Iberê no Festival de Cinema de Gramado

20/jul

 

 

O filme em curta-metragem sobre a produção de Iberê Camargo será exibido no Festival de Cinema de Gramado. O documentário “Tudo permanece em constante movimento”, da artista visual Cristine de Bem e Canto, foi selecionado para o 50° Festival de Cinema de Gramado, na categoria Curta-metragem Gaúcho. Com sete minutos de duração, o filme será exibido no dia 14 de agosto, no Palácio dos Festivais, com entrada gratuita.

 

O filme nasceu a partir da participação da artista no XVI Prêmio Funarte Marc Ferrez de Fotografia, cujo resultado pode ser conferido no Google Arts & Culture da Fundação Iberê Camargo, instituição parceira do projeto “Iberê Camargo: um corpo fotográfico”.

 

Em 1992, ao acompanhar a produção de guaches das séries “Andando contra o vento” (1993) e “O homem da flor na boca – um ato de amor à vida” (1992) e da pintura “Tudo te é falso e inútil V” (1993), no ateliê da rua Alcebíades Antônio dos Santos, Cristine produziu aproximadamente 500 fotogramas em preto e branco. As imagens ficaram guardadas durante 30 anos e foram retomados em 2022 para a produção de um livro digital.

 

Com o transcorrer do tempo, essas fotografias revelaram uma nova potência: ao dedicar-se a transposição do analógico para o digital, no tratamento das imagens, a artista percebeu a integração do corpo do pintor com o próprio corpo da pintura e, também, do espaço que ambos habitavam.

 

“Porque tu tiras tantas fotos?” – perguntou Iberê a Cristine. Esta resposta só viria décadas depois: para colocar o corpo do pintor uma vez mais em movimento. Para isso, ela precisou também da animação que o vídeo possibilita. Aliado ao trabalho de design de som, que reforça a corporificação do espaço e seus afetos, assim surgiu o documentário. No tratamento das fotografias, alguns movimentos e gestos de Iberê Camargo quase imperceptíveis – como abrir e fechar a boca, para assimilar a mesma expressão de seu modelo, foram reativados na sequência animada das fotografias.

 

Reflexões em torno da mostra de Hal Wildson

19/jul

 

 

Convite conversa aberta com Clarissa Diniz, Hal Wildson e Sandra Benites – “Re-Utopya: reflexões para um futuro possível”, dia 20 de julho, às 18h, na Galeria Movimento, Gávea, Rio de Janeiro, RJ, no ambiente da exposição “Re-Utopya”, de Hal Wildson com as curadoras e críticas Clarissa Diniz e Sandra Benites. A mediação é de Érika Nascimento. A entrada é gratuita, e o agendamento via Whatsapp: 21 97114-3641.

 

No evento, será lançado o NFT da videoarte “Reflorestar Nossa Gente” pela plataforma Tropix, onde parte do valor da venda será revertido para a aldeia Rio Silveira, da etnia Guarani Mbyá, no litoral de São Paulo.

 

Érika Nascimento observa que “ao trazermos reflexões sobre a vasta história do Brasil, buscamos refletir sobre o lugar de sobrevivência da memória, dos povos originários e da natureza, como um dever de proteção global. Com isso buscamos traçar uma ponte do passado a um projeto de futuro. Um futuro que possamos repensar estratégias de sobrevivência coletiva”.

 

A exposição “Re-Utopya” fica em cartaz na Galeria Movimento até 30 de julho. É a primeira grande individual de Hal Wildson, artista e poeta que investiga a história do Brasil, onde memória, esquecimento, identidade e a palavra são suas ferramentas para pensar em um futuro possível para o país, e para o povo brasileiro, “ainda em formação”. Atualmente morando em São Paulo, Hal Wildson é conhecido principalmente por seu trabalho com imagens criadas a partir de uma datilografia. “Re-Utopya” reúne sua produção inédita e recente, em vários suportes. Símbolos nacionais, máquina de escrever, digitais, primeiros registros históricos do povo brasileiro são usados neste processo crítico que compõe sua poética.

 

Sobre o artista

 

Hal Wildson (1991) artista multimídia e poeta, nascido no  Vale do Araguaia, região de fronteira entre Goiás e Mato Grosso. É conhecido pela pesquisa que envolve conceitos de escrita, identidade e a reconstrução de memórias coletivas e autobiográficas, atravessadas por questões sociais e políticas. A pesquisa sobre memória e esquecimento é a base de um trabalho que investiga a criação de territórios narrativos por meio de símbolos e documentos usados como ferramentas de construção e reconstrução no campo pessoal e coletivo. “Sou instigado por coleções documentais, técnicas escritas e materiais de documentação, pois acredito que os documentos são objetos que permitem a criação de narrativas simbólicas da memória, na esfera pessoal, criando ficções sobre a própria existência e em larga escala na fabricação da história de uma nação, uma vez que cada memória carrega consigo o peso do esquecimento – o que estamos esquecendo de contar?”

 

Sobre Clarissa Diniz

 

Clarissa Diniz (1985) nasceu em Recife e atualmente reside no Rio de Janeiro. É crítica de arte e curadora. Graduada em Lic. Ed. Artística/Artes Plásticas pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Artes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia da UFRJ. Entre 2006 e 2015, foi editora da “Tatuí”, revista de crítica de arte. Publicou diversos livros e realizou curadorias, dentre as quais destacam-se “Contrapensamento selvagem” (cocuradoria com Cayo Honorato, Orlando Maneschy e Paulo Herkenhoff), Itaú Cultural, SP, “Zona tórrida – certa pintura do Nordeste” (cocuradoria com Paulo Herkenhoff), Santander Cultural, Recife, “Ambiguações”, Centro Cultural Banco do Brasil, Rio de Janeiro, 2013, “Pernambuco Experimental”, Museu de Arte do Rio (MAR), Rio de Janeiro, 2013, “Do Valongo à Favela: imaginário e periferia” (cocuradoria com Rafael Cardoso), Museu de Arte do Rio (MAR), 2014, “Todo mundo é, exceto quem não é” – 13ª Bienal Naifs do Brasil, SESC Piracicaba, 2016 e Sesc Belenzinho, 2017, e “Dja Guata Porã – Rio de Janeiro Indígena” (cocuradoria com Sandra Benites, Pablo Lafuente e José Ribamar Bessa), MAR, 2017. Foi curadora assistente do Programa Rumos Artes Visuais 2008/2009 (Instituto Itaú Cultural, São Paulo) e, entre 2008 e 2010, integrou o Grupo de Críticos do Centro Cultural São Paulo, CCSP.

 

Sobre Sandra Benites

 

Sandra Benites (1975) nasceu na aldeia Porto Lindo, no Mato Grosso do Sul, e hoje vive e trabalha entre o Rio de Janeiro e São Paulo. É curadora, educadora e pesquisadora Guarani-Nhandeva. De 2010 a 2013, foi professora de guarani na Associação Indígena Guarani e Tupinikin (AITG), escola indígena na aldeia Três Palmeiras, no município de Aracruz, no Espírito Santo. Benites é doutoranda em antropologia social pelo Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Como curadora, se dedica à arte indígena – conceito bastante amplo, que engloba a produção de diferentes povos, etnias e culturas. Em 2017, juntamente com José Ribamar Bessa, Pablo Lafuente e Clarissa Diniz, foi curadora da exposição “Dja Guata Porã – Rio de Janeiro Indígena”, Museu de Arte do Rio (MAR), Rio de Janeiro. Em 2019, foi nomeada curadora adjunta de arte brasileira do Museu de Arte de São Paulo (Masp). Tratou-se de um marco na história dos museus e da curadoria no Brasil, por ser a primeira curadora indígena a integrar a equipe curatorial de um museu de arte no país.

 

Sobre Érika Nascimento

 

Érika Nascimento (1988) nasceu em Belford Roxo, região da Baixada Fluminense do Rio de Janeiro, vive e trabalha na cidade do Rio de Janeiro. É Bacharel em Cenografia (EBA/UFRJ), Mestre em Cultura e Territorialidades (PPCULT/UFF) e doutoranda na linha Arte, Sujeito e Cidade (PPGARTES / UERJ). Possui MBA em Gestão Cultural (PECS/UCAM). Sua pesquisa está focada em questões territoriais, zonas fronteiriças e a ótica da resistência. Ao longo dos últimos quatro anos, atuou na gestão artística da galeria Simone Cadinelli Arte Contemporânea. Desde 2009 atua na co-gestão de projetos do Centro Cultural Donana, em Belford Roxo. Atualmente é gerente da galeria Movimento e sócia na Sotaque Carregado Artes.

 

 

Krajcberg homenageado pela Pinakotheke Cultural

18/jul

 

 

A Pinakotheke Cultural, Botafogo, Rio de Janeiro, RJ,  apresenta de 25 de julho a 27 de agosto a exposição “Frans Krajcberg (1921-2017) – Natureza em preto e branco”.  Em comemoração ao centenário de nascimento de Frans Krajcberg, um artista pioneiro na defesa do meio ambiente, a mostra cria uma conversa entre suas obras – pinturas, gravuras, esculturas e fotografias em preto e branco – e fotografias e filmes de Luiz Garrido, seu amigo e incentivador ao longo de sua vida.

 

“Sonhei, e ao acordar a natureza

estava preta e branca.

(…) O branco vela o negrume das arvores queimadas.”

 

Frans Krajcberg

 

A exposição tem curadoria de Galciane Neves e Max Perlingeiro, e celebra o centenário de nascimento de Frans Krajcberg, “um precursor na defesa do meio ambiente”, como destaca Marcia Barrozo do Amaral, presidente da AmaFrans. “Ele se revoltou com a destruição da natureza que conheceu em suas viagens pelo país, e sua indignação não esmoreceu até o fim de sua vida, aos 96 anos”, conta.

 

“Natureza em preto e branco” apresenta pinturas, esculturas, gravuras e fotografias em preto e branco de Frans Krajcberg, em diálogo com fotografias e filmes de Luiz Garrido (1945, Rio de Janeiro), seu amigo e incentivador ao longo de sua vida, e que durante décadas o fotografou em diversas ocasiões. Estará na mostra o ensaio e o documentário produzidos por Garrido em 1996, em Nova Viçosa, na Bahia, com registros de intimidade entre os amigos, fruto de um olhar que se achegava do “homem-árvore”, embrenhado na urgência da vida.

 

A exposição será acompanhada do livro “… ao acordar, a natureza estava preta e branca”, com textos de Galciane Neves, Jaider Esbell, Thiago de Mello, Max Pelingeiro, Bené Fonteles, uma entrevista da curadora com o artista Advânio Lessa (1982, Lavras Novas, Minas), amigo de Krajcberg, e ainda o Manifesto do Rio Negro do Naturalismo Integral, de Pierre Restany (1930-2003), lançado em 1978, na presença de Sepp Baendereck (1920-1988) e Frans Krajcberg.

 

A Estética não me basta

 

Max Perlingeiro afirma que “distribuída em telas, esculturas, objetos, relevos e fotografias, a produção de Krajcberg encerra um impressionante libelo pela preservação do patrimônio ambiental, bem de uso comum do povo e consagrado à subsistência e proveito da humanidade”.

 

Marcia Barroso do Amaral conta que ouviu incontáveis vezes Krajcberg dizer: “A estética não me basta. É necessário que a obra possa ecoar e reverberar o grito que trago no peito”. Judeu de origem polonesa, ele chegou ao Brasil em circunstâncias trágicas, aos 27 anos, buscando superar os horrores da Segunda Grande Guerra, conflito no qual esteve pessoalmente envolvido e que lhe roubou a família, dizimada nos campos de concentração. “Aqui, neste país tropical, de natureza exuberante, Krajcberg encontrou mais do que inspiração para sua obra”, diz Marcia.

 

“Além de excepcional artista – premiado em importantes Bienais, como Veneza e São Paulo, e com obras nos acervos de importantes museus, como o Beaubourg, em Paris – Krajcberg foi um combatente, um ativista ambiental, quando ainda pouquíssimosse sensibilizavam pelo tema e por suas drásticas consequências. Impossível examinar suas esculturas, pinturas e relevos sem a conexão profunda e indissociável com a causa que o artista abraçou, integral e decididamente ao longo de sua vida. Nesse caso, não há forma dissociada do conteúdo, do contexto em que fora recolhido o suporte natural”, afirma. Para ela, a obra de Krajcberg “é o alerta de um pioneiro na defesa e preservação de nossos biomas naturais e dos remanescentes povos originários, e uma exortação dolorosamente atual, ante a colapsada fiscalização e controle ambiental sob responsabilidade do Estado brasileiro”.

 

Luiz Garrido por Frans Krajcberg

 

Frans Krajcberg disse sobre a obra de seu amigo Luiz Garrido: A técnica não é tudo, e sim a participação do artista na obra. Na fotografia me impressiona essa relação do fotógrafo com a máquina, a maneira como ele cria, a percepção da luz, o enquadramento da imagem, o momento exato do clique. Conheci o Garrido, em Paris, em 1968, quando ele estudava fotografia, e nossa amizade desenvolveu-se a partir dos muitos encontros nos quais sempre discutíamos bastante sobre o assunto. Depois de alguns anos, descobri, já no Rio de Janeiro, o fotógrafo Garrido e fiquei impressionado com o seu trabalho. Um artista captando, com a máquina fotográfica, uma imagem muito própria, criando sua obra. Isso me impressiona sempre, o talento e o desejo de criar uma obra própria, o trabalho de pesquisa, o domínio da técnica como instrumento e não como fim. A máquina não é tudo, o artista sim. Os retratos, foco de seu atual interesse e que fazem parte dessa exposição, são a síntese dessa união entre técnica, luz, imagem, percepção de um

 

momento fugaz de um olhar, um gesto, uma postura que dizem algo além da imagem retratada. Em resumo, é a participação, por inteiro, de artista, em sua obra, são os retratos do ponto de vista Garrido, é a fotografia como forma de expressão, arte, uma obra que foi cuidadosamente elaborada e que transcende a imagem retratada.

 

Sobre Frans Krajcberg

 

Frans Krajcberg foi escultor, pintor, gravador e fotógrafo. Autor de obras que têm como característica a exploração de elementos da natureza. Destaca-se pelo ativismo ecológico, em que associa arte à defesa do meio ambiente. Em toda sua trajetória, participou seguidamente de exposições em importantes museus no Brasil e no exterior, foi premiado várias vezes. Participou de Bienais em diversos países – França, Cuba, Uruguai – foi premiado na Bienal de Veneza, em 1964, integrou muitas edições da Bienal Internacional de São Paulo, desde a primeira, em 1951, e continuamente as de 1953,1955,1957,1961,1963 1977 1979 1989 e 2000. Frans Krajcberg nasceu em 12 de abril de 1921, em Kozienice, na Polônia, filho de um modesto comerciante, e de mãe militante comunista. É o terceiro de cinco filhos: dois irmãos e duas irmãs. Por ser judeu, sofre preconceitos e perseguições pelos nazistas. Toda sua família foi morta no Holocausto. Preso, consegue fugir. Integra-se ao exército russo, aquartelado na Polônia, seguindo para Vilna, de onde é enviado à Romênia. Depois de tentar ingressar sem sucesso na Escola de Belas-Artes de Vitebsk, desloca-se para Leningrado, onde começa a estudar engenharia hidráulica e belas-artes na universidade, em 1940. Em 1941, quando os alemães invadem a URSS, Krajcberg integra-se à Resistência Polonesa, incorporando-se a seguir ao exército polonês, apoiado pelos russos. Com a patente de oficial, ajuda a construir pontes de emergência nas frentes de batalha. No fim da guerra, vai pra Alemanha, estuda com Willi Baumeister (1889-1955), professor da Bauhaus, na Escola de Belas-Artes de Stuttgart. Expõe no Centro de Refugiados da cidade. Em 1948, migra para o Brasil aos 27 anos, incentivado pelo amigo e também artista plástico Marc Chagall. Sem dinheiro e sem saber falar português, dorme ao relento durante alguns dias na praia do Flamengo, no Rio de Janeiro, então partindo para São Paulo, onde, recomendado por Francisco Matarazzo, é contratado para trabalhar como operário na manutenção do Museu de Arte Moderna. Expõe duas pinturas na I Bienal Internacional de São Paulo, em 1951, época em que trabalhava na montagem da exposição no pavilhão Trianon, como funcionário do Museu de Arte Moderna de São Paulo. Participa do I Salão Paulista de Arte Moderna, na Galeria Prestes Maia, em São Paulo. Expõe individualmente na Galeria Domus, em São Paulo. Em 1952, por indicação de Lasar Segall, que dele comprara um desenho, vai trabalhar como engenheiro-desenhista nas indústrias de papel Klabin em Monte Alegre, no Paraná. Contudo, abandona esse emprego para se isolar nas matas para pintar. Ali, no interior do Paraná, Krajcberg testemunha desmatamentos e queimadas nas florestas. Participa da II e da III Bienal Internacional de São Paulo, e em 1956 se muda para o Rio de Janeiro, onde produziu os seus primeiros trabalhos fruto do contato direto com a natureza. Em 1964, criou suas primeiras esculturas com madeiras mortas. Realizou diversas viagens à Amazônia e ao Pantanal, fotografando e documentando os desmatamentos, além de recolher materiais para as suas obras, como raízes e troncos calcinados. Em 1969, participa de exposições em vários países, e passa a ser internacionalmente conhecido. Ganha uma exposição individual no Centro Nacional de Arte Contemporânea e no Centro Georges Pompidou, em Paris. A partir de 1972 viveu no sul da Bahia onde manteve o seu ateliê no Sítio Natura, no município de Nova Viçosa. Chegou ali a convite do amigo e arquiteto Zanine Caldas (1919-2001), que o ajudou a construir sua morada: uma casa, a sete metros do chão, no alto de um tronco de pequi com 2,60 metros de diâmetro. À época Zanine sonhava em transformar Nova Viçosa em uma capital cultural e a sua utopia. Em 1978, durante 32 dias, Frans Krajcberg, o artista Sepp Baendereck e o crítico Pierre Restany cruzaram em um barco o Rio Negro, na região amazônica. Durante o trajeto eles refletiam sobre uma nova maneira de ver, sentir e fazer a arte dentro de uma ótica voltada para a realidade brasileira. Os dois artistas, Baendereck e Krajcberg, então já cidadãos brasileiros e declaradamente apaixonados pela nossa biodiversidade, convidaram o crítico Pierre Restany para que ele aprofundasse sua relação com o Brasil e pudesse perceber melhor a grandeza de nosso país. No final do empreendimento, além de um “Diário de Viagem”, Restany produziu o “Manifesto do Rio Negro”, que foi divulgado em outubro de 1978 em todo o mundo. Em 1996, participa da exposição “Villette-Amazone/  Manifesto para o Meio Ambiente no Século XXI”, no Grande Halle de la Villette, em Paris. “A obra de Krajcberg é um grito contra a destruição da Floresta Amazônica e tem uma força universal”, diz Jacques Leenhardt, sociólogo e filósofo francês que divide com Bettina Laville a organização da exposição. A ideia foi a de transformar o Parc de la Villette em um “território ecológico”. Logo ao entrar, o visitante depara com as esculturas monumentais de Krajcberg, que ocupam, com murais, colagens e fotografias, um espaço de 1.800 m 2 , totalizando 141 peças. Por sua luta para a preservação da natureza, mundialmente reconhecida, Frans Krajcberg recebe em 2012 do prefeito Bertrand Delanoë a mais alta honraria de Paris, a Medalha Vermeil – prêmio de agradecimento pela contribuição às artes. Krajcberg foi o único artista vivo, não francês, que possuiu um espaço dedicado às suas obras mantidas pela prefeitura parisiense. Frans Krajcberg morre em 15 de novembro de 2017, e seu desejo é cumprido: em um domingo, suas cinzas são depositadas no tronco de uma árvore escolhida por ele, no sítio Natura, em Nova Viçosa, onde ele viveu desde 1972. A obra de Krajcberg reflete a paisagem brasileira, em particular a floresta amazônica, e a sua constante preocupação com a preservação do meio ambiente. Ao longo de sua carreira, o artista denunciou queimadas no estado do Paraná, a exploração de minérios no estado de Minas Gerais e o desmatamento da Amazônia e do Pantanal. Antes de morrer, ele focou em fotografia, reproduzindo o desmatamento e o descaso com o meio ambiente.

 

 

Exposição de Reynaldo Candia

 

 

A BELIZÁRIO Galeria, Pinheiros, São Paulo, SP, abriu a mostra “O concreto já rachou!”, de Reynaldo Candia, artista paulistano que criou trinta e cinco obras inéditas para contar a história não mostrada sobre a construção de um sonho. Não um sonho pessoal do artista e sim uma ideia que foi apresentada a uma nação sobre o “País do Futuro” com sua “Capital da Esperança”. O texto crítico é de Divino Sobral.

 

“A mostra “O concreto já rachou!” busca seu título em um verso da letra da música “Brasília” (1985), gravado pela banda brasiliense “Plebe Rude” em seu disco de estreia que, também, tinha esta frase como título”, explica Divino Sobral, que acrescenta: “Brasília parece chamar atenção da cidade para o momento em que o concreto começa a trincar e a rachar, deixando prestes a desabar os pontos frágeis da construção edificada sob o selo da democracia e da liberdade política.(….) Por outro lado, o título leva a pensar também nas fissuras ocorridas na construção do próprio conceito de cidade e de arquitetura moderna, diante das pressões de um país subdesenvolvido”. O concreto, o ferro e a madeira são os principais elementos utilizados pelo artista na construção de seus trabalhos, os quais também são os elementos base de Brasília. Diferente do que possa sugerir o título, em “O concreto já rachou!”, Reynaldo Candia enfatiza prioritariamente a influência dos candangos sobre a execução deste grandioso projeto e resgata a cultura histórica brasileira.

 

O artista não se posiciona como um crítico ou analista de tempos ou posicionamentos diversos e sim como um historiador que busca o resgate dos personagens sombreados pela redação histórica. Os “candangos” são personagens importantíssimos uma vez que o olhar de Reynaldo Candia não se furta de observar a realidade humanística das épocas e regiões brasileiras às quais dedica sua pesquisa. Após imersão na região nordeste do Brasil para sua série pregressa, o artista deparou-se com relatos das migrações para o Planalto Central na época da construção da nova capital. Por definição, “candango” é o termo dado aos trabalhadores que migraram à futura capital para sua construção. A palavra de origem africana, tem significado pejorativo – “ordinário”, “ruim” – e era a denominação que se dava aos trabalhadores que participaram da construção de Brasília. “Foi do Nordeste que saiu o retirante, fugindo da seca e da fome, para calejar as mãos na construção das riquezas de outras regiões” define Divino Sobral.

 

Pinturas, colagens, intervenções fotográficas, instalação, técnicas e suporte diversos, todos criados em 2022, preenchem o espaço e contam a história da pesquisa do artista que, após uma imersão na região nordeste, virou seu foco para o planalto central. A tela “Eixo”, cinzenta como o cimento, faz alusão à primeira cicatriz do solo da nova capital deixada por Lucio Costa em 1956 quando fixou com uma cruz o encontro do Eixo Monumental com o Eixo Rodoviário onde começam tanto a nova cidade como todo um processo que resultou em profunda transformação da região Centro-Oeste do país.

 

Com fotografias transpostas para uma superfície de concreto, o Reynaldo Candia sobrepõe frases célebres que poderiam servir como uma segunda legenda, como em “Candangos construção”. O políptico, também Candangos, manipula pontos de vista lançados sobre a monumental escultura de Bruno Giorgi e o mesmo título se repete em um objeto, encapsulado por acrílico onde o livro Candangos é perfurado e nos orifícios são inseridos retratos de trabalhadores impressos em vermelho. Já em “Antes”, antes, uma fotografia é perfurada por círculos que funcionam como molduras para outras imagens com detalhes arquitetônicos da cidade.

 

A grande “Terra vermelha” exibe um mapa do Brasil, executado com terra extraída do solo da cidade e posto em posição invertida, o que provoca um certo desconforto no olhar e sugere questionamentos. Duas obras que retratam a ausência e a incompletude – Aqui não tem sudeste nem sul e “Pau-brasil” – representam o mapa do Brasil por meio da união de técnicas de pintura agregada à apropriação de objetos. Enquanto a tela em óleo, “Aqui não tem sudeste nem sul”, é formada por um fragmento do mapa com as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, “Pau-brasil” é um trabalho tridimensional com uma prancha da madeira título perpendicular à parede como suporte às capas de livros de história sobre as quais está pintado o mapa brasileiro. “São obras que tratam do esvaziamento da historiografia oficial e da necessidade de reescritura da história, em observância ao narrar do vencido e não do vencedor, como é habitual”, diz Divino Sobral.

 

“Viramundo”, oferece um mapa onde tanto a região Nordeste como a palavra do título surgem pintados com a mistura de cimento, pigmento e tinta acrílica aplicada sobre um suporte de madeira. Para História, com exemplares da enciclopédia Delta dedicados à história geral ou à história do Brasil, uma intervenção de recortes redondos escavados nas capas e nos miolos dos livros, resultam em uma movimentação visual sugerindo acesso ao conteúdo a partir de pontos pré-definidos. “Lacre” e “Torre” são trabalhos que possuem livros vedados no interior de placas de concreto simbolizando as ideias que havia no período da ditadura. Já em “Memória” reúne um grupo de livros didáticos que funcionam como base de sustentação do mastro que ergue a bandeira nacional, confeccionada em feltro com cores acinzentadas “(….) as obras de Reynaldo Candia têm a ousadia de firmar posição de crítica ao fascismo e ao conservadorismo, e de fazer compromisso com a defesa dos valores que garantem a liberdade política, o futuro da juventude e o crescimento da justiça social do País”.

 

Divino Sobral

 

Até 13 de agosto.

 

Telefone: (11) 3816.2404

 

Horários: de segunda a sexta-feira, das 10h às 19hs; sábado das 11 às 15hs

 

Número de obras: 35

 

Técnica: pintura, colagem, corte, serralheria, alvenaria, costura, instalação

 

Dimensões: de 30 x 20 cm a 3

Diálogo espacial no MON

15/jul

 

 

O MON, Curitiba, PR, promove a exposição coletiva “Ópera Citoplasmática”, com a participação de vinte três artistas e cerca de setenta obras, ocupando o espaço do Olho. A curadoria é de Diego Mauro e Luana Fortes. A curadoria adjunta e concepção é de João GG.

 

“Ópera Citoplasmática” propõe um diálogo com o próprio espaço expositivo do Olho, fazendo com que a sua especificidade arquitetônica participe do projeto. A luminosidade controlada do local possibilita um desenho expográfico e uma ambientação experimental, incorporando a curvatura do teto e o vidro escuro das janelas imensas como elementos importantes.

 

A seleção dos artistas considerou a multiplicidade de linguagens, que inclui desde as mais tradicionais pintura e escultura, passando por instalações, vídeos, projeções de texto, intervenções sonoras feitas especialmente para a exposição e interferências espaciais.

 

Os participantes são Boto, Darks Miranda, Fernanda Galvão, Gabriel Pessoto, Giulia Puntel, Hugo Mendes, Iagor Peres, Ilê Sartuzi, Janaína Wagner, João GG, Juan Parada, Juliana Cerqueira Leite, Luiz Roque, Mariana Manhães, Marina Weffort, Maya Weishof, Miguel Bakun, Motta & Lima, Paola Ribeiro, Rafael RG, Renato Pera, Rodrigo Evangelista e Wisrah Villefort.

 

Gilvan Nunes volta a expor no Brasil

14/jul

 

 

 

Radicado nos Estados Unidos, Gilvan Nunes abre individual, – até 14 de agosto em exibição -, com curadoria de Fernando Cocchiarale na Galeria Patricia Costa, Copacabana, Shopping Cassino Atlântico, Rio de Janeiro, RJ.

 

“O caminho sempre acaba convergindo”, definiu Gilvan Nunes ao falar sobre as pinturas a óleo, desenhos, cerâmicas e porcelanas que apresenta na individual “Hilomorfismos”, após um hiato de cinco anos sem expor no Brasil. As obras são fruto de um processo que aconteceu durante a pandemia, entre 2020 e 2022. Este período se revelou bastante fértil, tendo o artista produzido trinta pinturas em grandes e pequenos formatos, vinte e oito desenhos desenhos e cincoenta cerâmicas, entre vasos e peças de parede. Segundo Gilvan, as cerâmicas ganharam força a cerca de dez anos, quando se transferiu para a Filadélfia, onde adquiriu um forno e pôde evoluir na técnica. “Meu trabalho sempre foi matérico: paisagens e todas as pinturas. De repente, foi como se eu tivesse uma necessidade de retirar um pouco a matéria e organizar em outro lugar. Talvez tenha sido esse o desejo maior: reorganizar a matéria, separando nas telas e nas superfícies. A experiência de morar fora proporcionou mais tempo para pensar, redirecionar as ideias. Esse “hiato” possibilitou uma espécie de recomeço”, diz Gilvan Nunes que já participou de duas exibições coletivas nos Estados Unidos, onde também já tem marcada uma individual para o ano que vem.

 

A palavra do curador

Anotações sobre gosto, demiurgo

 

Esta mostra de Gilvan Nunes reúne obras em pintura, desenho, cerâmica e porcelana por ele recentemente produzidas. Parte considerável das obras expostas pode ser associada ao abstracionismo, posto que são de difícil identificação levando-nos a buscar no título dado pelo artista à exposição maior consistência poética: Hilomorfismo.

 

Tal conceito remete-nos ao pensamento de Aristóteles, há mais de dois mil anos, segundo o qual todos os seres corpóreos são compostos por matéria e forma. A poética de Nunes e o hilomorfismo encaminham-nos a áreas contíguas como a questão do demiurgo, que trabalhava a matéria ou o caos para dar-lhes forma. No pensamento grego, particularmente no de Platão, é um deus ou o princípio organizador do universo que não cria formas, apenas as modela, com base na contemplação do mundo das ideias.

 

A distinção entre matéria e forma observável na dinâmica poética da obra Gilvan Nunes, de outra maneira, parece ser bastante próxima. A partir desse ponto é que a consideramos importante para certos jogos que exercitam, alimentam e produzem a invenção poética.

 

Gosto é o critério ou o cânone usado para julgar os objetos do sentimento. Foi somente a partir do século XVIII que o gosto foi reconhecido como uma faculdade autônoma, distinta da faculdade teorética (filosófica e matemática), posto que possuía um campo e um pensamento técnico próprio, fato percebido por Leonardo da Vinci já no século XVI (“pittura é cosa mentale”) e, progressivamente, por Kant e Baumgarten no século XVIII.

 

Fernando Cocchiarale, julho de 2022.

 

Sobre o artista

 

Gilvan Nunes nasceu em Vermelho Novo, Minas Gerais, em 1966. Sempre foi fascinado pela natureza, suas cores e formas e passava muito tempo desenhando e pintando. Quando ingressou na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio de Janeiro, em meados dos anos 1980, teve a oportunidade de interagir com outros artistas de sua geração e com professores fundamentais para sua formação. Naquele momento, ocorria o renascimento da Pintura Brasileira e o Parque Lage era o epicentro desse movimento. Gilvan é enormemente conhecido pelas suas pinturas densas, e também trabalha com desenhos, colagens e gravuras de temas invariavelmente relacionados à sua visão da constante transformação da natureza. Esculpir e trabalhar com cerâmica são paixões mais recentes, paralelamente à pintura. Seu trabalho tem sido exibido em diversas mostras coletivas e individuais, além de feiras de arte em diferentes cidades do Brasil, África, Europa e EUA. Em 2017, Gilvan mudou-se para os Estados Unidos, o que inspirou o artista a criar uma nova série de pinturas a óleo e cerâmica esmaltada. Atualmente, é representado por duas galerias: Galeria Patricia Costa no Rio de Janeiro e InLiquid Gallery na Filadélfia, EUA.

 

 

 

Duas exposições na Marcelo Guarnieri SP

 

 

A Galeria Marcelo Guarnieri, Jardins, São Paulo, SP,  apresenta, de 16 de julho a 13 de agosto, na sede de São Paulo, “Guima”, exposição individual do artista paulista e “Gabinete”, exibição coletiva com obras de Alfredo Volpi, Alice Shintani, Antonio Lizárraga, Elisa Bracher, Eleonore Koch, Flávio de Carvalho, Gerty Saruê, Helena Carvalhosa, Iberê Camargo, Ismael Nery, Ivan Serpa, LIUBA, Luiz Paulo Baravelli, Marcello Grassmann, Maria Leontina, Mira Schendel, Niobe Xandó, Paola Junqueira, Pedro Correia de Araújo, Roberto Magalhães, Tarsila do Amaral e Waltercio Caldas. Na Sala 1 serão apresentadas pinturas do taubateano GUIMA (1927-1993) produzidas durante as décadas de 1960 e 1970 e na Sala 2 serão apresentados desenhos, sejam eles obras ou estudos preparatórios, produzidos entre os anos de 1920 e 2020 por artistas brasileiros de diversas gerações.

 

Sobre o artista

 

GUIMA é Luis Moreira Castro Toledo de Souza Guimarães. Nascido em Taubaté em 1927 e formado como artista no Rio de Janeiro em tradicionais centros de estudos de artes como o MAM RJ e a Escola do Povo (fundada por Portinari, Oscar Niemeyer e Quirino Campofiorito), dedicou-se à gravura, ao desenho e à pintura de marinhas e paisagens rurais desertas, muitas vezes habitadas por seres fantásticos e monstruosos. Tais figuras – peixes alados, dragões e outros híbridos gigantes – surgem de influências diversas, tais como o Apocalipse bíblico, as imagens do inconsciente exploradas pelos Surrealistas e o bestiário de Marcello Grassmann, artista que foi também seu professor de gravura. As pinturas de GUIMA variam entre a calmaria silenciosa dos verdes campos do Vale do Paraíba, os ambientes soturnos de pesadelos madrugais e o sentimento trágico das tempestades em alto mar. GUIMA participou da IX Bienal de São Paulo (1967), da coletiva “O Monstro na Arte Moderna” (1967), das 17ª, 18ª, 19ª e 22ª edições do Salão Nacional de Arte Moderna (1968, 1969, 1970, 1973), do 25º Salão Paranaense (1968) e da 16ª Arte e Pensamento Ecológico (1978), dentre outras.

 

A coletiva

 

“Gabinete” reúne obras em desenho produzidas por vinte e dois artistas em diferentes momentos da história da arte brasileira em um período de cem anos. O conjunto de trabalhos permite observar modos distintos com os quais os artistas exploraram o rastro do atrito sobre o papel, seja através das modalidades clássicas da linguagem como o desenho de observação – modelo vivo, paisagem, natureza-morta -, seja através da investigação de seus elementos plásticos e estruturais – o traço e a geometria, por exemplo – ou mesmo através de seu uso como ferramenta para estudos e projetos.

 

 

No Paço Imperial e no Espaço OASIS

 

 

Ricardo Ribenboim presente em dois momentos singulares: o resgate do passado e a criação do novo presente!

 

O artista plástico Ricardo Ribenboim exibe, em datas sequentes no circuito cultural do Rio de Janeiro, após uma ausência de 18 anos, duas exposições individuais: “Rastro dos Restos”, no Paço Imperial e “O Acaso” no Espaço OASIS. As duas mostras estão sob curadoria de Yuri Quevedo. As 120 obras inéditas em exibição, mesmo não se apresentando como recortes de um todo, oferecem dois aspectos complementares e elucidativos da produção do artista nos últimos 5 anos. Em “Rastro dos Restos”, os trabalhos dialogam com o tempo e exibe a consciência do artista sobre o curso da história, a passagem do tempo e a finitude das coisas de onde surge a possibilidade de transformação do todo em vestígios. Já em “O Acaso”, há o compartilhamento por parte do artista, de seu processo criativo onde ressignifica fragmentos de trabalhos antigos. Ricardo Ribenboim oferece a proposição de convivência com o mutável e o incerto, sem buscar frear o fluxo dos eventos e da vida, mas admirando-os como uma força estética.

 

“Em cada um dos espaços a produção de Ricardo Ribenboim é vista sob um aspecto diferente. No Paço Imperial, temos a investigação mais recente do artista, que parte de rastros do passado para configurar o novo. Já no Oasis, espaço de residências experimentais, estão aquelas obras onde ele compartilha conosco  seu processo de trabalho e os entraves para elaborar aquilo que o rodeia.”, explica o curador.

 

“Rastro dos Restos” – Paço Imperial

 

“A partir da lembrança, Ribenboim propõe a singularidade”, define Yuri Quevedo. Coletando, aleatoriamente, restos de materiais diversos, fragmentos do ordinário, do urbano, restos do atelier, rastros de seu próprio trabalho com memórias de sua trajetória, o artista enfrenta o desafio e a necessidade de criar o novo e apresentá-lo na seleção de 80 trabalhos expostos. Enquanto muitos buscam encontrar o sentido de um todo coeso, Ricardo Ribenboim vai na contramão e faz da desarticulação o seu método; desmembra sistemas inteiros e os analisa e, sendo o artista que encontra poesia nova naquilo que sobrou – aquilo que é substantivo no rastro dos restos”, diz o curador. O artista formula uma ecologia própria – o que restou de algo, pode servir de suporte para uma nova realidade. Aqui, a história é vista como uma trama, em que ciclos se reciclam, intercalados com lacunas de esquecimento. Ao construir marcos e estandartes com esses retalhos de lembranças, Ribenboim compartilha conosco sua ética: a memória pode ser matéria do presente à medida em que ela adquire significado no agora.

 

“O Acaso” – Espaço Oasis

 

Nos últimos anos, Ribenboim fez do ateliê e da própria trajetória, um espaço  de reflexão, onde seu potente lado criativo finaliza objetos inconclusos, reanima pedaços de trabalhos antigos e lhes dá nova forma, nova ordem, nova significância. Nas 40 obras selecionadas pelo curador, estão as grandes telas onde ‘sinistras silhuetas tentam romper as camadas’. Desta forma “o artista compartilha conosco o valor do fazer como pensamento, do fazer enquanto dúvida, do fazer como processo de configuração de si e do mundo – e não como terreno das definições e das certezas”, explica Yuri. Em “O Acaso”, Ricardo Ribenboim nos descreve seu processo criativo, as agruras do fazer, onde resgata os vestígios guardados daquilo que as coisas eram antes de serem articuladas em novos sentidos: suas pinturas olham para suas esculturas para transformá-las em imagens. Para Yuri Quevedo, “…como no sonho, o caldo disforme do inconsciente ganha matéria em associações, coincidências e encaixes. Indefinições que resistem a ser figuradas, daí o acaso vira assunto”.

 

Paço Imperial até 15 de agosto e 27 no OASIS.

 

 

Duas mostras no MAR

11/jul

 

 

O Museu de Arte do Rio, Centro, Rio de Janeiro, RJ,  abriga duas exposições simultâneas, em cartaz até setembro. Em “Gira”, Jarbas Lopes, cuja trajetória na arte começou há 30 anos, propõe novos significados para objetos que foram descartados nas ruas, de jornais e revistas a faixas de divulgação de shows e propaganda política, com os quais ele criou esculturas e pinturas interativas. Com curadoria de Amanda Bonan e Marcelo Campos, a mostra reúne cerca de 100 obras que fazem parte da produção do artista, além de trabalhos inéditos e projetos que só existiam no papel. Lopes também apresenta fotografias, desenhos, livros, maquetes e instalações.

 

Já a mostra “Coleção MAR + Enciclopédia Negra” propõe uma reparação histórica, trazendo à luz trabalhos realizados por artistas contemporâneos, que retratam personalidades negras cujas imagens e histórias de vida foram apagadas ou nunca registradas. Antes do século 19, apenas os nobres eram retratados. Já negras e negros, foram fotografados, muitas vezes, em condições anônimas ou em cenas em que apenas aparecem carregando mercadorias em suas cabeças.

 

A exposição – que hoje reúne obras de 36 artistas contemporâneos no MAR – nasceu da colaboração entre os consultores e curadores Flávio Gomes, Lilia Schwarcz e Jaime Lauriano e teve sua primeira apresentação na Pinacoteca de São Paulo, em 2021. O trabalho resultou também no livro “Enciclopédia Negra”, que reuniu biografias de mais de 550 personalidades negras, em 416 verbetes individuais e coletivos, publicado em março de 2021 pela editora Companhia das Letras.

 

Das 250 obras de artes expostas, 13 são novos retratos, criados por seis artistas contemporâneos, convidados pelo MAR, e que vão entrar para a coleção do museu após a mostra. O elenco de artista reúne Márcia Falcão, Larissa de Souza, Yhuri Cruz, Bastardo, Jade Maria Zimbra e Rafael Bqueer, que fizeram retratos de personalidades como Abdias Nascimento, Heitor dos Prazeres, Tia Ciata, Manuel Congo, Mãe Aninha de Xangô e João da Goméia. Em tempo: Coleção MAR + Enciclopédia Negra é a sexta exposição inaugurada neste ano pelo Museu de Arte do Rio e é parceria com a Pinacoteca de São Paulo.

 

“Gira”, Jarbas Lopes – Até 16 de setembro.

“Coleção MAR + Enciclopédia Negra” – Até 11 de setembro.

 

 

Ampliando espaço e nova exposição      

08/jul

 

Completando uma década de atividade, a galeria Gaby Indio da Costa Arte Contemporânea, São Conrado, Rio de Janeiro, RJ, amplia seu espaço expositivo e comemora, no dia 09 de julho, sábado, com exposição individual de Marcus André.  Em “Tamoia-Califa”, o artista apresenta cerca de 25 obras inéditas e o lançamento do múltiplo serigráfico “Califórnia”, desenvolvido por Heloisa Amaral Peixoto, que assina o projeto curatorial.

 

“Partindo da sua experiência de formação técnica e estética em gravura, em especial na sua prática permanente com a xilogravura, o artista Marcus André rearticula as suas pesquisas para novas pinturas numa poética intercambiável onde enfatiza a superfície do seu suporte, a madeira. Deixando mais exposta a sua matéria/matriz, o artista explora a sua textura e a sua aparência natural, assim como determina as áreas de intervenção cromática, aplicando as suas técnicas combinadas”, diz a curadora.

 

Sobre a galeria

 

Gaby Indio da Costa atua no mercado de arte desde 2009, abrindo seu espaço em 2012. Desde então, acompanha de perto a produção de vários artistas. Há dez anos realiza diversas exposições, a maioria com a curadoria de críticos e curadores renomados. A galeria Gaby Indio da Costa Arte Contemporânea tem como objetivo principal divulgar a produção dos artistas que representa e suas propostas, promover projetos e exposições e manter um diálogo constante com críticos, curadores e colecionadores, incentivando a formação de novas coleções e buscando fortalecer as que já existem. Trabalha com artistas jovens e consagrados, alguns com trajetória consolidada, todos eles comprometidos com a experimentação e a ousadia no âmbito da linguagem que define a arte contemporânea.

 

Sobre o artista

 

Marcus André nasceu no Rio de Janeiro em 1961. Vive e trabalha entre o Rio de Janeiro e Búzios, RJ. Frequentou o curso de desenho e introdução à pintura na Oficina do Corpo na Escola de Artes Visuais do Parque Lage no Rio de Janeiro entre 1978-79. Entre 1981 a 1985, cursa Desenho Industrial na Universidade Federal do Rio de Janeiro tendo como professores Roberto Verscheisser e Gilberto Strunke e paralelamente freqüenta a Oficina de Gravura do Palácio do Ingá em Niterói com orientação de Anna Letycia e Edith Behring, recebe prêmio no IV Salão Carioca de Arte e participa da V Mostra Nacional de Gravura em Curitiba. Em 1984 realiza sua primeira individual na Galeria Contemporânea e participa nas exposições; Como Vai Você, Geração 80 ?, Arte Brasileira Atual e V Salão Nacional de Artes Plásticas no MAM no Rio de Janeiro. Viaja para Nova York em 1985 frequentando a Parson’s New School Of Social Reaserch Printing Studio com o artista Roberto DeLamonica 1985-88, estágio na Osíris Priting Co. e mais tarde é contratado como impressor-colorista na Ruppert J. Smith Printing Co. em Nova York, participando das edições de artistas como James Rosenquist, Larry Rivers, Kenny Scharf e Andy Warhol, sob coordenação do impressor Jean-Paul Russell, atualmente Durham Press, Pennsylvania. Participa da exposição Latin? ABC Notório Gallery no East Village. Em 1988 retorna ao Brasil, recebe prêmio no XIII Salão Nacional de Artes Plásticas e realiza individuais de pintura na Funarte Projeto Macunaíma/ Espaço Alternativo RJ, Projeto Centro Cultural São Paulo / Pavilhão da Bienal Ibirapuera e MASP SP e nas representações brasileiras da Bienal Ibero-Americana Cidade do México, Bienal de La Havana Cuba, Bienal de Pintura Cuenca Equador 2001 e no Machida Tokyo Museum Japão. Recebe os prêmios de aquisição em pintura no Museu de Arte de Brasília DF e na Mostra Internacional de Gravura Curitiba PR. A partir de 1995 é contemplado com as bolsas: Primeiro Programa de Bolsas RioArte 1995-96, tendo na comissão os críticos e professores Heloisa Buarque de Holanda e Ronaldo Britto, O Artista Pesquisador MAC Niterói RJ 1998, Bolsa FAPERJ / Fundação de Apoio a Pesquisa 1998 e The Pollock-Krasner Foundation Inc. Grant NY 2007. Marcus André investe na construção e desconstrução de espaços afetivos, estabelecendo narrativas orgânicas de traços e linhas, espaços mentais de uma natureza contaminada pelo advento do industrial e organização social, vestígios do humano cotidiano. O artista alcança o sublime, extraindo da pintura duas técnicas básicas e milenares; a pintura encáustica e a têmpera, um resultado em que se vê o que se toca, consequência da soma de diversas camadas, peles da pictórica sobrepostas conferindo uma narrativa contemporânea que traz ao presente a utilização de técnicas tão laboriosas.

 

A palavra da  curadora

 

A partida para a escolha de um múltiplo serigráfico do artista Marcus André teve inspiração na sua obra instalativa vencedora do prêmio “Projéteis Funarte 2006” realizada no hall do icônico edifício modernista Palácio Capanema, no centro do Rio de Janeiro.   Desde que o artista se propôs a executar uma pintura mural de grande porte, de caráter panorâmico e espacial, utilizando a têmpera e a encáustica, duas técnicas milenares, estabeleceu-se na sua produção um tipo de ritual narrativo formal de interpretação bastante singular do que entendemos como “paisagens”. Na experiência de conduzir a sua expressão de modo integrado aos aspectos arquitetônicos do entorno, o artista incorporou as premissas do contexto muralista e levou para as suas pinturas uma série de propostas estruturadas na superposição de linhas e outros grafismos. Consciente de que o seu percurso é compreendido dentro de uma poética intercambiável, no diálogo entre procedimentos e métodos produzidos para diferentes fins, e no seu caso em especial, na prática íntima com a xilogravura, Marcus André passa a rearticular as suas pesquisas trazendo de volta a superfície do seu suporte, a madeira. Deixando mais exposta a matéria, ele explora a sua textura e aparência natural, assim como determina as áreas de intervenção cromática, aplicando as suas técnicas combinadas. Esse procedimento vem acompanhado desta vez de elementos geométricos mais ampliados, que ganham mais contornos e volumes, e ainda sugerem um plano de terceira dimensão. Seus recentes trabalhos produzem uma sensação de apropriação de ingredientes de raiz cultural popular, entretanto há uma presença da metrópole invadindo a pintura. Nesse duplo contato com a tradição artesã e da cultura de massa, própria do cenário urbano, as suas formas e signos se acomodam na madeira. O suporte material é também poético. Partindo da natureza vão se encadeando a criação, a transformação e a síntese, e uma inédita visualidade vai se revelando em simples e eloquentes acontecimentos.

 

De 11 de julho a 19 de agosto.