa foi não só encontrar centenas de peças nunca vistas, mas descobrir que se tratava de um conjunto de trabalhos de força expressiva, situados na tênue linha do que separa o que é arte ou artesanato, artista ou artesão, estético ou utilitário.

 

– O Silvio chamava esse espaço de “meu ateliê”, e os trabalhos dele, de “minha obra” – comenta Vera, que o conheceu ainda nos anos 1960.

 

Autodidata e sem nenhuma instrução artística, Nunes Pinto deu origem a objetos e esculturas que intrigam pela originalidade das construções e pelo grau de invenção formal que ultrapassa a função utilitária. Esse caráter o vincula a toda uma linhagem da chamada arte popular ou naïf. Também pelo fato de que a matéria é a madeira, seja ela trabalhada no entalhe ou como módulos a serem acoplados na elaboração de objetos. E porque a natural feição rústica confere às inventivas criações uma atemporalidade típica da arte primitiva.

 

– Ele não tinha formação artística, mas era muito habilidoso, observador e tinha uma grande sensibilidade – comenta Vera. – A criatividade e certo humor fazem com que muitas das peças não sejam decifradas de primeira em seu motivo ou utilidade.

 

Objetos que chamam atenção pela inventividade podem ser vistos como esculturas

 

Nesse sentido, os móveis nunca parecem ser exatamente móveis, tamanha é a estranheza causada pelo design inusitado. O mesmo vale para os objetos que Nunes Pinto considerava decorativos por não terem função, mas que, observados agora, podem facilmente ser reconhecidos como esculturas. Na exposição, também podem ser vistas diversas ferramentas igualmente intrigantes que o próprio Nunes Pinto construiu, mas não sem subverter a feição que habitualmente se esperaria de instrumentos funcionais. Tudo isso criado no pequeno ateliê que foi reproduzido na exposição em suas dimensões originais para exibir um vídeo com imagens captadas no original espaço de trabalho.

 

Texto de Francisco Dalcol para o jornal Zero Hora/Porto Alegre.