RAFAEL ALONSO EM CURITIBA

19/jun

A SIM GALERIA, é um dos mais novos espaços dedicado à arte contemporânea em Curitiba, Paraná. Agora, dando curso na  programação, será a vez de mostrar os trabalhos do jovem Rafael Alonso com a exposição individual de pinturas denominada “Repetidor”. O texto de apresentação é assinado pelo crítico de arte Fernando Cocchiarale. O projeto e a coordenação é de Flávia Simões de Assis e Waldir Simões de Assis Filho.

 

 

Texto de Fernando Cocchiarale:

 

De um ponto de vista histórico a pintura poderia ser mapeada a partir dos diferentes métodos e técnicas de representação do espaço, desenvolvidos ao longo de dezenas de séculos, por diversas civilizações. Um afresco egípcio, mural romano ou tela da Renascença, seriam identificáveis a partir de sistemas de pintura comunitários distintos e claramente manifestos em suas configurações finais. Por conseguinte, nada de arbitrário havia em cada um desses sistemas, posto que expressavam o olhar comunitário, por meio de regras comuns (antes o olhar individual do artista se tornar o fundamento de seu próprio sistema).

 

Não se pode falar de pintura egípcia, sem que se mencione seu sistema. Nele não existiam estilos pessoais; tampouco sutilezas ou evidências de um sujeito-artista que quisesse deixar no mundo suas marcas pessoais. A lei da frontalidade estabelecia padrões de representação espacial tanto de figuras humanas, animais, plantas e objetos, estritamente respeitados por todos os pintores.

 

A pintura renascentista, em que surgiram os primeiros estilos individuais, também possuía um sistema baseado na perspectiva do sombreado. O respeito às características planares objetivas da tela pela arte moderna foi o último sistema de pintura minimamente fundamentado a surgir antes da emergência da produção contemporânea.

 

Tal ausência de sistemas de pintura, atualmente, não favoreceu a produção de um sentido comum (de fundo) que salvaguardasse o arbítrio das diferentes expressões individuais hoje em curso na produção artística. O pintor agora deve inventar seu próprio sistema e torna-lo visível ao olhar público. Esse é o desafio maior não só da pintura, como também da produção contemporânea.

 

Dentre os jovens pintores do país Rafael Alonso é um dos que melhor compreenderam a necessidade de produzir e fazer ver suas pinturas a partir de um sistema. Rafael tornou-se conhecido ao pintar sobre quadros de cantos arredondados faixas idênticas às produzidas com fita adesiva marrom para embalagem usada pelos vendedores de bebidas para proteger a tampa do isopor de pancadas.

 

Entre a pintura e o isopor Alonso estabeleceu relações tanto pictóricas (a pincelada que corre horizontal, num gesto manual, mas mecânico, o teor planar da tela e do isopor) quanto semânticas (a relação entre sua pintura – aparentemente abstrata – e situações pictóricas evocadas por objetos reais planos como telas. Nessa transmutação de telas reais com que convivemos diariamente e as pinturas do artista encontra-se o fundamento de seu sistema pictórico.

 

Não há dúvida que Rafael pinta o nosso mundo. Mas não o abstrai como os modernistas o fizeram (já que seus referentes reais se insinuam na configuração das pinturas), nem o representa, tal como os clássicos. Ele faz migrar pela pintura, de modo ilusionista, fragmentos da dimensão planar do cotidiano, para o quadro.

 

As pinturas que Alonso agora apresenta, trabalhadas no último ano e meio, são, conforme suas próprias palavras, “uma tentativa de produzir uma pintura que se relacione com os objetos do design que me cercam, mais especificamente computadores, monitores de TV, tablets. Objetos que hoje mais do que em qualquer outro momento servem como mediadores das imagens, de nosso contato com o mundo.”

 

São, portanto, imagens planas, de objetos planos (mediadores de imagens), feitas manualmente. Trata-se do mesmo sistema de ocupação espacial utilizado nas pinturas das fitas adesivas aplicadas sobre isopores de ambulantes.

 

Seus trabalhos recentes, no entanto, não mais evocam o Brasil precário, mas aquele globalizado pela tecnologia. Rafael Alonso investiga sua configuração mais frequente na vida diária – tabuletas, tablets − com múltiplas e coincidentes funções que povoam-na de luzes. Sua transposição às pinturas consiste na mais recente manifestação do sistema por ele inventado.

 

De 21 de junho a 30 de julho.

 

ERNESTO NETO

18/jun


Aliança - Ernesto Neto

Nova exposição individual de Ernesto Neto no Rio e São Paulo.  A mostra intitulada “Não Tenha Medo do Seu Corpo” acontecerá simultaneamente na Galeria Fortes Vilaça, Vila Madalena, e no Galpão Fortes Vilaça, Barra Funda,  com trabalhos inéditos feitos em crochê. A exposição terá um formato inovador, apresentando um perfil itinerante: a inusitada inauguração para convidados acontecerá no atelier do artista, no centro do Rio de Janeiro, onde as obras poderão ser apreciadas em seu local de criação original, viajando para São Paulo logo em seguida. Em agosto, haverá novo evento: uma conversa, aberta ao público, entre o artista e o curador Adriano Pedrosa.

 

Depoimento de Ernesto Neto sobre a exposição:

 

“No reino do objeto, do produto, da cultura, a obra propõe o ser vivo, a natureza como  protagonista da vida, da terra, do cosmo. A cultura é uma ferramenta não um objetivo, serve ao corpo que é o lugar da subjetividade, do prazer, da tristeza, da compreensão no mundo, a mente é parte do corpo, a cultura é parte da natureza, somos a natureza. Se nós criamos os objetos, natureza eles são, num computador tem mais natureza que numa caixa de fósforos, tudo que há na terra dela veio, somos só um veículo de nosso desejo e o desejo quer vida, seja num micróbio ou num organismo complexo, a natureza quer vida, o corpo pensa, e expressa o que somos, não há nada fora do corpo a paisagem é corpo a vida é corpo, não tenha medo do seu corpo!”.

 

 

Abertura

Atelier Ernesto Neto – Centro – Rio de Janeiro – RJ

30 de junho 2012  – das 20 às 22h

 

Local 1

Na Galeria Fortes Vilaça

Vila Madalena – São Paulo – SP

10 de julho a 18 de agosto

 

Local 2

No Galpão Fortes Vilaça

Barra Funda – São Paulo – SP

10 de julho a 18 de agosto

POLYANNA MORGANA NO IBEU

Convite exposição

A exposição individual “PolyTati Representações LTDA: life in concert, Vol. II”, de POLYANNA MORGANA, faz parte do edital de exposições 2012, do IBEU, Copacabana, Rio de janeiro, RJ. A mostra, que acontece na Galeria de Arte do IBEU, é uma instalação sonora site specific que reflete sobre o cotidiano da artista, que mora em Taguatinga e que faz diariamente o deslocamento para Brasília, DF. O título é uma referência ao ponto de partida para a realização do percurso: o escritório do pai de Polyanna, em Taguatinga, o PolyTati Representações Ltda. (que tem esse nome em homenagem as duas filhas – Polyanna e Tatiana). A instalação é composta por alto-falantes distribuídos em três painéis, que apresentam o som da paisagem sonora de três lugares diferentes do Distrito Federal: Taguatinga, a Estrada Parque e Brasília. Esses locais possuem sonoridades distintas. Em Taguatinga, há o som de comércio popular, buzinas, pessoas falando alto; a Estrada Parque apresenta um som de via expressa e Brasília revela uma paisagem sonora típica, onde se escutam passarinhos, carros ao longe e pessoas conversando à distância.

 

Duas pinturas colorfield traçarão os mapas de Brasília e de Taguatinga. As pinturas fazem uso da paleta de cores própria de cada uma das cidades, ou seja, em Brasília, como parte da herança arquitetônica moderna, a artista usa basicamente as cores branca, concreto, cinza e verde (da natureza). Já Taguatinga, que possui outra relação com o espaço urbano, Polyanna usa uma paleta de cores mais diversificada e vibrante, semelhante às cores das cidades do interior do Brasil.

 

“Quero criar um ambiente onde as pessoas possam caminhar pela Galeria Ibeu, e de alguma forma, construir uma experiência com a paisagem representada ali. Todos os meus trabalhos partem, basicamente, de um mesmo entrelaçamento: o meu corpo e a cidade no dia-a-dia”, diz Polyanna Morgana.

 

Para Fernanda Lopes, curadora convidada para a exposição: A jovem produção de Polyanna é marcada por trabalhos com performances ou por obras, como desenhos e objetos, que resultam de uma ação performática da artista. Em PolyTati Representações LTDA: life in concert, Vol. II o corpo do outro também passa a ser incorporado ao trabalho, quando o público começa a reconstruir suas próprias paisagens a partir dos indícios de som e imagem apresentados pela artista e a partir das informações que chegam diretamente da cidade, através das grandes janelas localizadas no espaço expositivo.

 

Até 29 de junho.

GRASSMANN EM RIBEIRÃO PRETO

17/jun

A Galeria Marcelo Guarnieri, Ribeirão Preto, São Paulo, SP,  apresenta a exposição “Marcello Grassmann | Déc. 40 – Produção recente”. O recorte apresentado evidencia questões que sempre acompanharam a produção do artista: seres fantásticos e um universo mítico, partindo do desenho dos anos 40 até suas últimas produções. Junto aos trabalhos de Grassmann é mostrado a produção de artistas que iniciaram ou tiveram sua pesquisa em meados de 1940.

 

A década de 1940 é representada por um momento de transição na produção da arte brasileira, período entre duas rupturas: de um lado o Modernismo e do outro o desenvolvimento da arte construtiva. Nesse intervalo, alguns artistas remanescentes da vanguarda modernista e outros que começaram a sua pesquisa a partir de meados dos anos 40 produziram um significativo corpo de trabalho e tiveram uma substancial importância no cenário nacional e o que veio a se desenvolver posteriormente, alguns ficaram delegados a segundo plano – sendo revisados anos depois – e outros sempre mantiveram seu reconhecimento na História.

 

A exposição evidencia a produção de Marcello Grassmann e, entre seus desenhos e gravuras, será mostrado um apanhado de trabalhos de artistas que produziram ou que iniciaram suas pesquisas nos anos 40 – Flávio de Carvalho, Maria Leontina, De Fiori, Bonadei, Volpi, Rebolo, Zanini, Guignard, Pancetti, Dacosta, Portinari, Tenreiro. Com isso, há uma revisão de um período pouco mostrado no circuito profissional de arte.

 

Marcello Grassmann nasceu em 1925, em São Simão, São Paulo. Iniciou-se nas artes em 1932 no Instituto Profissional Masculino, SP. Frequentou o curso de entalhe, o que lhe parecia mais próximo ao ensino da escultura, na mesma época frequentou o curso de pintura e a partir de 1943 iniciou seu trabalho em gravura. No final dos anos 40 passa a residir no Rio de Janeiro, onde realiza sua primeira exposição. Em 1950 expõe na Escola Nacional de Belas Artes, 1951 na 1ª Bienal Internacional de São Paulo, onde obtém prêmio aquisição, 1952 no Ministério da Educação e em 1954 ganha no Salão Nacional de Arte Moderna, o Prêmio de Viagem à Europa. Ao longo dos anos vem participando de diversas exposições e bienais nacionais e internacionais. Seu trabalho sempre manteve uma coerência,  Grassmann tem uma produção de mais de 70 anos. O artista vive e trabalha em São Paulo, SP.

 

De 22 de junho a 28 de julho.

JASPER JOHNS – PARES TRIOS ÁLBUNS

15/jun

O Instituto Tomie Ohtake, Pinheiros, São Paulo, SP e a Universal Limited Art Editions, apresentam “Pares Trios Álbuns”, exposição individual de técnicas gráficas de Jasper Johns, um verdadeiro panorama da obra do artista, com cerca de 70 peças concebidas a partir da década de 1960. Técnicas fundamentais na experiência pictórica do artista, que mantém, pela ULAE, uma impressora dentro de seu ateliê, a gravura teve início com as litografias produzidas a partir de 1960, quase imediatamente após sua histórica exposição individual de pintura, na Leo Castelli Gallery, em 1958, considerada seminal da pop art, e a coletiva “16 Americans”, no MoMA, em 1959.

 

A mostra, com curadoria de Bill Goldston, revela as experiências de Jasper Johns com litogravura, gravura em metal e serigrafia enfatizadas pelo universo gráfico presente em suas obras, objetos banais, como bandeiras, números, letras, targets, mapas, etc. Segundo Tony Towle, poeta e antigo administrador da ULAE, que assina o texto do catálogo da exposição, “…os aspectos de adição e transformação, contidos no procedimento da litografia, influenciaram a maneira de pensar de Johns”. Ao artista interessava um novo ponto de vista sobre as coisas vulgares, como dizia, pelo fato de “uma coisa não ser o que é, de ela se tornar qualquer coisa diferente”. Artista precursor da arte pop, ao lado de Robert Rauschenberg (também apresentado no Instituto em 2009), de quem foi inicialmente vizinho e amigo, Jasper Johns é protagonista e testemunha viva de um período da arte do século XX que, após o expressionismo abstrato, provocou as rupturas que até hoje pautam o pensamento contemporâneo.

 

Nas pinturas de Jasper Johns figuram símbolos populares e, ao mesmo tempo, constituem um aglomerado de pigmento ou cera movimentado pelo gesto do artista, resultando em trabalhos em que os desenhos parecem saltar para fora das telas. Em suas gravuras, “as variações de cor e os modos de impressão combinados a partir de cada conjunto de matrizes deixam claro que o que vemos ao final são figuras e, também, são camadas de material pictórico manipulável como parte de uma experiência artística”, explica Paulo Miyada, coordenador do Núcleo de Pesquisa e Curadoria do Instituto Tomie Ohtake.

 

“A melhor crítica de uma figura é outra figura”, dizia Johns. Há 50 anos, Tatyana Grosman, fundadora da ULAE, o convidou a produzir litografias, pois apostava que a técnica poderia acrescentar outra dimensão à sua obra, que evoca figura e procedimento. O conjunto de trabalhos reunido nesta exposição atesta o que a editora vislumbrava nos anos iniciais da carreira do artista. O artista vive e trabalha em Nova York.

 

De 19 de junho a 26 de agosto.

ARTISTAS BRASILEIROS NA ITÁLIA

14/jun

Tendo como pano de fundo a vasta parceria que ensejou o deslocamento de artistas brasileiros para aperfeiçoamento em algumas das mais importantes instituições de ensino artístico da Itália,  ao longo de três séculos, o Museu Nacional de Belas Artes, Centro, Rio de Janeiro, RJ, criou e inaugura a exposição “Artistas brasileiros na Itália”. Elaborada a partir da coleção singular de arte brasileira do Museu Nacional de Belas Artes, a mostra proporciona uma fruição e reflexão a respeito do fazer artístico do oitocentos, do século XX, chegando ao contemporâneo, a partir de experiências estéticas vivenciadas por um seleto grupo de artistas que assimilaram a cultura italiana na construção de seu legado artístico.

 

Por trás deste cenário –  são cinco salas expositivas com cerca de 97 obras, entre pinturas, esculturas, desenhos  e gravuras -, encontra-se em exibição trabalhos de 38 artistas,  cujo recorte de sua  produção, selecionada pelos curadores,  oferece uma análise sobre a atração que um centro de referência artística como Ia tália exerceu, nos séculos XIX e XX sobre os artistas brasileiros;  passando pelos meandros da convivência entre a então Academia Imperial de Belas Artes (cujo acervo foi herdado pelo MNBA) e instituições italianas como Academia San Lucca, em Roma, ou com os ateliês particulares, aqui pontuando os de Minardi e Cansoni.

 

Outra questão desenvolvida na exposição “Artistas brasileiros na Itália” abrange as premiações, enfocando o universo dos prêmios de viagem que os artistas recebiam para aprimorar estudos em Roma, um forte centro formador de arte no século XIX,  eixo que, contudo, migrou para Paris no início do século seguinte.

 

A mostra reúne nomes consagrados como Vitor Meireles, Agostinho da Mota, Zeferino da Costa, Rodolfo Bernardelli, Pancetti, Carlos Oswald, Bruno Giorgi, Maria Bonomi,  Iberê Camargo e Darel, dentre outros.

 

O evento comemora os fortes vínculos artísticos e culturais entre os dois países,  dentro do “Momento Itália-Brasil” e a Data Nacional da República da Itália, em 2 de junho. A curadoria é de Monica Xexéo, Daniel barreto, Pedro Xexéo e Laura Abreu.

 

De 18 de junho a 05 de agosto.

PINTURAS CEGAS DE TOMIE OHTAKE

Tomie Ohtake

A Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, RS, apresenta em seu 4º andar, a exposição “Pinturas cegas”, individual de Tomie Ohtake. Realizadas entre 1959 e 1962, as pinturas cegas de Tomie Ohtake compõem um grupo de obras criadas com os olhos vendados. Apesar da riqueza de sentidos que as pinturas emanam, foi só em 2011 que elas receberam um olhar atento para então se tornarem objeto de exposição particular. Assim, a Fundação Iberê Camargo apresenta em seu espaço expositivo este conjunto pouco antes visto, mostrando uma faceta peculiar do trabalho de Tomie Ohtake.

 

As cerca de 30 obras que a Fundação Iberê Camargo agora exibe, representam a experiência de imersão da artista em questões que se estabelecem entre luz e sombra, presença e falta. Sua produção se deu na tentativa de ajustar o olhar ao ponto cego (região no campo visual do disco ótico no qual a visão entra em colapso), e dialogar com o acaso e a intencionalidade. Na cegueira, ela buscou o fazer através do não-ver, materializando pictoricamente questões de profundidade e transparência.

 

Pode-se reconhecer nas pinturas cegas, além do dinamismo, a presença de elementos constantes ao longo de toda a produção posterior da artista, como o seu diálogo com o tempo, a importância do gesto e certa tensão em relação ao espaço.

 

Tomie Ohtake nasceu em 1913, na cidade de Kyoto, no Japão. Ao visitar um irmão no Brasil, em 1936, ela foi impedida de retornar ao país devido à Guerra do Pacífico. Estabelecida em território brasileiro, Tomie começa a pintar, já por volta dos 40 anos, por influência do artista japonês Keiya Sugano. Aos 50, sua carreira já era reconhecida e sua obra era difundida em diferentes países e cidades. Seu currículo contabiliza mais de 90 exposições individuais e participações em mais de 20 bienais internacionais ao redor do mundo.

 

 

Texto do curador Paulo Herkenhoff:

 

Existe uma região no campo visual do disco ótico no qual a visão entra em colapso, o ponto cego – punctum cecum – também chamado de escotoma fisiológico. No início da década de 1960, Tomie Ohtake confrontou sua pintura com questões óticas e oftalmológicas para discutir o estatuto de seu saber pictórico ao vedar os olhos para pintar. Era como se buscasse ajustar seu olhar ao ponto cego e a partir dele se engajar na experiência. A essas obras denominamos, conforme o testemunho da artista sobre seus procedimentos e método de trabalho, de “pinturas cegas”, feitas sob um estado de não-ver.

 

Esta série forma um corpus estimado em pouco mais de trinta telas, uma singularidade na história da arte brasileira. Na época em que foram produzidas, de 1959 a 1962, artistas como Willys de Castro e Mira Schendel interessaram-se pela experiência de Ohtake. Malgrado sua importância intelectual, o conjunto permanece desconhecido pelo grande público e ignorado mesmo por segmentos da historiografia, posto que até aqui só mereceu referência em textos dedicados a outras questões da obra de Ohtake, mormente o substrato espiritual em sua pintura.

 

No final da década de 1950, o crítico de arte Mário Pedrosa retorna ao Brasil, depois de passar um largo período no Japão em processo de pesquisa de sua história da arte, buscando estabelecer um diálogo com a produção contemporânea ocidental de então. Quando chega ao País, passa a propor e a reivindicar que os artistas brasileiros, de origem nipônica ou não, dessem maior atenção a certos aspectos da cultura japonesa: a caligrafia, a pintura sumi, a arquitetura, o espírito Zen, entre outras questões. Pedrosa também volta sua atenção para alguns nomes de origem japonesa, como Tomie Ohtake.

 

Em sua obra, contudo, Ohtake não reduz sua pincelada à relação formal com a pincelada de escritura ideogramática. Ela desloca a questão para uma relação entre valores e procedimentos Zen e a concepção do signo pictórico em seu processo de constituição de linguagem. Por isso, as vendas nos olhos tinham o sentido de realizar uma ação pictórica no limite da percepção. O pincel não buscava demarcar território ou produzir a figuração possível. Tratava-se da pura experiência da passagem do tempo no processo Zen. A pintura de Ohtake nos submete a um paradoxo poético, é simultaneamente produção de linguagem e de conhecimento, experiência do não saber e da intuição.

 

De 14 de junho a 12 de agosto.

GOELDI: SOMBRIA LUZ

13/jun

 

O Museu de Arte Moderna, MAM-SP, Parque do Ibirapuera, São Paulo, SP, apresenta “Goeldi, Sombria luz”, exposição dedicada à obra de um dos expoentes máximos da corrente expressionista no Brasil, Oswaldo Goeldi. Com cerca de 200 trabalhos, entre gravuras originais e desenhos produzidos dos anos 1920 até sua morte, a retrospectiva inédita mostra a visão obscura do maior gravurista do país e sua veia expressionista, trazida da capital suíça onde passou sua juventude e infância. Paralela à exposição, está em cartaz também no MAM, “O ateliê de Goeldi”, que remonta seu espaço de criação no Leblon, Rio de Janeiro, RJ, exibindo instrumentos de trabalho e objetos pessoais sob a organização de Lani Goeldi, sobrinha-neta do artista, além de documentos, cartas, fotografias e uma prensa . Meio século depois de ter sido encontrado morto no quarto onde morava de favor no bairro do Leblon, esta é a maior retrospectiva já realizada de sua obra. A curadoria é de Paulo Venâncio Filho.

 

Criados a partir da década de 20, quando a produção do gravador atingiu a maturidade, os trabalhos foram arranjados por afinidade temática e plástica. O percurso leva o visitante a uma trajetória em zigue-zague, passando por cruzamentos e becos, temas comuns no universo sombrio de Goeldi. “A intenção foi criar uma exposição que não tivesse começo ou fim definidos”, diz o curador. Predominam as xilogravuras de alto contraste, com atmosfera marginal e melancólica na qual a luz luta para ganhar seu espaço. Sobressaem ainda os exemplares do início dos anos 30, época em que o artista começou a explorar a cor, e a sessão dedicada ao mar e aos pescadores.

 

“Um europeu sentimental exilado”, como ele mesmo se definia, Goeldi era filho do cientista Emílio Augusto Goeldi. Cresceu e começou sua carreira na Suíça. Ao voltar para o Rio, em 1919, recusou a euforia artística do período entreguerras. Chegou a ilustrar revistas e livros, como a “Obra Completa”, de Fiódor Dostoievski, publicada pela Editora José Olympio em 1937. Foi ainda professor na Escolinha de Arte do Brasil e na Escola Nacional de Belas Artes, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ali abriu uma oficina de xilogravura, que mais tarde deu origem ao curso de graduação em gravura da instituição.

 

De 15 de junho a 19 de agosto.

 

RETROSPECTIVA DE IONE SALDANHA

A Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, RS, apresenta no atrio e em seu 3º andar, a exposição “Ione Saldanha: o tempo e a cor”, retrospectiva da artista que, “situando-se no limiar entre o moderno e o contemporâneo, encontrou sobretudo na cor o lirismo de sua expressão artística”. Com este caráter panorâmico sobre a produção da artista, a exposição apresenta desde suas figuras e fachadas dos anos 1940 e 1950 até o amadurecimento do uso da cor em sua obra, passando pelas aproximações construtivas que inspiraram seu trabalho. “Ione Saldanha: o tempo e a cor” apresenta obras em suportes tradicionais e experimentais, lançando um olhar amplo sobre trajetória da artista. As décadas de 1960 e 1980 ganham foco por tratarem-se de períodos em que a produção de Ione atingiu uma poética madura e particular, materializada pelo uso sensível da cor. A curadoria é de Luiz Camillo Osório.

 

Nascida em Alegrete, no Rio Grande do Sul, em 1919, Ione ainda criança viu a família envolvida no movimento de 1923, que marcou a história do estado pelo conflito entre chimangos e maragatos. Devido às ligações políticas, o pai da artista integrou o governo de Getúlio Vargas em 1930, o que determinou a ida da famíçia para o Rio de Janeiro – cidade onde Ione Saldanha residiu até seu falecimento, em 2001. O flerte com a arte se deu desde cedo, através dos primeiros estudos com Pedro Corrêa de Araújo e das viagens a Florença e Paris para realizar cursos de afresco. Durante os anos 1950 e 1960, participou de exposições em diversas cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Santiago do Chile, Roma, Berna e Houston. No início de sua trajetória, as obras são marcadas por um figurativismo de cores escuras que aos poucos deram lugar à geometria lírica, conferindo também outro ritmo cromático para as pinturas. O protagonismo da cor, do pigmento, vai assumindo diferentes faces no decorrer do desenvolvimento da poética da artista.

 

Foi no ano de 1968 que ela expôs pela primeira vez os característicos bambus e ripas pintadas. A partir do uso de suportes experimentais, Ione incorporou algumas das características da contemporaneidade para dentro de sua produção, sem distanciar-se de certo caráter formal do concretismo e do uso da cor. Transitou, assim, entre o moderno e o contemporâneo, como bem observou o curador Luiz Camillo Osório.

 

Texto do curador Luiz Camillo Osório:

 

A obra da artista Ione Saldanha segue ainda desconhecida do grande público e à margem da história da arte brasileira recente. Nascida em Alegrete no Rio Grande do Sul, mas tendo vivido grande parte de sua vida no Rio de Janeiro, teve sua formação marcada pela sensibilidade cromática de Volpi e pela desconstrução figurativa de Vieira da Silva. Passados dez anos de sua morte, está na hora de rever seu percurso artístico.

 

A exposição, tendo caráter retrospectivo, procurará realizar um recorte panorâmico em sua trajetória, desde suas figuras e fachadas das décadas de 1940 e 1950, desdobrando-se pelo flerte construtivo no começo da década seguinte, até sua grande aventura de liberação da cor do final dos anos 1960 até a década de 1990.

 

Sua obra consegue combinar o rigor formal da tradição concreta com a experimentação constante de novos materiais e suportes, sem abrir mão, entretanto, da dimensão lírica da cor. Trata-se, portanto, de uma artista que viveu de dentro a passagem do período moderno para o contemporâneo.

 

Apesar da concentração nas décadas de 1960 e 1980, quando sua obra atinge maturidade poética, procuraremos nesta exposição traçar o seu desenvolvimento desde a década de 1940, mostrando seu período formativo e a longa maturação de sua sensibilidade para a cor. Combinando desenhos, estudos, pinturas e a experimentação com os mais variados suportes – ripas, bambus, bobinas e empilhados. Sua obra está presente nas principais instituições e coleções brasileiras, predominantemente no Rio de Janeiro e em São Paulo.

 

De 14 de junho 12 de agosto.

UMA NOVA LEITURA DE IBERÊ CAMARGO

12/jun

Convite da exposição

A Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, RS, exibe em seu 2º andar, a exposição “O “outro” na pintura de Iberê Camargo”. O “outro” na pintura de Iberê Camargo apresenta ao público visitante a alteridade na produção do artista. Propõe-se uma desconstrução do estereótipo do excesso e da tonalidade sombria que cerca a produção de Iberê, ao mostrar que sob o “caos” pictórico está a ordem construtiva deste processo. Entre os momentos em que  configura-se este outro, a curadora Maria Alice Milliet destaca as vielas de Santa Tereza, os objetos alinhados sobre a mesa, o raio de sol sobre a parede do ateliê. A ideia da duplicidade já habitava os pensamentos de Iberê Camargo. No mês em que faleceu, março de 1994, o artista escreveu o conto “O duplo”, em que narra em primeira pessoa uma perseguição protagonizada pelo  outro.  Assim, ele constatou seu próprio medo em encarar-se: “Falta-me coragem para ver o outro que vive fora de mim”, termina a pequena história.

Procurar o não visível na obra de Iberê se torna um desafio proposto pela exposição, que tem como fio condutor as afinidades que o artista desenvolveu durante a vida e que se apresentam em sua produção.  O conjunto contempla 69 obras e é guiado por estas diferentes formas de proximidade. A pintura metafísica de Giorgio de Chirico e a construção geométrica de André Lhote exemplificam estas similaridades, mas foi com a obra de Giorgio Morandi que Iberê estabeleceu um íntimo diálogo. Esta relação afinada se construiu a partir de gravuras e pinturas nas quais Iberê apresentou objetos comuns de maneira solene, valorizando processos pessoais e sensoriais na produção artística. Apropriar-se de um olhar diferente para a pintura de Iberê é a provocação lançada na exposição.

 

De 14 de junho de 2012 a 10 de março de 2013.

 

“O duplo”, um conto de Iberê Camargo

Sentado num dos primeiros bancos do ônibus número 15, Praça São Salvador–Rio Comprido, vejo surpreso, e logo com crescente espanto, minha imagem refletida no retrovisor, com traje e movimentos que não são meus. Para afastar a possibilidade de uma alucinação, faço, como prova, exaustivos gestos propositadamente exagerados, que a imagem refletida não repete.

– Um sósia? Mas esse é semelhante, jamais idêntico.

Meu desassossego, meu espanto crescem.

O outro, com roupa e movimentos diferentes, permanece tranquilo, impassível, alheio à minha presença e parece nem se importar em ser réplica.

– Ele não me terá visto? Impossível, estamos próximos. Ele talvez ocupe um assento à minha frente. Não sei.

A ideia do indivíduo de ser dois apavora.

Já agora preso de um terror incontrolável, soo a campainha do coletivo e desço precipitado, sem olhar para trás, sem sequer ousar localizá-lo: falta-me coragem para ver o outro que vive fora de mim.