Dois na Casa França-Brasil

22/ago

Cromática

A exposição individual de Waltercio Caldas, denominada “Cromática”, é atual cartaz da Casa França-Brasil, Centro, Rio de Janeiro, RJ. Esta é a primeira grande exposição do artista no Rio após a mostra retrospectiva realizada no MAM em 2010. O evento acontece em um ano bastante produtivo e premiado para Waltercio, que acaba de lançar dois novos livros. Além disso, conquistou o prêmio da Bienal de Cuenca e prepara outra importante exposição para a Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre.

 

Diz a lenda que, na estreia de seus filmes, o diretor Alfred Hitchcock costumava pregar, na porta dos cinemas, um cartaz que dizia: “Não contem o final para seus amigos”.  Nessa mesma linha, a surpresa é um dos ingredientes essenciais dessa nova exposição de Waltercio Caldas, evento que procura estimular algumas reflexões: O que acontece quando nos vemos diante de uma obra de arte?  Como estender um momento fugidio até o limite possível? Dá para explicitar coisas que não são explícitas?

 

Para o artista, nada é mais importante do que o momento em que o objeto de arte se apresenta para a pessoa: “- Esse instante, tem características “inaugurais” – acentua. – Quando o objeto de arte aparece pela primeira vez, se apresenta somente na integridade da sua própria percepção. É “o momento do objeto”, aquele instante inicial de surpresa e aparecimento – que pretendo que dure  o maior tempo possível”.  – destaca.

 

 

Metáfora do valor

 

Em todas as suas grandes exposições, a Casa França-Brasil convida um outro artista para ocupar o espaço do Cofre. Desta vez a escolhida é Analu Cunha, artista alagoana radicada no Rio de Janeiro cuja obra é centrada nas questões da imagem e das qualidades ambíguas e contraditórias que lhes atribui.

 

A instalação “Pickpocket” – que usará como suporte uma TV LED de 24 polegadas, discretamente embutida na parede do cofre – pretende realçar o caráter soturno (e mesmo secreto) desse lugar, normalmente fechado “a sete chaves”. A porta entreaberta convida o espectador a acompanhar o surgimento de uma imagem misteriosa, que se transforma e se modifica gradualmente até o fim abrupto do filme.

 

Valendo-se da metáfora do “valor” econômico, a artista propõe ao visitante uma reflexão sobre as ambiguidades de nossa própria vida privada, sobre o que decidimos mostrar ou esconder, exibir a esmo ou trancar num cofre.

 

 

Até  21 de outubro.

A poética das ruas

Devotionalia 1

Os premiados artistas contemporâneos Dias & Riedweg inspiraram-se em João do Rio e levaram ao Centro de Artes Hélio Oiticica os caminhos videopoéticos do Rio em que vivem. “Até que a rua nos separe”, é a exposição que reúne alguns dos mais expressivos trabalhos da dupla no Centro de Artes Hélio Oiticica, Centro, Rio de Janeiro, RJ. A exibição foi qualificada pelos autores como uma ode a João do Rio, considerado o maior cronista das doçuras e mazelas cariocas entre o final do século 19 e o início do século 20.

 

Assim como João do Rio, o autor de “A alma encantadora das ruas”, os dois artistas se identificam com os movimentos, sentidos e sensações que a cidade inspira. Como cronistas ampliados pela tecnologia de seu tempo, Dias e Riedweg compõem retratos fiéis das várias realidades cariocas com som, imagem e movimento. A exposição compõem-se de nove instalações em vídeo e outras obras que envolvem fotografia, desenhos e música, sem abrir mão do movimento e do pulso da vida na cidade.

 

 

Sobre os artistas

 

Maurício Dias nasceu no Rio de Janeiro, 1964, e Walter Riedweg em Lucerna, Suíça, 1955. Trabalham juntos desde 1993 e participaram de algumas das mais importantes exposições de arte contemporânea internacionais, como a 12ª Documenta de Kassel 2007, Bienal de Veneza, 1999, e outras bienais, como as de São Paulo, Havana, Mercosul, Liverpool, Xangai, Gwanjú e Tenerife.

 

Com individuais de grande formato realizadas no CCBB do Rio de Janeiro, no MACBA de Barcelona, no Kiasma em Helsinki, no Le Plateau de Paris, no MUAC da Cidade do México e no Americas Society de Nova Iorque, a dupla se consolidou no cenário de arte contemporânea internacional por seu trabalho pioneiro, que mistura projetos participativos de arte pública e videoinstalação.

 

Dias & Riedweg tornaram-se conhecidos do público carioca a partir da primeira exibição de “Devotionalia”, no Museu de Arte Moderna. O trabalho, que teve grande ressonância crítica e popular, é hoje parte do acervo do Museu Nacional de Belas-Artes. Convidados pelo curador Paulo Herkenhoff para a 24ª Bienal de São Paulo em 1998, tiveram participação marcante com a videoinstalação “Os Raimundos, Severinos e Franciscos”. Logo a seguir fizeram outra videoinstalação, “Belo é também tudo aquilo que não foi visto”, com um grupo de pessoas cegas do Instituto Benjamim Constant (exibida na 25ª Bienal de São Paulo) e “Mera Vista Point”, um projeto de arte no mercado informal paulistano, criado para o Arte Cidade 4, em São Paulo.

 

Os artistas consolidaram sua trajetória em 2002, com a grande individual “O Outro começa onde nossos sentidos encontram o mundo”, curada por Catherine David (Documenta X), no CCBB do Rio de Janeiro.

 

 

Até 30 de setembro.

Segall na Pinakotheke

20/ago

A Pinakotheke Cultural, Botafogo, Rio de Janeiro, RJ, apresenta a exposição “Lasar Segall – Obras sobre papel: pinturas, desenhos e gravuras”, com 71 trabalhos, obras pertencentes a família do artista. Grande parte dessas obras é inédita ao público, em seleção feita pelo curador Max Perlingeiro. A exposição abrange obras produzidas entre 1910 e 1956, na maior diversidade de técnicas e processos, e na maior variação temática já apresentada em uma única exposição sobre Lasar Segall. São 17 pinturas, 23 desenhos e 31 gravuras, reunidos em temas como retratos e autorretratos, flores e naturezas-mortas, figuras e grupos de figuras, judaísmo, brasileiros e europeus, negros e brancos, guerra, paisagens, animais, e séries importantes como “Emigrantes” e “Mangue”.

 

Max Perlingeiro desenhou a exposição de modo a que público possa apreciar a mestria de Segall como pintor, desenhista e gravador. Uma temática recorrente na obra de Lasar Segal, o judaísmo está destacada na gravura “Vigília fúnebre”, de 1928, uma das obras que o artista fez após a morte de seu pai, Abel Segall, em 1927. Esta mesma imagem, Segall reproduz em pintura a óleo sobre tela, obra exibida nesta exposição.

 

A exposição na Pinakotheke resgata ainda várias obras apresentadas na marcante exposição de 1943, no Museu Nacional de Belas Artes – como as séries “Mangue” e “Emigrantes” – que causou enorme impacto e dividiu a opinião pública.

 

Na abertura da exposição será lançado um livro com 176 páginas, português/inglês, apresentado por Max Perlingeiro, e ensaio inédito no Brasil escrito por Jorge Schwartz, diretor do Museu Lasar Segall e outros assinados pelo chanceler Celso Lafer; Rodrigo Naves  e Vera d’Horta.

 

 

O artista

 

Nascido em 1891 em Vilna, capital da Lituânia, cedo Segall aprende desenho, e viaja para estudar e expor em Berlim, depois Dresden e Amsterdã. Em 1912 e 1913 mora em São Paulo, onde estão seus irmãos. Nesse período, já tem obras suas adquiridas por coleções  brasileiras. De volta a Berlim, fica até 1923, quando se muda definitivamente para o Brasil, país que adota até sua morte, em 1957.

 

 

A palavra do curador

 

Quando propus à família do artista a realização desta exposição já tinha consciência da dificuldade na seleção das obras, pois como colecionador de papel − um suporte dito “frágil” −, sei bem do extraordinário fascínio sobre os colecionadores.

 

As primeiras obras de grandes coleções, geralmente, são pequenos papéis. E assim, foram meses de pesquisa até chegar a um ponto onde nada mais poderia ser incluído e, muito menos, retirado. Tornou-se semelhante ao sentimento de um artista. Um trabalho solitário. A partir daí a tarefa foi criar uma narrativa para as setenta e uma obras selecionadas, a grande maioria inédita, produzidas entre 1910 e 1956, na maior diversidade de técnicas e processos, na maior variação temática já apresentada em uma única exposição: retratos e autorretratos, flores e naturezas-mortas, figuras e grupos de figuras, judaísmo, brasileiros e europeus, negros e brancos, vivos e mortos, a guerra, paisagens, animais, e séries importantes como Emigrantes (1926-1930) e Mangue (1926-1929).

 

Quando Segall chega ao Rio de Janeiro, em 1923, conhece o Mangue, célebre zona de prostituição no centro da cidade. Daí resulta uma série de pinturas e gravuras executadas em metal e madeira a partir de 1928, na França. São cenas sensuais e misteriosas. Mulheres, vistas através de cortinas e persianas, estabelecendo um clima de mistério entre seus personagens.

 

O judaísmo, temática recorrente na obra de Segall, está presente nesta exposição, na gravura Vigília fúnebre. Sobre esta obra, comenta Cláudia Valladão de Mattos* que após imigração definitiva para o Brasil, Segall afasta-se novamente do ambiente judaico que fora um importante estímulo para sua obra durante o período entre 1918 e 1923. Ao chegar, ele foi recebido e valorizado pelo ambiente artístico local como um membro importante do movimento expressionista alemão, sem que sua vinculação com a cultura judaica fosse posta em evidência. Segall retornaria, no entanto, à representação direta de temas judaicos em 1927, por ocasião da morte de seu pai, Abel Segall. A gravura Vigília fúnebre de 1928 entre outros, fazem parte desse conjunto. Diferentemente das obras de temática judaica do período alemão, que, como vimos, aspiravam à expressão de uma experiência universal por meio da especificidade judaica, essas obras parecem sublinhar o caráter pessoal e particular do evento retratado. Não por acaso são, em sua maioria, obras em papel, um meio mais intimista do que a pintura. Elas não falam de uma “dor universal”, ou da condição humana em geral, mas da dor da família Segall diante da perda de um ente querido. Assim também, as pessoas retratadas são reconhecíveis e seu sofrimento descrito com precisão. Tal registro pessoal e singular parece justificar o largo uso que Segall faz de símbolos e referências religiosas. Na parte superior desta gravura lê-se a inscrição: “Pai Segall”, em hebraico, invertida.

 

Para concluir, uma pequena historinha: em 1980 tive a ousadia de pedir ao filólogo Antonio Houaiss (1915-1999) para apresentar uma singela exposição de desenhos de artistas brasileiros, com a certeza de ouvir uma recusa elegante como era o hábito do meu saudoso amigo, entretanto, fui presenteado com um belo texto, que com o maior prazer compartilho, e que hoje parece ter sido escrito especialmente para esta exposição: (…) “Eis que essa folha branca tem sido o suporte de tudo o que o Homo Symbolicus pôde fantasiar e criar nesses milênios, multiplicando vertiginosamente a reserva do saber: e não fantasiou e criou pouco. Para essa folha branca, transpôs a arte parietal, fazendo-a traçado, desígnio, embutido, pincelado, riscado, grifado, gravado, grafado, multiplicado dürerianamente; para essa folha, transpôs a cromática aquarelada, aguada, sanguinizada, entremesclada; nela, folha branca, se cristalizaram sonhos os mais díspares, desde os gestuais dos mimos mímicos, até os puramente verbais, nas suas faces fônicas e psíquicas, com seus ensinamentos de amar − plantar, colher, fazer, ser, produzir, irrigar, drenar, construir, gozar, fruir, ouvir, dançar, musicar, sorrir, suspirar, respirar, dormir, sonhar, despertar −, até seus ensinamentos de desamar − conquistar, dominar, ter, destruir, militar, reter, deter, conter, torturar, matar: − eis aí o papel, esse documento (o que ensina) humano mais completo de belezas e tristezas. (…) Não fujamos à benção do papel: eis que − entre nós − a arte do papel, o papel de arte e a arte no papel ou sobre o papel são − ainda! − arte… menor”.

 

Max Perlingeiro

(*) In Lasar Segall e as vanguardas judaicas na Europa e no Brasil.

 

Até 20 de outubro.

A PESQUISA DE GAIS

12/ago

A galeria Huma Art Projects, Humaitá, Rio de Janeiro, RJ, inaugura a exposição “Gais – As poucas modificações feitas não desfiguraram o diretório: fotomontagem originalcopia” com 20 trabalhos trabalhos inéditos do artista nascido no Rio em 1980, e oriundo do grafite. Serão apresentadas dez fotomontagens originais com moldura de madeira e dez cópias ampliadas com moldura branca, de tamanhos variados. Esta nova pesquisa surgiu quando o artista comprou revistas da década de 1950 e 1960, em uma banca de jornal perto de casa, e começou a fazer colagens, utilizando também spray e acrílica. A frase “As poucas modificações feitas não desfiguraram o diretório” estava em uma reportagem, que trazia ainda uma imagem de uma mulher parada em uma esquina, que nomeou outro trabalho também presente na exposição.

 

Criado na Maré, conjunto de favelas no Rio, Gais, assinatura de Douglas Santos Tavares, ainda muito jovem começou a grafitar os muros da cidade e a participar de festivais e exposições do gênero. Seu trabalho chegou às ruas de Amsterdan e Roterdan e, no ano passado, teve uma tela de 100cm x 140cm leiloada por dez mil libras esterlinas na prestigiosa Phillips de Pury em Londres. Em março deste ano ele integrou a exposição “Gramática Urbana” no Centro Municipal de Arte Hélio Oiticica. A curadoria é de Vanda Klabin. As obras de Gais estão em várias coleções particulares, como o fundo de arte Brazil Golden Art dirigido por Heitor Reis.

 

De 14 de agosto a 29 de setembro.

ANTONY GORMLEY NO RIO

07/ago

Critical Mass II

O CCBB, Centro, Rio de Janeiro, RJ, exibe “Corpos Presentes – Still Being”, esculturas, vídeos, maquetes e fotografias de Antony Gormley, um dos mais fascinantes nomes da cena contemporânea internacional. “Corpos Presentes – Still Being”, com curadoria de Marcello Dantas, é a primeira exposição individual do artista no Brasil (apresentada anteriormente em São Paulo). O artista é um dos mais célebres e conceituados escultores em atividade. Seus trabalhos exploram a relação do corpo humano com os espaços que ele habita, criando desde esculturas intimistas até megainstalações em escala monumental. Em concreto, aço inoxidável, alumínio, borracha, arame, terracota, ou até pão e cera, os supercorpos construídos por Antony Gormley são maneiras diversas de pensar as relações do homem com a Arquitetura.

 

Homens deitados, pendurados de cabeça para baixo, de pé. Nessas e em outras posições, as obras de Gormley, provocam a passividade do espectador e dificilmente se tornam indiferença. O escultor apresenta um panorama da carreira através da exibição de onze trabalhos que, juntos, somam quase uma centena de esculturas. Na presente seleção, 31 figuras humanas moldadas em ferro fundido e fibra de vidro compõem a única atração da retrospectiva a ser instalada ao ar livre. No Rio, as imagens serão dispostas no entorno do CCBB.

 

Dentro do prédio ficarão representantes de várias fases da trajetória de Gormley. A mais antiga, de 1981, é “Floor”, uma forma plana, de borracha, com a silhueta dos pés do próprio artista e contornos que parecem se expandir, como se ele estivesse pisando em um espelho-d’água. Outro destaque no acervo é “Loss”, figura humana de 1,73 metro formada por blocos de aço inoxidável. Na rotunda do prédio estará uma de suas mais famosas criações: “Critical Mass II”, constituída por sessenta corpos de ferro fundido, com 630 quilos cada um, em doze posições diferentes. Alguns ficam suspensos por cordas. Há ainda uma inédita, “Sum”, composta de cristais, colocada no chão. Cinquenta maquetes, nove gravuras, 25 fotos e seis vídeos completam o conjunto em exibição.

 

De 07 de agosto a 23 de setembro.

DOIS NA GALERIA LAURA MARSIAJ

“Delay”, da artista Waleria Américo apresenta um conjunto de trabalhos inéditos, todos resultados de sua última pesquisa. A exposição na Galeria Laura Marsiaj, Ipanema, Rio de Janeiro, RJ, é composta por vídeos, fotografias, desenhos e indica a temporalidade particular que se articula entre lugar, corpo e deslocamento. Revela uma série de imagens que servem como relatos e notas, que se ativam por um corpo/memória, em fragmentos de vários lugares, tempos e ritualidades.

 

Dessa investigação entre “corpo subjetivo” e “corpo geográfico” surgem questões no qual o corpo é agente determinante, tanto mecanicamente pelo deslocamento entre diferentes geografias e paisagens, quanto, nas construções subjetivas na qual a instância relacional é ativada, “Delay”, reverbera o desejo pelo outro lugar, pelo desconhecido. Os trabalhos compõem uma cartografia, que se conjuga por proximidade e distanciamento, busca e desejo, limite e risco e anuncia o posicionamento do corpo dentro desse rizoma. A curadoria é de Bitu Cassundé.

 

No Anexo da galeria, Carlos Mélo apresenta “Sobre humano”, uma instalação na qual dezenas de ossos de boi colados e sobrepostos formam uma escada-escultura, cuja funcionalidade se encerra na fragilidade. A montagem denuncia a precária condição de um corpo estranho sem pele encostado em uma parede.

 

A exposição divulga uma citação de Félix Guatari: “Quanto mais se sobe numa hierarquia, mesmo pseudorrevolucionária, menos possível se torna a expressão do desejo (em compensação, ela aparece nas organizações de base, por mais deformada que seja) a esse fascismo do poder, nós contrapomos as linhas de fugas ativas e positivas, porque essas linhas conduzem ao desejo, às máquinas do desejo, a organização de um campo social de desejo: não se trata de cada um fugir pessoalmente, mas de fazer fugir, como quando se arrebenta um cano ou um abcesso”.

 

 

De 07 de agosto a 05 de setembro.