10ª Bienal do Mercosul

22/out

A cerimônia oficial de abertura da 10ª Bienal do Mercosul, que ganhou a titulação geral de “Mensagens de Uma Nova América”, ocorre nesta sexta-feira, dia 23 (e até 06 de dezembro), no Santander Cultural, Centro Histórico, Porto Alegre, RS. Está sendo anunciada a presença de membros da Diretoria e do Conselho de Administração, equipe curatorial desta edição, artistas, patrocinadores e parceiros.
A mostra “Antropofagia Neobarroca”, situada no Santander Cultural estará aberta para visitação.As demais mostras abrem para visitação no sábado, 24 de outubro. Em exibição obras dos mais importantes artistas latinos de diversas épocas como dentre outros, Maria Martins, Iberê Camargo, Tunga, Ione Saldanha, Hélio Oitica, Tomie Ohtake, Estevão Silva, Wesley Duke Lee, Amílcar de Castro, Carmelo Arden Quin, Cruz Diez, Tunga, Cildo Meireles, Adriana Varejão, Carlos Asp, João Fahrion, Liuba, Pedro Américo, Oswaldo Maciá, Rubén Ortiz-Toreres, Romanita Disconzi, Avatar Morais, Paulo O. Flores, Didonet Thomas, Francisco Ugarte, Luiz Zerbini e Daniel Lezama.

 

 

Mostras, Espaços Expositivos e Horários

 

Modernismo em Paralaxe
MARGS – Praça da Alfândega, s/n – Centro
Horário: De terça a domingo, das 9h às 19h

 

Biografia da Vida Urbana
Memorial do Rio Grande do Sul – Praça da Alfândega, s/n – Centro
Horário: De terça a domingo, das 9h às 19h

 

Antropofagia Neobarroca
Santander Cultural – Praça da Alfândega, s/n – Centro
Horário: De terça a sábado, das 9h às 19h. Domingo, das 13h às 19h

 

Marginália da Forma / Olfatória: o cheiro na arte
A poeira e o mundo dos objetos/Aparatos do Corpo
Usina do Gasômetro – Av. Pres. João Goulart, 551 – Centro
Horário: De terça a domingo, das 9h às 21h.

 

Plataforma Síntese
Instituto Ling – R. João Caetano, 440 – Três Figueiras
Horário: De segunda a sexta, das 10h30 às 22h. Sábado, das 10h30 às 21h. Domingo, das 10h30 às 20h

 

Programa Educativo e a obra A Logo for America – Alfredo Jaar –

Centro Cultural CEEE Erico Verissimo – R. dos Andradas, 1223 – Centro Histórico
Horário: De terça a sexta, das 10h às 19h. Sábado, das 10h às 18h

A mostra das Musas

21/out

Tassi Espaço Cultural, Pacaembu, São Paulo, SP, abre a mostra coletiva “Musas”, com curadoria de Elizabeth Tenani e obras de Edu Cardoso, Fabrini Crisci, Flammarion Vieira, Piero Figura e Sonia Menna Barreto. O conceito curatorial busca reunir artistas em torno de um tema comum, propondo que cada um crie novas peças para homenagear suas respectivas musas.

 

Para a exposição a Tassi, convidou cinco artistas para que revelem ao público suas musas, mulheres renomadas, que os influenciam ou inspiram de alguma forma. Neste sentido, Edu Cardoso elege Dona Beja para a homenagem, personalidade influente na região de Araxá, Minas Gerais, durante o século XIX. Esta escolha não se deu apenas pelo fato da mitológica beleza de Dona Beja, mas também por sua vida e história estarem repletas de mistérios. “(…) me remete a uma plasticidade com uma certa aura surreal e que tem tudo a ver com a identidade do meu trabalho”, comenta o artista, que apresenta, na mostra, uma tela, pintada com tinta acrílica, tinta óleo e alguns detalhes de tinta spray dourada. Fabrini Crisci, por sua vez, exalta a figura de Marlene Dietrich, atriz e cantora alemã, por quem sempre foi fascinado. “Já pintei várias vezes Marlene e sempre fico hipnotizado com o olhar penetrante sedutor e fatal dela. Morei alguns anos na Alemanha, trabalhando em cabarets, em um destes espetáculos uma atriz, representando Marlene Dietrich, se apaixonava por um autômato, o qual eu representava. Maravilhoso quando o artista ‘encontra’ sua Musa”, relembra Fabrini.

 

Flammarion Vieira participa da mostra celebrando Frida Kahlo, por se identificar com a artista na estética, no modo como viveu amores, dores e paixões. Flammarion já trabalha com este tema há anos, e utiliza colagem e assamblage, inspirado também por Farnese de Andrade e Jean Dubufet. Já Piero Figura resgata o modo alegre e contagiante de Carmen Miranda, escolha que se deu em razão da estética e pela forma lúdica que a artista apresentava o Brasil, sempre cantando e cheia de vida. “Imagino a personagem sempre como se ela estivesse fazendo algo exclusivamente para mim, congelo este instante e reproduzo, utilizando a técnica acrílica sobre canvas”, comenta. Por fim, Sonia Menna Barreto homenageia Catarina de Bragança, Rainha Consorte da Inglaterra, Escócia e Irlanda, entre 1662 e 1685. Após realizar várias pesquisas para um determinado trabalho, Sonia descobriu que foi Catarina, quando na ocasião do casamento com o rei inglês Charles II, quem levou para lá o hábito do chá com bolinhos das 5h; hábito seguido e cultuado pelos ingleses até hoje. “Também introduziu na Corte Inglesa o hábito de servir as refeições em pratos de porcelana, e também inventou o garfo! Foi uma mulher admirável”, diz a artista.

 

Com esta mostra inédita, a Tassi Espaço Cultural confirma sua inserção no circuito cultural paulistano, com proposito de contribuir para a formação artística da população local. De uma forma descontraída, a mostra “Musas” oferece ao público a oportunidade de entrar em contato com a história de personalidades importantes, que inspiram a criatividade em diversas pessoas.

 

 

De 05 de novembro a 22 de dezembro.

Serpa + Zalszupin

19/out

A galeria Bergamin&Gomide, Jardins, São Paulo, SP, apresenta a exposição Serpa + Zalszupin. O carioca Serpa e o paulista de origem polonesa, Zalszupin, até onde se sabe não se conheciam, mas é surpreendente a simetria no trabalho de ambos. Enquanto Serpa recortava a tela em tiras e quadrados, Zalszupin recortava as folhas de jacarandá baiano para construir tampos de mesas executados para a L’Atelier. O período coberto pela obra de Zalszupin se inicia nos anos 1950, período de glória da arquitetura brasileira.

 

A paleta de cores encontrada em estudos de Serpa, da década de 1950 e 1960, parece ter sido transferida para os revestimentos escolhidos por Zalszupin para seus estofados. Até os tampos em mármore bege Bahia, o preferido de Zalszupin, se assemelham a pintura livre e mais abstrata desenvolvida por Serpa no início dos anos 1960.

 

A intenção da mostra é expor as semelhanças entre o desenho industrial do designer Jorge Zalszupin e a prática artistica de Ivan Serpa, durante os anos mais prolíficos de suas carreiras, entre as décadas de 1950 e 1970.

 

Pretendemos também com essa mostra, elevar o design a condição de arte. Exibindo um artista que nos anos 1950 criou o Grupo Frente, e teve como pupílos nomes como Lygia Clark, Lygia Pape e Helio Oiticica, ao lado de um dos maiores nomes do desenho nacional, pioneiro na utilização de compensado curvado no Brasil, demonstra a genialidade alcançada por estes mestres.

 

A galeria pretende apresentar uma integração despretensiosa entre o trabalho de cada artista. Em suas paredes, estarão cerca de 25 trabalhos de Ivan Serpa, entre pinturas e desenhos, produzidos entre os anos 1950 e 1970. As 17 peças de mobiliário serão ambientadas informalmente, como dispostas em uma residência.

 

 

De 24 de outubro a 04 de dezembro.

Herbert Baglione no Rio

Expondo pela primeira vez no Rio de Janeiro, Herbert Baglione, realiza seu debut na cena carioca através da Galeria Movimento, Copacabana. A exposição denomina-se “Rito”, e traz obras inéditas que refletem a sua fase transitória desde que começou, no ano de 1999, a pintar as famosas sombras, considerada uma fase negra e pesada no início de sua carreira. São nove telas e dez fotografias que transportam as mais conflitantes emoções, – que ficam claras nas cores e traços de seus trabalhos -, mas desta vez, coloridos e plenos de luz.

 

Nos últimos três anos e meio Herbert Baglione fez exposições individuais em lugares muito especiais e que concentram muita energia, como Colômbia e México. O artista, sensível, e em busca de respostas profundas, viu coisas que não mais revisita em seus trabalhos: a angústia, o lado negro, o lado que provocava discussões relativas à religiosidade, o sexo e a violência de uma forma geral. O artista encontra-se em outro momento e no processo atual a sensibilidade é notória por isso foca e traz luz e alegria nos trabalhos, como se fosse um processo de limpeza em obras com leveza e sentido mais abstratizante. Nos trabalhos anteriores, destacam-se a série “1000 Shadows”. A primeira “sombra” foi pintada em 1999 no Brasil e, a partir, daí o artista apaixonado – e estudioso autoditada – pela Arquitetura e Fotografia, começou a utilizar a interferência urbana. Ele está entre os poucos que usam calçadas, telhados e até mesmo os gramados como tela. Já o “EQM (Estado quase morto)”, também importante, nada mais é do que a visão que se tem entre vida e morte. Um trabalho muito mais espiritual.

 

Sobre o artista

 

Movido por uma curiosidade e desejo de provocação ímpar, com 20 anos de carreira, Herbert Baglione, começou a desenhar aos três anos de idade. Seu estilo distinto e a complexidade dos temas explorados, visíveis em suas ilustrações, pinturas, fotografias e intervenções, fazem de Baglione um nome respeitado no cenário da arte contemporânea.  O artista já foi publicado inúmeras vezes, inclusive na capa, da Revista Juxtapoz, uma das principais no segmento de arte e cultura urbana no mundo. Além disso, seu trabalho também está presente no livro premiado de um estudioso londrino, Rafael Schacter, o The World Atlas of Street Art and Graffitti, e uma de suas pinturas (Um minuto de silêncio) se mantém viva em São Paulo, sendo a única da Binneale (evento que trouxe artistas para fazerem intervenções na cidade) que não foi apagada pela prefeitura. Seus trabalhos estão em importantes coleções como no Museu de Arte Contemporânea de Bogotá, Eugênio Sidoli (Itália), Rik Reinking (Alemanha), Fernando Abdalla, Joshua Liner (NY), Steve Lazarides (Inglaterra), entre outras. Herbert, que já participou de exposições individuais no México, Colômbia, França, Espanha, EUA, Itália, Inglaterra, Canadá, Tunísia, Dinamarca, SP e Porto Alegre. Baglione foi convidado para a Coletiva Street Art – Um Panorama Urbano, que aconteceu ano passado, na Caixa Cultural, onde ao lado de suas obras estavam trabalhos de Banksy.

 

Os principais contatos com a pintura, o desenho e a fotografia, se deram na década de 80, quando Herbert ainda era uma criança, fazendo intervenções nas fotos de família, desenhando amigos da escola e depois reproduzindo logotipos de bandas de Rock.

 

Fã assumido de The Jam, Justin Sullivan e principalmente do folk cinematográfico de Tom Waits, o trabalho de Herbert tem forte influência musical. No início dos anos 90, por conta da necessidade de maior espaço para suas criações e experimentações, começou a usar a rua como seu atelier e teve como escola a contracultura, consumia quadrinhos e tocava bateria em banda punk. Esta bagagem lhe possibilitou conhecer, reconhecer e interceder no espaço urbano de forma a extrair o melhor da arquitetura, pintura, instalações e fotografia, linguagem que o artista incorpora com sabedoria pois leva o expectador a um outro olhar sobre a produção artística. Seus trabalhos extraem do universo urbano a fluidez e liberdades presentes da prática da street art e combina forte carga conceitual, que é incorporada às suas referências de movimentos artísticos, da Art Noveau e Minimalismo ao Expressionismo abstrato, e Pop Art. Levanta questões pessoais à discussões sobre o papel do homem na sociedade, armado pela ideia do consumismo imediato, tecnologia e tabus. Em 2001 e 2002 aconteceram as exposições Urban Discipline em Hamburgo – Alemanha, com alguns dos principais artistas do mundo naquele momento. Representando o Brasil tinha o grupo formado por Herbert, OsGemeos , Vitché e Nina. Os trabalhos de Banksy também estavam na mostra. Em 2001 Baglione foi convidado para uma individual nos EUA e a carreira internacional segue até hoje.

 

 

De 22 de outubro a 19 de novembro.

Frantz na Mamute

A Galeria de Arte Mamute, Centro Histórico, Porto Alegre, RS, convida para a mostra “Temporal”, do artista Frantz. Por ocasião da participação do artista na 10a Bienal do Mercosul, a galeria organiza uma exibição individual com um conjunto de obras abrangendo pouco mais de 25 anos da sua produção, com uma série de trabalhos inéditos. Partindo do processo de produção de Frantz, no qual o artista forra ateliês de outros artistas  para, depois de um tempo, recolher o material e então editar o que será considerado obra, a exposição abriga um conjunto de trabalhos de Frantz a partir de uma perspectiva mais sombria do que geralmente associa-se a ele. Uma profusão de pretos e brancos toma conta do espaço expositivo e nos leva a lançar um olhar mais silencioso sobre as grossas camadas pictóricas. São pinturas, carimbos, potes e livros que nos mostram os lentos processos de acúmulo dos quais sua obra nos fala. Com curadoria de Bruna Fetter, “Temporal” se propõe a realizar uma leitura sutil da obra de Frantz, extrapolando possíveis temporalidades (nas quais o piso do ateliê do artista do inicio dos anos 90 é apresentado juntamente com potes finalizados há cerca de dois meses) e desdobrando suas conexões espaço-temporais para além do(s) ateliê(s).

 

 

A palavra da curadora

Temporal

 

Usualmente com a duração de algumas dezenas de minutos, um temporal é um fenômeno atmosférico marcado por chuva forte, vendavais, trovoadas, relâmpagos e raios. Como chuva que cai e molha o solo, por vezes nutrindo-o, outras alagando-o, a pintura de Frantz é alimentada pela tinta que escorre e entranha a tela. Inundação pictórica. Em Temporal, a partir de uma palheta de cores reduzida, céus de tormenta preto e branco preenchem o espaço expositivo e silenciam o olhar. Entendendo o temporal também como uma ideia relativa à temporalidade de objetos e conceitos, a mostra aborda a poética do artista para além de uma relação maniqueísta que opõe o transitório à permanência. Ao entender o tempo como uma dimensão a mais a compor a obra, o artista o incorpora em íntimo diálogo com o espaço e seus limites. Nas palavras de Deleuze: “O tempo já não se reporta ao movimento que ele mede, mas o movimento ao tempo que o condiciona. Por isso o movimento já não é uma determinação do objeto, porém a descrição de um espaço, espaço do qual devemos fazer abstração a fim de descobrir a tempo como condição do ato”.

 

É a partir de tais relações e de ligações afetivas que o trabalho do artista toma forma. Contando com a disponibilidade e generosidade de colegas, Frantz forra paredes e pisos de ateliês que, cobertos, permanecem. Camadas e camadas de tinta vão se sedimentando numa lenta construção que registra processos de outros artistas. Aceitando o passar do tempo de forma displicente, esses espaços recebem respingos de tintas, massas de distintas cores, marcas de latas, pegadas de quem por ali passa,  acúmulo de pó. São vestígio e descarte que, posteriormente, sob o enquadramento do artista, viram obra. Dessa maneira, pinturas se materializam. Pinturas que rompem a bidimensionalidade, podendo ser pisadas, tocadas, manipuladas. Pinturas que advém de distintos endereços, questionando a noção de autoria e dissolvendo a aura da obra de arte. Pinturas que são documento e coleção; e que, através de telas, potes e livros, abrigam o processo e poética de Frantz.

 

Reunindo mais de 25 anos de produção artística, Temporal extrapola esses distintos momentos. Ao colocar o piso do ateliê do artista do inicio dos anos 90 em diálogo com potes finalizados há cerca de apenas dois meses, a mostra busca desvelar como a ação do artista se desdobra em temporalidades mundanas e, do espaço abstrato, constrói variados cenários, potentes em seus fragmentos únicos. Pingos e poças, ventos e trovões. Assim é a produção poética de Franz. Para além de breves momentos de desague, atemporal.

 

 

Sobre o artista

 

FRANTZ Rio Pardo/RS. (1963). Mora e mantém atelier em Porto Alegre, onde se dedica as Artes Plásticas, desenvolvendo várias técnicas, como desenho, aquarela, gravura, mas dedicando-se mais intensamente a pintura.  1982 – “Pichações” Museu de Arte do Rio Grande do Sul – Porto Alegre RS; 1983 – “OS NOVOS”, Espaço Cultural Yázigi, Porto Alegre RS; 1987 – “Exercícios Para Um Grande Impasse” Galeria Macunaíma FUNARTE – Rio de Janeiro RJ.; 1988 – “Esculturas-Estruturas” Museu de Arte do Rio Grande do Sul – Porto Alegre RS; 1984 – “Coletiva Pinturas e Desenhos” 11 artistas Gaúchos Paço das Artes – São Paulo SP; – “Panorama 84 Arte Sobre Papel” Museu de Arte Moderna – São Paulo SP; 1985 – “Caligrafias e Escrituras” Galeria Sérgio Millet Instituto Nacional de Artes . Plásticas / FUNARTE; – “XVII Salão Nacional de Artes Plásticas” Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro – FUNARTE – Rio de Janeiro RJ; – “Artistas Gaúchos” Museu de Arte Contemporânea – Montevidéu – Uruguay; 1994 – “Coletiva de Novos 94” – Palácio das Artes – Belo Horizonte – MG.

 

 

Sobre a curadora

 

Bruna Fetter é Doutoranda em História, Teoria e Crítica de Arte pelo Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da UFRGS. Tem se dedicado a pesquisar questões que envolvem legitimação e constituição de valor na Arte Contemporânea. Também é curadora das mostras Da Matéria Sensível: Afeto e Forma no Acervo do MAC/RS (Porto Alegre/2014); O Sétimo Continente (Zipper Galeria, São Paulo/2014); Lugar Qualquer (Casa Triângulo, São Paulo/2013). Co-curadora das exposições Mutatis Mutandis, com Bernardo de Souza (Largo das Artes, Rio de Janeiro/2013); e Cuidadosamente Através, com Angélica de Moraes (Centro Cultural da Funarte, São Paulo/2012).

 

 

De 20 de outubro a 04 de dezembro.

O caos na arte de Marcelo Gandhi

13/out

O universo caótico das grandes cidades, a globalização determinando novas relações entre as pessoas, a crise de representação que, sintomaticamente, atinge em cheio o homem urbano. Em meio a essas reflexões, nasce e se fortalece a arte do potiguar Marcelo Gandhi, cuja mostra individual, intitulada “Suco de Máquina”, poderá ser vista Roberto Alban Galeria, no bairro de

 

 

Ondina, Salvador, BA.  

 

A exposição será composta por, aproximadamente, 15 obras de médio a grandes formatos, entre desenhos sobre papel e sobre tela, um objeto em alumínio fundido, uma animação e projeções de alguns outros trabalhos. A mostra, como explica o próprio Marcelo Gandhi, é fruto de sua incursão, “rotineira e incessante”, pela cidade de São Paulo, onde passou a viver desde que saiu do Rio Grande do Norte há alguns anos.

 

“A partir das minhas relações e reflexões de estar numa metrópole complexa como São Paulo, o desenho foi assumindo um caráter mais cartográfico, caótico, evidenciando também a minha condição de nordestino, negro, árabe, assim como o meu posicionamento objetivo e subjetivo dentro dessa grande centrifuga”, define Gandhi.

 

A relação crítica e provocativa com a cidade, ainda assim, não elimina as possibilidades de um viés mais intimista e universal do artista diante do novo paradigma do mundo em rede, “onde não há mais lugar centralizador e, sim, vários pontos de disseminação e circulação de informação”.  Para Gandhi, seu trabalho artístico adquire a partir daí um perfil divergente dentro dessa grande rede: “Uso e abuso da repetição, da arte conceitual, da pop arte, resignificando, assim, uma cosmogonia particular no meio dessa gênese coletiva. Assumo que o corpo da minha obra é híbrido, misturado ..uma perfeita metáfora do Brasil com todas suas contradições e contundências”. Segundo ele, essa metáfora se traduz por interrogações que perpassam questões como signo, fronteira, gênero, política, economia, sociedade, sexualidade, espiritualidade.

 

Em desenhos, Marcelo Gandhi começou trabalhando com nanquim e papel, herança da sua formação universitária e ibérica, depois incorporou também telas e canetas coloridas e até pintura. “Tenho me colocado em experimentação, observando como a linha se comporta em outras superfícies e suportes. A cor, pra mim, surgiu de um esgotamento do uso do preto e branco e também da dinâmica de avanço inerente ao próprio trabalho, pois chega um momento em que o próprio trabalho diz pra onde você tem que ir ou o que deve fazer. A arte é um sistema vivo e dinâmico, um motor contínuo sem começo nem fim”, sintetiza.

 

 

Toy art e Walt Disney

 

O caráter questionador e estético da obra carregada de abstração de Gandhi é reconhecido pelo curador e crítico de arte Bitu Cassundé, que apresenta a mostra da Roberto Alban Galeria. Analisando sua trajetória, ele diz que os desenhos do artista adquiriram mais recentemente uma nova estruturação e são contaminados por eixos do universo dos toy art, dos ready mades de Marcel Duchamp, dos quadrinhos, do cinema e do ocultismo. “Impossível não citar também influências diretas como Walt Disney, Jeff Koons, bonecos Playmobil, Farnese de Andrade, Louise Bourgeois, H.R. Giger, Andy Warhol, Basquiat, etc.“, afirma.

 

 

Sobre o artista

 

Nascido em Natal no ano de 1975, Marcelo Gandhi formou-se em arte-educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Transitando pela música, performance e desenho, foi selecionado  para a Bolsa  Residência EXO, do Itaú Cultural/ Ed. Copam, em São Paulo. Participou também, em 2006, do projeto Rumos, promovido pelo Itau Cultural em São Paulo. Em 2007, realizou a sua primeira individual na Pinacoteca do Rio Grande do Norte. Em 2012, integrou a exposição Metro de Superfície, no espaço Paço das Artes, na USP/SP. Algumas de suas obras pertencem a acervos como Centro Cultural Dragão do Mar, em Fortaleza (CE) e Pinacoteca do Rio Grande do Norte.

 

 

De 15 de outubro a 16 de novembro.

Os incríveis anos 60

09/out

A Pinacoteca Ruben Berta, Centro Histórico, Porto Alegre, RS, exibirá a exposição “OS INCRÍVEIS ANOS 60 – britânicos na Pinacoteca Ruben Berta”, um verdadeiro tesouro escondido. Por ter sido poucas vezes mostrada na sua totalidade, e por não existirem telas com este perfil na maioria dos museus brasileiros, a exposição é uma rara oportunidade de apreciar o trabalho de artistas britânicos vistos como visionários nos anos 60, época culturalmente revolucionária.

 

A exposição apresenta peças criadas por nomes que no calor daqueles “anos incríveis” já haviam conquistado importantes lugares no mundo das artes como Graham Sutherland, John Piper, Kitaj e Alan Davie. Mas também de um artista, como Allen Jones, naquele momento apenas iniciando uma carreira que o tornaria, como os demais, uma referência da Arte Pop no mundo inteiro. Outros tantos, ao longo das décadas seguintes atuariam com trajetórias constantes, seja como professores, ou projetando-se no mercado de arte internacional, como Michael Buhler ou Mario Dubsky.

 

As linguagens destes trabalhos – consoantes com as profundas mudanças da sociedade dos anos 60 – influenciaram sucessivas gerações de brasileiros que miraram nestas expressões atuantes na Inglaterra. Estas obras que aportaram na capital do Rio Grande do Sul são representativas dos desdobramentos lírico, expressionista e informal da pintura e apontam para a consagração dos elementos pictóricos que compuseram a Arte Pop, em especial nos procedimentos gráficos desenvolvidos pela publicidade e pela propaganda.

 

A Pinacoteca Ruben Berta foi doada à Prefeitura de Porto Alegre em 1971 pelos Diários e Emissoras Associados, conglomerado pertencente à Assis Chateubriand. O magnata das comunicações empreendeu entre 1965 e 1967 a criação de cinco museus – entre eles a Pinacoteca Ruben Berta – instalados em diversas regiões do país. Um dos nichos destas coleções era formado por obras de artistas britânicos adquiridas em galerias londrinas obras de Alan Davie, Michael Buhler, Allen Jones, John Johnstone, Neville King, Bill Maynard, John Piper, Patrick Procktor, Graham Sutherland, Mario Dubsky e Peter Behan.

 

 

De 13 de outubro a 30 de novembro.

Wanda Pimentel na Frieze Masters

A artista brasileira Wanda Pimentel é um dos destaques da Frieze Masters, feira que reúne mestres da história da arte contemporânea, que acontece de 14 a 18 de outubro, no Regent’s Park, em Londres. Segundo o site da feira, Wanda Pimentel possui uma importante e reconhecida trajetória artística de quase 50 anos. Ela apresenta na feira  de Londres nove pinturas produzidas nos anos 1960.

 

No Brasil, o trabalho da artista pode ser visto no Rio de Janeiro, na Anita Schwartz Galeria, na Gávea, onde ela apresenta, até o dia 17 de outubro, a exposição

 

“Geometria/Flor”, ocupando todo o espaço expositivo da galeria com pinturas, desenhos e esculturas inéditas. Os trabalhos da exposição têm a ver com um processo iniciado pelo artista em 2011, de rever o passado.

 

“Esses trabalhos tem um tom dramático, têm a ver com as minhas memórias, mas, ao mesmo tempo, é uma saudação à vida, rompendo com tudo que já fiz. Vou dissecando lembranças e construindo novas memórias”, afirma a artista.

A cor fremente de Gonçalo Ivo

28/set

A Galeria Simões de Assis, Curitiba, PR, inaugura exposição individual de pinturas de Gonçalo Ivo. O catálogo desta nova exibição traz textos assinados pelo escritor angolano – também artista plástico – Valter Hugo Mãe e Felipe Scovino, crítico de arte e curador que responde pela apresentação do artista expositor.

 

 

Sobre o artista

 

Não apenas mais um colorista

Felipe Scovino

 

Duas pesquisas ou situações simbólicas me chamam a atenção na experiência de presenciar o trabalho de Gonçalo Ivo: a sua capacidade de criar módulos distintos de experiência cromática em suas telas e a abertura para a ideia de uma partitura na maneira como compõe, e aqui leiam com o duplo sentido que essa palavra pode ter (fazendo um enlace tanto com a composição de uma música quanto a ideia de criação que ela também possui), a aparição da linha.

 

E isso não é pouco. Imagino que o leitor desse texto deva estar cansado da quantidade de subterfúgios e pouca vitalidade que uma parcela da chamada pintura contemporânea possui. Gonçalo se mantém à parte disso. Sua obra transita entre dois mundos muito próprios da história da arte brasileira e mundial. Suas referências internacionais variam entre a delicadeza e o misterioso abstracionismo de Paul Klee, a experiência arrematadora do abstracionismo geométrico de Vieira da Silva, a cor-luz pulsante de Rothko e os color fields de Barnett Newman, para me ater a alguns. No campo brasileiro, sua pesquisa cria conexões com a passagem entre o moderno e o contemporâneo, o ponto paradigmático da experiência de maturidade da arte brasileira. Estou me atendo ao período de aparecimento, ransformação e quiçá diferença que as obras de matriz construtiva introduzem de forma ampla no país. É a geração de Hércules Barsotti, Hermelindo Fiaminghi, Ivan Serpa, Volpi e Willys de Castro.

 

Acredito que foram guias espirituais, mestres, que Gonçalo acompanhou atentamente e que deles, entre outros, extraiu a essência de suas pesquisas e simultaneamente criou, Gonçalo, a sua própria trajetória. Percebam a semelhança e ao mesmo tempo as marcas pessoais de Volpi e Gonçalo ao compararmos a série “Ogiva” do primeiro e o tríptico azul em madeira realizada pelo último e exposto nessa mostra. A imagem de uma arquitetura religiosa, a relação não fortuita entre espaço e plano e finalmente a tridimensionalidade da pintura são pontos em comum, além da experiência com a têmpera, técnica renascentista, artesanal, utilizada pelos dois pintores em suas obras. Contudo, penso que aqui Gonçalo cria o seu caminho próprio. É a experiência com a cor que traduz isso. O artista cria uma corporeidade para a cor; não da forma como Hélio Oiticica fez e relata em seus textos mas como uma cor que possui matéria e significativamente espessura, “odor”, pois ela é toda corpórea, física, maleável. Há um fascínio ou investimento para que o olhar se converta em algo tátil. E mesmo quando a expande para o espaço, com seus objetos em madeira, que por sua vez criam um diálogo interessante e consistente com arte africana, há um desejo de continuar falando sobre pintura e não exatamente sobre tridimensionalidade ou escultura.

 

É perspicaz o fato de que Gonçalo particulariza os módulos de cor em sua pintura. Faz uso de um vocabulário geométrico mas não é exatamente a forma abstrata, imagino, a sua real preocupação mas as (inúmeras) qualidades e aparições que a cor venha a possuir. Para cada campo que constrói a cor ganha um significado e uma aparição ao mundo muito própria: pode se exibir com uma matéria áspera, suave, delicada, retraída, pulsante. É a maneira como orienta as pinceladas e o número e a forma como realiza as investidas de tinta sobre a tela que fazem essa percepção de que a cor em Gonçalo seja sempre diferente.  Não há separação,também, entre tela e moldura, pois esta é criada à revelia pelo artista. É comum vermos linhas verticais pintadas lado a lado definindo o que seria o papel da moldura. É na aparição da linha, por sinal, que assistimos à gestualidade do artista e seu embate com um suposto entendimento de que a pintura geométrica é racional e rigorosa. Está lá, na pintura de Gonçalo, assim como em Mondrian, guardadas as devidas especificidades de cada obra, uma linha torta e assumidamente humana. Descrevendo outra qualidade da linha de Gonçalo, percebemos o quanto ela é harmônica e musical. Aliás, a aproximação entre música e pintura já fica evidente na escolha dos títulos das obras (contraponto, acorde, prelúdio, etc). A  qualidade intervalar que é construída por meio dos módulos de cor me leva a crer que suas pinturas, agrupadas em um conjunto, podem ser lidas também como uma partitura. As linhas como notas a serem lidas que logo reverberam uma melodia que atravessa o espaço em que essas obras estejam habitando. É algo mágico e inventivo perceber essas centelhas que têm uma função inacreditável: nos tornar mais sensíveis ao que nos cerca, percebermos um instante de crença no homem para além da barbárie que assistimos todos os dias. Claro, não há som mas a ideia de que possam ser percebidas para além de sua materialidade e possam, portanto, criar vida em um outro regime, agora de escuta, é sensacional. Ampliar essa capacidade da pintura é demonstrar que, a contragosto de alguns, a pintura não morreu. Pelo contrário, o artista nos ajuda a entender que há muitos caminhos, sentidos e existências para essa técnica milenar. Portanto, a obra de Gonçalo não se traduz como um exercício de persistência da geometria ou de balancear, contrapor e/ou associar cores mas fundamentalmente provocar um estado de inovação do campo pictórico e associá-lo às mais distintas imagens e qualidades. Repito: a fabricação dessa operação não é para muitos.

 

 

Cromatismo

Valter Hugo Mãe

 

Por vezes imagino que nos salvamos de toda a matéria e viramos apenas identidades que
habitam a cor. A cor é um substantivo da matéria. Tenho sempre a impressão de que se rebela contra adjetivá-la e se torna tudo, como um ser que espera. As cores esperam. Enquanto lemos a luz, a cor torna-se alguém. Sabe coisas e é alguém. Um dia, desintegrados, talvez sejamos esplendorosa e unicamente participações na luz. A pintura de Gonçalo Ivo é mais do que um estudo da cor, é uma escola para a cor. Ali, ela aprende. Amadurece, como animal efectivamente caçado, que não pode mais deixar de assumir sua evidência no mundo. Cada tela é uma classe, feita de superior mestria, onde a luz incide para se adorar já não enquanto acaso mas enquanto inteligência. É esta a diferença entre a cor por consciência e a casual. O trabalho de Gonçalo Ivo, cientista desta arte, é um modo de revelação, não enquanto delirante tentativa mas exatamente enquanto pronúncia de sábio que chega cada vez mais perto do que não se podia ver. As suas telas existem como provas de um gesto de luz semelhante ao gesto de Deus. A luz sabe o que faz. Nas telas de Gonçalo Ivo a luz aprende a fazer.

 

 
A arte deixa cair o figurativo porque a realidade exposta já não é suficiente, talvez nunca o
haja sido e a insatisfação dos artistas esteve sempre comprovada, até tragicamente. A
libertação da arte em relação à obrigação de representar, ou de apresentar cabalmente o seu significante, é fundamental para adentrar um espaço mental, que não deixa de ser também uma dimensão da realidade, caracterizado por uma imprecisa questão para uma ainda mais imprecisa resposta. Chegar à questão é o desafio, obter alguma resposta é a absoluta improbabilidade. O trabalho de Gonçalo Ivo pode ser a negação total da matéria para que a alma de cada coisa se liberte apenas no comportamento da luz. Neste sentido, faz-me sentir como a espiritualidade de tudo. Uma espiritualidade bastante que advém exclusivamente do poder da arte. Salvas da sua contingência material, todas as coisas se apresentam como atributos apenas mentalmente consideráveis, que é modo racional, pragmático, para se referir questões de alma. Gosto de pensar que as telas de Gonçalo Ivo são o despido dos corpos, corpos nenhuns, porque ainda assim se manifestam de modo fremente, o que comprova a sua intensa existência, como intensas podem existir outras realidades também insondáveis.

 

 
Aquém da transcendência, muitas coisas são suficientemente transcendentes, vulgo, coisas da arte. Aludindo à ideia de despir matéria, a pintura de Gonçalo Ivo lembra tecidos, isso que as manualidades inventaram para protecção e adorno e que se faz do intrincado de fios ínfimos. A ideia de intrincado interessa-me. Ainda que nos deparemos com a impressão de uma limpeza tremenda, o rigor da pintura de Ivo é uma forma de virtuosa ourivesaria da cor. Igual a facetar um diamante, o ofício deste pintor é o de depuração do comportamento da luz. Sim, como dizia, as suas telas são escolas para a cor. Ela, ali, aprende.

 

O belo poeta Martin Lopez-Vega (no perfeitíssimo catálogo Contemplaciones, editado na
Espanha pela Papeles Mínimos) diz que nas telas de Gonçalo Ivo, profundamente planas, não há relevo, apenas geografia. Gosto muito. Tudo passa a ser sobretudo um lugar, como se pudéssemos efetivamente entrar num espaço sem, contudo, nada se definir por inteiro. Somos acolhidos, mas o que nos acolhe é a pura liberdade. Se as suas telas fossem tecidos, estaríamos sob eles ainda que o ato de observar nos crie a sensação de permanecermos sobre ou diante das coisas. Na arte, e porque é uma transcendência específica, o dentro e o fora, o cima e o baixo, podem simplesmente ser predicados inutilizados. Na arte, e porque provavelmente é a única transcendência existente, o dentro e o fora, o cima e o baixo, podem simplesmente ser predicados inutilizados. Tudo no trabalho de Gonçalo Ivo o explica. Essa convicção de que, na geografia, existe afinal caminho para o lado de lá da matéria, como aferição de uma alma, como passeio pela luz, colhendo cores igual a quem colhe um ramo generoso de rosas. Amo rosas.

Porto, 12 de abril de 2015.

 

 

De 01 a 31 de outubro.

Dois na Galeria Mezanino

21/set

A Galeria Mezanino, Pinheiros, São Paulo, SP, inaugura as exposições individuais “Meu sertão” de Nilda Neves, com pinturas e “Lágrimas artificiais” de Emídio Contente com fotografias. A apresentação da pintora baiana é da curadora Eugênia Gorini Esmeraldo e a do fotógrafo paraense Emídio Contente traz a assinatura do expert da área, o curador Diógenes Moura.

 

“Não deixar o sertão morrer”. Esta foi a explicação imediata e objetiva que recebi de Nilda
Neves ao perguntar sobre a razão de suas pinturas. Não é para menos, uma vez que ela ilustra suas lembranças e histórias com precisão de detalhes. E foi para fazer a capa de seu primeiro livro – ou seja, ela também escreve – que começou a pintar. Sua marca é o mandacaru. As pintoras sem formação acadêmica são inúmeras no Brasil, afora a infinidades de amadoras que se dedicam à pintura desde sempre. Isso se considerarmos apenas as mulheres que, ao longo do tempo, em fuga da solidão da rotina doméstica, por vezes buscam na potencialidade dos pincéis uma forma de desabafo, alívio, reconhecimento das pessoas mais próximas e, talvez, uma certa alegria interior. Algumas, corajosas e desafiadoras, voam mais alto, conseguem ultrapassar o recinto caseiro e ousam se manifestar com maior intensidade e fantasia. Elas precisam do olhar do público para se sentirem participantes do mundo. O trabalho de Nilda Neves, traz à lembrança três Marias artistas: Maria Auxiliadora da Silva, Maria Florência e Maria de Lourdes Indelicato. A primeira, negra, egressa da Praça da República, foi descoberta pelos colecionadores. Florência já tinha idade e fazia pequenas pinturas, delicadas, em geral de flores. Lourdes era dona de casa, nordestina casada com um italiano, se inspirava nas lembranças de sua região com um certo folclore. Nilda e essas Marias, de quem poucos lembram, o que as leva a tomar esta decisão de pintar? Sobre Nilda, a primeira informação foi de uma ‘cabelereira’ que pintava e expunha suas obras no próprio salão. Renato De Cara mostrou as pinturas, os desenhos e fomos conhecer. Numa rua de poucas centenas de metros, uma insólita cabeceira de cama coberta de pinturas, colocada na calçada, antecipa que é ali. Sobe-se dois degraus e o salão minúsculo abriga uma infinidade de trabalhos que confunde o olhar. A mulher forte, risonha, bonita e decidida que se apresenta foge do estereótipo das que não sabem direito o que estão fazendo. Nilda sabe, e bem, a que vem. Não teve uma vida fácil, como muitos nordestinos que procuram o sul. Mas ela é diferente. Nilda nasceu no interior baiano, em 1961, em Botuporã. Desde menina, curiosa, teve interesse por história e cultura. Quando jovem ajudava o pai em todos os trabalhos, inclusive nas boiadas. Sabe montar e vaquejar. Estudou, casou, teve filhos, lecionou matemática. Em São Paulo desde 1999, trabalhou no comércio. Como as pessoas gostavam de suas histórias, decidiu escrever um livro. A pintura veio da necessidade de ilustrar a capa. Gostou e não parou mais. A leitura de seus dois livros, numa linguagem falada muito pessoal, mistura acontecimentos pessoais com lendas de sua região, com simplicidade em descrições que, muitas vezes, ilustra depois nas pinturas. Nos trabalhos Nilda utiliza o óleo com base em tinta acrílica. A temática é prolixa como ela: vasos de flores, temas do sertão, de suas lembranças e vivências. As cores, sem exagero como as do sertão, são sóbrias e algumas obras lembram grafismos. Cenas do campo, lendas do imaginário popular brasileiro, animais, paisagens, vaqueiros, cactos – palmas, mandacarus, xique-xiques – surgem floridos com ingenuidade; ela também insere flores delicadas nas árvores. Algumas obras mostram o interior de casas, paióis, o cotidiano rural com uma intenso rodeio e mesmo uma comovente cena de igreja. A presença familiar é forte, frequente e ela credita aos pais a formação sólida, que a fez gostar e ter esta consciência de pertencimento àquela região, apesar de viver longe dali. E vem à mente até mesmo algo de Frida Kahlo e suas auto referências corpóreas. Mas o corpo que Nilda foca é a natureza, em constante ameaça.

 

Duas pinturas me impactaram pela estranheza e uma fantasia muito própria, agressiva.
Imediatamente lembrei uma experiência pessoal de anos atrás que nunca esqueci: uma
gravação com a grande Tarsila do Amaral, feita por Paulo Portella Filho aos 18 anos, que ele me fez ouvir. Jovem e, como disse ele, ingênuo, ousou perguntar-lhe de onde viera a figura do Abaporu; a artista respondeu-lhe que eram as lembranças que ela tinha da infância, quando as criadas, na fazenda, faziam relatos dos monstros que vinham à noite assustar as crianças que não se comportavam… Perguntei a Nilda sobre as duas obras. Foi direta: “Esta é uma raiz da árvore queimada pelo homem que se revolta e se torna monstro. É a revolta da natureza, como eu chamo”. A outra é sua visão da floresta sendo engolida pelo fogo e retornando como um espectro disforme. Em ambas estão suas angústias pessoais. Nilda é clara: quer mostrar o perigo do desequilíbrio ecológico, da falta de cuidado do homem com seu habitat, com o mundo. Só posso desejar que ela persista, e permaneça. Como ela diz: “o trabalho é a base que me segura perante o mundo…”

Enfim, pintar é realmente a necessidade de mostrar a todos que o sertão é forte, bonito, sua gente é boa e isso não pode ser esquecido.

 

Eugênia Gorini Esmeraldo/agosto 2015

 

 

Sobre a artista

 

Nilda Neves, Botuporã, BA, 1961  – Nasceu em 1961 em Botuporã, no sertão da Bahia. Em Brumado, BA, estudou contabilidade e teve seu segundo filho. Com a família morou em várias cidades do estado e, ao divorciar, voltou para sua cidade natal, onde foi professora particular e de escola pública, ensinando matemática. Chegou a ter restaurante, fazendo muito sucesso. Perdendo parte da família nos anos 1990, resolveu vir para São Paulo em 1999 e, em 2010, escreveu o romance O Lavrador do Sertão em três dias. Logo depois lançou O Belo Sertão, com os seres lendários do Brasil, na Bienal do Livro do mesmo ano. Para produzir a capa do livro resolveu ela mesma pintar e, desde então, não parou mais de produzir, contando suas lembranças e histórias do sertão. Hoje, em seu pequeno ateliê, possui um acervo com mais de 2.000 pinturas, além de músicas e esculturas.

 

 

Uma programação química

 

 
Lágrimas Artificiais é um experimento. Emídio Contente vasculhou um bulário médico-
oftalmológico para chegar diante dos olhos dos outros, que são os seus mesmos olhos e
refletir sobre a existência humana, o corpo líquido, a chama das imagens que derretem
segundos – um após o outro e nos faz perceber a linha tênue que se instala entre o modo ver e o modo enxergar. O artista se importa com a nossa existência. Busca uma saída. Imprime olhossob o efeito de drogas: dilatadores de pupilas, a janela aberta, remédios para gripe, cocaína, o ônibus do outro lado da rua, maconha, a última notícia no telejornal, o lindo sonho delirante, o encontro fortuito no meio da madrugada, Ritalina para concentrar os resquícios do amanhã, o sexo desnudo porque se você falar em amor eu vou embora, a pífia solidão como material de consumo. Imprime lembranças de sua terra natal, Belém, porque guarda na memória a imagem do seu avô em estado de luta diária para vencer o tempo: os olhos de cera (ex-votos) sobre a mesinha ao lado da cama. Uma promessa atrás da outra para que Nossa Senhora de Nazaré não se derreta entre as velas do Círio, quando o que mais todos os santos desejam atualmente é descansar de todos nós. A fotografia empalidece.

 

 
O tempo de Emídio Contente é um tempo em camadas. Sua “arte contemporânea” é barroca: azul sobre o corpo infectado ou em estado puro, impresso sobre folhas de atlas de anatomia. Algo se decompõe/outro algo se renova: o homem derretido, o símbolo das almas. Uma impressão descansa sobre a outra para fazer surgir o terceiro olhar. Cianotipia sobre a droga descrita na página impressa. O artista frequenta o Hospital das Clínicas. Vive nos arredores. Vasculha as esquinas da cidade e os sebos em busca de livros científicos de todos os tempos.Aprisiona um pequeno animal dentro de um vidro/a transparência do vidro (seria uma falsa liberdade?) que rola na beira da praia até ser engolido pelo azul de noturno mar. Antes, pensou assim: onde verdadeiramente estaria a simbologia de uma pomba com seus olhos de cristal bruto, o sentimento petrificado? Mais adiante, ali, pairando sobre o portão de entrada? Ou taxidérmica, em sua solidão impregnada, em seu estado cristão de pureza e simplicidade e mais adiante semeando a paz, a oxoplasmose, a criptococose, a psitacose, a cegueira?

 

Emídio Contente ainda tem esperança. Mesmo que suas lágrimas sejam artificiais.

 

Diógenes Moura/Escritor e Curador de Fotografia

 

 

Sobre o artista

 

 
Emídio Contente, Belém, PA – 1988 – Fotógrafo e artista visual paraense, graduado em comunicação social. Seu trabalho possui uma poética singular, utilizando-se de uma fotografia adulterada, com técnicas fotográficas pouco convencionais, para abordar um universo delicado, denso e algumas vezes melancólico. Na série Cobogó, por exemplo, se utiliza de furos de tijolos como recurso para a construção de uma câmera, criando um plano dividido em seis imagens distintas que remetem ao olhar decupado do cubismo e da película cinematográfica.

 

Exibiu suas obras em coletivas e salões de arte como IV Prêmio Diário de Fotografia (2013); Salão Arte Pará (2012); XIX Salão Unama de Pequenos Formatos (2014); Muestra Internacional de la Fotografia Estenopeica (México / 2012); Muestra Internacional de la Fotografia Estenopeica (Equador / 2013); Ruídos e Silêncios: Corpos Flutuantes (2013); 100menos10 (2012) e Indicial: Fotografia Contemporânea Paraense (2010) Em 2012 recebeu o Grande Prêmio da Mostra Primeiros Passos (MABEU), em 2013 foi premiado no IV Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia e também em 2013 foi o vencedor da categoria fotografia do Movimento Hotspot. Possui obras nos acervos do Museu de Artes Brasil Estados Unidos/MABEU, Associação Fotoativa e Museu de Arte Contemporânea Casa das Onze Janelas.

 

 

De 22 de setembro a 10 de novembro.