Revelação abstrata na Pinacoteca

23/mar

A Pinacoteca de São Paulo, museu da Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo, exibe no primeiro andar da Pina Luz – Praça da Luz, “Hilma af Klint: Mundos Possíveis”, sua primeira exposição do calendário de 2018 e um dos grandes destaques do ano. Com patrocínio de Banco Bradesco e Ultra, chega pela primeira vez na América Latina uma mostra individual da pintora sueca Hilma af Klint (1862-1944), cujo trabalho vem sendo reconhecido como pioneiro no campo da arte abstrata e que passou despercebido durante grande parte do século XX.

 

Hilma af Klint frequentou a Real Academia de Belas Artes, principal centro de educação artística da capital sueca, mas logo se distanciou do seu treino acadêmico para pintar mundos invisíveis, influenciada por movimentos espirituais como o Rosa-cruz, a Teosofia e, mais tarde, a Antroposofia. Ela integrou o As cinco”, grupo artístico composto por artistas mulheres que acreditavam ser conduzidas por espíritos elevados que desejavam se comunicar por meio de imagens e já experimentavam desde o final do século 19 a escrita e o desenho automático, antecipando as estratégias surrealistas em mais de 30 anos.

 

A exposição inclui 130 obras. Destaque para a série intitulada “As dez maiores”, realizada em 1907 e considerada hoje uma das primeiras e maiores obras de arte abstrata no mundo ocidental, já que antecede as composições não figurativas de artistas contemporâneos a af Klint como Kandinsky, Mondrian e Malevich. Além deste conjunto, a exposição em São Paulo contará com algumas séries de obras que nunca foram apresentadas ao público.

 

A mostra da Pinacoteca tem curadoria de Jochen Volz, diretor geral da instituição, em parceria com Daniel Birnbaum, diretor do Moderna Museet, e é uma colaboração com a Hilma af Klint Foundation. “O trabalho de Hilma af Klint dialoga de certa forma com o sincretismo e a pluralidade de cosmovisões tão presente na cultura do Brasil. A serialidade encontrada em sua obra também aparece na arte brasileira, em especial no concretismo e neoconcretismo”, explica Volz.

 

O trabalho de af Klint foi exposto pela primeira vez em 1986 na mostra “The Spiritual in Art: Abstract Paintings 1890–1985”, realizada no Los Angeles County Museum of Art.  Mas apenas a grande retrospectiva organizada pelo Moderna Museet de Estocolmo em 2013 e, consequentemente, a sua itinerância pela Alemanha, Espanha, Dinamarca, Noruega e Estônia permitiu que o trabalho de af Klint fosse reconhecido internacionalmente pelo grande público. Desde então, suas obras participam de exposições realizadas na Europa e Estados Unidos.

 

A Pinacoteca prepara um catálogo bilíngue, português-inglês, que reunirá três textos inéditos escritos pelos autores Jochen Volz, Daniela Castro, curadora independente, e Daniel Birnbaum. O livro trará ainda reproduções das obras expostas e uma cronologia escrita por Luciana Ventre, pesquisadora brasileira que lança nos próximos meses uma biografia de Hilma af Klint.

 

 

Até 16 de julho.

Fotos de Alice Quaresma

21/mar

A Casa Nova, Jardim Paulista, São Paulo, SP, apresenta no dia 24 de março, o projeto solo “Coisas da Vida”, da artista carioca Alice Quaresma. O projeto é inédito e traz como foco o questionamento do movimento e cronologia através da fotografia. Para a sala de projeto solo da Casa Nova, a artista criou um mural fragmentado usando fotografias e paneis coloridos pendurados individualmente criando profundidade e distanciamento entre cada imagem e cor. A instalação permite que o público percorra o trabalho de forma que se surpreendam com a fotografia panorâmica da cidade natal da artista, Rio de Janeiro, ao fundo da sala.
Além disso, o projeto “Coisas da Vida” contemplará seis obras únicas, onde Alice Quaresma cria linhas e marcas gestuais sobre fotografias tiradas no Rio de Janeiro, nos últimos 15 anos. A artista continua investigando os limites da fotografia como um objeto de precisão e verdade. A geometria e marcas gestuais são elementos constantes nos trabalhos da artista, nos quais investiga maneiras de romper com formas representadas nas fotografias. Decisões subjetivas e ocasionais são constantes e aparentes em seus trabalhos, de modo que aproximam suas obras a acontecimentos da vida, trazendo um olhar poético para pequenos encontros e desencontros do dia a dia, criando assim, uma história sem cronologia.

 

 

Sobre a artista

 

Alice Quaresma nasceu no Brasil em 1985 e vive atualmente em Nova York. Possui em seu currículo uma série de prêmios, convites para projetos especiais e residências, incluindo o renomado Prêmio da Foam Talent em Amsterdã. Em 2017, Alice participou de exposições coletivas e individuas na Europa, Estados Unidos e Brasil e integrou um grupo de artistas em duas residências nos Estados Unidos e teve seus trabalhos publicados em revistas, jornais e sites importantes no Brasil, Japão, EUA e Europa. Cursou o MFA no Pratt Institute em 2009 e foi selecionada como umas das vencedoras do prémio PS122 durante o mesmo ano.

 

 

De 24 de março a 21 de abril.

 

Suzana Queiroga no Paço Imperial

20/mar

No dia 21 de março, será inaugurada a exposição Miradouro, com obras recentes e inéditas da artista plástica Suzana Queiroga, que ocuparão três salas do segundo andar do Paço Imperial, Centro Histórico, Rio de Janeiro, RJ, em uma área total de 300 m2. Com curadoria de Raphael Fonseca, serão apresentados cerca de quinze trabalhos em grandes dimensões, dentre pinturas, esculturas, instalações e vídeos, que mostram a pesquisa da artista sobre o tempo, a paisagem e a cartografia. A exposição também terá uma parte documental, com diversos estudos, mapas, pesquisas e o processo de trabalho da artista no ateliê. A mostra comemora os dez anos do projeto “Velofluxo”, em que a pesquisa de Suzana Queiroga sobre a cartografia, as cidades, os fluxos e o tempo, culminou com voos no balão Velofluxo, criado pela artista, em que a experiência do voo foi compartilhada com o público no CCBB de Brasília, em 2008. Para este ano, a artista também tem uma exposição programada na Cassia Bomeny Galeria, em Ipanema.

 

“A exposição traz ao público algo da variedade de mídias com as quais Suzana tem trabalhado. Há trabalhos na linguagem da pintura, área na qual seu trabalho foi inicialmente institucionalizado nos anos 1980 e o qual pesquisa sistematicamente. Há trabalhos realizados na linguagem mais próxima ao desenho e à pesquisa de diferentes materialidades de papel. E há também, por fim, trabalhos em vídeo que exploram a relação entre a documentação da paisagem e sua exploração por meio do desenho e da pintura”, conta o curador Raphael Fonseca. 

 

As obras da exposição se relacionam entre si e o percurso da mostra foi criado de forma a aproximar o público. Logo na entrada, estará uma grande pintura redonda, de 1,5m de diâmetro, em óleo sobre tela, com veios em tons de azul, verde e laranja, que representam os fluxos. Nesta mesma sala, haverá desenhos e sketches, montados sobre a parede, sem moldura, trazendo um pouco da atmosfera do ateliê da artista para o museu.

 

Adentrando o grande salão principal, que tem área total de 182m2, estarão cinco pinturas em grande formato, que representam paisagens, não só urbana, mas também aérea e marítima. “No meu trabalho, penso a cartografia de forma ampla. Minha pesquisa envolve a cartografia do tempo, do infinito”, afirma. Nesta mesma sala estará a obra Nuvem”, composta por 24 papéis vegetais, que recebem banhos de pigmentos em tons de cinza, violeta e rosados. “A obra tem uma palheta de nuvem carregada, prestes a chover, quando recebe os últimos raios de sol do dia”, explica a artista, que deu os banhos de pigmento com a intenção de “retirar a rigidez do papel, transformando-o em um campo atmosférico”. Este trabalho, de 2013, é inédito e foi criado como base para os vídeos Mar”, em que a artista vai folheando esses papéis mesclados com imagens de nuvens, e “Cais”, em que os papéis se misturam com ondas do mar.

 

Também estará na exposição o vídeo Atlas” (2015), em que um olho observa o interior de um globo terrestre em constante rotação. “Esse trabalho é uma cartografia mutante, fala do tempo e do fluxo. Em ‘Atlas’, somos observados e ao mesmo tempo observamos a este olho que oprime e inebria, como num voo ou circunavegação infinita às avessas na cartografia terrestre”, conta a artista.

 

A grande instalação Topos”, que ocupará o chão da última sala, é composta por diversos recortes em feltro, que representam as cartografias de várias cidades, reais e imaginárias. “O feltro bruto, feito de aparas de refugo de indústria têxtil possui uma massa corpórea espessa que se projeta no espaço e estabelece uma relação direta com a escala humana e arquitetônica. Ao mesmo tempo possui uma carga simbólica: é um tipo de manta utilizada pela indústria mas também pelo indivíduo morador de rua como cobertor, veste e abrigo”, diz a artista, que ressalta que nesta obra estão presentes elementos que atravessam o seu trabalho nos últimos anos: o fluxo, o tempo, o infinito, as cidades e as cartografias.   

 

A exposição também terá uma grande parte documental, com pesquisas e estudos de ateliê. O espectador entrará em contato com os fragmentos deste percurso através de uma montagem pouco ortodoxa e suportes variados, que incluem desenhos, estudos, mapas, entre outros. Uma oportunidade única e rara de adentrar o ateliê da artista e seu processo de trabalho.

 

 
 
Sobre a artista
 
Suzana Queiroga nasceu no Rio de Janeiro, em 1961, e atua nas artes plásticas desde a década de 1980, suas poéticas atravessam a ideia de fluxo e tempo. Traz à tona questões da expansão da pintura e do plano dialogando com diversos meios, entre os quais instalações, performances, infláveis, audiovisual e escultura. Participou de importantes exposições, no Brasil e no exterior, como “ÁguaAr”, no Centro para Assuntos de Arte e Arquitetura, em Guimarães, Portugal, 2015, onde também foi artista residente e a individual “Prelúdio”, na Galeria Siniscalco, em Nápolis, 2014; realizou uma individual para o Projeto Ver e Sentir do Museu Nacional de Belas Artes, 2017. Acumulou cerca de 12 prêmios como o Prêmio de Aquisição na XVIII Bienal de Cerveira, em Portugal, 2015; 5º Prêmio Marcantônio Vilaça/Funarte para aquisição de acervos, 2012, pelo qual apresentou a individual “Olhos d’Água” no Museu Nacional de Arte Contemporânea de Niterói no ano seguinte; o I Prêmio Nacional de Projéteis de Arte Contemporânea/Funarte, 2005, e a bolsa RIOARTE, 1999. Foi também finalista do 6º Prêmio Marcantônio Vilaça para as Artes Plásticas, cuja coletiva aconteceu no Museu Brasileiro da Escultura e da Ecologia, 2017. Foi artista residente na Akademia der Bildenden der Künste Wien, na Áustria, 2012, no Instituto Hilda Hilst, em São Paulo, 2012, na IV Bienal del Fin del Mundo, na Argentina, 2014, entre outros.
 
De 21 de março a 27 de maio.

Assemblages de Farnese

16/mar

A Galeria 3 da CAIXA Cultural Rio de Janeiro, apresenta a mostra “Farnese de Andrade – Arqueologia Existencial”, que reúne um conjunto de 71 assemblages e objetos pertencentes a coleções particulares e a herdeiros do artista plástico mineiro, mapeando sua produção ao longo dos anos 1970 a 1990. A exposição traz também o filme “Farnese”, de 1970, do cineasta e crítico  de arte Olívio Tavares e Araújo, uma entrevista em vídeo com o curador e textos/poemas que ajudam a elucidar a trajetória e fundamentos criativos do artista. O projeto tem patrocínio da Caixa Econômica Federal e do Governo Federal.

 

Farnese de Andrade foi um artista múltiplo cuja produção, vida e arte se enlaçam de maneira inseparável dando origem a uma obra densa, de caráter fortemente autoral. Com curadoria de Marcus de Lontra Costa, a mostra apresenta a linguagem única e singular do artista, incorporando aspectos de sua personalidade e trajetória às diferentes fases de sua obra.

 

“As obras de Farnese articulam habilidosamente a tradição, seja barroca, romântica ou simbolista, com elementos regionalistas, populares, pessoais e mesmo com lições oriundas das chamadas vanguardas negativas, como o Dadaísmo e o Surrealismo. São confissões que emergem das profundezas de uma alma que presta devoção a uma realidade artística nacional da qual ela própria foi, por vezes, excomungada, já que a sua essência contrasta com um projeto abstracionista, construtivo e positivista que imbuiu nossa arte durante décadas e que ainda dá forma aos trabalhos de muitos artistas”, comenta o curador.

 

Apontado como dono de uma personalidade difícil e de uma produção marcadamente autobiográfica, Farnese revelou, em seus trabalhos, uma densa trajetória pelas memórias de infância, do pai, da mãe, dos irmãos e da sagrada família mineira, além de um certo aspecto libertário e transgressor, a partir de sua mudança para o Rio de Janeiro. Pautada no inconsciente, a poética de Farnese de Andrade contrasta com as de outras tendências do período, como as da arte construtiva e concreta. Produziu, assim, uma obra na qual o lirismo oscila do concreto ao abstrato e o bruto consegue ser gentil.

 

A exposição “Farnese de Andrade – Arqueologia Existencial” passou, anteriormente, pelas unidades da CAIXA Cultural de Brasília e São Paulo, sendo indicada pelo programa Metrópolis como uma das 10 melhores mostras de 2015; pelo Guia da Folha de São Paulo ao Prêmio Melhores do Ano de 2015, na categoria “Exposições”; e pela revista Veja como a primeira das cinco melhores mostras de 2015, em Brasília. Em 2016, foi apresentada no Palácio das Artes – Fundação Clóvis Salgado, em Belo Horizonte (MG), com versão retrospectiva e ampliada em homenagem ao aniversário de 20 anos de morte do artista mineiro.

 

 

 

Prêmios e coleções

 

Praticamente esquecido nas últimas décadas, Farnese foi regularmente premiado de 1962 a 1970, como no Salão Nacional de Arte Moderna de 1970 (Prêmio de viagem ao exterior) e, em 1993, com o Prêmio Roquette Pinto de Os Melhores de 1992, pela exposição “Objetos”. Reconhecido como um dos mais valorizados artistas nacionais, suas obras podem ser encontradas nas maiores coleções particulares e museus do Brasil e do mundo, incluindo a Coleção de Arte Latino-Americana da Universidade de Essex, na Inglaterra, o Instituto de Arte Contemporânea de Londres, o MAC Niterói (RJ), o Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (MoMA), o MAM RJ, o Museu Nacional de Belas Artes, o MAM SP, entre outros.  Com uma produção ininterrupta participou de diversas Bienais internacionais e nacionais e suas obras hoje são disputadas entre grandes colecionadores.

 

 

 

Sobre o artista

 

Nascido em Araguari, MG, Farnese de Andrade entrou, em 1945, na Escola do Parque de Belo Horizonte, onde foi aluno de Guignard e contemporâneo de artistas como Amilcar de Castro, Mary Vieira e Mário Silésio. Em 1948, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde trabalhou como ilustrador para suplementos literários de diferentes jornais e revistas. Começou sua carreira como desenhista e gravador. Na década de 1950, realizou a primeira exposição individual de seus desenhos e começou a frequentar o ateliê de gravura do MAM RJ, onde estudou gravura em metal com Johnny Friedlaender e Rossini Perez.  A partir de 1964, cria objetos ou assemblages com cabeças e corpos de bonecas, santos de gesso e plásticos, todos corroídos pelo mar, coletados nas praias e nos aterros. Utilizou com frequência velhos retratos de família e postais, e realizou trabalhos com resina de poliéster, sendo considerado um pioneiro da técnica no Brasil. Bolsista do governo brasileiro, viajou em 1970 para Barcelona. Sua volta em 1975 rendeu frutos e a fama de Farnese fortaleceu a paisagem artística brasileira. Mas não é por seu trabalho na gravura, sempre abstrato, nem como desenhista, seja abstrato ou figurativo, que ele é, hoje, conhecido e reconhecido, mas pela criação dos objetos chamados boxforms, cuja matriz explodida e iconoclasta é o barroco de sua infância. Oratórios, pedaços de madeira de igreja, ex-votos e outros constituíram, até a sua morte, um mundo estranho, às vezes mórbido e com fortes referências eróticas. Resultado de uma infância secreta, a obra sempre onírica e poética dá força e senso a um trabalho sem igual.

 

 

 

De 20 de março a 20 de abril.

70 anos de Arruda/MAM-Rio

14/mar

O Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, Parque do Flamengo, Rio de Janeiro, RJ, inaugura no próximo dia 17 de março de 2018, às 15h, a exposição ARRUDA, Victor”, que homenageia o artista Victor Arruda, um dos grandes nomes da arte contemporânea. A exposição, que tem curadoria de Adolfo Montejo Navas, percorre os quase 50 anos de trajetória do artista, com cerca de cem trabalhos produzidos desde o início dos anos 1970 até 2018.  A mostra é não recomendável para menores de 18 anos.

 

Victor Arruda é conhecido por sua pintura rude, bruta, sem concessões, com uma feroz crítica contra a hipocrisia e o abuso de poder, e a presença, desde sempre, de questões de gênero, com cenas explícitas de sexo. Para o artista, sua arte é conceitual, em que a “pornografia” (“nas aspas”, ele ressalta) e a agressividade estão a serviço da discussão de temas internos e também sociais, como o assédio denunciado na pintura “Salário mais justo”, de 1975. Suas obras estão em coleções importantes como as de Gilberto Chateaubriand, Luiz Schymura, João Sattamini, Hélio Portocarrero e a do crítico italiano Achille Bonito Oliva, que conheceu seu trabalho por intermédio do artista Antonio Dias.

 

Adolfo Montejo Navas apontou dois grandes temas para aproximar os trabalhos de Victor Arruda na exposição: O primeiro é Palavras e Textos, que estrutura grande variedade de obras e suportes. A escrita é uma característica marcante na pintura do artista, e ora aparece como frases ou palavras soltas, ora como narrativa.  As demais pinturas estarão agrupadas por décadas: 1970, 1980, 1990, 2000 até o momento. Além de pinturas, a exposição terá uma instalação – “Homenagem às vítimas do dinheiro” (2014) – desenhos, fotografias, vídeos e cadernos de anotação do artista.

 

O segundo tema coloca a ênfase no lado culturalista que tem sua obra, cheia de diálogos heterodoxos com artistas de diversas épocas. Os trabalhos de Victor Arruda trazem referências à história da arte, como os suprematistas russos ou Magritte – “o artista que mais admiro, que já disse tudo o que tinha que dizer” – embora nem sempre aparentes.  Quando ao terminar uma tela percebe que ela contém elementos conhecidos, de outros artistas, Victor Arruda deixa clara a homenagem no título da pintura.  Estarão na exposição várias dessas pinturas feitas “em homenagem” a outros artistas. “Penso muito nos títulos”, explica. “Quero deixar tudo explícito, facilitar a comunicação com o espectador”, diz Victor.

 

Nascido em Cuiabá, Mato Grosso, em 1947, Victor Arruda se mudou para o Rio aos 14 anos. Estudou museologia na UniRio, com especialização em arte contemporânea. “Eu era um artista contemporâneo antes mesmo de este termo ser usado, porque não me identificava com nada do que se fazia na época. Tudo era moderno e eu não era moderno”, conta.

 

 

 

Carlos Zéfiro e Nelson Rodrigues

 

Ele conta que alguns fatos foram decisivos para ele se convencer do caminho a trilhar em seu trabalho. Em 1973, viajou para Paris.  Ao entrar no Grand Palais, a claridade do dia de verão parisiense contrastou com a penumbra do interior do museu. Isso fez com que pensasse que uma tela do pintor abstrato Ad Reinhardt, exposta na grande galeria, era toda pintada  de preto.  Não entendeu o sentido daquilo, pois Malevich já havia pintado o célebre “branco sobre branco” há décadas, e o quadrado preto sobre preto; e, depois, Robert Rauschenberg mostrou só a tela branca. Foi então que o olhar se acostumou à luz do salão, e ele pode perceber que na verdade se tratava de cruzes em um tom muito escuro de púrpura – “praticamente berinjela” – sobre um fundo negro. “Aquilo era de uma tal sofisticação cromática, uma coisa tão transcendental, que pensei: isso não é pro meu bico”. “E o que era o meu bico? As pinturas que eu já estava fazendo, impulsionado pelo processo psicanalítico”.

 

 

Um ano depois, outra experiência marcante. Decidiu morar um tempo em Londres, e viu na Tate uma exposição de Lichtenstein. “Quando vi aquelas telas enormes, uma metralhadora mandando bala em um avião que já está explodindo (“As I Opened Fire”, 1964), quase caí pra trás. Pensei, uau, é por aqui que tenho que ir. Mas espera aí: isso é a pop art americana, e eu não vou agora copiar o Lichtenstein, eu não nasci pra isso. Eu não tinha a menor chance de competir com aquilo que eu admirava tanto. Não ia ser o seguidor de última categoria do Picasso”.  Então, Arruda escreveu em um pedaço de papel: “não pinto para virar verbete”, conceito escolhido por Adolfo Montejo para nomear a exposição.

 

 

Victor Arruda conta que foi a partir de então que decidiu persistir no que já vinha fazendo. “Não vou fazer arte de Nova York. Sou brasileiro, de Cuiabá, Mato Grosso.  Vou procurar meu jeito de me expressar”. Além da psicanálise que também tem um papel relevante na produção do artista. “A psicanálise revirou tudo, o sentimento de culpa por ser homossexual, por não ser uma pessoa dita normal, e resolvi enfrentar as questões que vinham de fora: o dedo acusador. Passei a questionar quem era o homem normal, maravilhoso, o pai de família sério, que usava terno & gravata. Aquele mesmo que acha normal assediar a empregada, dentro da normalidade escravagista,  prometendo-lhe pagar um “Salário mais justo”. O tal “normal” é machista, racista, explorador, homofóbico! Entendi isso aos vinte e poucos anos. Decidi que minha pintura tinha que ser uma reação contra essas pessoas conservadoras pois eram as donas do poder. Com as minhas pinturas, aponto o dedo de volta. para toda essa nojeira que é o abuso do poder do dinheiro. Contra essas pessoas que ditam as regras. Só que não podia falar sobre isso. Por quê? Porque a arte ainda era a arte moderna. Não podia ter texto, não podia ter narrativa, não podia ter perspectiva, frente e fundo, não podia ser autobiográfica. Não podia sexo, não podia nada! Sabe o que resolvi fazer? Resolvi usar tudo o que não podia ao mesmo tempo!”.

 

 

Victor Arruda enfatiza que na época recebeu um importante apoio de Antonio Dias. “Ele me ajudou muito. Um amigo importantíssimo. Foi ele quem me apresentou ao Achille Bonito Oliva, ao João Sattamini. Muito generoso. Depois, com o surgimento da transvanguarda – termo cunhado justamente por Achille Bonito Oliva – e a bad art, Victor Arruda sentiu-se encaixado, e identificado com esses movimentos.

 

Ele lembra que Gilberto Chateaubriand uma vez disse: “o que mais me espanta em seu trabalho é a sua coragem”. Victor destaca que não está preso a nenhuma data. “O trabalho “Salário mais justo”, de 1975, uma pintura brutal, malfeita, está ligado ao néon de “Homenagem às vítimas do dinheiro”, de 2014, super elaborado, uma traineira que navegou nas águas da Baía de Guanabara em frente à ArtRio. As duas obras estão na exposição, ligadas pelo mesmo conceito que faz com elas existam”, afirma. Os temas sociais permeiam toda a exposição, como “a tortura, que existente em qualquer lugar do mundo, uma coisa pavorosa”.

 

Desde o início dos anos 2000, Victor Arruda passou a usar mais cor em seus trabalhos. “Sabe que durante 35 anos eu não usei verde? Olha que coisa louca. Eu pintava o verde e depois acabava cobrindo de cinza, conta”.

 

 

O artista tem o hábito de desenhar durante telefonemas, muitas vezes tarde da noite, quando amigos o procuram para comentar o dia, ou filmes a que assistiram. Para isso, ele se vale de qualquer papel a sua frente, muitas vezes precisando dobrar a folha para continuar desenhando. Depois, o mosaico formado pelas várias imagens se transformam em pintura. “As imagens são tão diferentes que lembra a prática surrealista de desenhos produzidos coletivamente”, explica. A obra “Kadavre exquis, meu somente” (2017), em acrílica sobre tela, de 120 x 80 cm, é um exemplo disso. A família materna de Victor Arruda é russa e quando imigravam para o Brasil, sua mãe nasceu, em Harbin, na Manchúria, no período em que a Rússia ocupou a cidade, de 1896 a 1924. “Eles eram muito brancos, de olhos claros. Já a família de meu pai é uma mistura de portugueses com índios, negros,  provavelmente cristãos novos, por isso me considero um coquetel molotov”, brinca. Fiel as suas próprias pulsões internas, Victor Arruda mantém uma trajetória pulsante e coerente, que o público poderá conhecer, de forma abrangente, com esta exposição no MAM Rio.

 

 

De 17 de março a 17 de junho.

Exposição de Nelson Leirner

A Galeria Silvia Cintra + Box 4, Gávea, Rio de Janeiro, RJ, abre seu calendário de 2018 com “A  Nova Revolução Industrial”,  exposição individual de Nelson Leirner. Com curadoria de Lilia Schwarcz, a exposição apresentará ao público nove tapeçarias que foram produzidas manualmente, reproduzindo os projetos do artista, por um grupo de tecelões durante o último ano.

 

A “nova revolução” proposta por Leirner é na realidade uma volta no tempo, quando o mundo não estava dominado pelas máquinas da revolução industrial, e nem pela tecnologia que recentemente inundou nossas vidas, mudando inclusive a forma como nos relacionamos com o tempo. E é exatamente a essa forma de produção artística que Leirner tem se dedicado: o artesanal.

 

As tapeçarias que já foram moda, e atualmente são vistas como algo kitsch, ganham no universo de Leirner uma graça que lhe é peculiar. Uma natureza-morta bordada ganha a companhia de frutas de plástico, partituras em preto e branco saem do papel para virarem um grande tapete, assim como as teclas de um piano. Mas o grande homenageado da exposição é o italiano Alighiero Boetti e seus “Maps of the world”, também uma série de bordados onde o artista suprimia países, alterava fronteiras e criticava todo tipo de jogo político. Desta vez é com ele que Leirner dialoga criando novas versões para o mapa mundi e aguçando e atualizando as tensões e ironias que já eram presentes na obra do italiano. Nas obras da mostra, o mundo aparece ora como um quebra cabeça, ora se desfazendo em fios, com o oriente refletindo o ocidente e também com novas representações territoriais. Todo o processo de feitura das obras também vai estar presente na exposição. Uma vitrine no centro da galeria abrigará as lãs e agulhas usadas pelos artesãos e também uma série de fotos deles trabalhando durante as várias etapas do projeto.

 

É desta forma que Leirner pretende fazer um convite ao espectador para se rebelar contra a aceleração em que estamos vivendo. Ver essas tapeçarias é compartilhar de um tempo bem gasto e pensar no significado simbólico do trabalho manual. Perder tempo também pode ser ganhar.

 

 

 

 

De 17 de março a 21 de abril.

Obras de Krajcberg

A mostra organizada por Márcia Barrozo do Amaral reúne em sua a galeria, no Shopping Cassino Atlântico, Copacabana, Rio e Janeiro, RJ, a partir do dia 15 de março, importantes trabalhos, – muitos deles inéditos -,  de diversas fases artísticas de Frans Krajcberg. São 15 peças produzidas entre os anos 1960 e 1917.

 

A exposição proporciona um rico passeio pela carreira do artista. Entre as raridades, um livro arte de madeira com duas gravuras. Krajcberg produziu apenas 60 destas “caixas”, que hoje estão espalhadas pelo mundo e desmembradas. Um trabalho incomum chama a atenção: uma paleta em tão de azul vai surpreender o público acostumado aos trabalhos do artista em tons terrosos e de vermelho.

 

“Esta exposição é uma forma de homenagear Krajcberg ao apresentar alguns trabalhos nunca antes expostos”, afirma a galerista, que fez questão de apresentar muitas peças da técnica na qual ele era um mestre – relevo em papel. No total, são quatro trabalhos deste tipo, que revelam toda genialidade do artista. O púbico ainda vai poder conferir obras das mais diversas vertentes artísticas, como duas esculturas da famosa série “Sombra”, uma pintura sobre madeira, entre outros trabalhos.

 

“A obra de Frans Krajcberg é tão rica e abrangente, que inclui praticamente todas as técnicas mais conhecidas: escultura, pintura, desenho, litografia e fotografia. Sem contar a que ele desenvolveu e usou ao longo da carreira: o relevo em papel. O exemplo mais impactante desta técnica é quando ele usa a areia, molhada pela água do mar, como matriz destes relevos”, avalia Marcia Barrozo do Amaral.

 

 

Sobre o artista

 

Falecido em novembro de 2017, Frans Krajcberg chegou ao Brasil em 1948, com 27 anos, após ter lutado na 2° Guerra Mundial por acaso.  Chegou ao país sem ter amigos e sem conhecer a língua. E aqui renasceu. “Nasci deste mundo que se chama “natureza”. O grande impacto da natureza foi no Brasil que senti. Aqui eu nasci uma segunda vez. Aqui eu tive a consciência de ser homem e de participar da vida com minha sensibilidade, meu trabalho, meu pensamento. Aqui me sinto bem”, afirmou o artista. Frans Krajcberg viveu em Monte Alegre, no Paraná, onde produziu a série de pinturas denominadas “Samambaias”, em São Paulo, no Rio, sempre trabalhando, sempre criando. Morou em Paris, onde manteve um atelier. Viveu em Ibiza, ali iniciou a série de relevos sobre pedra que lhe valeram o Prêmio de Pintura, na IV Bienal de São Paulo (1957) e na Bienal de Veneza (1964). De volta ao Brasil, Krajcberg se estabeleceu em Minas Gerais, na região de Itabirito e travou conhecimento com os pigmentos naturais de origem ferrosa, que se tornaram marca registrada em seus trabalhos. Foi a época dos relevos em papel, das esculturas em madeira lavada, entre outros trabalhos. Em 1972, mudou-se para Nova Viçosa e construiu a sua “Casa na Árvore” pousada num pequizeiro. Dali partiu inúmeras vezes para Amazônia, para o Pantanal, Marajó, São Luiz, sempre registrando a beleza destas regiões do Brasil, sua grande paixão. Mas, principalmente, denunciando a destruição da natureza, as queimadas, a extinção das tribos indígenas. Como consequência destas viagens, Krajcberg introduziu o fogo na sua obra – é a época das esculturas queimadas, que tanto impacto causaram no público que visitou a exposição de Bagatelle, ponto alto do ano Brasil-França. Frans Krajcberg, além de artista plástico mundialmente renomado, com obras nos mais importantes museus, é excelente fotógrafo.

 

Em suas viagens à Amazônia, ao interior de Minas Gerais e ao Pantanal assistiu cenas chocantes de destruição ambiental. Esses registros feriram tal maneira sua sensibilidade, que estão sempre presentes em suas obras, principalmente nas “esculturas queimadas”. A importância de sua obra no contexto da ecologia mundial é indiscutível. A viagem que fez ao Alto Amazonas com o crítico e filósofo Pierre Restany, quando redigiram e lançaram o “Manifesto Rio Negro”, foi um marco fundamental em seu trabalho: toda sua atenção se voltou para a preservação da natureza. Outro aspecto deste protesto são as fotos – registro vivo da tragédia – cujo impacto é extraordinário. Assim, grande defensor das causas ecológicas, acumulou, ao longo de décadas, um importante acervo de fotografias, reunindo não só imagens da riqueza da flora brasileira, como das agressões por ela sofrida.

 

 

De 15 de março a 06 de abril.

Monolux, no MAM-Rio

O Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, Parque do Flamengo,  inaugura a exposição “Monolux”, com 28 obras inéditas do fotógrafo Vicente de Mello. Com curadoria do poeta Eucanaã Ferraz, a mostra reúne fotogramas, “…imagens singulares, simples impressões construídas pela velatura da luz direta que ocorre pelo contato de objetos sobre a superfície do papel fotográfico”. “Os objetos mais sólidos não deixam refletir seus contornos, e os mais claros e transparentes revelam leveza e imprevisibilidade”, observa o artista.

 

Vicente de Mello explica que diante da “…desconcertante reprodutibilidade na prática social, onde a imagem se tornou um fluxo permanente que deságua nas redes sociais em uma profusão nunca antes vista”, buscou a natureza primeira da fotografia: os fotogramas. Os fotogramas “são fotografias sem câmera e sem negativo, uma antítese do impalpável e imensurável universo de pixels”. “Agradava-me a ideia de pensar que tanto a luz quanto os objetos exerciam uma ação tátil de clara composição ambígua sobre o papel, resultando em um fato fotográfico de força enigmática”, explica.

 

Fotógrafo educado a “…reconhecer o ato fotográfico como uma ação de foro pessoal, autoral, profissional, da procura da imagem perfeita, singular, carregada de significados implícitos”, Vicente de Mello conta que buscou entender e lidar com esta nova situação, em que a tecnologia “esgarçou no século 21 as fronteiras da captação e da pluralidade de imagens”.

 

“No meio da constatação desta espetacular hecatombe de imagens, senti que, eu mesmo já estava há anos convivendo com um grande manancial de imagens editadas, conhecidas, exibidas, adquiridas, publicadas, além das arquivadas que nunca chegaram a outros olhos”, conta o artista. “Essas imagens formavam o ‘cosmos’ da minha propriedade como autor, ainda a ser descoberto e revisto em múltiplas análises, recortes e inserções”. Ele ressalta que não considera ter esgotado sua percepção, mas que precisava “retornar a um pensamento em que pudesse construir, dominar, e que ele fosse único, sem a possibilidade de estar, enquanto original, em vários lugares”. “Um novo estatuto da fotografia, sem freio”, afirma.

 

Vicente de Mello reconhece que ao reproduzir digitalmente as imagens dos fotogramas, e elas forem lançadas nas redes, “todo mundo terá acesso, enquanto o original não poderá ser duplicado”. “Para conhecer o original será preciso que o olho humano esteja em frente a ele”, diz.

 

 

Telescópio japonês

 

O título da exposição, “Monolux”, vem da lembrança de Vicente de Mello do nome de um telescópio japonês de uso amador dos anos 1970, e “pelo fato físico de que, para imprimir os fotogramas, uma única fonte de luz é utilizada: a lâmpada da cabeça do ampliador”.

 

“Os fotogramas abandonam a materialidade do negativo, para lidar com a materialidade da luz, e a experimentação é a força orientadora, a âncora na imaterialidade da imagem”, diz. “O princípio do fotograma é o avesso do que está por cima do papel fotográfico, é o nexo entre a materialidade dos objetos e seu volume nulo, em fundo-abismo”.

 

O artista explica que os materiais utilizados têm uma relação particular entre si: “vieram das minhas coleções de madeira, de itens fotográficos, de coisinhas acumuladas que achei na rua, que comprei no mercado de pulgas, de objetos de uso doméstico e as que criei, exclusivamente, para configurarem como formas reconhecíveis”.

 

Na impressão dos objetos, dentro do retângulo de 50cm x 60cm, “todas as modulações, tentativas e acidentes foram às cegas”, conta ele. “O laboratório precisa estar em completa escuridão e somente uma luz vermelha (que não revela o papel virgem) permeia o ambiente para guiar a colocação dos objetos. O que vejo nos fotogramas é que a forma impressa não respeita a gravidade, tudo flutua e parece entrar em orbita, em um infinito impalpável. Não estou reinventando a pólvora”.

 

Vicente de Mello associa esta volta ao laboratório ao fato histórico conhecido de quando José Oiticica Filho, nos anos 1950, rompeu com os procedimentos clássicos da fotografia e se aprofundou na criação de séries, em que pintava sobre ampliações, com sobreposições de materiais diretos no papel e depois refotografados (“Formas”), fotografias convencionais que sofriam alteração na própria cópia (“Derivações”), e esses dois processos somados a fotogramas e solarização “(Recriações”).

 

“José Oiticica Filho deixou de lado, naquele momento, a problematização do que é fotografia, arte e reprodutibilidade, tema que até hoje é discutido ad nauseam, e, com as fotografias pelos meios digitais, as certezas estarão mais pulverizadas”, avalia Vicente de Mello.

 

O artista diz que sobre o assunto há duas interpretações – uma na literatura italiana e outra na brasileira – que lhe agradam “aos olhos e mente”:

 

“Umberto Boccioni (1882 – 1916), que desde o texto do manifesto técnico da pintura futurista, afirmava que era fundamental estabelecer uma relação de complementariedade entre a observação do mundo fenomênico, o indelével que só existe em nossa mente e o que se manifesta por meio da recordação. A meu ver, ele queria atribuir importância à capacidade de se recorrer às recordações individuais, e por meio da ‘intuição e estado da alma’ constituir o fazer artístico.

 

A outra interpretação de que gosto é a uma fala em “Grande sertão: veredas”, de Guimarães Rosa (1980-1967) que contextualiza as referências das imagens dos meus fotogramas: “O que lembro, tenho!”. A relocação dos objetos no pré-table top, foram fundamentais para transcender o representado, o que via na composição realizada a olho nu, das imagens que tinha em mente, não eram o resultado em preto e branco, após o laboratório. Olhava para as composições e pensava: ‘vocês perderão a posição de protagonistas e entrarão em uma atmosfera de cumplicidade’.”

 

 

Até 17 de junho.

Arnaldo de Melo no Rio

12/mar

No dia 13 de março, Cassia Bomeny Galeria, Ipanema, Rio de Janeiro, RJ, inaugura a primeira exposição individual do artista Arnaldo de Melo no Rio de Janeiro. Com curadoria de Franz Manata, serão apresentadas 15 obras inéditas, dentre pinturas – sobre tela, madeira e papel – e monotipias do artista, que começou sua trajetória em 1979, e já expôs em importantes instituições, como MASP e MAC/USP, em São Paulo; Palácio Das Artes, em Belo Horizonte, Centro Cultural Correios, no Rio de Janeiro, entre outros. Nos últimos anos, artista esteve afastado do circuito das artes, dedicando-se ao mestrado e ao doutorado em arquitetura, mas sem nunca deixar de pintar.

 

As obras que serão apresentadas na Cassia Bomeny Galeria foram produzidas no segundo semestre de 2017 e mostram a mais recente produção do artista, cuja formação artística se deu em Berlim, onde morou entre 1987 e 1990, e em Nova York, onde viveu entre 1984 e 1985, época em que predominava efervescência artística influenciada pelo início da arte de rua e o esplendor de carreiras em rápida ascensão através de linguagens e narrativas imediatistas e espontâneas como a “pop-art”, a “action painting” e a performance. Essa vivência influenciou a sua obra até hoje.

 

“O Arnaldo de Melo pintor é incansável na exploração de meios, formas e suportes para sua representação artística. Suas referências vêm de observações, vivências e introspecção enraizadas em seu atento e curioso olhar desde os primórdios de sua carreira artística”, afirma Tereza de Arruda no texto que acompanha a exposição.

 

 

Obras em exposição

 

Na exposição, serão apresentadas sete pinturas em grandes dimensões, com tamanhos que chegam a 2mX3m, em tinta acrílica sobre tela e madeira, que seguem o expressionismo abstrato. “Arnaldo de Melo bebeu nas duas fontes que originaram esta vertente artística: a intensidade do expressionismo alemão banhado no antifigurativismo das Escolas abstratas da Europa, como o Futurismo, Bauhaus e Cubismo. Devemos considerar que este movimento surgiu nos Estados Unidos e especificamente em Nova York no iníco da década de 50. Ambos contextos foram vivenciados ‘in loco’ pelo artista no início de sua carreira, emanando tentáculos que o influenciam até a atualidade”, ressalta Tereza de Arruda.

 

A exposição também terá cinco pinturas em acrílica sobre papel, uma pintura em acrílica sobre colagem e duas monotipias. “As telas e assemblages, por ele criadas como suporte através da junção e sobreposição de molduras e outros materias com que se depara, recebem um tratamento pictórico semelhante a uma camuflagem a tornar a superfície homogênea através da criação de formas e contornos que se complementam mantendo a abstração como gesto e intenção”, conta Tereza de Arruda.

 

 

 

Influências artísticas

 

O artista sempre enfatiza sua escolha pela pintura gestual a partir de sua inserção no ambiente onde se deu a pintura abstrata-expressionista do imediato pós-guerra, sendo de Kooning, bem como outros artistas ligados a New York School – a exemplo de Jackson Pollock, Robert Motherwell, Franz Kline e Lee Krasner – influencias marcantes em seu trabalho até os dias atuais. Vale lembrar, todavia, que na primeira metade dos anos 1980 as mais potentes galerias de arte de Nova York, cotidianamente visitadas por Arnaldo nos dois anos de sua permanência naquela cidade, exibiam em frenética rotatividade exposições dos pintores neo-expressionistas alemães, italianos e norte-americanos (Baselitz, Lüpertz, Penck, Hödicke, Chia, Clemente, Schnabel, Salle, entre muitos outros) que, exacerbando figurações e temáticas conectadas ao Zeitgeist – vivido e discutido em conjunto com a literatura, a música e as contradições políticas e ideológicas -, também resgatavam os gestos pictóricos e a escala de trabalhos consagrados do abstrato-expressionismo.

 

Nesse sentido, a “ponte” entre a abstração e a figuração estabelecida na pintura de Arnaldo de Melo sempre esteve em constante diálogo, marcadamente pelas influências obtidas nesse seu período de formação. Segundo o artista, interessa-lhe incursões figurativas não como narrativas a substanciar um longo período de trabalho, mas tão somente para abordar situações de um “som ao redor”: uma vez em Berlim, por exemplo, o artista passou cerca de um ano trazendo às telas imagens de imensos Kebaps, estes alusivos à forte presença da comunidade turca na cidade.

 

Para Arnaldo de Melo, a arte lhe serve como um “exercício de liberdade”, daí o cuidado para não se alongar por caminhos que logo poderiam lhe comprometer para além daqueles atinentes à pintura, à sua paleta de cores que incorpora a preferência pelas aguadas e os gestos rápidos mais aproximados de uma “escrita” como, aliás, foi a caligrafia oriental fonte de interesse para os abstrato-expressionistas americanos.

 

 

Sobre o artista

 

Arnaldo de Melo vive e trabalha em São Paulo. Frequenta a Hochschule der Künste Berlin (hoje Universität der Künste), com bolsa DAAD, concentrando-se em pintura sob orientação de Karl-Horst Hödicke (1987-1990). Em período anterior (1984-1985), reside e trabalha com pintura em Nova York. Em 2006, conclui o curso de Arquitetura na Escola da Cidade, em São Paulo. Em seguida, parte para a pós-graduação na FAU-USP em História e Fundamentos da Arquitetura e do Urbanismo concluindo, em 2014. Em 2015 é contemplado pelo Prêmio ProAC do Governo do Estado de São Paulo. Dentre suas exposições individuais destacam-se se “West-Berlin 1987-199: trabalhos sobre papel (2017), Sé Galeria, São Paulo”, “Círculos Urbanos” (2016), Phosphorus, São Paulo; a exposição no Palácio das Artes (1994), Belo Horizonte; “Selecionados do Centro Cultural São Paulo” (1992), Fundação Bienal, São Paulo; as mostras no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (1992) – MAC/USP, e na Galerie Röpke (1990), Berlim, entre outros. Dentre suas exposições coletivas estão “A Arte que Permanece – Coleção Chagas Freitas” (2014), no Museu Nacional dos Correios, Brasília e Centro Cultural dos Correios, Rio de Janeiro; “Selecionados do Centro Cultural São Paulo” (1991), no Museu de Arte de São Paulo – MASP; “Freie Berliner Kunstausstellung” (1998), Messehallen am Funkturm, West-Berlin; “Salão Nacional de Arte” (1980), FUNARTE, Rio de Janeiro, entre outras.

 

 

Sobre a galeria

 

Cassia Bomeny Galeria (antiga Um Galeria) foi inaugurada em dezembro de 2015, com o objetivo de apresentar arte contemporânea, expondo artistas brasileiros e internacionais. A galeria trabalha em parceria com curadores convidados, procurando elaborar um programa de exposições diversificado. Tendo como característica principal oferecer obras únicas, associadas a obras múltiplas, sobretudo quando reforçarem seu sentido e sua compreensão. Explorando vários suportes – gravura, objetos tridimensionais, escultura, fotografia e videoarte.
Com esse princípio, a galeria estimula a expansão do colecionismo, com base em condições de aquisição, bastante favoráveis ao público. Viabilizando o acesso às obras de artistas consagrados, aproximando-se e alcançando um novo público de colecionadores em potencial. A galeria também abre suas portas para parcerias internacionais, com o desejo de expandir seu público, atingindo um novo apreciador de arte contemporânea, estimulando o intercâmbio artístico do Brasil com o mundo.

Matsutani na Bergamin & Gomide

09/mar

A galeria Bergamin & Gomide, Jardins, São Paulo, SP, exibe “Takesada Matsutani: Selected Works 1972 – 2017″, uma seleta de obras de Takesada Matsutani. Nascido no Japão e membro da segunda geração do grupo Gutai, Takesada Matsutani participou em 2017 da mostra Grafite Works, em Nova York e da 57ª Bienal de Veneza, Itália.

 

Entre as características que marcam a obra de Takesada Matsutani, artista japonês radicado em Paris, está o material utilizado para compor seus trabalhos: a cola de vinil – uma espécie de adesivo de contato de aderência rápida e flexibilidade após a secagem. O artista representa a nova tomada do expressionismo abstrato e estará presente na exposição inédita no Brasil que a Bergamin & Gomide apresenta a partir do dia 03 de março, em parceria com a galeria Hauser & Wirth e organizada com Olivier Renaud-Clément.

 

Em seus primeiros experimentos, Matsutani impregnou a superfície da tela com elementos bulbosos, usando sua própria respiração para criar formas inchadas e rompidas, evocando carne e feridas. A carreira do artista começou nos anos 1960 como membro-chave da “segunda geração” na Gutai Art Association, o inovador e influente coletivo de arte do Japão na pós-guerra. Um dos mais importantes artistas ainda em produção, Matsutani continua a demonstrar o espírito de Gutai, transmitindo a reciprocidade entre o gesto puro e a matéria-prima. Suas pinturas, desenhos e esculturas envolvem temas do eterno e ecoam os intermináveis ​​ciclos de vida e morte.

 

Para a exposição na Bergamin & Gomide, foram selecionadas cerca de 20 trabalhos com grafite, cola de vinil, colagem e acrílico, entre outros materiais, tendo como suporte o papel, a tela e a madeira. Nos últimos três anos, Matsutani realizou as exposições individuais no Manggha Museum of Japanese Art and Technology (Krakow, 2018), na Hauser & Wirth Los Angeles (Los Angeles, 2017), na Hauser & Wirth, Zurique, (Suíça, 2016), no Otani Memorial Art Museum, “Correntes”, Nishinomiya (Japão, 2015) e na Hauser & Wirth New York (Nova York, 2015).

 

Além da exposição na Bergamin & Gomide, Matsutani realizará uma programação paralela na JAPAN HOUSE São Paulo, na Avenida Paulista. Entre 06 e 11 de março, o espaço receberá duas obras do artista, além de performances exclusivas. Uma delas, aberta ao público, será realizada no dia 11 e integrará a programação do evento Paulista Cultural; iniciativa que prevê uma programação especial em diversas instituições da Avenida Paulista, como Casa das Rosas, Centro Cultural Fiesp, Instituto Moreira Salles, Itaú Cultural e MASP. Criada pelo governo japonês em São Paulo, Los Angeles e Londres, a JAPAN HOUSE se propõe a ser um ponto de difusão de todos os elementos da cultura contemporânea japonesa para a comunidade internacional com programação cultural e vivências abertas ao público.