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AGENDA CULTURAL

O livro de São Sebastião

Anita Schwartz Galeria de Arte, Gávea, Rio de Janeiro, RJ, apresenta a partir de 14 de dezembro próximo a exposição “O livro de São Sebastião”, com trabalhos inéditos e feitos especialmente para o espaço da galeria pelo artista pernambucano Bruno Vilela, que desde 2001 é atuante na cena nacional e internacional. Serão apresentadas 15 pinturas, das quais sete óleos sobre tela e oito trabalhos sobre papel, nos quais Bruno Vilela utiliza diversas técnicas, desde a sobreposição da tinta óleo ao pastel seco e carvão, ao uso da folha de prata. As obras dão sequência à pesquisa do artista sobre arquétipos e mitologias, em que desta vez se aprofunda no universo judaico-cristão e no hermetismo.
“Pintar é uma maneira de reproduzir as imagens do inconsciente em uma tela. Na impossibilidade de se fotografar sonhos e pesadelos, é possível entrar em estado de sonho através da pintura”, conta Bruno Vilela, que aborda o universo onírico, e investiga memórias ancestrais e pessoais. “Esta exposição é como um livro. Seus textos foram perdidos. Mas suas ilustrações sobreviveram”, diz ele.

 

Artista que passa até onze horas no ateliê, Bruno Vilela foi tema de um episódio da série “Se Cria Assim”, do cineasta Cláudio Assis, dirigido por Beto Brant. Com 26 minutos de duração. O filme exibido este ano no canal Arte 1 será projetado no contêiner localizado no terraço da galeria. Além de dois livros de artista – “Animattack” (2014) e “Vôo Cego” (2010) – Bruno Vilela estreou ano passado na ficção, com o romance “A sala verde”, escrito após 70 dias cumprindo residência artística no Palácio do Marquês de Pombal, em Lisboa, a convite da instituição Carpe Diem Arte e Pesquisa. A publicação de 166 páginas, que inclui pinturas e montagens feitas pelo artista, estará à venda na galeria, durante o período de exposição, por R$ 35,00.

 

A cada série de trabalho Bruno Vilela usa um caderno onde anota ideias, o que lê, filmes que assiste, com o registro daquele período e produção. Ele colocará à disposição do público para leitura e manuseio o caderno que acompanha este trabalho “O livro de São Sebastião”.

 
Obras
A exposição segue uma narrativa misteriosa em muitas medidas, após estudo do espaço da galeria, para dispor seus trabalhos de acordo com esta narrativa, dividida em cinco capítulos. As obras ocupam o grande piso térreo, a escada, e o segundo andar. No diagrama feito pelo artista, ele comenta cada trabalho. A seguir, um resumo desses comentários:
(Cap. 1)
O Divã (2016, óleo e carvão s/ papel, 115cm x 150cm) – Uma visão da sala de Freud e seu divã. Para mim os sonhos e pesadelos são uma espécie de teatro, ou cinema fantásticos. Hiperfantásticos. O realismo mágico na pele. Com a prática é possível ter cada vez mais consciência durante os sonhos e aumentar o poder de memória de suas “cenas”.

 

Fio de prata (2016, óleo s/ tela, 90cm x 200cm) – Já houve o descolamento do corpo com o espírito. A alma entra na escuridão e fundo se avista a floresta do subconsciente. Um salto no vazio. A lua aparece no lugar da cabeça. É a luz para iluminar a escuridão da noite.

 

Moisés (2016, óleo e pastel seco sobre papel, 60cm x 80cm) – Uma luz sai de uma fenda na montanha. É o Monte Sinai. Referência ao momento em que Moisés vê a Sarça ardente e conversa com Deus. Tem alguma coisa lá longe na paisagem. O que tem dentro daquela fenda? Daquela caverna?

 

A Virgem dos Rochedos (2016, óleo sobre tela, 189,5cm x 120cm) – Lembrança da pintura de Da Vinci vista na National Gallery, em Londres. Não se vê os seres encantados, só suas auréolas.
(Cap. 2)
Maria (2016, óleo e carvão sobre papel, 65cm x 80cm) – Maria. Os ossos sagrados que nunca desaparecem. O útero é a caverna escura e a auréola o símbolo da santidade que brilha na sombra.

 

Fabíola (2016, óleo s/tela, 180cm x 140cm) – O amor de São Sebastião está na exposição frente a frente com o urso, na mesma altura dos olhos encarando o animal. Ela não tem os dois dedos, indicador e médio, fundamentais para um arqueiro. Os franceses arrancavam os dois dedos dos arqueiros ingleses. Por isso, levantar esses dois dedos na Inglaterra, é uma ofensa. Já os ingleses arrancavam o dedo médio dos arqueiros franceses. Daí surgiu o gesto de levantar o dedo!
São Sebastião (2016, óleo s/tela, 140cm x 190cm) – O urso. A resiliência. Foi flechado e não morreu. Foi um dos personagens centrais do romance “Fabíola” (“A Igreja das Catacumbas”), escrito em 1854 pelo Cardeal Nicholas Wiseman. Na minha desconstrução do mito o urso acha que foi flechado, mas não foi. Ele criou seu próprio sofrimento. A explicação está na arqueira, Fabíola, que não tem os dedos indicador e médio.
O Anjo (2016, carvão sobre papel, 92cm x 114cm) – Existem muitas referências a discos voadores na Bíblia. E uma vasta pesquisa em diversos livros como no clássico: “Eram os Deuses Astronautas?”, de Erich von Däniken.

 

 

(Cap. 03)
Paradise Lost (2016, óleo e pastel seco sobre papel, 80cm x 110cm) – “Paraíso Perdido”, escrito por John Milton, originalmente publicado em 1667 em dez cantos. O poema descreve a história cristã da “queda do homem”, através da tentação de Adão e Eva por Lúcifer e a sua expulsão do Jardim do Éden. Uso a imagem das placas Pioneer, que foram colocadas a bordo das naves espaciais Pioneer 10 (1972) e Pioneer 11 (1973), com uma mensagem pictórica que possa ser interceptada por vida extraterrestre ou até mesmo humanos do futuro. As placas mostram as figuras nuas de um homem e uma mulher. Na minha mitologia pessoal fazem o papel de Adão e Eva. Atrás vemos a árvore da Ciência do Bem e do Mal (“Gênesis” 3:22).

 

Red Right Hand (2016, óleo sobre tela, 150cm x 120cm) – A mulher com a espada é a versão feminina do Arcanjo Gabriel. “Red Right Hand” é uma música de Nick Cave baseada num texto de John Milton, “Paradise Lost” (1667). A mão vingativa de Deus. O Arcanjo em forma de mulher. A unha da mão vermelha é branca, e a unha da mão branca é vermelha. Yin & Yang circulando no corpo. A bengala é de preto velho. Para Milton, antes de serem expulsos, Adão e Eva receberam uma revelação do Arcanjo Gabriel sobre o horror que o homem cometeria ao longo da história da humanidade.

 

O Pontífice (2016, óleo e folha de prata sobre tela, 90 cm x 130 cm) – A Ponte do Diabo ou Ponte Mizarela, localizada na fronteira de Portugal com a Espanha, na Serra do Gerês. Segundo o mito um fugitivo da justiça se vê aos pés de um penhasco, onde abaixo passava um rio cheio de pedras. Apelou para o Diabo que construiu a ponte, em troca lhe ofereceu a alma. Depois de escapar, a ponte é derrubada pelo demônio e seus perseguidores não podem lhe pegar mais. Depois do ocorrido, aflito pelo que fez, o ladrão pede a ajuda de um padre. Esse o faz invocar novamente o criador da ponte. E lhe pede que a construa novamente. Ele faz sua vontade e levanta a ponte. Então surge o padre lhe joga água benta, fazendo o anjo do mal desaparecer. A ponte foi construída pelo Diabo, mas mantida pelo emissário de Deus. O padre, O Pontífice. Que como Mercúrio, Hermes, Exu e Pã, faz a ligação entre o mundo dos mortais e o Divino. A ponte simboliza essa passagem. A aureola é feita de folha de prata, forma o símbolo do infinito, ou a fita de Möebius, junto com o vão da ponte.
O Dilúvio (2016, óleo sobre tela, 110cm x 140cm) – O Fechamento. A balsa de salvamento é arremessada ao mar e o barco naufraga. No fundo vem vindo a tempestade, que já molha a tela, a visão do observador, com o escorrido da tinta. Representa O Homem, Adão e Eva, a humanidade. Expulsos do paraíso perdido.

 

(Cap. 04)
A escada de Jacó (2016, carvão s/ papel, 80cm x 60cm) – Esta obra fica na escada da galeria e faz a ponte entre o térreo e o segundo andar. O espectador vê e sente a passagem na própria escada que está prestes a subir para encontrar as duas últimas obras.
(Cap. 05)
A Terra (2016, carvão mineral e folha de ouro s/papel, 140cm x 115cm) – Do pó ao pó. A lembrança do mundo clássico grego no jarro de cerâmica. A terra presente no jarro é eterna, como os ossos, nunca desaparece. De dentro sai flutuando, com o mesmo diâmetro da boca do jarro, a serpente. Ouroborus. Aquela que se arrasta pela terra.

 

O Céu (2016, carvão mineral e folha de ouro s/papel, 140cm x 115cm) – No livro sagrado do hermetismo, o “Caibalion”, o primeiro e mais importante dos sete preceitos herméticos é:” O todo é mente. O Universo é mental”. A Deusa tem o rosto solar. O Sol é representado pelo ouro em diversas civilizações. A pedra filosofal dos hermetistas, que se disfarçavam de alquimistas (químicos de suas épocas), transformava metais pesados em ouro. Mas isso era uma metáfora pra transformar sentimentos e mentes primitivas e vulgares em luz através do conhecimento. O ouro, o sol, a luz, são o conhecimento divino. Na arte hermética e alquímica o sol é representado pela figura humana de um homem ao lado de uma mulher com a lua no rosto. Aqui eu subverto essa imagem clássica do misticismo e fecho essa história, não linear, fruto de um sonho, simbólica e espiritual, com as últimas palavras de William Turner no leito de morte: “Deus é o Sol”.

 
Sobre o artista
Bruno Vilela nasceu em Recife, 1977, onde vive e trabalha. O artista participa de mostras individuais e coletivas no Brasil e no exterior deste 2001. Seu trabalho integra coleções como a do Centro Cultural São Paulo, Banco Mundial, em Washington, Centro Dragão do Mar, e Centro Cultural do Banco do Nordeste, em Fortaleza, Museu de Arte Moderna Aluísio Magalhães (MAMAM), Fundação Joaquim Nabuco e Museu do Estado de Pernambuco, em Recife. Das exposições individuais realizadas, destacam-se “A Sala Verde”, Palácio Pombal, Carpe Diem Arte e Pesquisa, Lisboa/Portugal, “ELA”, Dragão do Mar, Fortaleza, em 2015; “Dia de festa é véspera de dia de luto”, Paço das Artes, São Paulo, em 2013; “O Céu do Céu”, Museu do Estado de Pernambuco, Recife, em 2009; “Bibbdi Bobbdi Boo”, Galeria Massangana, FUNDAJ, Recife, em 2008; “Réquiem sobre papel”, Museu Murilo La Greca, Recife, em 2006. Dentre as coletivas selecionadas, estão “Orixás” Casa França Brasil, Rio de Janeiro, 2016; “Art from Pernambuco”, Embaixada do Brasil, Londres, 2015; “New Brasil Bolivia Now”, Memorial da América Latina, São Paulo, 2013; “Metrô de superfície”, Paço das artes, São Paulo, 2012; “World Bank Art Program”, Washington, e “Jogos de guerra”, Caixa Cultural Rio de Janeiro, 2011; “Investigações Pictóricas”, MAC Niterói, 2009, 58º Salão de Arte Contemporânea do Paraná, MAC, Curitiba, e Prêmio Internacional de Pintura de Macau, IMM, Macau, China, 2001.

 
De 14 de dezembro a 04 de março de 2017.

 

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