Fotos de David Drew Zingg

03/jun

O Instituto Moreira Salles, Higienópolis, São Paulo, SP, exibe em seu centro cultural de São Paulo, a exposição “David Drew Zingg: Imagem sobre imagem”, dedicada ao trabalho do fotógrafo norte-americano David Drew Zingg. Com curadoria de Tiago Mesquita, a mostra reúne cerca de 70 imagens, integrantes do acervo do fotógrafo, depositado desde 2012 no IMS.
A mostra reúne fotografias de cartazes, letreiros, imagens e anúncios em meio a construções, ruas e pessoas. Imagens feitas ao longo do tempo, e nem sempre ligadas aos trabalhos comissionados que fazia como fotógrafo. Por pelo menos duas décadas, Zingg caçou essa iconografia no Brasil e no exterior, em regiões rurais e em grandes centros urbanos. Retirando escritos e figuras do seu contexto, essas fotografias evidenciam uma certa dimensão pop, componente fundamental dessa vertente do trabalho de David Zingg. Sua força imagética está exatamente naquilo que não tem por pressuposto ser um ícone. Letreiros de épocas e de procedências diversas, reunidos nas imagens do fotógrafo, anunciam e comunicam suas mensagens simultaneamente. Uma figura na parede comenta algo sobre um letreiro acima, que desmente a inscrição ao lado. Assim, em uma das fotos, em uma fachada de azulejos verdes, vemos uma porta em formato de ogiva de igreja gótica ao lado de uma pintura a imitar o anúncio fotográfico da Brahma Chopp. Na mesma casinha, o lugar é descrito como drogaria, restaurante e hotel. E o lugar é de fato tudo isso, e algo mais que não pode ser bem expresso por legendas.
São resíduos de uma época que insiste em não ir embora e de um presente que se estabelece de maneira pouco convincente. Passado e presente convivem em uma única imagem. Em uma fotografia da pitoresca Vila Tororó, em São Paulo, todas as ambiguidades se mostram juntas. Naquela época, o antigo palacete havia se tornado um cortiço. Na foto, a vila já é mostrada como casa modesta. A coluna, no centro da imagem, é adornada com uma versão kitsch de uma divindade greco-romana. Na imagem, ela está alheia ao uso da casa, por ser encoberta com varais carregados de roupa. A construção já não é mais a mesma coisa. Mas a escultura permanece, mesmo fora de contexto.
Para o curador, “…são nesses momentos que o trabalho fica mais forte. Quando nos faz perceber esses desequilíbrios. Melhor, quando coloca junto construções, elementos arquitetônicos, textos, paisagens e personagens que parecem não se conhecer, mas compartilham o mesmo espaço. É como se os lugares fossem feitos dessas colagens, de empilhamentos de diversas épocas, de diversos lugares. O cartaz de trás deixa manchas no da frente e outro rouba o fim de uma palavra. Por vezes, os papéis amontoados estão em conflito: um impede que o outro seja entendido. Mas, às vezes, por sorte, ao se juntarem, se tornam mais graciosos. Há junções divertidas. Em um tom de crônica, as fotografias de Zingg mostram essas coincidências felizes e o ruído ensurdecedor de um amontoado de ruínas. Muitas vezes tudo isso está na mesma imagem.”

 

 

Sobre David Drew Zingg
Nascido em Nova Jersey, nos Estados Unidos, David Drew Zingg estudou na Columbia University, onde mais tarde seria professor de jornalismo. Foi repórter e fotógrafo da revista Look e trabalhou para outras publicações, como Life, Esquire e Vogue. Em 1959, Zingg veio ao Rio de Janeiro como membro da equipe do veleiro Ondine na corrida oceânica Buenos Aires-Rio. Encantado com o país, começou a viajar frequentemente para o Brasil. Suas reportagens sobre acontecimentos nacionais, incluindo a construção de Brasília, foram publicadas em várias revistas americanas e britânicas. Esteve presente na noite de abertura do Show de Bossa Nova, estrelado por Tom Jobim e Vinicius de Moraes na boate Au Bon Gourmet, no Rio, e contribuiu para a organização do memorável Concerto de Bossa Nova no Carnegie Hall, de Nova York, em 1962. Colaborou com os principais veículos de comunicação do país, como Veja, Manchete, Playboy, entre outros. Em 1978, mudou-se para São Paulo, onde foi consultor e cronista da Folha de S. Paulo, escrevendo de 1987 a 2000 a coluna “Tio Dave”. Zingg também participou da banda Joelho de Porco, célebre pelas letras recheadas de humor. Nas inúmeras viagens que fez pelo país, produziu um dos mais significativos registros do Brasil dos anos 1970 a 1990. Fotografou o povo brasileiro e sua cultura, além de realizar milhares de retratos de músicos e personalidades, como John Kennedy, João Gilberto, Os Novos Baianos, Pelé, Chico Buarque, Pixinguinha, Leila Diniz, Elke Maravilha, Vinicius de Moraes e Juscelino Kubitschek. David Drew Zingg morreu no dia 28 de julho de 2000, em São Paulo. Seu acervo, composto por mais de 250 mil imagens fotográficas (principalmente diapositivos coloridos), documentos e objetos pessoais, passou a integrar o acervo do Instituto Moreira Salles em 2012, por meio de comodato realizado com seus descendentes.

 
David Drew Zingg por David Drew Zingg
“Fotografia é história, e é essa sua função fundamental. A máquina mostra os dias de hoje àqueles que queiram ver os dias de hoje. Mas a máquina também mostra o ontem àqueles que queiram aprender. (…). O dever de um fotógrafo no Brasil, me parece, é insistir no registro do sofrimento e do prazer, do belo e do irônico. Só o tempo e o público decidirão o significado que as fotografias realmente têm.”

 
Até 09 de agosto.

Abstração geométrica de Sean Scully

02/jun

A Pinacoteca do Estado de São Paulo, Estação Luz, São Paulo, SP, museu da Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo, apresenta a exposição Sean Scully. Com patrocínio do Credit Suisse, da Oi, do Iguatemi São Paulo e apoio cultural do Oi Futuro esta é a primeira grande retrospectiva no Brasil deste consagrado artista irlandês. As obras de Sean Scully foram vistas poucas vezes no Brasil, como em 2002 na Bienal Internacional de São Paulo, e no Centro de Arte Hélio Oiticica, Rio de Janeiro. Na exposição da Pinacoteca, será possível conferir um panorama da sua criação em 46 trabalhos, produzidos entre 1974 a 2014, um amplo recorte que permite observar as variações do seu processo criativo, com curadoria de Jacopo Crivelli Visconti. A exposição ocupa todo o primeiro andar da Pinacoteca

 
A pintura de Sean Scully é abstrata, composta por formas geométricas precisas, com linhas mais demarcadas e claras. Há telas com blocos que vêm para fora, com diferença de espessura. O artista utiliza uma variedade de paletas de cores que vão desde tons de preto e densas variações de marrom e vermelho, até cores vibrantes como o azul-de-rosa e o amarelo canário.

 
Nesta exposição é possível conferir também aquarelas e pasteis, obras menos conhecidas do grande público. Algumas de suas pinturas são muito impactantes por seu tamanho, como “Darkness here”, de 1989, que exibida nesta exposição, é seu maior quadro, com 4 metros, e contribuiu para que o artista fosse mais conhecido a partir dos anos 90.

 

 
Sobre o artista

 
Sean Scully nasceu na Irlanda em 1945, se educou em Londres e vive nos Estados Unidos desde 1975, onde se naturalizou. É o pintor abstrato mais importante desta geração. Seu trabalho é aclamado internacionalmente e integra algumas das mais importantes coleções do mundo, incluindo o Metropolitan Museum of Art, Nova Iorque; Guggenheim Museum, Nova Iorque; Tate Gallery, Londres; Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofia, Madrid; e Instituto Valencia d’Arte Moderna, Valência, Espanha.

 

 
Até 28 de junho.

Marcelo Cipis, obra em livro

O artista Marcelo Cipis lançou seu livro na Galeria Emma Thomas, Jardim Europa, São Paulo, SP, publicado pela Editora da Universidade de São Paulo dentro da Coleção Artistas da USP. Este volume da Coleção mostra a obra de Marcelo Cipis, desde os primeiros trabalhos até a produção recente de meados da década de 2000. Desde o início de seu trabalho artístico, nos anos de 1980, Marcelo Cipis transita entre os diferentes movimentos de arte, reprocessando influências e “…criando uma espécie de mistura de caráter sempre lúdico e experimental”, segundo afirma.

 
No livro, Valéria Piccoli analisa a obra do artista e comenta sua trajetória, afirmando sobre sua obra: “Cipis retira dos objetos o seu sentido utilitário e o contexto que lhes dá significação, enfatizando sua dimensão de cópia. Ele tem consciência do poder que o artista tem de transformar o sentido dos objetos ao manipulá-los por meio da representação. Mais que qualquer objeto em si, o que interessa a Cipis são as infinitas possibilidades de representá-lo.” O evento contou com a presença do artista autografando a obra.

 

 
Sobre o artista

 
Marcelo Cipis nasceu em São Paulo, 1959. Entre 1977 e 1982 estuda arquitetura na FAUUSP. Entre 1980 e 1987 participa de todos os Salões Paulistas de Arte Contemporânea. Em 1988 é convidado a participar do workshop Berlin-in-São Paulo, expondo no MASP e no Kunsthalle de Berlin. Em 1991 participa da 21ª Bienal Internacional de São Paulo com a instalação Cipis Transworld Art, Industry and Commerce. Em 1992 e 1994 participa da Bienal de La Habana. Em 1993 participa da coletiva Verde-Amarelo – Arte Contemporânea Brasileira no Fujita Vente Museum em Tóquio. Em 1988 realiza individual na Casa Triângulo em São Paulo. Em 2000 publica seu primeiro livro como autor chamado 530g de Ilustrações pelo Ateliê Editorial, uma compilação das ilustrações publicadas na Folha de São Paulo, e recebe a bolsa da Pollock-Krasner Foundation de Nova York. Em 2004 realiza individual na Galeria Virgílio em São Paulo. Entre 2005 e 2014 publica uma série de títulos como autor e ilustrador. Em 2013 é indicado ao Prêmio PIPA e realiza exposições no Centro Cultural São Paulo e na FUNARTE em São Paulo. Em 2014 participa da coletiva Brazil Arbeit und Freundshaft no Pivô em São Paulo e realiza individual na Galeria Emma Thomas em São Paulo. Entre os prêmios recebidos estão o 12º, 18º 19º, e 25º prêmios Abril de Jornalismo, melhor pintura em 1990 pela APCA com a exposição Pyrex Paintins & Recents Works na Galeria Kramer em São Paulo e em 1994 o Prêmio Jabuti pela melhor capa para o livro “Como Água para chocolate”.

Novo livro de Rosana Ricalde

A artista plástica Rosana Ricalde lançou novo livro. A obra, denominada “Entre Imagem e Linguagem”, recebeu textos da crítica de arte Glória Ferreira. O livro saiu com o selo da Editora Apicuri. O lançamento foi na Livraria da Travessa de Botafogo, Rio de Janeiro, RJ. Rosana Formou-se pela EBA/RJ em 1994. Trabalha no Rio de Janeiro e em Rio das Ostras, na Região dos Lagos, RJ, onde reside. Realizou exposições individuais no Rio de Janeiro e em São Paulo e também no exterior, em cidades como Madri, Oslo, Miami, Lisboa e Havana. Seus trabalhos fazem parte da Coleção Gilberto Chateaubriand – MAM-Rio. Participou de projetos de residências artísticas em São Tomé e Príncipe, em 2008, Ilha de Susak, na Croácia, em 2008, e em Rotterdam, na Holanda, em 2005.

Mostra de Luiz Ernesto

O artista visual Luiz Ernesto apresenta no OI Futuro Flamengo, Rio de Janeiro, RJ, a mostra” EQUILIBRANDO-SE EM LUZ REVELAVA -SE”.  A curadoria é de Alberto Saraiva.

 

Artista plástico e ex-diretor da Escola de Artes Visuais do Parque Lage, desenvolve seu trabalho em diversos meios – desenho, pintura, objetos e fotografia, tendo como ponto de partida os objetos banais do cotidiano. O crítico Agnaldo Farias assim se referiu à obra do artista, durante uma exposição, em 1999: “As pinturas, desenhos e assemblages de Luiz Ernesto sempre se propuseram a animar as coisas de sua letargia para deixá-las transbordar, fazê-las abandonar seu estado inicial rumo a uma condição próxima”.

 

 

Até 07 de junho.

Miró no Instituto Tomie Ohtake

O Instituto Tomie Ohtake, Pinheiros, São Paulo, SP, organizou e inaugurou “Joan Miró. A força da matéria”. Esta é a maior mostra dedicada a Joan Miró no Brasil. A exposição reúne mais de 100 obras do artista, entre pinturas, esculturas, desenhos, gravuras e objetos (pontos de partida para a criação de suas esculturas). Na composição da mostra, fotografias sobre a trajetória do genial pintor catalão.
A mostra ficará em cartaz em São Paulo até 16 de agosto, e seguirá para o MASC – Museu de Arte de Santa Catarina, Florianópolis, de 02 de setembro a 14 de novembro.
Texto
O texto de “Joan Miró – a força da matéria” , do escritor Valter Hugo Mãe, integra o catálogo da exposição. Confira um trecho abaixo:

 

A reinauguração da cultura, sobre Joan Miró

 

“Las miradas son semillas, mirar es sembrar Miró trabaja como un jardinero y con sus siete manos traza incansable – círculo y rabo, io! y ah! – la gran exclamación con que todos los dias comienza el mundo.”
Octavio Paz

 

A morte da pintura está para Joan Miró como a morte de deus esteve para Friedrich Nietzsche. Foi fundamental que saísse da equação para que o exercício da arte, que é o mesmo que dizer vida, correspondesse à mais do que genuína personalidade do mestre catalão.

 

 
A desmistificação é ponto essencial para o domínio da identidade. Alguns artistas não consentem, nem remotamente, com propagar o expectável. A arte, em sua superior oportunidade, é mais o enunciado de um novo postulado do que a obediência a quaisquer premissas estabelecidas. Ou, como diria Merleau-Ponty, a arte “é antes a realização de uma verdade do que o reflexo de uma verdade prévia” (Merleau-Ponty, 1999). Para Miró, por essência, a arte foi sempre um imperativo de liberdade. Se quisermos simplificar o seu aparecimento no mundo podemos declarar que se definiu exatamente por uma fúria imprescindível pela liberdade. Ao manifestar-se interessado em assassinar a pintura está a dizer que quer ser sem ser o mesmo. Quer ser sem ser o mesmo, o que justificaria o seu constante modo de fuga, desatando obrigações para com academismos prévios e, sobretudo, impiedosamente divergindo de si, a cada tempo começando outros métodos, explorando outros materiais, problematizando estilos, tão surpreso quanto sempre angustiado pela compulsiva busca.

 

 
Joan Miró atravessa o pior do século XX. Numa Europa em guerra, plena de ideologias totalitárias e predadoras, a sua origem catalã será invariavelmente um radical para permanente inconformismo e protesto. Uma espécie de mácula afetiva, como um pecado original de que ele se orgulharia e pelo qual se bateria sempre. A passagem por Paris, fundamental para a sua depuração, nunca lhe roubaria a convicção de ser catalão, coisa que evidenciaria constantemente na obra como linha de força e também como digno sofrimento. A liberdade possível é sempre uma ansiedade na assunção de uma identidade. Para Joan Miró, a Catalunha foi a base para todas as ansiedades, lugar plástico e espiritual de onde retiraria as referências mais recorrentes e inelutáveis, como quem cataloga os tópicos materiais de uma alma. Faria arte como quem é e como quem luta.

 

 
Discursando na sua distinção durante o Doutoramento Honoris Causa pela Universidade de Barcelona, em 1979, Miró terá dito: “Quando um artista se expressa num contexto em que a liberdade é difícil, deve converter cada uma das suas obras numa negação das negações, numa libertação de todas as opressões, de todos os preconceitos e de todos os falsos valores estabelecidos.” (Punyet-Miró 2014). Antoni Tàpies, claramente influenciado pela obra de Miró e por ele também instigado a um mesmo brio para com a Catalunha, viria a declarar que “o impacto clandestino da obra de Joan Miró, como também a de Picasso, foi uma contribuição importantíssima para uma tomada de consciência que não se reduzia, é claro, aos problemas da estética, mas sim, como provoca todo o criador, se estendia a toda a vida. (…) Miró gozou com todos os oficialmente bem pensantes, porque ninguém demonstrou como ele o fracasso e a inutilidade de todas as falsas hierarquias que perdem o tempo a condecorarem-se, e depois têm de correr precipitadamente atrás dos passos dos que realmente fazem caminho.” (Tàpies, 2002). Neste sentido, é importante entender que a assunção de uma identidade nunca foi um modo de fechar o sujeito, ou a arte, num lugar ou num tempo, muito pelo contrário. A identidade é o único modo de converter um sujeito, ou a arte, num tópico de respeito universal. Vale a pena atentar no diz Joan Punyet-Miró, ponderando acerca da atenção de Miró à cultura de outros lugares, como a chilena, e estabelecendo um paralelo com outros génios seus contemporâneos, como seriam Picasso e Dalí: “havendo criado uma poética artística universal, transladam-se mais além do limite nacional, político ou geográfico, para acabar sendo de qualquer lugar e de lugar nenhum por vezes.” (Punyet-Miró, 2014).
De outro modo, a urgência pela oportunidade de uma realidade própria era já coisa antiga no espírito de Joan Miró. Contrário à padronização e fascinado com a amplificação dos sentidos, diria: “Quando saía com o meu pai de casa e lhe dizia que o céu era violeta, zoava de mim. E isso dava-me muitíssima raiva.” (Dupin, 2004). Para Miró era claro que o artista não podia simplesmente existir à maneira do mundo. O mundo precisava também de existir à maneira do artista.

 

 
O criador é um distúrbio no universo da continuidade. Lembro sempre uma passagem de Clarice Lispector, no livro Água Viva, para ponderar acerca destes assuntos: “Minha liberdade pequena e enquadrada me une à liberdade do mundo – mas o que é uma janela senão o ar emoldurado por esquadrias?” (Lispector, 2012). Do mesmo modo, a tela branca de um pintor, como assim a folha de um escritor, se apresenta também como uma ordem já bastante imposta à imaginação que se debate para materializar. A tela branca é uma regra, que Miró haveria de problematizar e contra a qual haveria de se rebelar inúmeras vezes. Miró foi a mais frequente perturbação de toda e qualquer continuidade artística.
Miró, que se assumiu um pessimista, um homem profundamente insatisfeito, buscava na arte a transgressão a todas as coisas, não apenas aos cânones estabelecidos, ele lidava com algo incrivelmente mais poderoso e que se punha como uma revelação cosmogónica, uma certa reinauguração da expressão, para uma expressão mais pessoal e, ao mesmo tempo, universal. O caminho mais verdadeiro para a universalidade acabou por encontrá-lo no aprofundamento constante da sua própria consciência. É na meditação sobre si mesmo e suas raízes que o mestre pode tornar-se infinitamente sapiente e conservar todo o esplendor e a frescura mais típicos do que é começador ou menino. A verdade, dentro dele, é um diamante que se reparte em todos os gestos, sempre puro na sua essência. Fácil se torna de entender porque na candura de tantos dos seus trabalhos, mesmo dos que discorrem sobre assuntos difíceis ou violentos, há uma espécie de reaprendizagem do gesto artístico ou um primitivismo que tinge tudo de espontaneidade, de originalidade. Nenhum outro artista moderno logrou tal grau de originalidade.
[…]

Arte africana contemporânea

01/jun

O Museu Afro Brasil, Portão 10, Parque do Ibirapuera, São Paulo, SP,  promove a maior mostra de arte contemporânea africana já realizada no Brasil. Com programação que inclui instalações, pinturas, vídeos, esculturas, moda e um encontro para discussões com os artistas, o projeto “Africa Africans”, que conta com o patrocínio do Banco Itaú e da Odebrecht, traça um panorama da recente criação visual do continente por meio de obras de artistas de diversos países africanos.

 

 
A exposição

 
A exposição conta com cerca de 100 obras, de mais de 20 artistas, em diversos suportes e linguagens, além de outras obras de arte africana, pertencentes ao acervo do museu e à coleção particular de Emanoel Araujo, diretor curatorial do Museu, focalizando a criação de artistas africanos, nascidos e residentes no continente ou fora dele, assim como artistas de origem africana que, mesmo tendo nascido fora da África, dialogam com a pluralidade de experiências estéticas e sociais presente nas diversas regiões do continente.

 
Uma das obras de maior destaque de “Africa Africans” será a colossal “The British Library”, do artista plástico nigeriano-britânico Yinka Shonibare MBE. Nascido em Londres em 1962, Shonibare foi criado na Nigéria e voltou para capital inglesa para estudar Artes, dando início à sua trajetória artística. Sua instalação é formada por 6.225 livros coloridos encapados por tecidos dutch wax – conhecidos como “tecidos africanos”, mas fabricados na Holanda com uso de técnicas inspiradas na arte milenar do batik indonesiano. O uso deste material é uma marca registrada do artista. Shonibare debate nesta obra questões que lhe são caras como colonialismo, pós-colonialismo e hibridismo e explora o impacto da imigração sobre todos os aspectos da cultura britânica, considerando as noções de território e lugar, identidade cultural, deslocamento e refúgio. A obra também usa recursos multimídia, a exemplo de iPads.

 
Também com presença confirmada está “Skylines”, de El Anatsui, ganês radicado na Nigéria. Nascido em 1944, ele é considerado o mais importante artista africano da atualidade, com grande prestígio na Europa e nos Estados Unidos e foi recém premiado, no dia 9 de maio de 2015, com um Leão de Ouro, na Bienal de Artes de Veneza. Suas obras estão nas coleções públicas do Metropolitan Museum of Art em Nova York; Museum of Modern Art em Nova York; Los Angeles County Museum of Art; Indianapolis Museum of Art; British Museum em Londres; e Centre Pompidou em Paris, entre outras instituições. Muitas das esculturas de El Anatsui possuem formas mutáveis e são concebidas para serem livres e flexíveis de modo que se adaptem visualmente em cada instalação. Ao trabalhar com madeira, barro, metal e, mais recentemente, tampas metálicas de garrafas de bebidas alcoólicas, Anatsui rompe com a tradicional adesão da escultura às formas fixas, embora faça visualmente referência à história da abstração na arte europeia e africana.

 
Outro destaque fica por conta da obra “Cloud Earth Twist”, do nigeriano Bright Ugochukwu Eke. A instalação que vem ao “Africa Africans” tem inspiração autobiográfica. Após sofrer uma infecção na pele decorrente de uma chuva ácida, Eke desenvolveu a obra que consiste em milhares de sacos plásticos cheios de água acidificada. O trabalho de Eke tem sido exposto em cidades como Durban, Lagos, Londres, Nova York e Verona, entre outras. Bright Eke cria uma arte socialmente orientada, explorando os caminhos pelos quais as pessoas interagem com seu meio. Usando água como tema e meio, ele desafia o espectador a pensar sobre este precioso recurso, politica, ética e ecologicamente.
Será produzido também um catálogo trilíngue (português-inglês-francês) sobre a exposição, a mostra de moda e o seminário.

 
A primeira etapa do “Africa Africans” aconteceu no último dia 17 de abril, parte do calendário da 39ª edição do São Paulo Fashion Week (SPFW), onde o museu teve a honra de receber a mostra “Africa Africans Moda” e apresentou os trabalhos de cinco estilistas africanos: Palesa Mokubung, África do Sul; Amaka “Maki” Osakwe, Nigéria; Jamil Walji’, Quênia; Xuly Bët, Mali e Imane Ayissi, de Camarões. A mostra de moda ocorreu no espaço central do museu e teve a curadoria do nigeriano Andy Okoroafor, reconhecido editor e diretor de arte, clipes musicais e moda em Paris, França.

 

 
Até 30 de agosto.

1ª COLETIVA EXPERIMENTA

29/mai

A Galeria Lume, Jardim Europa, São Paulo, SP, inaugurou a “1ª Coletiva Experimenta”, com curadoria de Paulo Kassab Jr e coordenação de Felipe Hegg e Victoria Zuffo. O projeto propõe divulgar e exibir a produção de artistas brasileiros e estrangeiros que já possuem uma trajetória artística mas que não são representados por nenhuma galeria, em São Paulo. Nesta edição inaugural, os artistas selecionados são Cecília Walton, Claudio Alvarez, Gian Spina, Maximilian Magnus e Renato Dib.

 

Em continuação à intensa programação de mostras, feiras nacionais e internacionais e eventos culturais, a Galeria Lume inaugura o projeto “Coletiva Experimenta”. Anualmente, a galeria abrirá inscrições para receber portfólios de artistas, os quais serão analisados por um conselho de curadores convidados pela galeria.

 

Nesta primeira edição, Cecília Walton apresenta “Bruxas no Ar” e “A Liberdade Guia o Povo”, nas quais emoldura telas em branco contendo informações estéticas apenas na parte inferior dos quadros, em uma proposta minimalista; além da série “Coleção de Arte da Cidade”, na qual exibe apenas a moldura de obras famosas e seus respectivos nomes, em uma crítica aos visitantes de exposições que veem nome, mas não a obra. Claudio Alvarez expõe “Mole”, uma peça em aço inox que segue o princípio de estruturação do artista baseado no movimento, reflexo da influência da arte cinética em sua produção. Gian Spina, por sua vez, traz “A Cada Minuto Morre um Poema” e “Não Param Nunca de Morrer”, fotografia composta por vários cliques da frase, escrita na mão esquerda do artista, em diferentes situações; e “The Day When my Rage Woke Up Before Me”, performance que realizou em Bordeaux, França, “colocando fogo” na Place de la Bourse, cartão postal desta cidade que arrecadou grande parte de sua riqueza com o tráfico de escravos, tendo seu auge no século XVII. Selecionado como destaque na residência da Tofiq House, o alemão Maximilian Magnus exibe “I’m Sorry” e “Thank You”, séries que tratam de sua vivência com o “jeitinho” brasileiro e suas consequências no mundo do trabalho. Por fim, Renato Dib participa com o projeto “Linhas da Mão”, utilizando luvas de lã como suporte para suas intervenções artísticas, e a série “Air Embroidery – Bordados no Ar”, composta por objetos em tecido suspensos.

 

Com mais este projeto inovador, a Galeria Lume abre espaço para artistas que não possuem nenhuma representação no circuito cultural de São Paulo, no intuito de diversificar a sua programação de seu espaço e exibir novas propostas criativas ao público.

 

 

De 29 de maio a 04 de julho.       

No Museu de Arte do Rio/MAR

O Museu de Arte do Rio, MAR, Centro, Rio de Janeiro, RJ, exibe a exposição “Tarsila e Mulheres Modernas no Rio”. Por meio de 200 peças (entre pinturas, fotografias, desenhos, gravuras, esculturas, instalações, documentos, material audiovisual e objetos pessoais), a exposição explicita a maneira pela qual a atuação de figuras femininas foi fundamental no que diz respeito à construção das sociedades carioca e brasileira, entre os séculos 19 e 20, nas mais diversas áreas – como artes visuais, literatura, música, teatro, dança, medicina, arquitetura, esporte, religião, política etc. Hecilda Fadel, Marcelo Campos, Nataraj Trinta e Paulo Herkenhoff assinam a curadoria da mostra.

 

A exposição “Tarsila e Mulheres Modernas no Rio” retrata mulheres com importante atuação em seus campos, do final do século XIX até hoje, e suas contribuições para a história da arte brasileira. O visitante se depara com mulheres com uma visão moderna não apenas nas artes visuais, mas nas ciências, na saúde, na segurança pública, na música, na dança. A exposição faz uma homenagem também às mulheres anônimas que revolucionaram nossa história ao demonstrar coragem e firmeza para fazer valer seus direitos.

É a primeira vez que Tarsila é contextualizada para além do campo das artes, abordando também o período pelo qual o Brasil e o Rio passaram, de lutas pelos diretos das mulheres que assumiam seu papel na sociedade, seus corpos e desejos. Nesse contexto, a vida e a obra da artista, representada com 25 pinturas e dez desenhos, serve como ponto de partida para a mostra da qual também fazem parte outros grandes nomes como Djanira, Maria Martins, Maria Helena Vieira da Silva, Anita Malfatti, Lygia Clark, Zélia Salgado e Lygia Pape.

 

O percurso tem inicio com as mulheres retratadas por Debret no século XIX, em ilustrações que evidenciam o uso de muxarabis – treliças de madeira que ocultavam a figura feminina nos recônditos do lar. A evolução da mulher na sociedade passa pelo direito ao voto e o reconhecimento do trabalho das domésticas no Brasil – incluindo a primeira publicação de reportagem sobre o assunto nos anos de 1950. O Aterro do Flamengo e o papel feminino na arquitetura do Rio moderno estão representados por Lota de Macedo Soares e Niomar Moniz Sodré, entre outras.

 

O momento em que as mulheres despontam na música, com apresentações em night clubs – até então um ambiente predominantemente masculino –, é contado por meio das histórias e canções de grandes divas do rádio, como Marlene e Emilinha Borba. As tias do samba e a mistura entre música e religião aparecem em fotos que revelam as feijoadas e os encontros nas comunidades da cidade, antes de se tornarem acessíveis ao publico em geral nas escolas de samba. Na dança, a primeira bailarina negra do Theatro Municipal, Mercedes Baptista, e outros nomes do balé clássico e contemporâneo, como Tatiana Leskova e Angel Vianna, também fazem parte da mostra.

 

O espaço dedicado à literatura lança luz sobre outras facetas de Clarice Lispector – as crônicas femininas publicadas sob o pseudônimo Helen Palmer, o trabalho como pintora e fotos de sua intimidade registradas pelo filho. Raridades como o manuscrito de O quinze, de Rachel de Queiroz, também fazem parte da seleção. A mostra reúne ainda fotografias e recortes de jornais para contar a história de mulheres que, ao contrário das retratadas por Debret, foram às ruas para lutar por seus direitos e de seus familiares, como a Pagu, primeira presa política do país, e a viúva de Amarildo, que enfrenta a polícia na busca pelo corpo de seu marido.

 

 

Até 20 de setembro.

Julia Csekö e o público

28/mai

A MUV Gallery, Ipanema, Rio de Janeiro, RJ, representa obras de artistas da nova geração da arte contemporânea, um projeto de Camila Tomé e Stéphanie Afonso, acaba de completar um ano. Para comemorar a data as sócias convidaram a artista americana Julia Csekö para apresentar a exposição individual “VOCÊ/EU”, com abertura marcada para o dia 17 de junho, onde o público poderá interagir e participar da montagem e resultado da obra. A mostra começa com o espaço expositivo praticamente vazio, a não ser por uma grande instalação de corações rosas e vermelhos afixados por fios prateados ao teto.

 

Por alguns meses Julia Csekö produziu uma grande quantidade de corações de veludo, pelúcia, cetim; tecidos brilhantes e texturizados. Cada coração é uma unidade de tempo, fazendo parte de uma longa meditação sobre o amor. A partir do momento da abertura o público é convidado a trazer objetos para serem trocados por estes corações. Aos poucos a Galeria será preenchida por objetos trazidos pelos visitantes. Os objetos trocados devem representar de alguma forma afetos e ideias/imagens que remetam ao amor.

 

Feitos de material macio, eles são fechados com fios metalizados, numa referência a prática Japonesa Kintsugi onde um objeto que se quebra é remendado usando ouro, prata ou platina. Cada cicatriz deixada, ao invés de ser escondida é ressaltada como um acréscimo ou elemento estético.

 

Alguns assuntos recorrentes na obra de Julia Csekö, como o trânsito entre micro e macro perspectivas, repetição e replicação versus originalidade estão presentes nesta exposição. Cada coração é único, feito a mão pela artista porém ao serem exibidos em um conjunto, sua singularidade é temporariamente atenuada. O processo de troca é imprevisível, a cada troca efetuada a exposição se torna mais plural e menos autoral. Cada coração é um objeto único e contém uma interação e relação interpessoal com o espectador em estado de latência. A cada troca a singularidade de cada coração é ressaltada. Quanto mais trocas efetuadas, mais plural a exposição se torna.

 

A penca de corações passa por uma transformação, começando como um conjunto de objetos similares e tornando-se a cada troca um conjunto de objetos díspares, fragmentos que juntos compõe uma narrativa sobre afetos, trocas, amores e desejos.  Os objetos se transformarão, mas o motivo que os une dentro do mesmo espaço permanece. Cada coração é uma ponte entre a artista e o público e entre a obra e o espectador. Os objetos trocados serão documentados e colocados num arquivo e catálogo digital, para que o exposição possa novamente transitar entre o material e o imaterial, entre o espaço físico, idéias, afetos e memórias.

 

 

Sobre a artista

 

Julia nasceu no Colorado, EUA, e cresceu no Rio de Janeiro. Voltou ao seu país de origem para cursar mestrado em artes visuais na School of the Museum of Fine Arts, em Boston, e suas obras estão em importantes coleções como na Morris and Helen Belkin Art Gallery, British Columbia University Museum, Canada e MAM Rio. Já participou de mostras na Galeria A Gentil Carioca, Caixa Cultural – RJ, Centro Cultural Banco do Barsil – SP, MAM- BA, Fundação Eva Klabin e em galerias em Portugal, Estados Unidos, Canadá e França.

 

 

De 17 de junho a 17 de julho.

(Sábados mediante agendamento pelo tel: (21) 3988-0600).