Entre a Documenta e Paris

10/set

Dois dos artistas representados pela OMA |Galeria, São Bernardo do Campo, SP, RIEN e Thiago Toes, partiram mais uma vez para a Europa para mostrar seus trabalhos. A primeira escala foi em Lüben, Alemanha. A cidade abriga o 13º Internationale Werkstattwoche, um simpósio que conta com uma residência artística (24 artistas, de nove países, entre pintores, escultores e fotógrafos), durante a qual promove momentos de convivência comunitária produzindo suas obras. Ao final da convivência, as obras passaram a ser expostas no local e, em 2016, integrarão exposições itinerantes por quatro cidades alemãs. A escolha dos artistas ocorreu por meio de edital, que avalia o currículo artístico dos candidatos. Toes e RIEN já realizaram diversas exposições no Brasil e no exterior e suas peças compõem relevantes coleções particulares.

 

Aproveitando a passagem pela Europa, em Paris, entre os dias 11 e 21 de setembro, Andrey Rossi, Toes e RIEN terão suas obras expostas na galeria Espace des Arts Sans Frontières. O local é conhecido por apresentar promessas das artes de vários pontos do mundo. Segundo o galerista da OMA | Galeria, Thomaz Pacheco, estes eventos são muito importantes para a divulgação da arte brasileira no exterior. “A escolha dos artistas para a residência na Alemanha demonstra o quanto a arte contemporânea brasileira tem conquistado cada vez mais espaço mundialmente. Em Paris, trata-se de uma exposição individual, em que cada artista ocupará uma sala da galeria e as obras poderão ser comercializadas. Esse tour europeu será um grande privilégio a todos nós e, certamente, trará ótimos frutos aos artistas e à arte brasileira”, afirma.

Em Ribeirão Preto

08/set

A Galeria Marcelo Guarnieri, Ribeirão Preto, São Paulo, SP, apresenta a exposição de Pierre Verger. Depois de realizar em fevereiro deste ano a mostra “O Mensageiro” na unidade de São Paulo, a galeria amplia o conjunto de imagens em uma nova montagem na unidade de Ribeirão Preto.

 

 

Antes de chegar ao Brasil, antes de se debruçar sobre a cultura afro-brasileira, antes de se tornar babalaô, Pierre Verger era, essencialmente, fotógrafo. Um fotógrafo já reconhecido desde antes da Segunda Guerra Mundial e com fotografias publicadas nas mais importantes revistas francesas e internacionais da época, como Life, Vu, Regards e Arts et Métier Graphiques.

Quando sua vida e sua obra caminharam em direção às questões afro-brasileiras, tornou-se um homem do candomblé, publicou intensamente sobre essa temática – notadamente sobre sua matriz religiosa -, fixou residência na Bahia e mergulhou tão profundamente nesse novo viver que foi aos poucos desaparecendo da memória de seus contemporâneos franceses e europeus, ao menos como fotógrafo.

Em 1993, a Revue Noire, das primeiras a destacar a arte africana no mercado ocidental, realizou a grande exposição Pierre Verger, Le Messager, com mostras na Suíça e na França, no Musée d’Art d’Afrique et d’Océanie. Amplamente divulgadas nos meios de comunicação franceses, esse grande evento cultural recolocou Verger no cenário da fotografia em seu país de origem.

No processo de construção dessa exposição e com o objetivo de selecionar imagens para a mostra e para o livro-catálogo, os diretores da Revue Noire vieram até a casa de Verger, na Bahia. Após um minucioso trabalho, desenvolvido em conjunto com o fotógrafo, levaram mais de 300 negativos para Paris, onde realizaram, pela primeira vez, cópias de excelente qualidade. A maioria dessas ampliações foram, então, utilizadas para fazer os fotolitos do livro Le Messager e/ou expostas.

Nessa época, os donos da Revue Noire, aproveitando a presença de Verger em Paris, conseguiram que ele assinasse uma certa quantidade dessas cópias, o que Verger aceitou fazer, embora normalmente não se submetesse a esse tipo de cerimonial. O que realmente importava para Verger – ao contrário de muitos fotógrafos – eram seus negativos, por representarem suas memórias. Na verdade, ele dava pouca importância às ampliações, que não costumava vender e que podia reproduzir quando se fizesse necessário.

 

 

Poucos anos depois, em fevereiro de 1996, Verger faleceu na Bahia, deixando esse conjunto único de imagens, que continuou em poder da Revue Noire, em Paris. Essas imagens foram comercializadas na França, até o final do ano de 2000, quando a Fundação adquiriu sua quase totalidade. (Fundação Pierre Verger)

 

 

 

Até 09 de outubro.

 

Interpretações e traduções

02/set

Com curadoria de Lilia Moritz Schwarcz, a exposição “Nelson Leirner leitor do outros e de si mesmo” na Galeria Vermelho, Jardim Paulista, São Paulo, SP,  apresenta cerca de 75 obras de Nelson Leirner nas quais o artista interpreta, traduz e dialoga com trabalhos de 12 artistas de diversas épocas, como Leonardo da Vinci, Lucio Fontana, Damien Hirst, Yayoi Kusama, Lucio Fontana e Mondrian. Cada espaço da Galeria Vermelho fica reservado às interpretações de cada um desses artistas com obras produzidas por Nelson Leirner entre os anos de 1968 e 2015.

 

 
Até 03 de outubro.

Releituras

31/ago


Chama-se “Releituras da Natureza-morta” a próxima exposição a ser

inaugurada na Carbono Galeria, Jardim Paulistano, São Paulo, SP. Com

curadoria de Ligia Canongia, a mostra reúne obras de treze artistas

nacionais e internacionais, que refletem suas percepções quanto às visões

contemporâneas da Natureza-morta.

 

A coletiva apresenta trabalhos dos artistas Alex Yudzon, Angelo Venosa,

Bruno Dunley, Carlito Carvalhosa, Gabriela Machado, Iran do Espírito

Santo, José Damasceno, Laura Lima, Livia Marin, Maria Nepomuceno, Vera

Chaves Barcellos, Vik Muniz e Waltercio Caldas.

 

A natureza-morta é estudada e representada ao longo da história da arte

e em “Releituras da natureza-morta”, o gênero será representado por um

“um conceito expandido, uma reinterpretação”.

 

 

De 29 de agosto a 31 de outubro.

Na Bergamin&Gomide

25/ago

Com curadoria de Felipe Scovino, “Atributos do Silêncio” faz referência às possíveis qualidades

ou atmosferas que o silêncio emana, tais como a delicadeza, o vazio, a suavidade, a

invisibilidade, o antiespetáculo, o apagamento e o etéreo. A nova mostra da

Bergamin&Gomide, Jardins, São Paulo, SP, reúne obras de Anna Maria Maiolino, Waltercio

Caldas, Mira Schendel, Lygia Pape, Luiza Baldan, Cao Guimarães, Leonilson, Caio Reisewitz,

Brígida Baltar e outros.

 

 

Atributos do Silêncio

Felipe Scovino

 

As obras reunidas para esta exposição fazem referência às possíveis qualidades ou atmosferas

que o silêncio emana, tais como a delicadeza, o vazio, a suavidade, a invisibilidade, o

antiespetáculo, o apagamento e o etéreo.

 

O conceito de silêncio tem sido tema de recentes exposições, mas o que nos interessa refletir

nesta mostra é a sua capacidade de múltipla representação e como as atmosferas citadas se

comportam e podem se conectar em uma rede de significados e transbordamento de sentidos.

 

Refletindo sobre a obra de Leonilson, Para quem comprou a verdade (1991), percebemos a

exposição de uma fragilidade que é tanto dos materiais empregados quanto do próprio

sujeito, que se revela audaz e corajoso. Estão contidos, nesse pedaço de bordado, seus medos,

dramas, frustações, solidão, mas significativamente sua voz. É a sua fala com o mundo, a sua

exposição ao outro, seu espaço de vida e celebração. Estes são aspectos passíveis de serem

atribuídos às obras dos artistas selecionados. O sentimento de despertencimento é abordado

de maneira mais dramática com a série Obituários (1998), de Jorge Macchi. É a morte que

encaramos nas páginas recortadas de um jornal. O artista recortou, dentro do caderno de

obituários do periódico, as informações sobre os falecidos, resguardando apenas as cruzes ou

as estrelas que determinam a religião do morto. Há um choque ao confrontarmos ao mesmo

tempo uma escultura e a realidade do material. A maneira como o artista transforma uma

estrutura de papel em um corpo desfeito de carnalidade. Vazado e triste, desolado e solitário,

Obituários reflete ausência e falta, mesmo sem sabermos quem eram aquelas pessoas e suas

histórias de vida.

 

Na obra de Thiago Rocha Pitta, a fluidez da natureza e o seu estado constante de

transformação sempre suave se tornam aparentes através da delicadeza e da construção de

um tempo próprio, estendido, deslocado e demorado que o olhar do artista nos oferece.

Ademais, pintura e vídeo estão se fazendo simultaneamente, porque há uma materialidade

pictórica e uma gestualidade na forma como a natureza das coisas nos é apresentada. A

câmera aproxima-se da natureza, mudando a nossa perspectiva e escala sobre o mundo e

transformando a própria materialidade da superfície em frestas, aberturas, descidas, pequenas

depressões e vales que se constroem e se desfazem na mesma velocidade. O artista nos alerta

sobre uma velocidade e transformação constante, mas que muitas vezes nos passam de forma

imperceptível, e é por essa escala de silêncio e suavidade que ele também se interessa.

 

Os espaços escavados ou apagados, marcados pela gestualidade, em Anna Maria Maiolino

efetuam uma espécie de inversão do plano. Ao mesmo tempo em que tanto a geração

anterior, a dos neoconcretos, quanto a geração de Maiolino pesquisavam e inventavam uma

saída do plano em direção ao espaço tridimensional, Mais buracos (1975/2000) não deixa de

operar essa tarefa, mas o sentido é outro: seu espaço é o interior, a cavidade, e não o ar ou a

exterioridade. Ele não é um desenho no espaço, mas um corpo, ou melhor, as entranhas de

um corpo, agora visível e irrefutável.

 

Estão presentes na exposição discussões sobre a desmaterialização do objeto e a noção de

“eficácia”, ou melhor, a apropriação de sentido e reflexão da obra de arte como ideia e não

mais objetualidade. Ademais, em um tempo em que o excesso de informação parece ser uma

tônica incondicional e irreversível, a exposição explora o outro lado: a partir de um “nada”, de

“silêncios”, podemos construir uma rede de significados e potências nunca antes imaginada.

São os casos das obras de Brígida Baltar e Cao Guimarães. Em Coleta da neblina (2002), Baltar

investe no processo do artista como personagem e num contexto em que ficção e realidade

convergem, embaralhando as nossas noções firmes e concretas sobre o que nos cerca. A

artista age como uma coletora de imaterialidade, isto é, transmite volume, peso e densidade a

algo que sempre foi identificado como etéreo. O fato de vagar por uma paisagem coberta pela

neblina amplia ainda o senso de silêncio da obra. Já em Guimarães, suas obras ativam

acontecimentos cotidianos triviais que são da máxima expressividade. São trabalhos que o

artista chama de “microdramas da forma”, ou seja, guardam em si uma potencialidade

dramática qualquer. Uma bolha que vaga a esmo, ou ainda uma folha seca cercada pelo

orvalho e vice-versa são imagens que possuem em si mesmas uma enorme dramaticidade. Em

Nanofania (2003) e Concerto para clorofila (2004), índices de imaterialidade – bolha, luz e

sombra – passam a deter texturas, formas, cores, uma estrutura de pele e carne. A nossa

perspectiva é dirigida para ações, lugares e seres que mal percebemos em nosso cotidiano. São

fenômenos cadenciados pelo seu tempo e escala próprios. Os pequenos dramas ou

acontecimentos da vida que são desprezados nos lembram que eles são exatamente o que

constituem a vida. Em Úmido (2015), não sabemos o que se estabeleceu primeiro: a “auréola”

em torno da folha ou o pouso suave desta que depois foi recompensado pelo orvalho da

chuva. Mais uma obra desse artista que chega ao mundo pelo prisma da delicadeza e por uma

narrativa com fortes ligações com a literatura e o cinema. É a ideia do acidente e da

impossibilidade de se confirmar o que vemos com a exata certeza de que a ciência ou a

realidade quer nos impor que transmite à obra de Cao Guimarães um forte imaginário poético.

 

A escala do mundo inverte-se em Sopro (2013), de Maria Laet: voltamos para aquilo que era

dado como supostamente imperceptível, menor ou desprezível. Presenciamos movimentos,

leituras e sintomas de um mundo que acontece sem nos darmos conta. Ademais, a forma

como opera a duração do tempo em suas obras, realizadas por meio de ações performáticas

extremamente singelas, convertendo-se em um ritmo monótono e lento, emprega uma

circunstância de investigação sobre o seu próprio estado. O ato de soprar água-tinta sobre o

papel acaba por provar que tempo e espaço se aliam como potências que provocam um

estado aleatório e de profunda poesia sobre as marcas do papel. Estão ali impregnadas por

entre suas tramas paisagens, variáveis, nuances e fundamentalmente um corpo, que não é

qualquer um, já que está ali contido também um registro imaterial do corpo da artista.

Quando digo que é corpo, não se trata de carne, mas efetivamente pele. E esta imagem ganha

ainda mais preponderância quando metaforicamente a imagem representada pelo sopro se

assemelha a uma impressão digital, à superfície da pele. Esta imagem cria uma consonância

perfeita com Vestígios na transparência (2006), de Maiolino, quando essa imagem metafórica

do corpo, em geral, e da pele, em especial, se faz devido a uma sobreposição de folhas em

papel japonês, em que a artista realiza um desenho na primeira dessas folhas. O desenho em

nanquim cria “rastros” que são absorvidos pelas folhas subsequentes criando uma variedade

de tons e formas derivados do aleatório, que é o indício máximo da própria vida.

 

As fotos de Caio Reisewitz e Luiza Baldan situam-se entre o silêncio e o (largo) intervalo entre a

espera e o esquecimento. Um território preenchido pelo indício de que algo acabou de

acontecer por ali ou há muito é preenchido apenas por memórias. No caso de Baldan, é uma

imagem de qualquer lugar, exatamente pela sua imprecisão espacial e temporal. Existe algo

tão próprio de nós nesses dois espaços (uma casa e uma garagem) por certo pelo fato de

estarem se comunicando com a ideia de espaço privado, mas que ambiguamente nos afasta de

um comprometimento de estabilidade ou segurança, pois são espaços abertos. Silêncio aqui

não está diretamente ligado à ausência humana (até porque existe a possibilidade de

“alguém” ter acabado de passar por ali) nem à economia de gestos, mas ao caráter ambíguo

de presença e solidão que Baldan e Reisewitz empregam nas imagens.

 

Este mesmo caráter reaparece em uma obra escultórica na mostra. Trata-se de London Angles

#1 (2014), de Pedro Cabrita Reis. Os materiais empregam simbolicamente uma característica

antropomórfica à estrutura metálica. A luz é pulsão de vida, registro de um corpo

desamparado, triste, solitário, débil. Clama por alguém. Eis um grito surdo que conclama ao

outro para que percebam a sua aparição no mundo. Quer se fazer vidente e visível diante do

silêncio.

 

Inteligência, comprometimento com a ruptura e intuição estavam na base da constituição das

poéticas de Amilcar de Castro, Franz Weissmann, Lygia Clark e Lygia Pape, importantes

referências para o trabalho de Waltercio Caldas, para conceber espaços relacionados ao corpo,

“ou melhor, ao olhar encarnado em um corpo em movimento a partir da revolução de

elementos puramente planares”.[1] O que Caldas realiza caminha em outro sentido. Percebam

que o observador não é participante da ação, mas reconstrói de forma subjetiva a condição

planar das esculturas e materializa-se naqueles sólidos geométricos. Os planos vazados, ar

enquanto volume, a relação antropomórfica, o espelho como um autorretrato e um elemento

de transferência entre corpo do observador e matéria escultórica constituem Eureca (2001)

como um espaço a ser inventado pelas múltiplas possibilidades de “posições de corpos”:[2]

sua, enquanto observador, e dela, escultura.

 

Planos em movimento a partir da relação entre cheios e vazios, figura e fundo, linhas

horizontais e verticais são o motor da obra de Lygia Pape. Remetendo ao debate sobre a

pintura, o minimalismo e a ilusão gráfica e pictórica do grid que atravessou os anos 1950 e

1960, Pape vai mais adiante: seu interesse, além de ampliar as características formais e

estruturais do desenho e da pintura – ela singularmente constrói um espaço cinético no plano

–, é comprometer-se com o corpo. Estimular, especular, inventar um organismo por entre o

espaço geométrico. Sua linha é luz, corpo, matéria. Com sua economia de métodos peculiar,

vagarosamente constitui uma ação, um método para a aparição de uma linha que se converte

em desejo, ação e libertação do plano. Quer se fazer corpo, portanto. Interessante perceber o

quanto esse debate sobre a operação gráfica e ilusória do plano se faz em uma geração mais

recente de artistas, como é o caso de Carolina Martinez. Operando com uma espécie de

sombra e luz da madeira, Martinez cria espaços de cor e campos de luz (assim como de sua

ausência), combinando um jogo de formas e espaços que se convertem ora em janelas ora em

horizontes, criando, portanto, fortes laços com a prática pictórica. E tudo isso regido por

elementos precisos.

 

Nas obras de Isa Genzken e Otavio Schipper, em que especialmente o som é um referente, o

diálogo delas se dá pelo seu negativo, ou seja, pela ação de obstruir o som e evocar o seu

(suposto) silêncio. O que existe, ou melhor, aquilo que se expande pelo espaço, é a imagem do

som, isto é, as mais distintas suposições que podemos ter sobre qual som poderia ser ouvido

se finalmente aquilo que o impede (um betão, uma solda) fosse solto ou reinterpretado. O

som, portanto, é evidenciado pela forma, mas a nossa expectativa pelo seu acontecimento é

negada pelo silêncio. Não necessariamente a impossibilidade de o som se converter em

audição se constitui como drama ou falência, mas como um fenômeno que nos possibilita criar

inúmeras metáforas para o que pode ser qualificado como som. Parafraseando o pensamento

de John Cage de que o silêncio não existe e, portanto, ele não se reduz à questão acústico-

musical, estas duas obras não afirmam um significado último e derradeiro para o silêncio; ao

contrário, pois mostram sua abertura, complexidade e multiplicidade e apontam finalmente

para o fato de que silêncio e som estão em constante mutação e interpenetração.

 

Em uma perspectiva de tempo na qual vivemos em um transbordamento de imagens em que o

excesso revela também o afogamento em dados inúteis e a banalização da imagem (ela fica

vagando num mundo onde ela não sabe se é um anúncio de publicidade ou uma obra de arte),

as obras desta mostra operam exatamente contra essa automatização. Trazendo as

monotipias de Mira Schendel como um norte poderoso para a discussão, estas obras

despertam outra forma de perceber o mundo, de criar um alfabeto que se caracteriza não pelo

pragmatismo que dele por ora se espera, mas pelo viés da poesia, da delicadeza e

substancialmente de uma relação de opostos (cheio e vazio, dentro e fora, branco e preto,

retilíneo e torto) que se revela como a síntese da condição humana. É um alfabeto que

constantemente precisa ser decifrado, pois ele nunca se completa e é exatamente esse

exercício de descoberta incessante que o “apaga” da sua “função original” e converte essas

obras em discurso silencioso, lento e impactante sobre como ver e sentir o mundo. As linhas

de suas monotipias, que se convertem continuamente em ideogramas e imagens plásticas,

devem ser interpretadas sob a luz das próprias intempéries da vida. Estão lá o drama, o riso, o

silêncio, a vida, o fim. Tudo contido em uma economia surpreendente e mágica.

 

Finalmente, esse conjunto de obras não deve ser pensado como testemunho de um tempo,

mas como compromisso com a vida. Não são obras “datadas” ou “históricas”: possuem vida e

tempo próprios cujas projeções são voltadas para a construção de novos olhares sobre o

mundo.

 

 

De 29 de agosto a 26 de setembro.

Marcello Nitsche, registro de uma trajetória

21/ago

A exposição retrospectiva do artista Marcello Nitsche abarca sua extensa trajetória, desde a

década de 1960 até dias atuais. Sua carreira artística é marcada pelo diálogo estreito com a

cultura pop, pela leitura ativa da paisagem e dos signos urbanos, pela exploração de diversas

linguagens – como pintura, desenho, intervenções no espaço urbano e a realização de filmes

em super-8 mm. Destaca-se, igualmente, sua atuação nos debates e projetos obre arte-

educação e no cenário político da redemocratização do país, nos anos 1980, sobretudo pela

realização da identidade visual da campanha Diretas Já. A mostra reúne mais de cem do artista

nas últimas cinco décadas.

 

“LIG DES” leva à área de convivência da unidade Sesc Pompeia, Água Branca – Oeste, São

Paulo, SP,  grandes esculturas infláveis denominadas bolhas, esculturas de pequeno porte,

obras de suportes e características variadas, maquetes de obras para locais abertos, desenhos,

pinturas, registros em fotografia e em filmes em 8mm, documentando acontecimentos em

torno de sua obra.

 

O diálogo entre o espaço do Sesc Pompeia e a mostra é um destaque a parte, em que se revela

um fator potencializador para a exposição. Segundo a curadora, Ana Maria de Moraes

Belluzzo, “LIG DES” dialoga com as características do espaço, que já foi uma fábrica,

transformado em ambiente nada convencional de cultura e convívio por Lina Bo Bardi”.

 

 
Texto da curadora

 

A nova visão da natureza moderna impõe-se pela paisagem urbana aos jovens artistas

brasileiros atuantes em meados dos anos 1960. Fábrica e cidade constituem a moderna

paisagem e marcam, de modo peculiar, a experiência artística de Marcello Nitsche entrelaçada

à vida de São Paulo.

 

A presença dessas obras no espaço da fábrica do Sesc Pompeia é um estimulante ponto de

partida. O local, transformado pela imaginação da arquiteta Lina Bo Bardi em espaço não

convencional de convívio e cultura, atualiza sua vocação ao mostrar essa obra aberta à

existência no espaço urbano.

 

A experiência de Marcello Nitsche se desdobra num momento em que se agitam convenções

artísticas e o país é assaltado por profundas transformações políticas e culturais, momento em

que artistas alargam o campo perceptive e lançam mão da apropriação estética de coisas que

povoam o entorno imediato dos habitantes da cidade.

 

A contribuição precoce de Marcello brota no interior de movimentos de renovação cultural no

país, em diálogo com coletivos internacionais da época pop, em meio ao debate sobre o novo

realismo e o retorno à figura. É parte dos avanços da nova objetividade brasileira. Em âmbito

paulista, as experimentações acolhidas pelo grupo REX contam com o substrato trazido ao

debate por mestres da Faap, afinados com a pauta arquitetônica.

 

Em diálogo com diferentes interlocutores, sua obra irrompe no vigor das concepções, sob

diferentes mídias. No teor experimental dos anos 1960, 1970, 1980, apuram-se aberturas para

contemporaneidade.

 

A apreciação retrospectiva do repertório do artista deve-se à cordialidade das coleções

públicas e privadas e à presença de versões fac-similares de peças desaparecidas, construídas

pelo Sesc para a ocasião.

 

Que o caráter inaugural dessa obra chegue às novas gerações, reproduzindo a surpresa vivida

por seus pares com o aparecimento de cada novo trabalho de Marcello.

Ana Maria de Moraes Belluzzo

 

 

Sobre o artista

 

Marcello Nitsche é paulistano, e seu trabalho se apresenta nos anos 1960, em meio ao cenário

de uma São Paulo que tem sua paisagem transformada pelo crescimento urbano industrial.

 

 

Até 30 de agosto.

Arquitetura da Luz

Em sua segunda exposição individual na Galeria Oscar Cruz, Itaim, São Paulo, SP, Hildebrando

de Castro apresenta uma série inédita de pinturas e relevos que comprovam seu domínio

refinado da técnica da pintura, mantendo sempre presente a sua constante preocupação com

a luz.

 

Nessa nova série de obras, ainda relacionadas com a arquitetura, percebe-se que mesmo

sendo uma pintura realista, o artista sempre deixa margem para a imaginação do observador,

na medida em que as composições retratadas flertam constantemente com a abstração

geométrica, a op-art, arte cinética e o construtivismo, porém sem nunca abandonar o terreno

da representação figurativa, é justamente aí que reside todo o mistério e encanto de sua

proposta.

 

 

De 03 de setembro a 24 de outubro.

Do arcaísmo ao fim da forma na Pinacoteca

A Pinacoteca do Estado, Luz, São Paulo, SP, museu da Secretaria da Cultura do Estado de São

Paulo, exibe até 27 de setembro a exposição “Marino Marini: do arcaísmo ao fim da forma”.

Com curadoria de Alberto Salvadori, diretor do Museo Marino Marini em Florença, a exposição

é a primeira retrospectiva no Brasil do artista italiano reconhecido mundialmente por suas

esculturas em bronze, e um dos nomes fundamentais da arte moderna italiana.

 

A mostra proporciona ao público uma visão ampla e generosa da produção artística de Marini,

expondo 68 peças, entre esculturas, pinturas e desenhos, de distintos períodos de sua carreira

e reúne obras das duas importantes instituições dedicadas à obra do artista na Itália, o Museo

Marino Marini de Florença e da Fondazione Marino Marini de Pistoia – cidade natal de Marini.

 

A exposição “Marino Marini: do arcaísmo ao fim da forma”, tem patrocínio da Pirelli e apoio do

Istituto Italiano di Cultura di San Paolo. Esta iniciativa faz parte do “Ano da Itália na América

Latina” promovido pelo Ministério das Relações Exteriores e da Cooperação Internacional da

Itália e já foi apresentada na Fundação Iberê Camargo em Porto Alegre.

 

 

Sobre o artista

 

Nascido em Pistoia (1901 – 1980), na região da Toscana, Marini cresceu cercado pelas

influências da vizinha Florença, nutrindo uma forte ligação com a arte etrusca e com a arte

egípcia pertencente aos museus da região, desenvolvendo em sua obra quatro temáticas em

particular: o retrato, a Pomona – a encarnação do eterno feminino –, os cavalos e os cavaleiros

e o circo. Por este último era extremamente fascinado, sentindo-se intrigado pela natureza do

ofício do malabarista, do palhaço e dos acrobatas. “A relevância de Marino Marini foi de um

artista que não se comportou como um filólogo, não aceitou os dados históricos consumidos

pelo estudo e pela interpretação antropomorfa do sujeito, mas revelou, no seu trabalho, uma

dimensão de atualidade da matéria numa relação direta entre homem e sujeito”, destaca

Alberto Salvadori.

O finissage de “Travessia”

19/ago

Guilherme Maranhão promove encontro dia 23 de agosto de 2015, domingo, das 11 às 14h, para fotógrafos, marcando o encerramento de sua exposição “Travessia”, em cartaz na Casa da Imagem / Museu da Cidade de São Paulo, Centro, São Paulo, SP. Ao reunir profissionais da fotografia, curadores e laboratoristas, o evento conta com duas mesas redondas em torno dos processos de trabalho e etapas na apresentação de ensaios fotográficos ao público. A primeira mesa recebe a participação de Ronaldo Entler, Henrique Siqueira e Fausto Chermont, e apresenta diversos pontos de vista em relação aos caminhos – editais, concursos, salões, residências – que visam tornar públicos os trabalhos fotográficos, como por meio de exposições, “zines”, livros etc. Já na segunda mesa redonda – com Roger Sassaki, Rosangela Andrade, Gibo Pinheiro, Elizabeth Lee e Edison Angeloni -, serão abordadas alternativas para a fotografia analógica, especificamente em São Paulo, levantando soluções e ideias para quem ainda não consegue superar esta técnica.

 

 

Convidados

 

Ronaldo Entler – Graduado em Jornalismo pela PUC-SP, mestre em multimeios pelo IA-Unicamp, doutor em artes pela ECA-USP, pós-doutor em multimeios pelo IA-Unicamp. Atuou na imprensa como repórter fotográfico entre 1997 e 2002, participando também de exposições coletivas e individuais. Foi diretor artístico da área de fotografia da Fundação Cultural Cassiano Ricardo de São José dos Campos, entre 1991 e 1995. Entre 2005 e 2010, atuou como professor visitante no Programa de Pós-Graduação em Multimeios do IA-Unicamp. Atualmente, é professor e coordenador de Pós-Graduação da Faculdade de Comunicação e Marketing da FAAP, e professor da Faculdade de Artes Plásticas da FAAP.

 

Henrique Siqueira – Possui graduação em Ciências Sociais e Políticas pela Escola De Sociologia e Política de São Paulo(1989) e mestrado em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo(2006). Atualmente é Diretor da Museu da Cidade de São Paulo – Casa da Imagem. Tem experiência na área de Artes, com ênfase em Fundamentos e Crítica das Artes.

 

Fausto Chermont – Fotógrafo e curador. Membro fundador do Mês Internacional da Fotografia de São Paulo. Membro da comissão criadora da Lei Mendonça, do Conselho Municipal e Estadual de Cultura. Presidente do Júri do Premio Nordeste de Fotografia. Vice-Presidente da Cooperativa dos Artistas Visuais do Brasil. Curador Assistente de fotografia e Criador do Depto de Novas Tecnologias do Mis – Museu da Imagem e do Som de SP e Presidente do Conselho. Atua como fotógrafo profissional e autoral há mais de trinta anos. É consultor de pré-impressão gráfica e produtor gráfico. É autor do livro de fotografias São Paulo Século XXI, sobre o centro de SP. Atualmente desenvolve projetos de produção e realização de documentários de fotografia.

 

Roger Sassaki – Bacharel em Fotografia pelo Centro de Comunicação e Artes do Senac-SP. Já realizou exposição sobre o sertão mineiro às margens do rio São Francisco, participou de outras mostras individuais e coletivas e é fotógrafo oficial de espetáculos e shows. Ministra cursos e oficinas de fotografia, com enfoque em técnicas artesanais analógicas.

 

Rosangela Andrade – Laboratorista profissional desde 1989. Trabalhou com o fotografo Zé de Boni na Álbum Laboratório. Em 1992 abriu seu próprio laboratório, o Imágicas Laboratório Fotográfico Analógico. Em 24 anos de atividade ampliou para exposições e livros de grandes nomes da fotografia brasileira como Cristiano Mascaro, Thomas Farkas, Boris Kossoy, Maureen Bisilliat, Ed Viggiani, German Lorca, Vânia Toledo, Pedro Martinelli, entre outros. Rosangela é uma grande entusiasta do processo analógico e foi quem idealizou e fundou o Clube do Analógico em março de 2014.

 

Gibo Pinheiro – Nasceu na cidade de São Paulo, em 1962, e cursou História na PUC–SP. Na década de 80, abriu uma marcenaria e entrou em contato com o mundo da fotografia ao executar a montagem de um laboratório fotográfico profissional. No início dos anos 90, Gibo começou a trabalhar na área de produção como laboratorista e especializou-se no processo C-41 de revelação e ampliações manuais de negativos coloridos. Após vencer um prêmio de fotografia, montou o Gibo Lab e tornou-se referência no processo analógico colorido, realizando diversas exposições e editoriais para revistas de moda e arte com profissionais renomados do Brasil e exterior. Atualmente, se u laboratório é um dos últimos da América Latina a trabalhar com ampliações manuais coloridas pelo processo analógico, além de fazer impressões fine art (arquivos digitais) e ministrar cursos na área.

Edison Angeloni – Com formação em jornalismo, é fotógrafo, professor e realiza cursos e workshops sobre fotografia em instituições como Centros Culturais, ONG’s e Universidades. Trabalhou nos laboratórios e estúdios da Faculdade de Fotografia Senac, desenvolve trabalho fotográfico pessoal com pesquisa em câmera de orifício (pinhole) e processos históricos do séc. XIX.

 

Elizabetth Lee – Com formação de Bacharel em fotografia pelo Centro Universitário Senac, participou de exposições coletivas e festivais de curta-metragem. Tem como pesquisa as técnicas alternativas e históricas de revelação fotográfica.

 

Guilherme Maranhão – Nascido em 1975, no Rio de Janeiro. Reside e atua em São Paulo. É bacharel em Fotografia pela Faculdade do Senac. Cria imagens sobre ciclos de vida, imperfeitos por natureza, cheios de ruídos, interferências e sujeitos ao acaso. Sua pesquisa imagética busca alterações no processo de formação das imagens técnicas e subversões das ferramentas produzidas pela indústria. Participou de diversas mostras coletivas e individuais. Possui fotografias em importantes coleções como MAM-SP (Museu de Arte Moderna de São Paulo) e Coleção Itaú. Vencedor do Prêmio Porto Seguro de Fotografia 2007, na categoria Pesquisas Contemporâneas, e do Prêmio Marc Ferrez Funarte 2014, com o trabalho Travessia.

José Resende na Galeria Milan

18/ago

A individual de José Resende na Galeria Millan, Vila Madalena, São Paulo, SP, pode ser

compreendida como um desdobramento da exposição realizada na Pinacoteca do Estado de

São Paulo, entre abril e junho de 2015.  Até caberia dizer que a exposição vem a ser um

transbordamento através do espaço e do tempo.

 

Na Millan, a mostra também é composta apenas por esculturas recentes e inéditas. Mas

engana-se quem, apenas, antevê uma nova etapa do trabalho de José Resende – composta por

projetos e soluções inovadoras. Pois o caminho percorrido nos 50 anos de produção do artista

é de um “eterno retorno”; um continuum refletido e surpreendente. O humor, a tensão, as

oposições de sentido, o movimento latente e a sua inscrição no espaço público sempre

estiveram e estão presentes em sua obra.

 

É inegável que a escultura de José Resende explora as relações entre a cidade e o corpo. Seja

pela escolha de materiais– chapas e tubos metálicos, pedras, vidro, tecidos -,  ou seja pelo

embate direto da obra – entre verticais, horizontais, diagonais e curvas – com o entorno.

Guiado por um rigoroso pensamento plástico e uma imaginação lúdica, o artista, através de

suas esculturas, provoca uma outra visibilidade sobre a paisagem urbana, a corporeidade e a

mobilidade do mundo.

 

Aliás, a ideia de imprecisão do movimento é algo que une as obras de Resende expostas na

Galeria Millan. A escultura Dobras (2015) é constituída pelo encaixe de duas chapas de aço:

uma circular, dobrada ao meio, com duas fendas em “v” e outra em formato de meia lua. A

densidade e a resistência das chapas inspiram uma permanência; uma estabilidade aparente.

Que logo cai por terra quando percebe-se que há uma multiplicidade de possibilidades

escultóricas dentro da mesma escultura – basta mudar o encaixe da chapa em v. É na ideia de

um obra aberta que reside seu movimento, sua tensão constante.

 

Vale ainda por fim, ressaltar que se na Pinacoteca, a obra Dobras (2015) estava disposta como

um par de esculturas idênticas, já na Galeria Millan, a peça se desmembra e aparece como um

conjunto de esculturas, em diversas dimensões.

 

A obra inédita Corpo de Prova II, 2015 alcança outro tipo de movimento. O título já faz uma

alusão ao que está em jogo na escultura. O cálculo e a precisão da engenharia são suficientes

para controlar a imprevisibilidade da imaginação e do caráter sugestivo da forma plástica? De

um lado, dois tubos de aço inox escovado de 4 metros, do outro, dois tubos de aço inox polido

também de 4 metros inclinados e, ambos, conjuntos estão ligados por um cabo de aço. Corpo

de Prova II remete a procedimentos anteriores – como nos vagões de trem suspensos por

cabos de aço e ainda em algumas esculturas da década de 1970 – mas apresenta novas

soluções: um balanço pressuposto e potente.

 

No átrio da galeria, a obra inédita Up Side Down, 2015 – constituída por tubos de latão

conectados por cabos de aço – impacta pela sua monumentalidade, pelo humor e pelo desafio

da gravidade. Mesmo a despeito da leveza e da qualidade aérea da obra que, aliás, parece

criar um volume virtual que avança em direção do corpo do observador, Up Side Down, com os

seus 6 metros de altura, tem como desafio se manter em pé. A escultura também excede em

termos de escala o ambiente onde está instalada; há uma tensão entre obra e arquitetura, as

dimensões dos espaços – como as colunas, a espessura das paredes, as passagens, os

revestimentos de parede, o piso, o teto – são revistas.

 

 

De 22 de agosto a 26 de setembro.