Inos Corradin no Espaço Citi

15/jan

O Espaço Cultural Citi, Paulista, São Paulo, SP, inaugura exposição do pintor Inos Corradin. A curadoria é do crítico de arte Jacob Klintowitz que também assina a apresentação do artista. O artista exibe seu conhecido universo poético e geometrizado povoado de músicos, malabaristas, jogadores, paisagens que ganhou o sugestivo título “Inos Corradin. No percurso da arte, o artista na estrada”.

 

 

A palavra do curador

 

É espantoso como os fios que o pintor Inos Corradin urde criam personagens tão vivos, atuais e dotados do encantamento lírico que quinhentos anos de história agregaram ao nosso psiquismo. Os seus mágicos, equilibristas, músicos, cantores, mímicos, artistas itinerantes sem pouso e que percorrem estradas apenas pressentidas, são quase os mesmos que no século XV andavam pelo interior da Itália e que criaram a lendária Commedia d’ella Arte. Hoje estes artistas ambulantes e a sua arte impregnada de improviso são o emblema da cultura antiacadêmica e o antípoda do naturalismo. O mundo contemporâneo ama e anseia por esta ação artística filha do eterno presente.

 

O nosso espaço é limitado, mas como não recordarmos da “Família de saltimbancos”, de Pablo Picasso, feita em 1905? Ou do casal de artistas ambulantes, na sua carroça, no “Sétimo Selo”, de Ingmar Bergman, no seu confronto com a morte e a fugacidade da vida, onde o símbolo da continuidade é o jovem casal itinerante e o seu bebê? Neste contexto, talvez seja pecado não citar “La Strada”, de Federico Fellini, de 1954, centrado num artista circense e na mais doce e evanescente musa inventada pela arte, Gelsomina- Giulietta Masina. Ou o mito americano do horizonte libertário, núcleo do épico no cinema do faroeste e raiz da literatura on the road. Esses e centenas de outros artistas buscaram os fios no mesmo tear que alimentou Inos Corradin.

 

A produção de Inos Corradin, aos 85 anos, é esfuziante e certamente ele é um exemplar raro do artista que cria por prazer. O seu domínio do ofício é também raro, pois ele pinta à semelhança dos mestres. É curiosa uma época na qual temos que destacar como virtude o que parece a obrigação mínima de qualquer profissional. A iconografia do artista está centrada na figura humana travestida na sua função poética, o que explica a quantidade de trajes característicos, instrumentos musicais, cenas teatrais. A partir desta proposta essencial, o artista se detém nas vilas e casarios e nas paisagens e nelas, antes de tudo, temos o espaço aéreo, o céu, como personagem. De certa maneira, o conceito de elevação simbolizado pela ação artística, pelos artistas, pelos emblemas populares como as bandeiras, os pequenos núcleos de moradia, a paisagem dominada pelo céu, é o que determina a pintura e a escultura de Inos Corradin. Refinamento pela poética da ação artística e o espaço celeste marcante como ascenção.

 

É possível que Inos Corradin, como parte da melhor arte da nossa época, possa ser entendido como um momento anárquico de rejeição de padrões institucionais marmóreos e estáticos, mas é, antes de qualquer outra coisa, um gesto pessoal de fidelidade à arte como poética e a certeza de que a humanização do ser humano não pode prescindir da vivência estética.

 

 

De 20 de janeiro a 21 de março.

Tomie Ohtake no Rio

13/dez

O Centro Cultural Correios, Centro, Rio de Janeiro, RJ, exibe a exposição “Correspondências”, mostra organizada pelo Instituto Tomie Ohtake, que faz parte das comemorações do centenário da artista e conta com obras de sua produção desde 1956 até 2013, além de trabalhos de artistas contemporâneos. Com curadoria de Agnaldo Farias e Paulo Miyada, a homenagem em forma de mostra aproxima o trabalho de Tomie Ohtake de outros artistas através de interesses em comum, como o gesto, a cor e a textura, e o modo como cada um deles lida com essas características. A partir daí, revelam-se temas e sensações inesperados, tanto na obra de Tomie, como na de seus interlocutores. “Partindo do gesto, por exemplo, somos conduzidos pelas linhas curvas das esculturas de aço pintado de branco de Ohtake, que atravessam o espaço e lhe imprimem movimento, as quais se encontram com a linha inefável dos desenhos Waltercio Caldas e a linha espacial composta pelo acúmulo de notas de dinheiro de Jac Leirner”, ressaltam os curadores.

 

Agnaldo Farias e Paulo Miyada destacam também que a curvatura do gesto das mãos de Tomie anuncia-se nos indícios da circularidade presentes em suas primeiras telas abstratas produzidas na década de 1950 e culmina no círculo completo e na espiral, formas recorrentes nas últimas três décadas de sua produção. Esse percurso é apresentado em companhia de obras que extravasam o interesse construtivo da forma circular, como nas obras de Lia Chaia, Carla Chaim e Cadu. Uma vez que se forma o círculo, discute-se a cor, pele que corporifica toda a produção de Tomie Ohtake e que é fundamental aos artistas que são apresentados nesse grupo. “De contrastes improváveis a variáveis que demonstram a profundidade latente em um simples quadro monocromático, exemplos de pinturas dos anos 1970, figuram lado a lado com obras recentes de Tomie e com telas de especial sutileza na produção de artistas como Paulo Pasta e Dudi Maia Rosa”. Segundo eles, em Tomie, a cor é sempre realizada por meio da textura e da materialidade da imagem, que foi deixada a nu em suas “pinturas cegas” do final da década de 1950 e, desde então, nunca se recolheu, mesmo em telas feitas com delicadas camadas de tinta acrílica.

 

Complementa o pensamento dos curadores a tese de que há uma longa linha de experimentos que desfazem a ilusão da neutralidade do suporte da imagem pictórica, a qual se inicia muito antes das colagens cubistas e possui um momento decisivo nas iniciativas que ousaram liberar-se do verniz em parte de algumas pinturas realizadas no século XIX. “Essa linha de experimentos tem em Tomie uma pesquisadora aplicada, que pode reunir em torno de si figuras tão distintas como Flavio-Shiró, Arcangelo Ianelli, Oscar Niemeyer, Daniel Steegmann Mangrané e Carlos Fajardo”.  A exposição conta com 84 obras, sendo 28 de Tomie Ohtake e mais: Adriano Costa, Angela Detanico & Rafael Lain, Bartolomeu Gelpi, Carmela Gross, Cildo Meireles, Claudia Andujar, Cristiano Mascaro, Fabio Miguez, Israel Pedrosa, Karin Lambrecht,  Kimi Nii, Leda Catunda, Luiz Paulo Baravelli, Maria Laet, Nélson Félix, Nicolas Robbio, Paulo Pasta, Sergio Sister, Tiago Judas e Tony Camargo.

 

 

De 18 de dezembro até 09 de fevereiro de 2014.

Duas mostras de Antonio Henrique Amaral

11/dez

O artista plástico Antonio Henrique Amaral inaugura, aos 78 anos, duas exposições em São Paulo. A primeira acontece na Pinacoteca do Estado, Praça da Luz; e a segunda estará em cartaz na Caixa Cultural, Praça da Sé. Para o jornalista Silas Martí, a obra do artista saiu no início “…do verde ao amarelo e ocre, … frutas que dominaram cerca de 200 pinturas do artista nos anos 1960 e 1970, entraram para a história da arte brasileira como metáfora tropical dos descaminhos da ditadura que começou com o golpe de 1964”.

 

Suas bananas estrearam com um estrondo em 1968, no auge da arte pop e da nova figuração, que dissolviam a austeridade do concretismo e viraram uma espécie de síntese colorida da tropicália de Caetano Veloso e Gilberto Gil. No começo, elas eram verdes, saudáveis, exuberantes. Depois, amadureceram até apodrecer. Foram parar no prato, destroçadas por garfos e enforcadas por cordas até que não sobrasse mais nada Agora, quase três décadas depois do fim da ditadura, Amaral e suas bananas são relembradas nessas duas mostras em São Paulo – uma retrospectiva com 160 obras na Pinacoteca  e a exposição de 100 desenhos e gravuras na Caixa Cultural. A curadoria da mostra da Pinacoteca é de Maria Alice Milliet,  que  vê uma série de elementos nas polêmicas telas. “A banana é o fálico, a latinidade, o luxuriante, o tropicalismo”, afirma. “Elas serviam para tudo.” Também serviram para alçar o artista ao panteão de sua geração no circuito das artes visuais no país.

 

 

A palavra do artista

 

“Queria esculhambar com o governo militar, que estava reduzindo o Brasil a mais uma república das bananas, como eram as republiquetas centro-americanas”.

 

“Meu desafio era pintar e, ao mesmo tempo, refletir sobre a tortura e as prisões numa coisa explosiva, sarcástica, de deboche.”

 

Ele lembra que na ditadura os censores do regime notaram as pencas de ironia plasmadas nas telas. “Mas eles cairiam no ridículo fechando uma exposição de bananas”, afirma. “Esse foi meu jeito de fazer uma sátira sem ser massacrado por eles.”

 

Sou um incoerente confesso”, diz Amaral. “Sempre fui um lobo solitário no meio das tendências.”

 

Na Pinacoteca do Estado de São Paulo,

até 23 de fevereiro de 2014.

 

Na Caixa Cultural,

de 14 de dezembro até 16 de fevereiro de 2014.

 

Fonte: Silas Martí – Ilustrada/Folha de São Paulo.

Artistas internacionais na Fundação Iberê Camargo

06/dez

A Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, RS, exibe a exposição “ZERO”, uma compilação de obras originais e reconstituições de uma das mais importantes vanguardas do pós-guerra europeu. Iniciado em Dusseldorf no final da década de 50 pelos alemães Heinz Mack e Otto Piene – a quem posteriormente se juntou Günther Uecker –, o movimento “ZERO” promoveu uma ruptura com o expressionismo abstrato e o tachismo em voga, utilizando em suas obras vibração, luz e sombra, monocromia, movimento mecânico e deslocamentos rítmicos. A mostra busca estabelecer um diálogo entre o trabalho do grupo de Mack, Piene e Uecker e o de artistas de outras partes do mundo, cujas aproximações nem sempre se deram de forma consciente – a exemplo dos quadros Branco/Preto de Hércules Barsotti; de Bicho – Relógio de Sol, de Lygia Clark e de Progressão e Sequência Vertical S-30, de Abraham Palatnik. Almir Mavignier, único brasileiro que participou ativamente do movimento, ganha a reconstrução de seu painel de cartazes Forma. Por outro lado, a exposição traz nomes que influenciaram o pensamento de ZERO, como o de Yves Klein com sua pintura monocromática azul e dos Conceitos Espaciais de Lucio Fontana.

 

O trabalho com a luz de Heinz Mack aparece na réplica da estrutura de espelhos em movimento Interferências – Movimentos integrantes de um espaço virtual e na original Vibração da luz, bem como no óleo sobre tela Estrutura dinâmica branco sobre cinza. Já Otto Piene faz a luz dançar com as instalações Balé de Luz, Sonâmbulo e Cilindro de Luz e duas telas, o óleo Luz em agosto e a pintura de fumaça Pintura a fumaça sobre vermelho / 1 volume. Os pregos, matéria-prima de Uecker, aparecem em Pintura branca, que, junto com o Objeto de cabides 1 e a reconstrução de sua Chuva de luz de 66, dão prova do talento e inventividade do artista da Alemanha Oriental.

 

Destaca-se também Hans Haacke, com a reconstrução de Pequena vela, tecido suspenso sobre ventilador, e com sua Escala grande de água. As pinturas móveis de Jean Tinguely e as grandes esculturas de espelhos de Christian Megert estabelecem um paralelo com a ambientação Espaço Elástico de Gianni Colombo, composta por feixes de elásticos movimentados eletromecanicamente. Já Corpo de ar, conjunto de balão, suporte e máquina pneumática, e Linha – trechos de uma linha infinita traçada pelo artista – são uma pequena amostra do trabalho conceitual de Piero Manzoni.

 

Não apenas uma exposição histórica, ZERO é uma experiência fortemente sensorial, que mostra, no segundo e terceiro andares do espaço expositivo da Fundação Iberê Camargo, a atualidade do pensamento de grandes nomes das décadas de 1950 e 1960. Com curadoria da historiadora de arte Heike van den Valentyn, a exposição é uma realização da Fundação com o Museu Oscar Niemeyer de Curitiba e a Pinacoteca do Estado de São Paulo e conta com a parceria do Goethe-Institut e o apoio do Ministério NRW e Pro Helvetia.

 

 

Até 04 de março de 2014.

 

A arte sonora de Floriano Romano

03/dez

A Galeria Laura Alvim, Ipanema, Rio de Janeiro, RJ, exibe sob a curadoria de Glória Ferreira, “Sonar”, exposição individual do artista carioca Floriano Romano. São oito instalações sonoras, das quais seis inéditas, e 14 desenhos. Floriano Romano é um precursor em obras que combinam instalação, performance e som. Seu programa ‘Oinusitado’, na Rádio Madame Satã, entre 2002 e 2004, na Lapa, RJ, foi considerado excepcional em termos de artes visuais, música e poesia. Ele teve propostas sonoras transmitidas pela Rádio WKCR, Columbia, NY, 2004; Rádio Student, Liubliana, Eslovênia, 2006; Rádio Ressonance FM, Londres, 2008 e Rádio MEC/FM, RJ, entre 2005 e 2007.

 

A exposição “Sonar”, segundo Floriano Romano, é “toda baseada em ruído”. Cabe definir ruído para as artes, com um trecho do texto do folder da mostra, assinado pela curadora: “A palavra ruído, no senso comum, significa barulho, som ou poluição sonora não desejada. Adquire, porém, outros significados em diversas áreas. (…). Para Romano, além do aspecto político, por estar à margem e ser, assim, expressão desordenada, ‘o ruído é a expressão do mundo, é indeterminado, então ele toca direto nos sentidos, fala direto com os sentidos (…)’”.

 

Os trabalhos da exposição estão programados para não soarem ao mesmo tempo. O som de cada um cresce na medida que o do outro decresce. São eles: “O Estrangeiro” é um móvel com vinte gavetas, cada uma emitindo ruídos diferentes de cidades visitadas pelo artista;
“Radionovelas” se compõe de quatro a seis rádios antigos. De cada um sai uma curta história ficcional de autoria de Romano; “Acusmata” batiza uma instalação de parede com uma cavidade, da qual partem ruídos gravados no cruzamento de ruas do centro da cidade do Rio. Acusmata é quem não percebe a origem de um som; “Turbina” ficará na sala que dá para a praia de Ipanema. Tubos de PVC, perpendiculares à parede de 9m2, recobrem a superfície, onde se ouve o som do mar. Paisagem externa e som aqui se fundem; “O Passeio” intitula 29 caixas de papelão que repercutem ruídos de atritos do corpo humano gravados por dois bailarinos dirigidos pelo artista; “Kafka” tem três máquinas de escrever mecânicas, cujas teclas se movem sozinhas, acionadas por motores. O título se refere a uma cena do filme “O processo”, de Orson Wells, sobre o livro homônimo de Franz Kafka; “Polipoesia” são criações em texto veiculados em monitores de TV; Na área externa da galeria, está a instalação “Chuveiros Sonoros” com três duchas de piscina que “despejam” músicas cantadas no chuveiro por anônimos. A torneira regula o volume. Os desenhos abstratos são feitos com fita isolante sobre papel. As linhas dialogam entre o bi e o tridimensional. São realizados como performances, sem projeto anterior, e remetem à trajetória do movimento do encontro de pessoas.

 

 

Sobre o artista

 

Floriano Romano se intitula “artista visual e sonoro”. Seu programa de rádio “Oinusitado” foi ponto de encontro da cena de arte sonora carioca de 2002 a 2004. Ele trabalha com intervenções urbanas e sonoras, abertas à participação e produzidas pelo próprio público. A partir do imáginário da multidão, produz objetos ou ações sonoras voltadas para os passantes. Entre os prêmios e bolsas conquistados pelo artista estão: Prêmio Projéteis de Arte Contemporânea e o Prêmio Marcantonio Vilaça, da FUNARTE, 2012;  Prêmio Interações Estéticas da FUNARTE com o trabalho “Sapatos Sonoros”, 2009 e Prêmio Projéteis de Arte Contemporânea com a performance “S.W.O.L, Sample Way of Life”, 2008. Sua performance com a mochila sonora “Falante” foi premiada no Salão de Abril, Fortaleza, em 2007, e participou da coletiva “Futuro do Presente”, no Itaú Cultural, São Paulo, SP. Em 2000/1 ganhou a bolsa de Artista Residente pela Câmara Municipal do Porto, Portugal, e, em 2008, a Bolsa de Estímulo às Artes Visuais da FUNARTE, com o projeto de intervenção urbana “Lugares e Instantes”. Entre várias outras mostras, realizou, em 2011, o projeto “INTRASOM” no MAM-Rio e participou das coletivas Panorama da Arte Brasileira no MAM-SP e “Voces Diferenciales”, em Havana, Cuba. Em 2009 integrou a 7ª Bienal do Mercosul, com “Grito e Escuta”. Esteve na “Mostra Desenho das Ideias” com a ação sonora “Crude”, de Guilherme Vaz, usando a arquitetura do museu como instrumento para executar a composição, e na “Mostra Absurdo”, com seus “Chuveiros Sonoros”. Participou da coletiva “Desenhos&Diálogos” em 2010, na Anita Schwartz, RJ, através de quem participou também da ArtRio de 2011.

 

 

Até 09 de março de 2014.

Memórias do artista

A Galeria Lume, Itaim-Bibi, São Paulo, SP, realiza a exposição “Avessos”, individual do artista plástico Lúcio Carvalho, com curadoria de Paulo Kassab Jr. A mostra é composta por 16 obras inéditas, entre fotos, esculturas, backlights e pinturas, totalizando a uma representação de uma coleção de memórias do artista por meio de lembranças reconstruídas.

 

Com recordações pessoais remontadas em suportes distintos, Lúcio Carvalho elabora suas obras a partir de elementos representativos de uma determinada época de sua vida, tais quais o onipresente coração, o crânio, o esqueleto animal, o pneu, entre outros. Cada um deles tem um significado único para o artista – como o pneu, que era um de seus “brinquedos” favoritos. Os trabalhos que compõem “Avessos” se apresentam como uma fusão de elementos da memória do artista. A série inédita possui uma intensa carga de memória afetiva e relata suas vivências.

 

Quando criança, Lúcio Carvalho conviveu com seus pais, avós, irmãos e primos em uma fazenda chamada “Não Sei”. O artista reparava e desenhava tudo ao seu redor, sempre em clima de diversão e amor, dentro de uma família muito extensa.  Entretanto, Lúcio Carvalho sentia-se deslocado nesse meio. Enquanto as demais crianças brincavam no campo e andavam a cavalo, o artista escondia-se embaixo da mesa ou em outros lugares, reparando o dia a dia na fazenda: “A mesma árvore onde brincávamos balançando em pneus, eram pendurados os alimentos. (…) Porém, ponderando sobre isso, eu percebi que meu trabalho é muito mais sobre os sentimentos nos quais se envolvem as minhas lembranças, do que simplesmente objetos pendurados. O “Avesso” é minha vontade de ver o contrário do que tudo aquilo representa como figura”, confessa o artista.

 

Nas palavras de Paulo Kassab Jr., diretor cultural da Lume e curador da exposição: “A nostalgia está sempre muito presente nos trabalhos de Lúcio Carvalho. Nessa série, observamos que todas as obras são acúmulos de memórias. Histórias contadas em uma única escultura, pintura ou fotografia. As cristaleiras de sua avó, usadas para guardar objetos e presentes importantes, misturam-se com os pneus que eram um dos seus brinquedos favoritos, envoltos em uma nevoa criada pela queima da cana de açúcar.”

 

 

 Até 21 de dezembro.

As pedras de Dan Fialdini

Autor de uma sofisticada linguagem escultórica, o artista plástico Dan Fialdini inaugurou na Ricardo Camargo Galeria, Jardim Paulistano, São Paulo, SP,  uma rara exposição – “Silêncio feito de pedra” –  com 18 esculturas em mármore, realizadas entre 2002 e 2012. Dan Fialdini passou uma década de trabalho com a pedra, dando-lhe forma, volume, relevo e expressão. O resultado é, segundo a palavra de Ricardo Camargo e Roberto Comodo “…uma obra que conjuga metafísica, o lúdico e o construtivismo”.

 

 

 
A palavra de Ricardo Camargo e Roberto Comodo

 

Essa diversidade única pode ser vista na mostra em peças como o elegante Casamento, feito com dois blocos de travertino. E que se contrapões a Ra, homenagem ao deus Sol egípcio que usa arenito do Paraná e folha de ouro. E ainda com as majestosas peças Know-a-bit, em mármore de Carrara; e Era assim, em travertino persa. Uma característica no vocabulário do escultor – a de manter a forma original da pedra em um dos lados da peça – é realçada em Lembranças do etnólogo.

 

Dan Fialdini foi assessor de Pietro Maria Bardi, o mítico diretor do Museu de Arte de São Paulo (Masp) por duas décadas, de 1970 ao início dos anos 90, onde também foi curador de exposições e montagens. Em seguida, passou a se dedicar primordialmente à escultura, um nobre ofício em que comemora 30 anos de atividade. A princípio, ele talhava o mármore com a técnica tradicional até ir à Carrara, na Itália, onde se aperfeiçoou e aprendeu novas maneiras de esculpir a pedra.

 

O artista prefere trabalhar em blocos maciços de mármore com tons claros, que ressaltam as sombras, dando maior dramaticidade às peças. O escultor lembra que o processo de esculpir é lento. Sem assistentes, é ele próprio que esculpe a pedra bruta. Uma atividade solitária e artesanal que contrasta com o marketing desenfreado de artistas que, com verdadeiras equipes, produzem obras em série.

 

Com várias esculturas que lembram cenários mediterrâneos, paisagens imaginárias e cidades mitológicas, esculpidas na dureza do mármore com sutileza poética, a obra de Dan Fialdini vista em conjunto transmite uma aura zen, que remete a um eloquente e sereno silêncio.

 

Ricardo Camargo
Roberto Comodo

 

 

Até 14 de dezembro.

Lançamento de Sabina de Libman

02/dez

A galeria Arte Aplicada, Jardins, São Paulo, SP, abriu a mostra “Pés & Livros”, do artista plástico Juliano Lopes, com curadoria de Sabina de Libman. Composta por uma série inédita de 18 obras, entre desenhos e pinturas sobre tela e livros antigos, os trabalhos mostram que “os pés” e “os livros” levam a todos os lugares (física e imaginariamente).

 

Nesta nova série, Juliano Lopes remete o espectador a momentos do cotidiano e da atual, em síntese: à contemporaneidade. Com um toque de metalinguagem, Juliano Lopes utiliza livros antigos (alguns com mais de cem anos) como suporte para determinadas pinturas. Tais livros foram cuidadosamente pesquisados em busca da perfeita harmonia com os desenhos; todos os textos são de sua escolha pessoal, com conteúdos que se relacionam com a proposta e o conceito da exposição. Na representação das figuras, a base técnica é o desenho em charcoal e grafite, com um cuidado anatômico realista, denso em certas partes e diluído em outras. Quanto às cores, seu critério foi o uso de variações das cores primárias e cores terrosas em tons baixos. Nas manchas de tinta acrílica somam-se linhas e riscos na construção de uma identidade transitória, mutável e quase sem delimitações, gerando movimento e espontaneidade aos trabalhos apresentados.

 

Registre-se que “Pés & Livros” é a primeira exposição de Juliano Lopes em São Paulo, uma descoberta para o público paulistano que admira a arte tanto de nomes consagrados como de novos talentos.

 

 

A palavra da curadora

 

“Criativo, domina com segurança o desenho e a pintura. Fiel ao princípio de que a obra de arte deve ser mágica, se apropria de velhos livros que usa como suporte para seus desenhos. Magia Pura. A Galeria Arte Aplicada tem o prazer de trazer a São Paulo esse promissor artista.”, afirma a conhecida marchande Sabina de Libman.

 

Até 14 de dezembro.

SEIS MOSTRAS NO PAÇO IMPERIAL

29/nov

O Paço Imperial, Centro, Rio de Janeiro, RJ, espaço dirigido por Lauro Cavalcanti, volta a ter inaugurações múltiplas. As seis mostras individuais apresentam escultura, pintura, desenho, fotografia e material documental de artistas novos e históricos. É para todos os gostos e o Paço tem entrada franca reunindo artistas novos e históricos em seus três andares de espaço expositivo:

 

 

MARIANA MANHÃES | “EVENTO”

 

Em “Evento”, Mariana Manhães, mostra “máquinas orgânicas” e desenhos de sua produção mais recente, todos inéditos no Rio de Janeiro. A artista concebe esculturas de chão e de parede que interagem consigo mesmas, criando um sistema de convivência na área de exposição.
Unidas pelos materiais – plástico, pvc, câmera de vídeo e sensores, cada máquina é comandada unicamente por vídeos de animação de louças da casa-ateliê de Mariana. A projeção se move, atinge os sensores que vão inflar e desinflar os volumes de plástico das obras. O trabalho capta seus próprios estímulos luminosos para colocar as peças em movimento. Os desenhos, expressão pouco conhecida da produção de artista, surgem dos esboços de obras escultóricas. O conjunto desta mostra são ensaios visuais do comportamento dos sacos de plásticos usados nas esculturas. Eles resultam da sobreposição de folhas de papel vegetal, cuja translucidez dá a noção de movimento dos volumes.

 

 

WILMA MARTINS: RETROSPECTIVA. COTIDIANO E SONHO

 

A artista mineira Wilma Martins, radicada no Rio, apresenta uma retrospectiva com 140 ítens – pinturas, gravuras, desenhos, aquarelas, livros e documentos, celebrando 80 anos de idade e 60 de carreira, sob  curadoria do crítico Frederico Morais. A mostra segue para o Museu de Arte da Pampulha, BH, e para o Instituto Tomie Ohtake, SP, em 2014.  “Wilma Martins: Retrospectiva. Cotidiano e Sonho”, o primeiro panorama completo de sua produção, de 1955 a 2008, está montada em núcleos de cada uma das linguagens que a artista trabalhou e como elas se relacionam. Por exemplo, um mesmo tema tratado na pintura e no desenho. As ilustrações que Wilma realizou para jornais e livros infantis serão apresentadas em vitrines. O segmento documental reúne catálogos, fotografias e recortes de jornal.

 

“Cotidiano”, sua série mais famosa, de desenhos, pinturas e litografias, tem cenários domésticos que abrem espaço para animais, de elefantes a formigas. Sobre a presença de bicho na cena caseira, Wilma avalia que ele seria “um prisioneiro, um visitante ou anjo exterminador que irá transformar aquele espaço e a rotina do cotidiano.” Há telas em que cristais atravessam paisagens em narrativas fantásticas; em outras, figuras geométricas são formadas por corpos humanos. “A necessidade de compatibilizar o cotidiano e o sonho é que parece guiar a mão de Wilma Martins quando ela desenha ou pinta”, escreveu Ferreira Gullar sobre a artista.

 

Wilma Martins [BH, 1934] foi aluna de Guignard, Misabel Pedrosa e Anna Letycia ainda na capital mineira. Ela participou das Bienais Internacionais de São Paulo, Liubliana, Biella/Itália, Santiago do Chile, Porto Rico, Veneza, Cali/Colômbia, da Trienal de Carpi/Itália e da Xylon V, Genebra e Berlim, e de diversas mostras de arte brasileira na América Latina, EUA e Europa. Ela ganhou o Prêmio Itamaraty, na Bienal Internacional de São Paulo de 1967, Prêmio de Viagem ao Exterior do Salão Nacional de Arte Moderna de 1975 e o Prêmio Principal do Panorama de Arte Atual Brasileira em 1976, no Museu de Arte Moderna de São Paulo.

 

 

VICENTE DE MELLO | BRASÍLIA UTOPIA LÍRICA

 

“Brasília Utopia Lírica” é uma série fotográfica inédita de Vicente de Mello, na qual o artista propõe “uma leitura subjetiva e atemporal da cidade de Brasília”, como define ele. Em 23 imagens em preto e branco, realizadas em 2011, Vicente exemplifica sua concepção de arquitetura e urbanismo de uma cidade continuamente fotografada e seu consequente desgaste de imagem. Este foi o ponto de partida para o fotógrafo evitar caminhos já percorridos e se despir de vícios do olhar. As fotos desta exposição são as “de uma cidade atualizada, em sua fotogenia clássica, onde pontuo uma reorganização da narrativa histórica iconográfica”, revela Vicente.

 

Há imagens de lugares conhecidos e de pontos pouco comentados, entre os quals o artista cita a torre de TV, desenhada por Lucio Costa, a escultura “Rito do Ritmo” de Maria Martins, nos jardins do Alvorada, formas desconhecidas de edifícios de Oscar Niemeyer, os painéis de Athos Bulcão e nova Ponte JK, do arquiteto Alexandre Chan. Mas o título de cada fotografia denuncia um traço identificador. Vicente de Mello vive e trabalha no Rio de Janeiro. Ele tem obras na Coleção Gilberto Chateaubriand | MAM Rio, Coleção da Maison Européenne de la Photographie, Paris, Coleção Lhoist, Bruxelas, Bélgica, Coleção Joaquim Paiva, RJ, Coleção José Roberto de Figueiredo Ferraz, Ribeirão Preto, MASP-Coleção Pirelli, entre outras. Já expôs em instituições importantes como CCBB RJ,  Pinacoteca do Estado de São Paulo, MAM SP, MAM Rio, Fundação DAROS, Suíça, Fondation Cartier pour l´art contemporain, Paris,  MAMAM, Recife; MAC SP e MAM Brasília.

 

 

ROGERIO LUZ | DESENHOS (1991-2013)

 

O artista plástico, ensaísta  e poeta Rogerio Luz mostra 67 desenhos de 1991 a 2013, expressão pela qual foi premiado quatro vezes em salões, entre 1973 e 1980. Seus trabalhos sobre papel são exemplos de um sistema manual do princípio de repetição. Ao não reproduzir de modo técnico um original, a forma das séries resulta em variações deste original e leva o espectador “à leitura de sequências ou passagens – como no cinema ou na música – sem destino resolutivo”, avalia Luz. A seleção do artista segue linhas de continuidade na maneira de conceber e realizar os desenhos, acentuando traços permanentes e, ao mesmo tempo, diferenças de interpretação e realização.

 

Rogerio Luz é formado Filosofia pela UFRJ, mestre em Comunicação pela Universidade Católica de Louvain [UCL], Bélgica. De volta ao Brasil, foi lecionar na UFPb. No início dos anos 1970, frequentou cursos de artes plásticas no MAM Rio. Voltou a morar na Europa, de 1983 a 1987. Em Paris, obteve o título de doutor pela UCL. Foi professor da ECO|UFRJ até 1998 e professor visitante da Comunicação e de Artes Visuais da UERJ até 2008. Luz tem quatro livros de poemas publicados: Diverso entre Contrários (Rio, Editora Contra Capa, 2004), Correio Sentimental (São Paulo, Giz Editoral, 2006) Escritas (Goiânia, Editora da Universidade Federal de Goiás, 2011) e As Palavras (São Paulo, Scortecci Editora, 2013).

 

 

“SERGIO CAMARGO, CONSTRUTOR DE IDEIAS”

 

E

 

“WILLYS DE CASTRO, DEFORMAÇÕES DINÂMICAS”

 

 

Completam a programação deste bloco do Paço Imperial mais duas individuais de artistas históricos já falecidos: “Sergio Camargo, construtor de ideias” e “Willys de Castro, deformações dinâmicas”. As curadoras Piedade Grinberg, da mostra do escultor Sergio Camargo, e Marilucia Bottallo, da do pintor, escultor e artista gráfico Willys de Castro apostam que a revelação de ítens do acervo e do arquivo documental destes artistas pode criar novas percepções à obra deles como um todo.

 

Para “Sergio Camargo, construtor de ideias”, Piedade Grinberg selecionou 100 ítens entre documentos, fotos, desenhos, estudos, rabiscos, frases, obras em pequenos formatos, divididos em seis núcleos: ateliês, esquemas, esquemas vermelhos, madeira, relevo azul e xadrez.

 

Em “Willys de Castro, deformações dinâmicas”, a curadora Marilucia Bottallo reuniu esquemas, esboços, fotografias, notas, partituras musicais, artigos de jornais e revistas, manuscritos, datiloscritos e correções, que ressaltam sua preocupação com a composição de séries, que acentuam o raciocínio moderno impresso em todas as suas experiências e pesquisas como artista: poemas, música, artes plásticas e gráficas.

 

A possibilidade de ter acesso ao arquivo documental e pessoal de um artista, cria circunstâncias inusitadas em relação à percepção de sua produção.  As descobertas dos segredos sutilmente guardados, os escritos, os arcabouços, esboços, pequenos detalhes que decorreriam dos croquis, rascunhos, projetos, são, muitas vezes, a essência do método, os pensamentos iniciais, que exigem uma parcela de indiscrição, de invasão da privacidade, de indiscutível constatação da dimensão da intimidade. Todos os ítens das duas exposições são do acervo em comodato do Instituto de Arte Contemporânea [IAC], de São Paulo.

 

Até 16 de fevereiro de 2014.

Ana Durães na Sergio Gonçalves Galeria

Aproximar o passado do presente é a proposta da artista plástica Ana Durães, que apresenta obras recentes na sua mais nova exposição “Novos Pretos Novos”, cartaz da Sergio Gonçalves Galeria, Centro, Rio de Janeiro, RJ. A artista mergulha na obra de Rugendas, trazendo uma abordagem contemporânea através de pinturas, stencils e grafittis. A ideia para o novo tema surgiu quando, pensando em trabalhar o universo do Rio Antigo, resolveu mergulhar no mundo de Johann Moritz Rugendas, alemão viajante do século XIX, que chegou como espião no Brasil e criou, dentre inúmeras obras, um precioso acervo sobre a vida dos escravos.

 

Pesquisando sobre o tema, Ana descobriu que o Brasil teve o maior mercado de africanos escravizados da história da humanidade. E no Rio de Janeiro, quando desembarcavam, eram levados para depósitos na Rua Direita (atualmente Rua Primeiro de Março) onde eram colocados à venda nas calçadas. Após 1769 o desembarque foi transferido para o Cais do Valongo (hoje Gamboa) e o local se transformou num comércio de escravos à céu aberto. Por não terem nenhuma habilidade para os serviços da lavoura ou domésticos, eles eram chamados de “Pretos Novos”. Daí surgiu o nome da exposição, que faz uma releitura desses escravos através das obras de Rugendas e de amigos da artista que foram retratados em suas telas, como o cantor Chico César.

 

Ana Durães utiliza a arcaica técnica do estêncil sobre superfícies preparadas com camadas de tinta que, em alguns casos, sofreram intervenções como oxidação, ou apropriação de matérias decalcadas. É um processo que demanda tempo entre uma etapa e outra, para que a artista crie a sua própria “arqueologia”. “Novos pretos novos” traz, ainda, grandes retratos e outros menores que são exibidos com pequenas paisagens, aves e até inusitados helicópteros, compondo um cenário com elementos que evocam alegria. Sentimento que Ana busca, de alguma maneira, devolver aos personagens criados. A curadoria é de Marco Antonio Teobaldo.

 

 

De 30 de novembro a 18 de janeiro de 2014.