Com Sergio Gonçalves

27/jul

A Sergio Gonçalves Galeria, Centro, Rio de Janeiro, RJ, inaugurou a exposição individual “Sobre Águas”, do artista plástico Newman Schutze. Nessa mostra, o artista paulista apresenta 16 obras inéditas incluindo 6 telas e 10 desenhos sobre papel. As obras de Schutze são afeitas às longas durações. O tempo sempre comparece como elemento constitutivo do trabalho, mesmo quando a ideia é desafiá-lo, como nos desenhos quase instantâneos feitos a nanquim. O artista é conhecido por esses desenhos em que utiliza aguadas para obter um efeito bem diluído da tinta sobre o papel.

 

Depois de três anos de atuação no Centro Histórico do Rio de Janeiro, a Sergio Gonçalves Galeria inaugurou novo espaço no CasaShopping, na Barra da Tijuca. O lugar passa a ser mais uma opção para os amantes da Arte Contemporânea no Rio de Janeiro.

 

 

 Até 29 de agosto.

Bate papo na TATO

17/jul

A Galeria TATO, Vila Madalena, São Paulo, SP, convida para um bate papo no dia 18/07/15, sábado, às 16:00h, com os artistas Aloysio Pavan, Diego Castro, Luiz 83, Monica Tinoco e Victor Lema Riqué e a curadora Juliana Monachesi sobre a exposição “A abstração como imagem – Parte 1″.

 

 

A mostra reúne trabalhos recentes de 8 artistas que incorporam de alguma forma o pensamento sobre “abstração” em suas obras: Aloysio Pavan, Diego Castro, Evandro Soares, Fernando Velázquez, Luiz 83, Monica Tinoco, Paulo Pasta e Victor Lema Riqué.

 
Aloysio Pavan trabalha predominantemente com desenho, muitas vezes usando a superfície do papel como se fosse uma tela. Quatro desenhos que realizou neste ano, cada um flertando com um tipo diferente de abstração.Monica Tinoco é fotógrafa de formação, mas utiliza-se de diferentes suportes e linguagens em sua pesquisa. Após trabalhar em pinturas que citavam os abstracionistas brasileiros, a artista desenvolve uma série de abstrações têxteis. Paulo Pasta pode ser considerado um mestre para diversos dos artistas presentes na exposição; o pintor participa como convidado especial, apresentando pinturas sobre papel e tela.

Exposição “Caro, Cara”.

14/jul

O MARGS, Museu de Arte do Rio Grande do Sul Ado Malagoli, Centro Histórico, Porto Alegre,

RS, apresenta como exposição complementar e em paralelo à mostra individual do artista

Alessando Del Pero, a coletiva temática “CARO, CARA”. Composta de retratos e autorretratos ,

o acervo exibe peças raras como “Retrato de Walmir Ayala”, de Inimá de Paula, “Retrato de

Maria Helena Lopes”, de Glauco Rodrigues A curadoria do evento é de André Venzon.

 

“CARO, CARA”:

 

Artistas participantes: Ado Malagoli, Aldo Locatelli, Alessandro Del Pero,

Alessandro Ruaro, Alexandre Pinto Garcia, Amália Cassullo, Ana Nunes, Arthur

Timótheo da Costa, Bea Balen Susin, Britto Velho, Bruno Goulart Barreto , Carla

Magalhães, Carlos Petrucci, Carlos Scliar, Cláudio Tozzi, Djalma do Alegrete, Edgar

Koetz Eduardo Cruz, Edy Carollo, Elaine Tedesco, Elle de Bernardini, Ernesto

Frederico Scheffel, Ernst Zeuner, Felipe Alonso, Flávio de Carvalho, Flavya Mutran,

Francisco Brilhante, Franz Von Lenbach, Gastão Hofstetter, Gilberto Perin, Gilda

Vogt, Glauco Rodrigues, Guignard, Heloisa Schneiders, Henrique Bernardelli,

Henrique Cavalleiro, Henrique Fuhro, Iberê Camargo, Inimá de Paula, J.C. Reiff

Jacintho Moraes, Jesus Escobar, João Bastista Mottini, João Fahrion, João Faria

Viana, João Otto Klepzig, Jorge Meditsch, José Carlos Moura, José de Souza Pinto,

Juan Uruzzola, Julio Gavronski, Julio Ghiorzi, Kira Luá, Leandro Selister, Leda Flores,

Leo Santana, Lepoldo Gotuzzo, Letícia Remião, Luiz Antônio Felkl, Luiz Carlos

Felizardo, Luiz Zerbini, Magliani, Marcelo Chardosim, Marcos Noronha, Maria

Leontina, Maria Tomaselli, Mariana Riera, Marilice Corona, Mario Agostinelli, Mario

Palermo, Mariza Carpes, Martin Heuser, Miriam Tolpolar, Neca Sparta, Nelson

Wilbert, Patrício Farias, Patrick Rigon Regina Ohlweiler, Ricky Bols, Roberto

Magalhães, Roberto Ploeg, Rochele Zandavali, Rodrigo Plentz, Roosevelt Nina,

Roseli Pretto, Sandra Rey, Sergio Meyer, Silvia Motosi, Sioma Breitmann, Sotero

Cosme, Telmo Lanes, Téti Waldraff, Theo Felizzola, Tiago Coelho, Trindade Leal,

Ubiratã Braga, Vasco Prado, Vitória Cuervo, Walter Karwatzki, Xico Stockinger, ZIP.

 

 

     A palavra do curador

 

O retrato daquele que fica. Dos notáveis e dos anônimos. O

retrato de pompa, da classe dominante, da burguesia.

O retrato do oprimido. O retrato imponente e o impotente. A

rebeldia do retrato. O retrato de família. O nu retratado. O retrato

do ídolo e da criança. O autorretrato.

O retrato imaginário, o anti-retrato.

O retrato como obsessão.

 

 

Caro, Cara…

Retratos correspondentes no acervo MARGS e artistas convidados

 

O retrato enfoca o humano no que possui de mais marcante: o rosto. Seja de perfil, voltado a

três quartos, de corpo inteiro, da cintura ou dos ombros para cima, equestre, de nobres,

militares, políticos ou religiosos; de artistas, personalidades ou marginais, de mulheres e

crianças. O retrato pintado, esculpido em carrara e encarnado − ou cuspido e escarrado como

no popular − desenhado, gravado, fotografado, em preto e branco, colorido, lambe-lambe,

3×4, polaróide, still, grafitado, no Facebook, a selfie…

 

A intensidade e qualidade das obras em retratos e autorretratos do artista italiano Alessandro

Del Pero, serviram de ensejo para a presente exposição Caro, cara, que busca valorizar na

correspondência entre obras do acervo do MARGS e artistas convidados, o que identificam a si

mesmo e ao outro por meio do olhar. Portanto esta é uma curadoria endereçada mais aos

artistas do que às obras, pois seus retratos representam o lugar mais próximo que podemos

estar deles, aonde o Museu também quer estar: ao lado dos artistas.

 

São diversos os exemplos de quanto este tema fascina os artistas. A começar pela literatura,

podemos citar o polêmico “O retrato de Dorian Gray” (1890), de Oscar Wilde, que faz uma

crítica social e cultural da sociedade britânica à sua época; o autobiográfico “O retrato do

artista quando jovem” (1916), de James Joyce, em que recorre a fases da sua vida para

construir o personagem alter ego do autor; o épico “O retrato” (1951), da trilogia “O Tempo e

o Vento”, de Érico Verissimo, cuja atmosfera histórica evoca na passagem do tempo as

gerações que se sucedem; até o romance “O pintor de retratos” (2001), de Luiz Antônio de

Assis Brasil, que expõe os questionamentos e contradições de um pintor frente à sedução da

fotografia.

 

No cinema, no filme de Giuseppe Tornatore, Stanno tutti bene (1990), Marcello Mastroianni

interpreta um pai que ao sair em viagem para rever os filhos exibe vaidoso pelo caminho uma

foto das suas crianças, fantasiadas como atores de ópera. O diretor ao introduzir esta imagem

do retrato como objeto de construção da sua narrativa visual, além de fazer uma rica menção

ao teatro, coloca-nos no lugar do personagem, que ao sentir saudade recorre ao álbum para

lembrar-se do outro.

 

É claro que nas artes plásticas também são inúmeras as criações que têm o retrato como

assunto central, a começar pelo quadro mais célebre da história da arte a enigmática Mona

Lisa (1503-1517), de Leonardo da Vinci. Ainda, entre as 12 obras de arte mais famosas de

todos os tempos, figuram nove retratos, como o revelador “Retrato do artista sem barba”

(1889) de Vincent van Gogh e o zeloso “O retrato do Dr. Gachet” (1890) do mesmo artista,

além das pinturas “Garota com brinco de pérola” (1665), de Veermer, que revela a intimidade

de uma modelo anônima; a familiar cena “Mulher com sombrinha” (1875), de Monet, cujo

enquadramento mais casual já é uma influência direta da fotografia; assim como o

descontraído “O almoço dos remadores” (1881), de Renoir; ou o angustiante “O grito” (1893),

de Munch; em contraste ao apaixonado “O beijo” (1909), de Klimt; até a inspiradora “Dora

Maar com gato” (1941), musa e amante, do cubista Picasso.

 

Segundo o filósofo francês Merleau-Ponty (1908-1961) “o retrato celebra o enigma da

visibilidade”, pois cada um tem sua própria história e devaneios. Por isto mesmo, o interesse

em revelar o retrato do contemporâneo, a partir do retrospecto deste gênero artístico no

acervo do MARGS, foi desde o início o principal objetivo deste projeto curatorial, que mostra a

diversidade da face do artista e seus pares, ao longo de obras da coleção que recuam há um

século e meio, até chegar à contemporaneidade que faz do retrato, enquanto disfarce sua

faceta mais interessante da liberdade de expressão do nosso tempo.

 

Há que destacar, porém, que o contínuo processo histórico ao longo do século passado de

transformação do sujeito retratado − apesar de representar uma revolução visual, entretanto,

passou por períodos de exceção em que o retrato do indivíduo ficou marcado pela

deformação. Foi desfeito, para não dizer destruído, durante os períodos de guerra e regimes

totalitários, causando a perda da identidade, da voz e da imagem, como representação visual

da humanidade. A ponto de, a multidão prevalecer quase totalmente sobre o indivíduo, que

esteve sem nome, sem título, tornando-se precário, excluído, invisível, não sendo mais capaz

nem de ser associado ao rosto que lhe carrega. Uma verdadeira castração psicológica que

transformou o humano em coisa.

 

Contudo, o modo de lidar com a sociedade de hoje não é ignorando-a. Os novos valores

estabelecidos, as mudanças e a rebeldia atual, nos ensinam cotidianamente ver com olhos

mais perspicazes e críticos este mundo de imagens em que estamos imersos.

 

Então, o que a arte e uma exposição de retratos podem nos levar a pensar e imaginar sobre

nós mesmos e o outro?

 

No mundo super contemporâneo, todos carregamos um pedaço de plástico com uma tela de

vidro na mão o dia inteiro… É quase uma extensão do nosso corpo a produzir imagens mobile

compartilhadas via redes sociais. Este tipo de comportamento − se de forma alienada − investe

contra a imaginação e a potência da visualidade. Na contramão deste movimento, a criação

artística assegura a permanência dos signos visuais e ao suscitar múltiplas possibilidades

perceptivas faz da imagem uma força de resistência contra o arbítrio da padronização.

 

Todavia, no campo da arte os retratos e autorretratos permanecem a ser construções de

exposição absoluta do indivíduo, nas quais os artistas se valem do próprio corpo ou do outro

como objeto de representação e veículo expressivo, pelo qual revelam sutis e sensíveis

verdades. Evidenciando, ao final, que a única coisa que podemos salvar é o olhar do outro, e o

retrato − ou o autorretrato, é a imagem pela qual verdadeiramente nos vemos.

 

 

Até 26 de julho.

Vergara no Instituto Ling

11/jul

Com curadoria de Luisa Duarte, a exposição “Carlos Vergara – Sudários”, em cartaz na Galeria

Instituto Ling, Porto Alegre, RS, traz obras representativas do percurso de experimentação do

artista que, desde os anos 80, investiga o campo expandido da pintura, utilizando novas

técnicas, materiais e pensamentos que resultam em obras caracterizadas pela inovação. A

exposição é composta de quatro telas – monotipias sobre lonas, realizadas entre 1999 e 2005

–, nas quais Vergara emprega pigmentos naturais e minérios para transferir texturas para a

tela, explorando, assim, o contato direto com o meio natural.

 

 

Uma grande instalação inédita, intitulada “Sudários”, apresenta 250 monotipias realizadas em

lenços de bolso, resultados de viagens para diversas regiões do mundo, como São Miguel das

Missões, Capadócia, Pompéia e Cazaquistão. Completam a exposição dezenas de fotografias

em pequeno formato com os registros das ações que originam os “Sudários”, sublinhando

assim a importância do processo para a obra como um todo. A exposição tem patrocínio da

Fitesa e financiamento do Governo RS / Sistema Pró-Cultura / Lei de Incentivo à Cultura.

 

 

 

Sobre o artista

 

 

Carlos Vergara possui uma obra extensa e consistente, que vem produzindo desde os anos

sessenta e que lhe conferiu posição de destaque na arte contemporânea brasileira. Nascido na

cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, em 1941, Vergara iniciou sua trajetória nos anos

60, quando a resistência à ditadura militar foi incorporada ao trabalho de jovens artistas. Em

1965, participou da mostra Opinião 65, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, um

marco na história da arte brasileira, ao evidenciar essa postura crítica dos novos artistas diante

da realidade social e política da época. A partir dessa exposição formou-se a Nova Figuração

Brasileira, movimento que Vergara integrou junto com outros artistas, como Antônio Dias,

Rubens Gerchmann e Roberto Magalhães, que produziram obras de forte conteúdo político.

 

 

Nos anos 70, seu trabalho passou por grandes transformações e começou a conquistar espaço

próprio na história da arte brasileira, principalmente com fotografias e instalações. Desde os

anos 80, pinturas e monotipias tem sido o cerne de um percurso de experimentação. Novas

técnicas, materiais e pensamentos resultam em obras contemporâneas, caracterizadas pela

inovação, mas sem perder a identidade e a certeza de que o campo da pintura pode ser

expandido. Em sua trajetória, Vergara realizou mais de 200 exposições individuais e coletivas

de seu trabalho, dentre elas a Bienal de Medelin 1970, Bienal de Veneza de 1980, Bienal de

São Paulo edições de 1963, 1967, 1985, 1989 e 2010, Bienal do Mercosul edições 1997 e 2011.

 

 

 

Até 23 de agosto.

Trajetórias em Processo 3

09/jul

Anita Schwartz Galeria de Arte, Gávea, Rio de Janeiro, RJ, apresenta, a partir do dia 15 de julho, a exposição “Trajetórias em Processo 3”, com 28 de obras de dez artistas selecionadas pelo curador Guilherme Bueno. Como nas edições anteriores, a ideia da exposição é apresentar trabalhos de artistas “cuja produção encontra-se em um momento decisivo, marcado pela consolidação da maturidade poética”. O curador ressalta que não há um fio condutor nem tema comum entre os trabalhos, a não ser o fato de todos os artistas estarem em um momento profissional semelhante. No entanto, é possível ter algumas leituras acerca das obras.

 

 

Na exposição, serão apresentadas obras em diferentes técnicas e suportes, como pinturas, desenhos, fotografias, objetos, esculturas e instalações, produzidas entre 2010 e 2015 pelos artistas Andrei Loginov (Berlim), Anton Steenbock (Rio), Daniel Albuquerque (Rio), Daniela Mattos (Rio), Fyodor Pavlov (Moscou), Guilherme Dable (Porto Alegre), Lucas Sargentelli (Rio), Marina Weffort (São Paulo), Romy Pocztaruck (Porto Alegre) e Thomas Jefferson (Rio), que não fazem parte do grupo representado pela galeria.

 

 

No dia da abertura, o artista Lucas Sargentelli fará uma performance nas redondezas da galeria. “Trata-se de uma caminhada em que se perceberão detalhes arquitetônicos, texturas e outros aspectos do percurso. É uma proposição que ele desenvolve já faz algum tempo”, explica o curador Guilherme Bueno. Durante a caminhada, alguns elementos coletados na rua serão levados para a galeria e expostos no contêiner, que fica no terceiro andar.

 

 

 

A palavra do curador

 

 

“Podemos às vezes pensar cruzamentos entre a abordagem de cenários e paisagens pela Romy e a Daniela, mas eles têm caminhos e significados próprios. Em outros casos, refletir sobre a escultura contemporânea nos casos do Daniel, Thomas, Anton e Marina. Seguindo um outro percurso, a relação com a bidimensionalidade nas pinturas do Guilherme e nas obras da Marina. Contudo, minha ênfase é justamente na diversidade e independência, privilegiando uma visão aberta da produção contemporânea, deixando que nesse caso, os pontos de contato entre as obras se façam intuitivamente.”.

 

 

“Os artistas convidados a participarem da edição de 2015, cada um por um viés próprio, apontam-nos para um feixe – dos inúmeros possíveis – a atravessar a condição atual da arte. Com isso pode-se explorar desde o paradoxo de uma tradição do readymade (passando, ademais por outro paradoxo – o dele ver-se exposto a uma irônica paráfrase de artesania), à obsedante inquietação provocada pelo poder conferido às imagens ou, igualmente desafiador, a possibilidade de a arte – independente ou decididamente crítica ao seu sistema assentado – tensionar sua lógica produtiva (que pode abarcar o debate em torno de sua institucionalização ou uma estrutura de trabalho a extrapolar a convencional rotina do ateliê).”.

 

 

“Um aspecto presente em todas as edições é a atenção à pluralidade de linguagens, privilegiando um olhar aberto sobre a arte contemporânea, afortunadamente irredutível a simplificações. Isso nos leva, inclusive, a refletir o quanto, nesse contexto, uma certa dinâmica de heterogeneidade e hibridismo permite, inclusive, que práticas mais atreladas a uma ‘historicidade’ da arte (como, por exemplo, a pintura e a escultura), para além da assimilação de questões vindas de outros meios, se vejam dispostas a rearticular seus próprios termos.”.

 

 

 

De 15 de julho a 22 de agosto.

Guignard no MAM-SP

07/jul

O MAM-SP, Portão 3, Parque do Ibirapuera, SP, apresenta a exposição “Guignard – A memória plástica do Brasil moderno”. A curadoria é do crítico de arte Paulo Sergio Duarte.

 

 
A palavra do curador

 
Guignard e o arquipélago moderno no Brasil

 
Um dos férteis caminhos para se pensar a formação da arte moderna no Brasil é uma metáfora geológica. Imaginemos um arquipélago em formação, com ilhas de diferentes altitudes, umas mais elevadas, outras menos. Estamos bem antes de um território contínuo, de um continente, como veremos se formar a partir dos anos 1950, com a assimilação das linguagens construtivas do segundo pós-guerra, no qual as linguagens das obras promovem um intenso diálogo entre si, independentemente das relações pessoais entre os artistas.

 

A ideia do arquipélago vem do caráter idiossincrático das linguagens exploradas, já modernas, que, entretanto, não conversam umas com as outras, cada uma buscando seu próprio caminho. Poderíamos pensar o início da formação desse arquipélago com algumas ilhas já decididamente modernas, por exemplo, Almeida Júnior (1851-1899), Castagneto (1851-1900), Eliseu Visconti (1866-1944), essas ilhas irão se multiplicar com Anita Malfatti (1889-1964), Tarsila do Amaral (1886-1973), Lasar Segall (1891-1957), Goeldi (1895-1961), Di Cavalcanti (1897-1976), Vicente do Rego Monteiro (1899-1970), Ismael Nery (1900-1934), Pancetti (1902-1958), Candido Portinari (1903-1962), Cícero Dias (1907-2003), entre tantos outros. Para o impulso multiplicador, teve papel importante, entre outros fatores, uma vontade de ser moderna, que aflige a cultura brasileira ao longo das primeiras décadas do século passado e se consubstancia na Semana de Arte Moderna de 1922, em São Paulo. Trata-se, agora, não só de experiências modernas isoladas – como os romances de Machado de Assis e Lima Barreto, ou a poesia dos simbolistas Cruz e Sousa e Alphonsus de Guimaraens –, mas também de uma atitude de combate sistemático, conduzida por artistas, escritores e intelectuais, contra os valores acadêmicos que ofereciam obstáculo à modernidade. Entre as ilhas modernas desse arquipélago, encontra-se uma de elevada altitude: a obra de Alberto da Veiga Guignard (Nova Friburgo, RJ, 1896 – Belo Horizonte, MG, 1962).

 

O lirismo de Guignard é único em nossa modernidade. As paisagens e festas que muitas vezes fazem flutuar – numa atmosfera azul acinzentado, às vezes muito escuro – edificações, casas, igrejas, junto a balões, parecem expor uma fenomenologia do aparecimento, tal como os desenhos e monotipias de Mira Schendel, e as pinturas de Rothko. É como se a arte flagrasse o momento em que as coisas surgem, antes mesmo de encontrarem seu lugar definitivo em um terreno. Os retratos de Guignard, juntamente com as paisagens, são outros capítulos privilegiados da obra do artista.

 

Seriam muitos os retratos em que poderíamos nos deter, mas os autorretratos, perseguidamente realizados ao longo de décadas, apontam para o lábio leporino que, segundo seus biógrafos, interferiu decisivamente em sua existência, particularmente, na vida amorosa. Mas, surpreendentemente, não se intrometeu na vida do educador. Guignard foi um grande formador de artistas, utilizando-se de gestos e da voz deformada pela deficiência; era capaz de ensinar e, de suas escolas, saíram grandes artistas, antes no Rio de Janeiro e, particularmente, na experiência desenvolvida em Belo Horizonte, a partir de 1944, convidado pelo prefeito Juscelino Kubitschek. Das lições de Guignard, é preciso lembrar aquelas do desenho, recordadas por um dos nossos maiores artistas, seu discípulo Amilcar de Castro, sobre o uso do lápis duro, o grafite seco que não permitia correções. Errou, tem que assumir. E, segundo Amilcar, do desenho ensinado por Guignard, deriva toda sua obra escultórica. Não é pouco.

 

Diz-se que sua obra é decorativa; Matisse também foi um grande revolucionário decorativo. Agradar aos olhos, hoje, pode ser um pecado, mas, quando uma grande obra se emancipa na modernidade, trazendo prazer à contemplação, e apresenta, com ela, momentos de reflexão junto com o prazer de olhar, é tudo de que precisamos. Aqui, ela está apresentada, com momentos de alguns de seus contemporâneos. Espera-se que o prazer de olhar seja acompanhado pelo gozo do pensar.

 

Paulo Sergio Duarte

 

 

A partir de 07 de julho.

Palatnik em Porto Alegre

A Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, RS, exibe a retrospectiva itinerante do mestre

internacional da arte cinética Abraham Palatnik, com curadoria assinada por Pieter Tjabbes e

Felipe Scovino. “A Reinvenção da Pintura” apresenta 78 obras produzidas entre os anos de

1940 e 2000. A exposição composta por pinturas, desenhos, esculturas, móveis, objetos e

estudos do artista brasileiro conhecido por obras que combinam luz e movimento e, em

muitos caso, utilizam instalações elétricas.

 

“A obra de Palatnik caracteriza-se por uma qualidade inegável: permite não só observar as

passagens do moderno ao contemporâneo, mas também estudar e reconhecer uma das

primeiras associações entre arte e tecnologia no mundo, um diálogo cada vez mais presente a

partir da metade do século XX. Esta exposição ultrapassa os limites da pintura e da escultura

modernas, intenção que o artista manifestou claramente nos Aparelhos cinecromáticos, nos

Objetos cinéticos e em suas pinturas, quando passou a promover experiências que implicam

uma nova consciência do corpo”, pontuam os curadores no texto de abertura do catálogo da

exposição.

 

Segundo os curadores, a singular contribuição de Palatnik para a história da arte não se dá

apenas por sua posição como um dos precursores da chamada arte cinética — caracterizada

pelo uso da energia, presente em motores e luzes —, mas também pela leitura particular que

faz da pintura e em especial pela articulação que promove entre invenção e experimentação:

“Seu lado ‘inventor’ está presente em uma artesania muito particular que o deixa cercado em

seu ateliê por porcas, parafusos e ferramentas construídas por ele mesmo e não pelas tintas,

imagem característica de um pintor. O crítico de arte Mário Pedrosa e o escritor Rubem Braga

já afirmavam, na década de 1950, que Palatnik pintava com a luz”.

 

“Palatnik dinamizou a arte concreta expandindo-a para além de seu campo usual e integrou-a

à vida cotidiana por intermédio do design. Ao longo de sua trajetória, o artista produziu

cadeiras, poltronas, ferramentas, jogos e sofás, entre outros objetos. Sua obra habita o mundo

de distintas maneiras, apontando para uma formação incessante de novas paisagens e leituras

à medida que diminui, desacelera e molda o tempo. Nesta exposição reunimos todos esses

momentos da obra extraordinária de Abraham Palatnik. Uma obra que oferece ao público

experiências marcantes e solicita, em troca, uma entrega total”, concluem os curadores.

 

 

A palavra da curadoria

 

A obra de Abraham Palatnik (1928) caracteriza-se por uma qualidade inegável: permite não só

observar as passagens do moderno ao contemporâneo, mas também estudar e reconhecer

uma das primeiras associações entre arte e tecnologia no mundo, um diálogo cada vez mais

presente a partir da metade do século XX. Esta exposição ultrapassa os limites da pintura e da

escultura modernas, intenção que o artista manifestou claramente nos Aparelhos

Cinecromáticos, nos Objetos Cinéticos e em suas pinturas.

 

A retrospectiva  Abraham Palatnik — A Reinvenção da Pintura começa pelas obras nas quais se

vê a técnica acadêmica com a qual ele romperia no final da década de 1940 para dedicar-se à

arte cinética, caracterizada pelo uso da energia, presente em motores e luzes, com as séries

Aparelhos Cinecromáticos e Objetos Cinéticos.

 

Essa mudança de rumos na produção de Palatnik ocorreu em um momento decisivo para a

arte nacional. Nascia a Bienal de São Paulo, um dos marcos na entrada do país no circuito da

arte internacional. Palatnik participou da Bienal de 1951 com um Aparelho Cinecromático, uma

invenção — tão artesanal quanto engenhosa — de uma pintura feita de luz e movimento.

 

Se os Aparelhos Cinecromáticos criaram uma nova forma de pintar, os Objetos Cinéticos

podem ser vistos como uma renovação na forma de ocupar o espaço. No lugar dos volumes da

escultura, esses aparelhos lúdicos, coloridos e quase sempre motorizados ocupam o espaço

com movimento, aproximando a pesquisa de Palatnik das proposições de Alexander Calder e

Soto. Palatnik foi um dos precursores da arte cinética e da arte concreta. Mas também

dinamizou a arte concreta, expandindo-a para além de seu campo usual, e integrou-a à vida

cotidiana por intermédio do design. O experimentalismo e a organicidade sobrevoam a sua

trajetória — em particular na série de obras que utilizam a madeira como suporte e meio,

aproveitando os desenhos naturais dos veios dos troncos de jacarandá.

 

Na década de 1980, o artista inicia outra pesquisa com cor: a criação de telas com cordas

coladas para dar volume, e novamente a exploração das cores com a tinta. Na série W, o

artista estuda os jogos óticos resultantes do corte (que hoje realiza com laser) e subsequente

reagrupamento de tiras de madeira pintada, técnica que teve origem na série Relevos

Progressivos (feitos com papel cartão) iniciada na década de 1960. Palatnik movimenta as

varetas do ‘quadro fatiado’ no sentido vertical, ‘desenhando’ o futuro trabalho, construindo

um ritmo progressivo da forma, conjugando expansão e dinâmica visual e “explorando o

potencial expressivo de cada material”. A produção de Palatnik, apresentada nesta

retrospectiva em todas as suas facetas, intriga e encanta: suas obras vão construindo uma

narrativa visual marcante e profundamente elaborada sobre os horizontes alargados por ele.

 

 

Até 25 de novembro.

Del Pero no MARGS

29/jun

 

 

A galeria artefato, Porto Alegre, RS, promove a exposição comemorativa ao seu trigésimo aniversário no Museu de Arte do Rio Grande do Sul, MARGS, tendo como artista convidado o pintor Alessandro Del Pero. Nascido na Itália, radicado em Nova York, Alessandro Del Pero encontra-se no Brasil desde o início de junho para a sua primeira exposição individual na América do Sul. Sob curadoria de André Venzon, a seleção de obras será exposta na Pinacoteca do Museu de Arte do Rio Grande do Sul. (MARGS). Alessandro Del Pero, que possui obras em coleções particulares da América do Norte, Europa e Ásia, veio para participar de um dos eventos que celebra os 30 anos da galeria arte&fato.

 

— Minhas influências vêm de minhas experiências. Quando eu era pequeno, me fascinei pelas obras de Caravaggio. Com o passar do tempo, fui me interessando por outros grandes artistas, como Van Gogh , Picasso e Modigliani, e a partir daí fui construindo minha identidade como artista —  contou o pintor de 36 anos.

 

Alessandro Del Pero, nesta primeira visita ao Brasil, mostra pinturas de grandes dimensões e em sua a agenda inclui um bate-papo com a comunidade artística, de Porto Alegre.

 

 

Até 25 de julho.

 

Geração 80 em Curitiba

18/jun

Entra em exibição na Simões de Assis Galeria de Arte, Curitiba, PR, a exposição “Geração 80: Ousadia & Afirmação”, com curadoria de Marcus Lontra. Artistas de uma geração cuja marca foi a busca da associação do pensar com o fazer serão apresentados na mostra, que traz obras de Barrão, Beatriz Milhazes, Cristina Canale, Daniel Senise, Delson Uchôa, Gonçalo Ivo, Jorge Guinle, Leda Catunda, Leonilson e Luiz Zerbini.

 

 

Em julho de 1984 e 123 artistas de várias partes do país se reuniriam num grande site-specific no prédio do Parque Lage, no Rio de Janeiro. A abertura da exposição foi uma festa que reuniu toda uma geração crescida à sombra de 20 anos de ditadura militar. Na mostra, diversas propostas reunidas pela jovem curadoria de Marcus Lontra, Paulo Roberto Leal e Sandra Mager tendo, como um de seus nortes, a importância da imagem. Intitulada “Como Vai Você, Geração 80?”, a mostra completou 30 anos em 2014 e é, a partir do dia 18 de junho, revisitada por meio de seus principais nomes. Em vez de trazer trabalhos da época da exposição histórica desses artistas, Lontra empreende uma visita à produção mais recente desses que são nomes integrantes da história da arte brasileira. “A mostra reúne obras de décadas variadas e funciona como um caleidoscópio: imagens que se sobrepõem, se movimentam e se alternam na construção de um conjunto íntegro e orgulhoso”, diz o curador.

 

 

 

Geração 80: ousadia & afirmação

“A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte”

“Comida” – Titãs, hit dos anos 80

 

 

Há pouco mais de trinta anos, cento e vinte e três jovens artistas se reuniram na Escola de Artes Visuais do Parque Lage no Rio de Janeiro, na emblemática data de 14 de julho, para invadir e ampliar as fronteiras da arte brasileira, na hoje célebre mostra “Como vai você geração 80?”. Eram outros os tempos, repletos de otimismo, e a juventude de então estava certa da necessidade premente de sair às ruas, de ocupar as avenidas e os becos da cidade comemorando a democracia que renascia no Brasil depois de um longo período de trevas. Assim éramos todos, jovens românticos e corajosos, querendo falar de afeto e liberdade, dispostos a construir um novo país e a alimentar uma produção artística que refletisse a pluralidade cultural e étnica do país.

 

 

O Brasil – e em especial o Rio de Janeiro – vivia um momento de ebulição política e cultural. Brizola e Darcy construíam CIEPs, concretizando sonhos de Anísio Teixeira e Paulo Freire. A piscina do parque Lage era a metáfora perfeita para o banho de criatividade que ocupava o casarão de Gabriela Bezanzoni e seus jardins. A curadoria (Paulo Roberto Leal, Sandra Mager e eu) era também jovem e não buscava excessos teóricos que acabam por transformar os artistas em meros ilustradores das geniais teses acadêmicas do teórico de plantão. No texto explicativo da mostra os critérios eram assim explicados: “… durante todo o processo de realização, nós, os curadores, jamais tentamos impor caminhos, forçar a existência de movimentos, de grupos, enfim, comportamentos superados nos quais somente alguns poucos `espertos` se beneficiam. A nós interessa menos o que eles fazem, e mais a liberdade desse fazer. Esse foi o princípio que norteou as nossas funções na coordenadoria da mostra.”

 

 

A total liberdade que permitiu aos artistas a escolha dos lugares onde expor e a correta função da curadoria, colaboraram para o estrondoso sucesso do evento. Em meio a tantos nomes surgiam obras e carreiras que hoje se afirmam na história recente da produção artística do Brasil. A mostra definiu a vocação plural e madura da arte brasileira; permitiu o aparecimento de uma crítica mais comprometida com a inserção da arte no panorama cultural brasileiro, oxigenou o mercado e reavaliou aspectos institucionais. Em sua essência democrática, a geração 80 foi, é e sempre será uma voz a serviço da diversidade. “Gostem ou não, queiram ou não, está tudo aí, todas as cores, todas as formas, quadrados, transparências, matéria, massa pintada, massa humana, suor, aviãozinho, geração serrote, radicais e liberais, transvanguarda, punks e panquecas, pós-modernos e pré-modernos, neo-expressionistas e neocaretas, velhos conhecidos, tímidos, agressivos, apaixonados, despreparados e ejaculadores precoces. Todos, enfim, iguais a qualquer um de vocês. Talvez um pouco mais alegres e corajosos, um pouco mais… Afinal, trata-se de uma nova geração, novas cabeças.”

 

 

Hoje, já na segunda década de um novo milênio, é gratificante constatar que a ousadia desses sempre jovens artistas está presente no cenário da arte contemporânea. Alguns com carreiras internacionais estabelecidas, outros com a certeza de que o tempo caminha ao seu lado, eterno cúmplice da qualidade das obras realmente significativas. A mostra aqui apresentada reafirma a importância de uma história já vivida e de um futuro no qual a liberdade caminhará de mãos dadas com a maturidade e o amplo domínio de seus meios expressivos. Reunir no mesmo espaço físico esse grupo de amigos, permite a curadoria – e ao público principalmente – o reencontro com obras que fazem parte do nosso saber e do nosso sentir. A mostra reúne obras de décadas variadas e funciona como um caleidoscópio: imagens que se sobrepõem, se movimentam e se alternam na construção de um conjunto íntegro e orgulhoso de uma geração que acredita no que faz e que ajuda a compor, cotidianamente, o retrato de sua época, de seu país, de nossos sentimentos e de nossas idéias.

 

Marcus de Lontra Costa – Maio de 2015

 

 

 

Até 01 de agosto.

Manfredo na Galeria Bergamin

09/jun

A exposição “Manfredo de Souzanetto “Paisagem ainda que”, entra em cartaz na Galeria Bergamin, Jardins, São Paulo, SP. Manfredo de Souzanetto é um dos nomes de ponta da arte contemporânea brasileira com vivência curricular profissional internacional.

 

 

Paisagem ainda que

Manfredo de Souzanetto – COR LOCAL

 

 

A presente mostra de Manfredo de Souzanetto na Galeria Bergamin, São Paulo, reúne uma seleção de quarenta anos da carreira do artista mineiro radicado no Rio. Fotos, pinturas e esculturas participam de uma trajetória iniciada em Belo Horizonte e amadurecida em Paris na década de 1970 que ainda hoje segue seus passos cadenciados e seguros. Nela se percebem dois traços característicos, frequentemente entrelaçados: a reflexão sobre a paisagem e a investigação de possibilidades em aberto para a pintura na contemporaneidade.
Desde o início a paisagem se colocara como um dado decisivo para o artista: a série de “postais” e um adesivo criado por ele chamavam a atenção para o desaparecimento por completo de montanhas por conta da mineração. Não deixava de haver um traço crítico e nostálgico perante essa transformação brutal da natureza, mas junto a ela vinha também a divagação simultânea sobre a estranha situação inerente à imagem fotográfica (ser o registro de uma memória e da perda de algo; aquela paisagem só sobrevive enquanto vestígio na imagem), uma reflexão sobre o trabalho artístico (bem como da atitude do espectador) de que criar um espaço é projetar literalmente a imaginação sobre o vazio. E, no que concerne a um problema “interno” da arte, tratava-se de estabelecer uma relação efetiva (e afetiva) com um determinado espaço cuja poesia não dependesse do recurso a mera representação lírica – isto é, a interpretação inspirada de uma cena, como, a título de comparação, fora a base de trabalho do romantismo um século e meio antes – e sim de uma encarnação física, uma (literalmente) corporificação de um motivo permeado de interesses tão distintos quanto uma luz especial ou um sentimento memorialista-nostálgico. Afinal, a arte moderna ensinou-nos que tudo isso era cabível na paisagem. O que ocupou as gerações posteriores era saber como reinventar essa relação. No caso de Manfredo, o que principia com os postais, cujas fotos são “retocadas” com a linha daquele espaço tornado invisível com sua desaparição, é de, partindo de um objeto essencialmente criado como souvenir, colocar-nos à prova de lembrarmos algo que talvez não tenhamos conhecido ou percebido, mas de cuja existência, não obstante, jamais duvidamos. A pressuposta impessoalidade de um objeto como o cartão-postal apenas reforça o descompasso visual de querer ver algo não mais disponível e malgrado seu fim, continuar crendo em sua existência. Mas, no fundo, não teria sido sobre isso que a paisagem sempre falou, desde quando promovida de um gênero secundário para a linha de frente da pintura moderna? Ao fim – e notaremos isso nas pinturas posteriores de Manfredo, o que se coloca é um convite ao espectador para reposicionar e alargar seu olhar. Isso mostra-se claramente quando nessas pinturas, o espectador não vê, mas entrevê e quase toca uma paisagem ali depositada.
Para Manfredo, a pintura (linguagem a que o artista também se dedica há décadas) se concentra na disponibilidade de exploração intercambiável e ilimitada de seus termos, mesmo que admitida uma quantidade limitada de variáveis. Das três gerações de artistas com as quais ele convive (daquela dos anos 1970 até as mais jovens, passando pelos anos 1980), talvez seja um daqueles que mais valorizou uma artesania em seus trabalhos. A plasticidade ganha um sentido alargado quando consideramos que a gestação da forma começa no esboço dos chassis. A pintura vai além da divagação a respeito de como ela corre ou se deposita sobre a superfície (ainda que isto seja algo que lhe interessa, ao nos determos na consistência argilosa de alguns planos), mas da superfície propriamente dita como problema de base e de conclusão da pintura, dado ela constituir as coordenadas a partir das quais, não importa qual noção de composição, dever-se-á por conta dela – e não de convenções assentadas passivamente – encontrar suas soluções. Isto porque mesmo quando o suporte é o retângulo mais comum, ativa-se sua opacidade inescapável enquanto geratriz do espaço. Se a sua silhueta admite qualquer desvio de seu formato usual, intensifica-se a constatação de que a pintura começa a partir deste dado material, ao qual conjugam-se outros, como a espessura sensual e corpórea do pigmento.
A artesania, portanto, não se manifesta na busca de um gestual marcado e único, mas nessa relação “orgânica” entre os materiais, deles obtendo resultados particulares, graças também a sua potencialização (isto é, eles não são nem dóceis nem inertes, podendo assumir diferentes aspectos). Seja ao decantar seus próprios pigmentos na produção das tintas (pigmentos estes, importante lembrar, extraídos das terras mineiras) ou ao desenhar os chassis das telas, Manfredo alarga e repensa o processo da pintura para além do preenchimento da superfície com pinceladas, entendendo-a como algo cuja espacialidade – tanto virtual da forma pintada quanto literal do objeto (o suporte) – começa a ser gestada na confecção mesma dos materiais. Isto fica claro nas obras surgidas a partir dos anos 1980, em que, por conta dessas diversas silhuetas dos chassis, a pintura ganha uma progressiva volumetria escultórica, na qual a composição do espaço interno da tela e seu formato tendem a coincidir, fazendo com que uma não seja apenas o “preenchimento” da outra. Complementa-lhe um sentido quase “arquitetural” da cor, que em sua delimitada gama, explicita a extensão do suporte, proporcionando-lhe um peculiar ajuste junto a parede, pois se a pintura tende com sua distensão homogênea a ajustar seu plano à continuidade da parede, ao mesmo tempo salta para além dela, dadas as reentrâncias e silhueta prismática da tela. Atentando para este fator mais cuidadosamente, vemos que ele parte de um prolongado debate da cultura moderna acerca da monumentalidade, por conta do dilema ocorrido entre o desejo de uma pintura com escalas ambiciosas e a preservação da regularidade, continuidade e ajuste da volumetria homogênea da parede e do prisma arquitetônico. Os planos largos de Manfredo apontam, por um lado, para este ajuste ponderado entre a pintura, sua superfície e a continuidade justa do lugar onde se escora (ou seja, a preservação do ritmo e simplicidade da parede); porém explora a dualidade dessa pintura não sublimar, mas, ao contrário, enfatizar sua histórica (e tensa) atitude de ecoar e duplicar o paralelismo dos planos pictóricos e o da parede. Quando, porém, o plano pictórico é vazado ou eviscerado por uma aresta protuberante ou um corte revelador do anverso da tela, a pintura é solicitada a reconhecer os complexos pactos entre ela e o muro, quebrando qualquer pretensão de naturalidade supostamente atribuída à parede. Nisto, pois, se revela a faceta escultórica desses quadros.
Na esteira destes pequenos achados aparecem os elos entre aqueles dois traços marcantes de sua produção acima indicados. Já em suas primeiras investidas na pintura, Manfredo recorria àquele caráter inerente à dinâmica da imagem. Conforme afirmado aqui, o fator emblemático da imagem é ela ser um resíduo de algo não mais visível. Do mesmo modo, nesses trabalhos iniciais o artista construía uma “pintura incidental”; as sutis e indeléveis camadas de cor diante de nós são, na verdade, a tinta vazada do verso da tela, ou seja, a pintura resulta de sua saturação. Por outro lado, a cor compacta dos trabalhos seguintes – a persistir ainda hoje – retoma a ligação com a paisagem. O pigmento decantado guarda consigo uma condição instigante: se ele fala de uma coisa que talvez não exista mais (uma montanha, para usar um exemplo forçado, mas não casual), é porque esta mesma coisa se metamorfoseou pelo corpo-cinzas do pigmento em uma outra entidade, isto é, o corpo do pigmento não deixa de ser uma cinza da paisagem também. É e não é a carne de uma paisagem perdida. A paisagem está (se não é) no pigmento, na cor. Há, por exemplo, a famosa história de Chopin que levou consigo uma caixinha de prata com terra da Polônia. Era bom ter sempre por perto algo especial, literalmente um pedaço de memória. Manfredo, nesse aspecto, não age diferente: a paisagem não precisa ser figurada porque ela – e todos os sentimentos que a envolvem – estão ali germinados no pigmento. Trata-se, porém, de mais do que uma pintura de paisagem; é uma pintura com a paisagem, uma pintura da paisagem, visto que ela é feita mais do que a partir da terra, do sentimento da terra.

 

 

Texto crítico: Guilherme Bueno

 

 

De 09 de junho a 10 de julho.