Galatea anuncia mostra inaugural

26/out

 

José Adário é a exposição que inaugura dia 09 de novembro o espaço físico da Galatea e a primeira individual do artista na cidade de São Paulo. A mostra conta com textos críticos de Alana Silveira, produtora e pesquisadora baiana que acompanha Adário há mais de três anos, e Rebeca Carapiá, artista baiana que trabalha com linguagens construídas a partir da lida com o ferro, além de projeto expográfico de Tiago Guimarães. A exposição reúne mais de cinquenta esculturas, em sua maioria criadas para a ocasião, que serão acompanhadas de fotografias de Adenor Gondim, fotógrafo baiano que retrata José Adário no contexto de seu ateliê há mais de três décadas

José Adário (1947) nasceu no bairro de Caixa d’Água, em Salvador, na Bahia. Foi iniciado aos 11 anos de idade no trabalho de ferreiro de candomblé pelo seu mestre e mentor Maximiano Prates, cuja oficina, situada na histórica Ladeira da Conceição da Praia, foi passada para Adário, que ali trabalha até hoje. As ferramentas de santo, esculturas de ferro que operam, no candomblé, uma espécie de mediação entre os homens e os orixás, entre o mundo físico – Aiyê – e o mundo espiritual – Orum -, são utilizadas nos terreiros em rituais e para devoção. Por produzi-las com grande sofisticação formal e originalidade, José Adário, também chamado de Zé Diabo, passou a ser reconhecido não só como o escultor-ferreiro mais celebrado dos terreiros de candomblé da Bahia, mas como um artista cuja prática é intimamente vinculada às raízes afro-diaspóricas da cultura de sua região – lembremos que Salvador é considerada a cidade mais negra fora da África.

As ferramentas produzidas por José Adário vinculam-se a diferentes orixás que “trabalham com o ferro”, que o possuem como matéria-prima – a começar por Ogum, o guerreiro e senhor das tecnologias. Cada ferramenta traz, de forma geometrizada, signos e aspectos gráficos vinculados à mitologia de cada entidade. Exu, o primeiro orixá no panteão das divindades iorubás, é o mensageiro entre os humanos e os deuses, a corporificação da encruzilhada, e é evocado através de formas que reproduzem os pontos riscados de cada qualidade distinta da entidade (Gira Mundo, Tranca Rua, Caveirinha), compostos por tridentes, lanças, círculos etc. A ferramenta de Ogum, entre as suas variações, trará sempre um arco de onde penderão utensílios agrícolas (machados, pás, facas, foices, lanças, martelos, enxadas, tesouras), sempre em número 7 ou seus múltiplos. Oxóssi, o caçador, tem como símbolo maior o arco e a flecha, seus instrumentos. Ossain, o senhor das ervas, frequentemente contará com folhas e um pássaro no topo de sua ferramenta. Oxumarê, termo de origem iorubá que significa “arco-íris”, é o orixá dos ciclos e da transformação, sendo frequentemente simbolizado por uma ou mais serpentes que envolvem a haste principal da escultura.

O reconhecimento do trabalho de José Adário não vem de hoje. Já em 1968, o estadunidense historiador da arte Robert Farris Thompson (1932-2021), especialista em arte e cultura afro-americana, conheceu o trabalho de Adário em visita à cidade de Salvador, incorporando-o à sua pesquisa. Assim, podemos encontrar menções e análises das esculturas em diversos livros e artigos, como Icons of the Mind: Yoruba Herbalism Arts in Atlantic Perspective (Ícones da mente: artes do herbalismo iorubá na perspectiva atlântica) (1975), Flash of the Spirit: African & Afro-American Art & Philosophy (A carne do espírito: arte & filosofia africana e afro-americana) (1983) e Face of the Gods: Art and Altars of Africa and the African Americas (A face dos deuses: arte e altares da África e das Américas Africanas) (1993). Em todos eles, Farris descreve e relaciona os signos abordados por Adário com a iconografia e liturgia dos povos iorubás, cujas tradições foram trazidas ao Brasil por populações negras escravizadas vindas dos territórios que hoje são países como Nigéria, Benin e Togo.

No que tange à inserção de José Adário no circuito brasileiro das artes, ela se deve, em grande parte, às iniciativas curatoriais do artista e curador Emanoel Araújo (1940-2022) a partir da década de 1990. Adário esteve presente em algumas das principais exposições em que Araújo pôde reunir e difundir a arte e a cultura afro-brasileira, até então fortemente negligenciadas pelas nossas instituições. Entre as mostras, estão: Os herdeiros da noite – fragmentos do imaginário negro, Pinacoteca do Estado de São Paulo, 1994; Arte e religiosidade no Brasil: heranças africanas, Pavilhão Padre Manoel da Nóbrega – Parque do Ibirapuera, São Paulo, 1997; e A África por ela mesma, Pavilhão Padre Manoel da Nóbrega – Parque do Ibirapuera, São Paulo, 1998.

Para Adário, trabalhar com o ferro é se inscrever na linhagem de descentes de Ogum a que pertence: seus pais, avós e bisavós todos tinham alguma relação com esse orixá. E, como explica Farris Thompson, Ogum “vive nas chamas da forja do ferreiro, no campo de batalha e, mais especificamente, no fio da faca.” Assim, a prática de José Adário é uma forma de conexão e reverência à entidade. Para além da destreza técnica, fazer as ferramentas de santo requer sensibilidade para que se possa captar os desejos do orixá que dará vida e energia ao artefato. É como se a construção de cada ferramenta partisse do anseio da própria entidade em materializar-se no mundo, sendo o artista, neste caso, o mediador, unindo o campo espiritual e material. Não por acaso, José Adário também é considerado um grande babalorixá.

 

 

Galeria Movimento comemora um ano na Gávea

 

A Galeria Movimento comemora um ano de sua sede na Gávea com a exposição “Oráculo” que reúne pinturas inéditas de Marcela Gontijo com abertura no dia 05 de novembro, às 14h. A artista nasceu em Belo Horizonte e está radicada em Brasília. Marcela Gontijo usou o tratado milenar chinês “I Ching” (o “Livro das Mutações”) para criar uma série de obras em que adiciona o acaso – os hexagramas resultantes do jogo de moedas – a seu processo de construção das tramas de linhas horizontais e verticais em cores fortes. Marcela Gontijo tomou contato com o “I Ching” quando morou em Hong-Kong, entre 2012 e 2015, e ao voltar ao Brasil começou a experimentar este sistema em seu trabalho, cujos resultados são agora apresentados ao  público. A exposição tem curadoria de Felipe Scovino.

A Galeria Movimento inaugurou seu espaço no Baixo Gávea com a exposição, “O Banquete”, também com obras de uma artista mulher, Viviane Teixeira, e curadoria de Victor Gorgulho. Desde então, já fez mais cinco exposições, entre coletivas e individuais, com os artistas Arthur Arnold, Edu Monteiro, Hal Wildson, Jan Kaláb, Marcela Gontijo, Marcos Roberto, Mateu Velasco, Paulo Vieira, Pedro Carneiro, Tinho, Viviane Teixeira e Xico Chaves.

 

 

Segredos e enigmas de Lize Bartelli

21/out

A Simões de Assis, Jardins, São Paulo, SP, apresenta a mostra “Skeleton Closet”, primeira individual de Lize Bartelli em seu espaço paulista. A série “Skeleton Closet” é um vislumbre da construção de um mundo que mistura imaginação e realidade, propondo criações figurativas, mas não necessariamente realistas. A artista convida amigas e familiares a posar para retratos absolutamente íntimos, geralmente solitários, em ambientes particulares e interiores domésticos. Ocasionalmente, um gato ou uma criança acompanham as modelos, carregando as cenas de um simbolismo misterioso. Lançando mão de cores não-naturalistas, as peles das figuras são esverdeadas e azuladas, evocando certa decadência, a mortalidade inerente a todas nós. O próprio título da mostra alude aos esqueletos no armário, apontando, de um lado, para o aspecto da morte, enquanto também sugere os segredos e enigmas que todas as suas personagens insinuam.

 

Até 10 de dezembro.

 

Celebração do artista e sua obra

 

“BARAVELLI 80″ é uma exposição organizada pela Fundação Stickel, Vila Olímpia, São Paulo, SP, em colaboração com a Galeria Marcelo Guarnieri que celebra os 80 anos do artista Luiz Paulo Baravelli. Serão apresentadas 57 obras do artista, cada uma correspondente a um dos seus 57 anos de carreira, desde 1965 até 2022. Pinturas, desenhos e relevos que manifestam o seu interesse pela arquitetura, pelo desenho da figura humana e pela pintura de paisagem, e que propõem um diálogo descontraído com a tradição. Para fazer companhia às suas obras, Baravelli convocou “Amigos e Vizinhos”, que segundo ele, foram – e ainda são – seus guias e orientadores ao longo de sua trajetória. Cerca de 200 imagens de obras de arquitetos, artistas, cartunistas e designers apresentados na exposição em formato de vídeo dão conta de aproximar o público visitante ao repertório do artista, que abarca desde uma pintura de Giotto de 1304, uma escultura de Barbara Hepworth de 1943, o still de uma cena do desenho animado “Os Jetsons” de 1962, até uma escultura de Martin Puryear de 2005.

Formado arquiteto e consagrado como pintor, Baravelli experimenta com o espaço tridimensional, tanto no campo físico, como no campo virtual de suas pinturas e desenhos. Em sua obra, as noções de perspectiva, planta, elevação e corte provenientes da linguagem da arquitetura são utilizadas para representar espaços interiores, casas e outras edificações, mas não se restringem ao traço, tornam-se ferramentas para questionar o formato quadrado da tela, dando às suas pinturas um certo dinamismo. É desse modo que elas transitam entre duas e três dimensões e adquirem o caráter híbrido de pintura-objeto. Podem ter contornos reconhecíveis como os de um corpo humano esguio ou contornos estranhos como os de pálpebras gordas e agigantadas que se beijam, contornos redondos que reivindicam seu lugar dentro da tradição do quadro e mesmo os quadrados que abrigam outras quadras e quadrículas dentro dos limites da moldura.

Baravelli compõe em camadas, recorta e sobrepõe referências, estilos, materiais e texturas. Tais operações estão carregadas de um senso de humor que tem permitido ao artista estabelecer uma relação espirituosa com sua obra nesses 57 anos de produção e que se faz evidente nos modos de abordar questões tão diversas como o amor, a história da arte, figuras de poder como políticos e colecionadores, problemas de planejamento urbano e a sensação de tédio de uma noite como outra qualquer. Não são temas, são questões que atravessam a qualquer um de nós, e que no trabalho de Baravelli surgem como comentários inusitados, mas sutis, daqueles que poderiam passar despercebidos em uma conversa com os mais desatentos. Não foi à toa que seus amigos e vizinhos foram convocados a participar dessa exposição, são vozes que ampliam o diálogo, adicionando camadas de significados e abrindo pontes para outras conversas.

Celebramos com alegria os oitenta anos de vida de um artista que dedicou cinquenta e sete anos a uma atividade de tão grande importância para a nossa cultura, formando outras tantas gerações de artistas, alunos, leitores e que é parte fundamental da história da arte de nosso país. E com a mesma alegria, celebramos a oportunidade de termos estado juntos durante os últimos trinta anos. Viva Baravelli!

 

Até 04 de fevereiro de 2003.

 

 

Exibição de Maxwell Alexandre

19/out

 

A Gentil Carioca – São Paulo e Rio de Janeiro – apresenta, para a Paris+ par Art Basel (stand F10), o solo de Maxwell Alexandre. As obras compõem a série Novo Poder, um desdobramento de “Pardo é Papel”, feito para explorar a ideia da comunidade negra dentro dos templos consagrados para contemplação de arte: galerias e museus. Entendendo a arte contemporânea como um campo de elite que concentra um grande capital financeiro e intelectual, a série busca chamar atenção da comunidade negra para esses espaços que legitimam narrativas na história. A série trabalha apenas com três signos básicos, sendo eles o preto (personagens), o branco (“cubo branco” ou espaço expositivo) e o pardo (arte).

 

 

Múltiplos encontros de arte

 

Anita Schwartz Galeria de Arte, Baixo Gávea, Rio de Janeiro, RJ, apresenta encontros na exposição “Klangfarbenmelodie: melodia de timbres”, Yolanda Freire, Waltercio Caldas, Paulo Vivacqua, Rosana Palazyan, Evangelina Seiler, Lilian Zaremba e Pedro Lago, entre outros convidados, estarão na programação gratuita de conversas, performances e filmes de artistas, entre 27 de outubro e 17 de novembro, sempre às quintas-feiras, às 19h.

Do dia 27 de outubro a 17 de novembro, participarão da programação Yolanda Freire, Waltercio Caldas, Paulo Vivacqua, Rosana Palazyan – artistas que têm obras na exposição -, Evangelina Seiler, Lilian Zaremba e Pedro Lago, entre outros convidados.

No dia 17 de novembro, será realizado um recital de poesia concreta com Pedro Lago e convidados em homenagem à publicação “Poetamenos” (1953), um conjunto de poemas de Augusto de Campos (1931), considerado um dos precursores do Concretismo no Brasil. Pedro Lago, poeta, editor e performer é presença confirmada para dar voz às poesias de autores desde Augusto de Campos e seu irmão Haroldo de Campos, até Arnaldo Antunes, passando por Décio Pignatari, Wlademir Dias-Pino, Ferreira Gullar e Paulo Leminski.

“Poetamenos” – que pode ser vista na galeria – é a obra que fundamenta a exposição “Klangfarbenmelodie: melodia de timbres”,com a apropriação feita por Augusto de Campos do conceito da técnica musical inaugurada por Arnold Schoenberg (1874-1951) em 1911, em que a coloração, a tessitura orquestral (os diversos timbres dos instrumentos) são usadas para compor uma linha melódica, horizontal, serial, vazada de silêncios e intervalos, e não mais sobreposta dentro de uma harmonia, rompendo assim com o sistema tonal vigente. No início da década de 1950, Augusto de Campos visitou o conceito da “Klangfarbenmelodie” de Schoenberg, e cria uma transcrição intersemiótica, inaugurando novas relações e procedimentos na construção e apresentação da poesia. Ao propor uma leitura de múltiplas vozes e cores, Campos cria o “Poetamenos”, publicação que em 2023 completará 70 anos. A exposição “Klangfarbenmelodie: melodia de timbres” apresenta obras de Lenora de Barros, Waltercio Caldas, Augusto de Campos, Yolanda Freyre, Cristiano Lenhardt, Antonio Manuel, Rosana Palazyan e Paulo Vivacqua.

De 27 de outubro até 19 de novembro.

 

A programação:

27 de outubro – Conversa com a artista Yolanda Freyre e a projeção de seu filme “A Hortência e a Galinha: luto e vida”;

03 de novembro – Conversa entre os artistas Waltercio Caldas, Paulo Vivacqua e a roteirista, artista e pesquisadora radiofônica Lilian Zaremba;

10 de novembro – Conversa da curadora e consultora de arte Evangelina Seiler com a artista Rosana Palazyan sobre seu trabalho;

17 de novembro – Recital de poesia concreta com Pedro Lago e convidados.

Recomenda-se a inscrição prévia pelo telefone 21.2274.3873.

 

 

A cerimônia da arte autoral

 

“RITUS” é a segunda exposição conceituada por Renato De Cara que abre no Porão da BELIZÁRIO, Pinheiros, São Paulo, SP, com 30 trabalhos de Leo Sombra e Otoniel Ferreira onde esculturas e fotografias contam histórias de diferentes momentos dos dois artistas que apresentam suas poéticas construídas através de sua fé e da documentação do fazer artístico. Renato De Cara traz artistas marginais ao eixo Rio/São Paulo como uma afirmação cabal de que o fazer artístico não se circunscreve à eixos pré-definidos. A capacidade de transmitir emoções, sensações, verdades, nasce onde o criativo está sempre que há foco e determinação em seguir suas crenças e poéticas e que vivencias e origens distintas não são determinantes de conflitos e sim de harmonia e congruência. “Histórias e lendas, crenças e mitos – assim construímos nossas narrativas. Os afetos vão corroborando repertórios apropriados para vivermos dentro daquilo que podemos nominar como conforto ou reforço na salvaguarda de nossas esperanças”, conceitua o curador.

As fotografias de Leo Sombra compõe a série “Cura Áspera”, um registro analógico em negativo de 35mm, onde o artista se apropria dos ruídos e do acaso, “construindo assim uma narrativa sutil com elementos simples e banais da natureza e do seu cotidiano familiar. A imagem fotográfica como diário de uma pausa forçada a partir de uma lesão no pé. O artista, então isolado e imobilizado, começa a inventariar a poesia sutil do entorno”, explica o curador. Os paradigmas panafricanos são o foco principal das pesquisas de Otoniel Ferreira que exibe trabalhos da série Adupé-Iowo-olorún (Graças a Deus por ter conservado minha vida e minha saúde até hoje) onde esculpe e desenha totens e oferendas para seus orixás e santos de devoção. Nas palavras de Renato De Cara, “as construções escultóricas se dão coletando madeiras e materiais variados para resinificar a fé e o respeito ao divino. Seja na tradição de ex-votos ou numa pintura nova e sincrética o artista nos alimenta de esperança potencializando a verdade viva que experimenta…Dentro dos limites pessoais ou na expansão da liberdade imaginada de cada um a linguagem se fortalece, seja em imagens representativas ou documentais para falarmos com sinceridade sobre aquilo que nos é caro.”

Renato De Cara

 

Sobre os artistas

Léo Sombra (São Miguel, RN, 1986) – Vive e trabalha em São Paulo, para onde se mudou em 1998. Em 2006 fez um curso profissionalizante na ONG ImageMágica, onde, por falta de recursos, começou a fotografar no formato pinhole, construindo imagens com câmeras sem lentes e papéis fotográficos vencidos. Documentou a cidade de São Paulo e sua periferia, assim como indivíduos à margem da sociedade como portadores de deficiência visual, usuários de crack e moradores de rua. Incorporando o acaso e os defeitos oriundos do processo artesanal que utiliza para fotografar, Sombra desenvolve uma imagética intrigante e expressiva que, em certos momentos, nos remete a um universo estético muito particular, cheio de ruídos e impurezas transformados em poesia. Em 2011 teve cinco de suas obras adquiridas pela Pinacoteca do Estado de São Paulo.

Otoniel Ferreira (Oto) – (Serrinha, BA, 1995) – Vive e trabalha em São Paulo. Ogã, Escultor, Pintor, Luthier e Artista Interdisciplinar, cursou Bacharelado Interdisciplinar em Artes da UFBA. Foi violinista e luthier no Programa NEOJIBA, acompanhando a Orquestra Juvenil da Bahia em sua Turnê Europa 2018; cursou construção e restauro na Geigenbauschule Brienz, na Suiça, e atuou como estagiário em ateliers em Genebra e França. Em 2019, participou da Exposição Pintura no Museu de Arte da Bahia e do 8° Salão da Escola de Belas Artes. Participou da Feira Latino Americana Equinox no ano de 2022. Segundo o artista, sua pesquisa é por meio da experiência no existir, corpo trajeto e território, suas estéticas e poéticas, comungando em sua arte o sentido de pertença à nação afrolatina e o descondicionamento às epistemes da colonização e do mundo globalizado.

 

Sobre o curador

Renato de Cara (Lins, SP 1963) – Vive e trabalha em São Paulo. Bacharel em Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica – PUC/SP (1985). Interessado em cultura, especializa-se em arte e moda contemporânea, produzindo, escrevendo, editando e fotografando para marcas e veículos de comunicação. No período entre 2006 e 2017, dirige a Galeria Mezanino, respondendo pela produção e curadoria de inúmeras exposições, tanto individuais como coletivas fazendo com que o espaço se consolide tanto como um celeiro para novos nomes como também de resgate para artistas em meio de carreira, cruzando linguagens e propondo novas abordagens no mercado de arte contemporânea. Em 2018, assume a Diretoria do Departamento de Museus municipais de São Paulo, coordenando quinze espaços museológicos e históricos, construídos entre os séculos XVII e XX. Atua como curador independente e consultor de arte, acompanhando artistas em parcerias com instituições diversas.

 

De 24 de outubro a 19 de novembro.

 

 

Jogo de sedução e fartura em Yêdamaria

14/out

 

“Yêdamaria: Políticas da Intimidade” é uma exposição – em cartaz até 10 de dezembro na galeria Simões de Assis, Jardins, São Paulo, SP – que convida a ver de perto, que trama vizinhanças. As obras que compõem o conjunto em exibição dão indícios de uma artista profícua e ainda por ser decifrada, mas que há pouco batemos em sua porta, para nos aconchegar no seu lugar.

Devemos pensar e considerar o contexto para a existência de uma figura tão pertinente e “teimosa” como Yêdamaria – que, mesmo diante das violências visíveis e invisíveis, deixa como legado a excelência de sua produção. Cabe dizer ainda que Yêdamaria pintou a fartura, os espaços de encontro, o íntimo e o popular. Suas cenas nos ensinam a encontrar intimidade no sublime, porque constrói miragens para os olhos por vezes fatigados do cotidiano.

 

Texto de Horrana de Kássia Santoz

“Para curar a cisão entre mente e corpo, nós, povos marginalizados e oprimidos, tentamos resgatar a nós mesmos e às nossas experiências através da língua. Procuramos criar um espaço para a intimidade.” (1)

Tenho a honra de apresentar “Yêdamaria: Políticas da Intimidade”, exposição que celebra a vida e o patrimônio artístico da professora e artista baiana Yeda Maria Corrêa de Oliveira (1932-2016) que, por mais de cinquenta anos, dedicou-se integralmente ao seu meio de expressão. Com uma conduta ilibada, sendo constante e criativa na fatura de suas obras, ela é um dos nomes fundamentais da pintura brasileira contemporânea e, pela mesma razão, sabemos hoje que ainda há muito a ser desvendado da sua trajetória.

Nascida na cidade de Salvador, capital do estado da Bahia, em 12 de março de 1932, Yeda Maria Corrêa de Oliveira, filha única da professora primária Theonilda da Silva Corrêa de Oliveira, teve seu olhar atravessado pela experiência do seu lugar. Cresceu no bairro da Ribeira, onde conviveu com as marinas, o comércio popular, as frutas, as cosmologias afrodiaspóricas; esses índices, por serem tão próximos, se tornaram a tônica de sua produção.

Formada no Instituto Normal da Bahia em 1951, Yêdamaria iniciou sua carreira lecionando na educação básica, seguindo os passos e os desejos de sua mãe. Em 1956 já pintava e, como aluna da graduação em Belas Artes e Pintura na Universidade Federal da Bahia (UFBA), muito bem relacionada entre os artistas de sua geração, recebeu o prêmio de Menção Honrosa, no Salão Baiano de Artes Plásticas. Outro momento da atuação de Yêdamaria como educadora foi em 1971, quando ingressou na UFBA como professora das disciplinas de desenho e gravura. Em 1977, viajou para os Estados Unidos para cursar o mestrado na Illinois State University. Foi após essa experiência que outras técnicas, como a colagem e a gravura, ganharam peso nas suas composições e sua produção alcançou merecido prestígio internacional.

No Brasil da década de 1970, a ditadura civil militar foi um dos momentos de maior tensão e de fortes restrições, especialmente para a classe artística e, nos Estados Unidos, devido às inúmeras manifestações pelos direitos civis e da luta antirracista, havia um cenário social e político igualmente desafiador. Para Yêdamaria, artista, mulher negra e latino-americana, sua carreira foi moldada por esse contexto. Para além dos reveses no Brasil, o corpo docente da universidade americana, por muito tempo e de forma nada elogiosa, demarcou sua produção como naïf. Mas, ao final da temporada de estudos, a universidade adquiriu toda sua produção do período para sua coleção permanente. Estes são apenas alguns dos incontáveis episódios de pelejas que Yêdamaria vivenciou e logrou êxito.

Dessa energia produtiva, na “fase dos barcos” – assim chamado o período célebre de cerca de doze anos que a artista produziu um grande número de pinturas marinhas – é possível notar o tratamento pictórico e a ordenação dos planos e linhas que Yêdamaria aplicava em suas cenas. Herdeira das vanguardas artísticas tanto quanto por seu olhar atento ao ordinário, a cor e o desenho são elementos primordiais em sua produção e é por meio deles que Yêdamaria demonstrou sua grande destreza compositiva.

Na obra “Barcos com casarios”, de 1964, exposta aqui, os casarios coloridos verticalizam a paisagem, enquanto os barcos minuciosamente aportados no primeiro plano flutuam na orla. A cena é solar, quente e carrega um pouco de nós, como o “Timoneiro” da canção de Paulinho da Viola. A densidade cromática dos azuis, vermelhos e amarelos revela a dedicação incansável da artista pelo estudo dos efeitos, nuances e mesclagens que aplacam suas composições e fazem o espectador quase se perceber dentro da obra, no balanço dos barcos e na brisa das marinas. O branco de sua paleta é intenso e, quando visto nas toalhas de mesa, nas porcelanas, no brilho das transparências das taças, talheres e das jarras de prata, é de um requinte acachapante.

As naturezas-mortas são puro deleite e luminosidade, contrapondo o tom soturno tão habitual nas cenas de interior desse gênero de pintura. Quem duvidaria da opulência ao ver um peixe farto, coberto por rodelas de limão, acompanhado de uma saladinha de alface e tomates e servido generosamente em uma travessa de porcelana azul e branca? Quem é aguardado pela bandeja azul posta em diagonal, repleta de cajus maduros, de um amarelo alegre, contrastando ao fundo esverdeado? Até mesmo do prato cinza com maçãs de um vermelho profundo e reluzente sobre fundo verde? Tudo em Yêdamaria é um jogo de sedução e fartura, seja pelo olhar, pelo tato e até pelo paladar.

Yêdamaria: Políticas da intimidade é uma exposição que convida a ver de perto, que trama vizinhanças. As obras que compõem o conjunto em exibição dão indícios de uma artista profícua e ainda por ser decifrada, mas que há pouco batemos em sua porta, para nos aconchegar no seu lugar. Devemos pensar e considerar o contexto para a existência de uma figura tão pertinente e “teimosa” como Yêdamaria – que, mesmo diante das violências visíveis e invisíveis, deixa como legado a excelência de sua produção. Cabe dizer ainda que Yêdamaria pintou a fartura, os espaços de encontro, o íntimo e o popular. Suas cenas nos ensinam a encontrar intimidade no sublime, porque constrói miragens para os olhos por vezes fatigados do cotidiano.
Magnum opus. É dessa forma que a obra de Yêdamaria merece ser vista e celebrada.

(1) Hooks, Bell. Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade / bell hooks; tradução de Marcelo Brandão Cipolla. – 2. ed., p.223 – São Paulo: Editora WMF, Martins Fontes, 2017.

 

Livros Espelho Consequências

13/out

 

A Mul.ti.plo Espaço Arte, Leblon, Rio de Janeiro, RJ, apresenta até 02 de dezembro uma exposição de Waltercio Caldas, um dos maiores nomes da cena de arte contemporânea brasileira. Para a mostra, Waltercio preparou, durante dois anos, 14 obras inéditas que trazem a sua assinatura poética de relacionar objetos que à sua visão pertencem à mesma família, entre eles os livros e os espelhos. Ao todo serão apresentados nove objetos e cinco desenhos tridimensionais, além de um catálogo com notas de sua caderneta de trabalho. A exposição pode ser visitada até o dia 02 de dezembro.

O reconhecimento da obra de Waltercio Caldas não encontra fronteiras. Sua arte é tanto poética quanto precisa. Segundo texto do crítico e professor Paulo Sérgio Duarte, “não existe arte contemporânea que não seja experimental. Sabemos disso desde Adorno e sua Teoria Estética. Mas existe algo em Waltercio Caldas além do experimentalismo: um ascetismo que não se confunde com aquele da Minimal Art. Trata-se de uma economia que não é avessa ao campo semântico, à polissemia dos significados. Isso estimula a experiência da obra”.

Nessa exposição, Waltercio Caldas trabalha a partir do conhecimento poético dos objetos e das coisas. “A passagem de uma ideia abstrata para um objeto real é o que permite o aparecimento da obra de arte. Ela entra em nossa vida de forma transversa, como algo que não conhecemos, inaugurando sua própria presença. Me interessa esse aparecimento, essa perplexidade inicial”, diz ele, que prioriza em sua prática artística a tridimensionalidade. “Por enfatizar novos aspectos da gravidade, do peso e das matérias, as obras surgem pondo entre parêntesis sua inserção no mundo”, afirma. Nesses objetos inéditos, Waltercio chega a formas extremamente rigorosas e precisas, carregadas de sugestões impossíveis de serem traduzidas em outras linguagens.

Não por acaso, na exposição da Mul.ti.plo, Waltercio Caldas acrescentou um catálogo com anotações que surgiram no decorrer do processo de criação desses trabalhos, e as chamou de “Consequências”. Escrever sobre as questões relacionadas ao processo criativo dos trabalhos reverbera o conteúdo da exposição em outra atitude. Procurar entender o funcionamento dos espelhos e dos livros é enfrentar mais uma vez o que ainda não sabemos”, diz o artista, que realiza a sua terceira exposição na galeria – a primeira foi em 2012, com múltiplos; e, a outra, em 2017, com desenhos.

 

Sobre o artista

Waltercio Caldas nasceu no Rio de Janeiro, em 1946. Realizou sua primeira exposição individual em 1973, no Museu de Arte Moderna (MAM) da mesma cidade, quando recebeu o Prêmio Anual de Viagem ao Exterior, concedido pela Associação Brasileira de Críticos de Arte. Desde então, tem participado de inúmeras exposições no Brasil e no exterior. Em 1998, recebeu o prêmio Johnnie Walker de Artes Plásticas e, em 2002, o prêmio Mario Pedrosa da Associação Brasileira de Críticos de Arte, ambos pelo conjunto de sua obra. Representou o Brasil nas Bienais de São Paulo de 1983, 1987 e 1996; na Documenta IX de Kassel, em1992; e na XLVII Bienal de Veneza, em 1997. Em 2005 recebeu o “City Light Award”, o grande prêmio da Bienal da Coreia. Em 2007 foi artista convidado para o pavilhão Itália da LII Bienal de Veneza. Em 2008 realizou exposições Centro Galego de Arte Contemporânea (Espanha) e Fundação Calouste Gulbenkian )Portugal). Em 2012 exibiu uma retrospectiva de suas obras na Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre, que, em 2013, foi para a Pinacoteca de São Paulo e para o Blanton Museum no Texas, EUA. Em 2018 foi artista curador convidado na XXXIII Bienal Internacional de São Paulo. O artista possui esculturas públicas nas cidades de Punta del Este (1982), São Paulo (1989 e 1997), Leirfjord, Noruega (1994), Rio de Janeiro (1997 e 2014), na fronteira do Brasil com Argentina (2000) e em Porto Alegre (2006). A escultura “O Modo Azul” foi instalada permanentemente no Museu do Açude em 2018, no Rio. Seus desenhos, esculturas e livros de artista fazem parte de diversas coleções particulares do Brasil e do exterior, além de museus como o MAM RJ, MAM SP, Museu de Artes de Brasília, Phoenix Art Museum, Neue Galerie Staatliche Museen, Alemanha; Daros Foundation, Zurique; e Centre Pompidou, Paris; Museu Reina Sofia, Madri; entre outros. Em 2001 foi realizada uma retrospectiva parcial de sua obra no CCBB do Rio de Janeiro e de Brasília. O Museum of Modern Art de Nova York adquiriu, em 2006, mais duas de suas obras. No mesmo ano, o artista lançou Notas, ( ) etc., livro que reúne uma seleção de seus textos sobre o trabalho. Em 2007 participou como artista convidado da 52a Bienal de Veneza e, em 2008, realizou mostras na Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa; e no Centro Galego de Arte Contemporânea de Santiago de Compostela, Espanha. Em 2010 expôs no Museu Vale e no MAM RJ. Em 2011, nas galerias Elvira Gonzalez, em Madri e Raquel Arnaud, em São Paulo, e na mostra Art/Unlimited em Basel, Suíça. No mesmo ano, recebeu o grande prêmio da Bienal de Cuenca. Em 2017 expôs na Galeria Xippas, de Paris. Sobre sua obra já foram publicados uma dezena de livros, com textos dos mais renomados críticos de arte do país.

 

Sobre a Mul.Ti.Plo

Mais do que uma galeria onde as obras ficam expostas para a apreciação do público, a Mul.ti.plo Espaço Arte apresenta-se como um ambiente de encontro com a arte contemporânea. Aqui, artistas consagrados e novos talentos oferecem o melhor de sua produção em múltiplos e obras em papel, objetos e pinturas, além de projetos especiais. A ideia é que o espaço crie as condições para que os olhares do público encontrem formas singulares de se relacionar com a arte. Além de comercializar obras selecionadas a partir de critérios estéticos de extraordinária densidade artística, a Mul.ti.plo realiza permanente trabalho de pesquisa no sentido de identificar e divulgar novos trabalhos. Por seu engajamento na circulação da arte e pela recusa em tomá-la como produto, a galeria vem se consolidando como um espaço que investe no lançamento de edições exclusivas, um lugar que cultiva preciosidades. Com os múltiplos e as obras em outros formatos de grandes artistas brasileiros e estrangeiros, a Mul.ti.plo trabalha no sentido de renovar a reflexão e a fruição estética, atrair não especialistas, despertar novos colecionadores e enriquecer coleções já estruturadas.

 

 

O processo criativo de Alice Quaresma

10/out

 

A primeira exposição individual de Alice Quaresma – “Origens” – acontece na Galeria Silvia Cintra + Box 4, Gávea, Rio de Janeiro, RJ. A mostra é o resultado de um arquivo fotográfico de mais de 18 anos da cidade natal da artista, o Rio de Janeiro.

Origens é uma exposição que começa com vestígios fotográficos de um passado, rastros de tinta sobre a imagem de um corpo presente e uma janela para o futuro com a pintura que renasce no processo criativo da artista. Ao entrar na galeria, a narrativa se inicia pelas fotografias que, caminhando para o fundo, passam a pertencer a tela de algodão.

Ao final, na última parede, a pintura prevalece por si só. As marcas nas pinturas são referências das formas registradas nas imagens do Rio. Essa é uma exposição que oferece uma visão completa: de onde começou a pesquisa com fotografias do Rio de Janeiro sobre memória e identidade e os próximos atos de experimentos na pintura.

Aos 18 anos de idade, Alice saiu do Brasil e desde então fotografa a cidade, de forma afetiva, como uma maneira de se sentir perto de suas raízes. No entanto, em 2014, percebeu que não se tratava apenas de um registro afetivo. Ao fazer o movimento de trazer para seu trabalho essas imagens despretensiosas de qualquer valor técnico ou conceitual, mas cheio de memorias, surpresas e valor sentimental, a artista constatou que estava explorando a ideia de identidade e pertencimento como imigrante.

Ao longo desse processo, é possível observar a admiração de Alice pelo movimento de arte carioca Neoconcretista. Através de pesquisas sobre Hélio Oiticica e Lygia Clark, como no livro “Cartas”, manifestou-se cada vez mais o interesse pela arte experimental e o poder da arte como ativação da mente e do pensamento e, não como resposta concreta. E assim surgiram as marcas geométricas imperfeitas, linhas coloridas pintadas a mão sobre fotografias do Rio de Janeiro, para criar obras que existem na interseção entre a memória e o campo imaginário, onde os fatos e as certezas são anulados. Cada obra, através de sua composição, cria espaço para imaginação do espectador. Os trabalhos falam de passado e presente usando pintura sobre a fotografia, questionando o limite de cada formato como um só.

“Na minha exposição Origens, mostro como a evolução da minha procura através das minhas imagens do Rio me levaram de volta a pintura, por si só, chegando de volta não só a minha Origem que é o Rio, mas também a minha origem na pintura, onde comecei nas artes plásticas. Meu olhar de fascínio e questionamento nas artes, começou na pintura com a obra “Quattro Stagioni” de Cy Twombly quando eu tinha 13 anos”, comenta a artista.

 

Até 05 de novembro.